Sistema de registro de preços: o que é e quais são as hipóteses de cabimento?
I. Do que se trata o Sistema de Registro de Preços?
O Sistema de Registro de Preços (SRP) é um instrumento utilizado pela Administração Pública para registrar o preço de produtos e serviços que poderão ser contratados, no futuro, durante a vigência de um determinado período. Em termos práticos, o SRP não se trata de uma modalidade licitatória, mas de um conjunto de procedimentos (artigo 78, IV, da Nova Lei de Licitações) que auxilia a Administração Pública a formalizar um pré-contrato, na forma de uma Ata de Registro de Preços. O SRP permite, portanto, uma expectativa de contratação, sem, contudo, obrigar a Administração a contratar (Artigo 82 da Nova Lei de Licitações).
Na Ata de Registro de Preços serão registrados o objeto, os preços, os fornecedores, os órgãos participantes e as condições a serem praticadas. O prazo de vigência da Ata de Registro de Preços será de 1 (um) ano e poderá ser prorrogado, por igual período, desde que comprovado o preço vantajoso (artigo 84 da Nova Lei de Licitações).
Trata-se, portanto, de um sistema que possui o objetivo de simplificar e agilizar o processo de aquisição de bens e serviços, evitando que a Administração realize sucessivas licitações para compras de um mesmo produto. Por meio desse procedimento, o particular deverá fornecer determinados bens ou prestar serviços durante período de vigência da Ata, sob demanda da Administração, a partir de preços definidos na licitação ou na contratação direta.
Imagine-se uma hipótese em que a prefeitura de determinado município necessita comprar cadeiras para as escolas, mas, por alguma circunstância técnica, como a inexatidão quanto ao número de alunos matriculados naquele ano, desconhece a quantidade exata que precisará. Nesse caso, a municipalidade pode adotar o Sistema de Registro de Preços. Caso a demanda exceda o estimado para a primeira compra, a prefeitura pode utilizar, ainda, se dentro do período de vigência, a Ata de Registro de Preços para adquirir um novo lote, sem a necessidade de realizar um novo procedimento licitatório.
Assim, mediante a utilização do Sistema de Registro de Preços (SRP), a Administração Pública poderá lançar uma licitação e receber propostas provenientes de particulares interessados, cabendo-lhe escolher aquela mais vantajosa. Contudo, diferentemente da maioria dos processos licitatórios, em que a Administração busca a contratação imediata, o SRP, como regra, visa formalizar os parâmetros para uma contratação futura.
Vale destacar que o SRP poderá ser compartilhado entre diversos órgãos e entidades públicas. Em uma mesma Ata de Registro de Preços, poderão ser contemplados mais de um órgão ou entidade públicos como beneficiários, que tiverem o interesse na aquisição do mesmo objeto. Isso garante uma economia em escala, visto que diversos órgãos poderão adquirir em conjunto produtos e serviços por meio da mesma Ata de Registro de Preços, reduzindo custos operacionais e o número de licitações. No exemplo acima citado, no qual a prefeitura utiliza-se do Registro de Preços para a compra futura de cadeiras para escolas do município, outros órgãos ou entidades interessados no mesmo objeto poderiam também compartilhar a Ata de Registro de Preços.
II. Quais as hipóteses de cabimento do Sistema de Registro de Preços?
De modo geral, o SRP é um procedimento cabível diante de circunstâncias em que (Art. 3°, Decreto Nº 7.892/2013):
a) há a necessidade de contratações frequentes;
b) há interesse no parcelamento de fornecimentos ou na remuneração de serviços por unidade de medida ou em regime de tarefa;
c) diversos órgãos ou entidades possuem interesse comum em contratar o mesmo objeto (compras compartilhadas); ou
d) o quantitativo do objeto é inexato.
A hipótese descrita na alínea “a” é a situação clássica e originária em que o SRP é aplicado. Trata-se de bens e serviços que o Poder Público necessitará corriqueiramente, mas em quantidades variáveis. Já as hipóteses das alíneas “b”, “c” e “d” vêm sendo cada vez mais frequentes e denotam situações em que a Administração possui uma demanda imediata, não sendo necessariamente um caso de contratação futura. Diante de alguma dessas hipóteses, portanto, a Administração Pública assinará uma Ata de Registro de Preços, e, sempre que houver necessidade, durante a vigência dessa Ata, contratará o particular detentor da melhor proposta, conforme a classificação formalizada no documento.
Por fim, vale destacar que o SRP não é aplicável a todas as modalidades de contratação. A Nova Lei de Licitações estabelece duas modalidades licitatórias em que o SRP poderá ser aplicado: no pregão ou na concorrência (artigo 6º, XLV), mediante registro formal de preços relativos à prestação de serviços, a obras e à aquisição e locação de bens para contratações futuras. Ainda, é possível que o procedimento seja utilizado em hipóteses de contratação direta, qual seja, nas hipóteses de inexigibilidade e de dispensa de licitação, para a aquisição de bens ou para a contratação de serviços por mais de um órgão ou entidade (artigo 82, §6 da Nova Lei de Licitações).
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Read MoreO procedimento de adjudicação e de homologação: lei e jurisprudência
I. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Quando todas as demais fases da licitação são encerradas, o certame seguirá para as suas etapas derradeiras. Nesse momento, a autoridade estatal competente estudará quais atitudes deverá tomar para finalizar (ou não) a licitação: poderá (i) declarar vencedor um ou mais licitantes, (ii) anular completamente o processo contratual ou (iii) determinar a sua reestruturação em resposta à constatação de algum vício. Neste texto, serão explicadas as fases de adjudicação e homologação, nome dado às fases que compõem o primeiro dos estágios acima descritos , as quais são reguladas pelo artigo 71, inciso IV, da Lei Federal no 14.133/2021.
A referida norma é clara em dispor que, encerrada as fases competitivas do procedimento licitatório (após o julgamento e a habilitação), e estando o vencedor em plenas condições de se tornar contratante junto à Administração, será realizada uma última deliberação, desta vez pela autoridade superior competente.
Antes da Lei nº 14.133/2021, a adjudicação era realizada pelo pregoeiro ou pela comissão de licitação, sendo o procedimento homologado, posteriormente, pela autoridade superior. Com a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos – NLLCA, porém, essas fases foram reunidas em uma só, sendo praticadas pela mesma autoridade superior, o que agiliza o processo de conclusão do procedimento licitatório.
Frise-se que somente é possível seguir para as etapas de adjudicação e homologação após o encerramento das fases de julgamento e habilitação, se não houver irregularidades a serem corrigidas ou irregularidades insanáveis no procedimento, e somente depois de serem exauridos os recursos administrativos cabíveis.
Pois bem, “adjudicar”, no contexto de uma licitação, é o ato administrativo que declara oficialmente que determinada empresa foi a vencedora do certame, ou seja, que identifica e declara qual das licitantes foi a proponente da melhor proposta, nos termos do edital. A adjudicação estabelece um vínculo jurídico entre a Administração e a licitante vencedora, pois representa o ato formal indicativo de que é com determinada empresa que a Administração contratará a execução do objeto licitado.
Há, portanto, uma continuidade lógica entre os atos: uma vez adjudicado o objeto, será possível à mesma autoridade superior homologar a licitação e finalizá-la.
Ao “homologar” a licitação, por sua vez, a autoridade superior formaliza e explicita que o procedimento licitatório está apto a ser finalizado, ou seja, que não foi identificada nenhuma irregularidade insanável. Em regra, a homologação significa:
- Que o edital respeitou os princípios da licitação pública, tendo sido garantida a competitividade do certame;
- Que as propostas foram apresentadas adequadamente, tendo sido julgadas conforme os critérios previamente definidos em edital e com base nos interesses da Administração Pública;
- Que a empresa vencedora foi devidamente habilitada, tendo apresentado todos os documentos e cumprido com todos os critérios necessários para que a futura execução do contrato seja regular e;
- Que todos os recursos interpostos foram julgados de forma imparcial.
A adjudicação, por outro lado, é um ato meramente declaratório, não devendo ser confundido com a etapa solene de assinatura do contrato, momento em que o vencedor será convidado para fechar o negócio.
Mesmo sendo um ato de caráter declaratório, é importante frisar que a adjudicação é ato vinculado às hipóteses do citado art. 71 da NLLCA. Isto significa que não será possibilitado à Administração, por mera liberalidade, deixar de adjudicar o objeto da licitação ao vencedor da licitação, haja vista que as hipóteses de não conclusão do negócio estão explicitamente previstas naquele dispositivo, seja pelo retorno dos autos para saneamento de irregularidades, seja pela revogação ou anulação do certame.
A adjudicação, portanto, faz surgir para o Estado verdadeiro dever de contratar o objeto exclusivamente com o(s) particular(es) adjudicado(s). Para o vencedor da licitação, por sua vez, surgem as obrigações de: (i) sujeitar-se às penalidades, se for o caso, e aos prazos estabelecidos para assinatura do contrato; e (ii) contratar e executar o objeto nos termos do edital.
II. PROCEDIMENTO
O licitante vencedor, de acordo com o art. 90 da Lei Federal nº 14.133/2021, será convocado para a assinatura do contrato no prazo preestabelecido no edital, sob pena de decair o seu direito de contratação, além de responder pelas penalidades previstas em Lei. O § 1o do art. 90 da mesma lei permite a prorrogação do prazo uma única vez (por igual prazo), desde que o adjudicatário fundamente seu pedido, e com ele concorde a Administração.
A não assinatura do contrato na data estabelecida, quando para isso convocado, tornará o adjudicatário totalmente inadimplente da obrigação, perdendo todas as eventuais garantias ofertadas em favor do órgão ou entidade licitante (Art. 90, § 5o). Nesse caso, a Administração poderá (facultativamente) convocar os demais licitantes em ordem de classificação para, nos mesmos termos da proposta do vencedor-recusante, celebrarem o contrato (Art. 90, § 2o).
Caso nenhum dos licitantes aceite cumprir o encargo nos mesmos termos do vencedor, será facultado à Administração convocar todos os competidores, em ordem de classificação, para uma etapa de negociações com o objetivo de obter o melhor preço, mesmo que este seja superior ao do vencedor (Art. 90, § 4o, I), ou, frustrada a barganha, adjudicar e celebrar o contrato com a melhor proposta remanescente (Art. 90, § 4o, II).
III. JURISPRUDÊNCIA
Por fim, destacam-se abaixo alguns temas que vêm sendo enfrentados pelo Tribunal de Contas da União em impugnações de atos realizados durante a fase habilitatória. Sobre os precedentes trazidos, cumpre ressaltar que, mesmo que eles sejam anteriores à vigência da NLLCA, tais julgados adotam entendimentos que devem permanecer válidos, pois dizem respeito a normas que não sofreram alterações substanciais com o advento da Nova Lei.
Diligências de saneamento de dúvidas
Destaca-se que, nos termos da jurisprudência do TCU, as diligências que tenham por objetivo eventual saneamento de dúvidas, como dúvidas relativas à capacidade técnica, devem ser realizadas, preferencialmente, de forma prévia à execução dos atos de homologação e adjudicação do objeto da licitação, conforme dispõe o Acórdão 5857/2009 da Primeira Câmara do TCU.
Vedação à homologação antes do fim do prazo para interposição de recurso
A homologação de licitação antes de esgotado o prazo para interposição de recurso é considerada uma irregularidade grave a ser atribuída à autoridade que homologou o certame, e não aos membros da comissão de licitação, nos termos do Acórdão 1520/2013 do Plenário do TCU.
Publicação na imprensa oficial
O TCU consolidou o entendimento de que é condição indispensável para a eficácia legal do contrato a publicação resumida de seu termo (extrato) na imprensa oficial, na forma do art. 61, parágrafo único, da Lei 8.666/1993, o que não seria suprido com a publicação dos termos de homologação e/ou adjudicação da licitação, conforme traz o Acórdão 1277/2009 do Plenário.
Com o advento da NLLCA, porém, tem-se o art. 94 dispondo que a divulgação no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP) é condição indispensável para a eficácia do contrato e seus aditamentos, não mais havendo necessidade de publicação na imprensa oficial.
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Read MoreÉ possível cobrar alimentos durante a gestação?
O ordenamento jurídico brasileiro reconhece como dever da família, do Estado e da sociedade assegurar à criança, ao jovem e ao adolescente, o direito e a proteção à vida, à saúde, à alimentação, à dignidade e à convivência familiar. Resguarda, ainda, desde a concepção, os direitos do nascituro, estendendo a estes o direito à prestação de alimentos.
Diante deste cenário, foi promulgada a Lei 11.804/2008, cujo objetivo principal foi regulamentar o direito de alimentos da mulher gestante, popularmente conhecido como “alimentos gravídicos”, garantindo a proteção do estado gestacional e possibilitando o desenvolvimento com dignidade e segurança do nascituro.
O que são alimentos gravídicos?
A Lei 11.804/2008 dispõe, em seu art. 2º, caput, que os alimentos gravídicos são entendidos como os valores suficientes para cobrir as despesas do período de gravidez e da concepção ao parto.
Portanto, os alimentos gravídicos são valores pagos à mulher gestante, com o objetivo de garantir o amparo financeiro ao nascituro, auxiliando nas despesas comuns durante o período gestacional.
Qual o valor dos alimentos gravídicos e o que eles cobrem?
Os alimentos gravídicos atuam como “subsídios gestacionais”, não cobrindo apenas os alimentos, isto é, os recursos necessários à subsistência e à preservação da vida, como também os gastos com assistência médica e psicológica, exames complementares, enxoval, internações, parto, medicamentos e demais prescrições preventivas e terapêuticas que o médico ou o juízo entendam como pertinentes.
O valor é fixado com base nas necessidades do nascituro e nas possibilidades financeiras do genitor (ou possível genitor). Assim, não há um valor fixo ou predeterminado, variando de acordo com as peculiaridades de cada caso concreto.
Quem tem direito ao recebimento dos alimentos gravídicos?
Entende-se que toda mulher grávida é legitimada a propor ação de alimentos gravídicos, pleiteando a necessidade de auxílio financeiro do (possível) genitor da criança, uma vez que ambos são responsáveis pelos custos da gestação do bebê.
Quem é o responsável pelo pagamento dos alimentos gravídicos?
Os alimentos gravídicos devem ser custeados pelo provável genitor. Nas uniões homoafetivas, em que o nascituro é concebido por técnicas de reprodução assistida, entende-se que também é cabível a prestação de alimentos gravídicos, sendo assim, custeados pelo futuro pai ou mãe.
Em regra, a obrigação alimentar é de responsabilidade dos genitores. No entanto, caso seja comprovada a total incapacidade financeira do genitor ou genitora para custear as despesas durante a gestação, a obrigação poderá ser transmitida aos avós paternos e maternos, de maneira subsidiária. Isso ocorre porque a obrigação de pagar alimentos se estende a todos os ascendentes, conforme determina a legislação civil.
Como conseguir tal direito?
Na hipótese das partes envolvidas não estarem de acordo com a fixação dos alimentos gravídicos ou com o quantum a ser fixado, é necessário que a gestante ingresse com uma ação judicial solicitando a fixação pelo juízo.
Caso as partes estejam de acordo com o valor e a forma a ser fixada, é bastante importante que se realize a minuta deste acordo e, posteriormente, busque a homologação pelo juízo. Isso garante que, em caso de inadimplemento dos valores por parte do genitor/genitora, a gestante possa cobrar os valores em atraso judicialmente.
Quais são os documentos necessários para propor a ação?
Para propor a ação não é preciso haver comprovação de casamento ou união estável, basta que a gestante reúna provas do relacionamento ou envolvimento amoroso, da gravidez decorrente e das despesas geradas em razão do período gestacional.
Além disso, é necessária a apresentação de indícios que apontem e comprovem a paternidade, tais como fotos, testemunhas e mensagens no celular, sendo cada vez mais frequente a aceitação de mensagens trocadas entre as partes via aplicativo de mensagens.
Após o nascimento da criança, o que muda?
Os alimentos gravídicos devem ser pagos até o nascimento da criança e, após o nascimento, devem ser automaticamente convertidos em pensão alimentícia em favor do recém-nascido, estabelecida de acordo com o binômio possibilidade-necessidade.
O que ocorre caso o pagante dos alimentos gravídicos não seja o verdadeiro pai?
O Código Civil entende que os alimentos pagos são insuscetíveis de cessão, compensação ou penhora. Isso significa que, em regra, os valores pagos à título de alimentos, não podem ser devolvidos. Assim, não há o que se falar de reembolso dos valores depositados à título de alimentos.
Na hipótese de se conseguir comprovar, de maneira inequívoca, que a gestante agiu dolosamente, isto é, que tinha conhecimento de que o pagante não era o genitor e, mesmo assim, ingressou com a ação requerendo a fixação dos alimentos em desfavor deste, o pagante poderá ingressar com uma ação requerendo a devolução dos valores indevidamente pagos e, a depender do caso, até a compensação pelos danos morais sofridos.
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Read MoreAnálise de documentação de concorrentes e os problemas mais comuns que levam à desclassificação de licitantes
I. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A análise de documentação de concorrentes pode definir a vitória de uma licitante, pois a partir dela é possível encontrar vícios que levem à inabilitação de outras licitantes ou à desclassificação de suas propostas. Portanto, é crucial que empresas que costumam participar de certames estejam atentas às principais hipóteses de inabilitação ou de desclassificação de propostas, bem como às discussões jurídicas ligadas aos temas.
Este artigo apresentará as hipóteses mais comuns de desclassificação de propostas de licitantes.
De início, vale rememorar a diferença entre inabilitação de licitantes e desclassificação de propostas.
A inabilitação diz respeito à própria pessoa da licitante, ou seja, características econômicas, financeiras, técnicas e/ou jurídicas que fazem com que a licitante não possa participar de determinado certame. Por seu turno, a desclassificação diz respeito à proposta apresentada pela licitante, ou seja, em que pese a licitante esteja habilitada a participar da licitação, a proposta ofertada é inadequada em relação aos critérios previstos em lei ou no edital.
Especificamente sobre a desclassificação, é válido ressaltar que a atividade de julgamento de propostas realizada pela Administração Pública acontece em dois momentos. No primeiro, são verificadas as regularidades formais e materiais das propostas apresentadas. No segundo momento, as propostas que preencheram os requisitos formais e materiais previstos no ato convocatório são comparadas por meio de critério pré-estabelecido no edital, como por exemplo, “julgamento pelo menor preço”. É justamente no “primeiro momento” da atividade de julgamento que podem ocorrer as desclassificações de propostas.
II. PROBLEMAS MAIS COMUNS QUE LEVAM À DESCLASSIFICAÇÃO DE PROPOSTAS DE LICITANTES
As hipóteses mais comuns que levam à desclassificação de propostas de licitantes podem ser resumidas da seguinte forma: (i) Propostas apresentadas com vícios insanáveis; (ii) Propostas em desconformidade com as especificações técnicas do edital; (iii) Propostas com valores inexequíveis; e (iv) Propostas com valor acima do orçamento estimado pela Administração.
II.1) Desclassificação de propostas com vícios insanáveis
As propostas com vícios insanáveis deverão ser desclassificadas pela Administração Pública.
A afirmação pode levar a uma dúvida bastante simples: como distinguir se um vício é sanável ou insanável? De modo geral, pode-se dizer que uma proposta contém um vício sanável quando pode ser repetida sem o vício. A leitura contrária, por conseguinte, leva à conclusão de que um vício é insanável quando não é passível de correção.
A indicação de exemplos práticos pode facilitar a compreensão.
Um exemplo de vício insanável seria o caso de licitante que deixa de indicar os custos de benefícios e despesas indiretas (BDI), afetando o valor total da proposta. Esse exemplo pode ser verificado em julgados recentes de Tribunais Estaduais [TJ-PR – AI: 00119583020218160000 Cascavel 0011958-30.2021.8.16.0000 (Acórdão), Relator: Rogerio Ribas, Data de Julgamento: 30/08/2021, 5ª Câmara Cível, Data de Publicação: 30/08/2021; TJ-RS – AI: 51694423420218217000 RS, Relator: Miguel Angelo da Silva, Data de Julgamento: 17/02/2022, Vigésima Segunda Câmara Cível, Data de Publicação: 23/02/2022].
Por outro lado, se determinada licitante simplesmente deixa de anexar à proposta o preenchimento de declaração sobre situação preexistente exigida em edital, pode-se estar diante de uma situação de vício sanável. Nesse caso, o vício será sanado com a simples anexação da declaração faltante.
A segunda pergunta que pode surgir é a seguinte: quando a licitante deverá corrigir o vício? Para responder esse questionamento é importante ressaltar que a proposta que contiver vício sanável não deve ser desclassificada de pronto pela Administração, que deverá possibilitar a correção do erro. A desclassificação, em caso de vício reconhecido como sanável, só ocorrerá caso a licitante não corrija o erro apontado pela Administração.
Inclusive, a Nova Lei de Licitações prevê que “a verificação da conformidade das propostas poderá ser feita exclusivamente em relação à proposta mais bem classificada” (art. 58, §1º). Com base nessa regra, é possível que a Administração avalie a conformidade da proposta da licitante melhor colocada no certame e, somente em caso de desclassificação desta, passe a analisar as demais propostas, em sequência.
Portanto, é absolutamente necessário que licitantes se atentem à conferência de inexistência de vícios insanáveis em suas propostas, bem como que estejam aptas a analisar se as propostas de seus concorrentes não possuem vícios dessa natureza.
II.2) Desclassificação de propostas que contenham desconformidade com as especificações técnicas do edital
As propostas que apresentem indicações de bens ou serviços em desconformidade com as especificações técnicas do edital também serão desclassificadas.
A administração pública, com a finalidade de analisar os detalhes técnicos das propostas, poderá exigir, dos licitantes provisoriamente vencedores do certame, a homologação de amostras de conformidade e prova de conceito.
Há distinção entre os conceitos de amostras e provas de conceito. As primeiras são relacionadas a bens padronizados, como por exemplo, “bens de prateleira”. As segundas, por seu turno, servem para os casos nos quais a Administração não busca apenas verificar as características do bem, mas sim testá-lo com a finalidade de confirmar se as funcionalidades indicadas pelo licitante realmente são cumpridas. A análise das amostras e provas de conceito será realizada com base em critérios objetivos previamente definidos em edital.
O artigo 42 da Nova Lei de Licitações, inclusive, prescreve meios de comprovação da qualidade do produto ofertado por licitante:
I – comprovação de que o produto está de acordo com as normas técnicas determinadas pelos órgãos oficiais competentes, pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) ou por outra entidade credenciada pelo Inmetro;
II – declaração de atendimento satisfatório emitida por outro órgão ou entidade de nível federativo equivalente ou superior que tenha adquirido o produto;
III – certificação, certificado, laudo laboratorial ou documento similar que possibilite a aferição da qualidade e da conformidade do produto ou do processo de fabricação, inclusive sob o aspecto ambiental, emitido por instituição oficial competente ou por entidade credenciada.
Nos casos de desclassificação por verificação de desconformidades com as especificações técnicas do edital, é possível também que haja parecer técnico elaborado pela administração pública. Os pareceres serão determinantes para a averiguação de conformidade da proposta com as exigências técnicas do edital, sendo esta uma tendência verificada na jurisprudência [TJ-SC – MS: 91522018720148240000 Capital 9152201-87.2014.8.24.0000, Relator: Sérgio Roberto Baasch Luz, Data de Julgamento: 11/05/2016, Grupo de Câmaras de Direito Público; TCE-MG – DEN: 862217, Relator: CONS. MAURI TORRES, Data de Julgamento: 22/08/2017, Data de Publicação: 31/08/2017].
Portanto, é relevante que as licitantes se atentem à adequação de suas propostas às exigências específicas do edital e, principalmente, à possibilidade de fornecer amostras ou provas de conceito adequadas – a depender das exigências editalícias.
II.3) Desclassificação de propostas que contenham preços inexequíveis.
As propostas tidas como inexequíveis são aquelas que não possuem condições de serem cumpridas, uma vez que trazem mais ônus do que vantagens ao licitante. Em outras palavras, os custos inerentes à execução do objeto são maiores do que os valores a serem pagos pela Administração Pública.
Alguém poderia questionar: mas não seria bom para a Administração Pública pagar um preço excessivamente baixo pelo fornecimento de bens ou pela execução de serviços? A resposta é negativa, pois propostas com preços inexequíveis, em regra, culminam no fornecimento de bens ou na prestação de serviços defeituosos, em obras com problemas estruturais e em objetos imprestáveis – circunstâncias que levam à rescisão de contratos, reparações e necessidade de novas licitações.
Em contratações de obras e serviços de engenharia, de acordo com a Nova Lei de Licitações, são consideradas como presumivelmente inexequíveis as propostas cujos valores sejam inferiores a 75% do valor orçado pela Administração Pública.
Feitas essas considerações é importante que se esclareça qual a postura esperada da Administração Pública nos casos de proposta com preços inexequíveis. Ao receber uma proposta com esse potencial vício, a Administração deve, em regra, diligenciar junto à licitante proponente sobre a inexequibilidade dos preços. Na prática, a licitante deve comprovar que, com os valores ofertados, poderá, ao menos, cobrir os seus custos.
O amplo contraditório junto à licitante, de acordo com a jurisprudência do TCU, é essencial à validade do ato administrativo de desclassificação da proposta tida como inexequível [Acórdão 1079/2017. Representação 006.046/2016-9. Data de julgamento: 24/05/2017. Relator Marcos Bemquerer; Acórdão 3092/2014. Representação nº 020.363/2014-1. Data de julgamento: 12/11/2014. Relator Bruno Dantas].
Em licitações do tipo pregão, também de acordo com a jurisprudência do TCU, apenas em situações extremas, quando os lances ofertados configurarem preços simbólicos, irrisórios ou de valor zero, gerando presunção absoluta de inexequibilidade, admite-se a exclusão de lance durante a etapa competitiva do pregão [Acórdão 674/2020. Representação nº 037.069/2019-5. Data de julgamento: 25/03/2020. Relator Walton Alencar Rodrigues].
Desse modo, é fundamental que as licitantes se certifiquem que, ainda que pretendam apresentar baixos valores, tenham como comprovar a exequibilidade de suas propostas, por meio da demonstração de baixos custos envolvidos com a execução do objeto contratual, por exemplo.
II.4) Desclassificação de propostas com valor acima do orçamento estimado pela Administração
A última hipótese comum de desclassificação de proposta diz respeito aos casos nos quais os preços ofertados permaneçam acima do orçamento estimado pela Administração Pública.
Na Lei nº 8.666/1993, há distinção entre “valor máximo” e “valor orçado”. Em razão disso, conforme a jurisprudência do TCU, aplicável à Lei nº 8.666/1993, a proposta só deveria ser desclassificada se ultrapassasse o valor máximo previsto em edital – ou quando o valor orçado fosse, por disposição expressa do edital, equivalente ao valor máximo [Acórdão nº 1549/2017. Representação nº 010.612/2016-5. Data de julgamento: 19/07/2017. Relator José Mucio Monteiro].
Entretanto, a Lei nº 14.133/2021, na mesma linha adotada pela Lei das Estatais (Lei nº 13.303/2016), realizou uma equivalência entre os conceitos de orçamento estimado e preço máximo, de modo que é vedado à Administração contratar por preço superior ao preço orçado.
Em razão disso, é relevante que as licitantes se atentem ao valor estimado pela Administração Pública no edital para que evitem o risco de apresentarem propostas com valores acima do orçado e, consequentemente, tenham suas propostas desclassificadas.
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Read MoreA manifestação de intenção de recurso na Lei nº 14.133/2021
Uma notável modificação no procedimento licitatório promovida pela Lei nº 14.133/2021 em relação à Lei nº 8.666/1993 foi a adoção, como regra geral (inclusive para a modalidade concorrência), do encadeamento de fases que já era previsto na Lei nº 10.520/2002 (Lei do Pregão), com a fase de julgamento das propostas, a fase de habilitação e, na sequência, a fase recursal una, na qual se debatem tanto as matérias relativas às propostas quanto as relativas à habilitação da licitante classificada em primeiro lugar.
Neste novo procedimento, a Lei nº 14.133/2021 estabeleceu a necessidade de que as licitantes manifestem, previamente à fase recursal, a intenção de recorrer contra eventual decisão, para poderem exercer esse direito. Esta regra também já era encontrada na Lei nº 10.520/2002, mas que não se aplicava às licitações na modalidade concorrência, regidas até então apenas pela Lei nº 8.666/1993.
No entanto, ainda que não seja novidade aos profissionais que já atuaram com pregão, a manifestação da intenção de recurso da Lei nº 14.133/2021 sofreu sensíveis alterações em relação ao previsto na Lei nº 10.520/2002.
A manifestação da intenção de recurso na Lei nº 14.133/2021
Para impugnar o julgamento de propostas ou a habilitação (ou inabilitação) de licitantes, os interessados devem antes manifestar a intenção de recorrer, o que deve ser feito imediatamente, sob pena de preclusão (isto é, a perda da capacidade de agir) dessa faculdade processual, conforme determina o art. 165, § 1º, inciso I, da Lei nº 14.133/2021.
O mesmo art. 165, § 1º, inciso I, da Lei nº 14.133/2021, apresenta, no entanto, uma redação ambígua, que leva a mais de uma interpretação possível sobre o marco inicial a ser considerado para a manifestação da intenção de recurso nas licitações.
Uma primeira interpretação possível é de que a manifestação deve ser feita imediatamente após o ato que se pretende impugnar, de forma que haveria, em tese, duas oportunidades para manifestação de intenção de recurso: a primeira, logo após o julgamento das propostas, e outra, logo após a fase de habilitação, observada ainda a possibilidade de inversão dessas fases (conforme art. 17, § 1º).
Essa era a lógica no Decreto nº 7.581/2011 (art. 53), que regulamentou o Regime Diferenciado de Contratação em âmbito federal (“Art. 53. Os licitantes que desejarem recorrer em face dos atos do julgamento da proposta ou da habilitação deverão manifestar imediatamente, após o término de cada sessão, a sua intenção de recorrer, sob pena de preclusão”).
A segunda interpretação dá continuidade à prática dos atuais pregões regidos pela Lei nº 10.520/2002 (esta que não impunha essa dificuldade hermenêutica), e infere que a manifestação de recurso também é realizada em apenas um único momento, logo após a declaração da licitante provisoriamente vencedora do certame, dando início à fase recursal (ou seja, apenas depois da fase de habilitação, ou, se adotada a inversão de fases do art. 17, § 1º, após o julgamento das propostas).
Essa segunda interpretação foi adotada em âmbito federal, por meio da Instrução Normativa SEGES/ME nº 73/2022, que regulamenta a Lei nº 14.133/2021:
Art. 40. Qualquer licitante poderá, durante o prazo concedido na sessão pública, não inferior a 10 minutos, de forma imediata após o término do julgamento das propostas e do ato de habilitação ou inabilitação, em campo próprio do sistema, manifestar sua intenção de recorrer, sob pena de preclusão, ficando a autoridade superior autorizada a adjudicar o objeto ao licitante declarado vencedor.
Assim, nas licitações promovidas com base na Lei nº 14.133/2021 no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional, a manifestação é realizada em apenas um único momento, logo após a declaração da licitante provisoriamente vencedora do certame.
Para os órgãos e entidades das demais esferas, cabe às licitantes a leitura atenta dos regulamentos próprios e dos editais de licitação, para que possam verificar como serão construídas as regras da fase recursal e em que momento deverá ser feita a manifestação da intenção de recurso em cada processo licitatório.
De qualquer forma, em ambas as hipóteses, evidentemente, o marco inicial para a manifestação de recurso conta da data de publicização ou intimação do ato, salvo se esta última ocorrer durante a própria sessão de licitação.
Ademais, diferentemente do que estabelece a Lei nº 10.520/2002, a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos não exige que as licitantes interessadas motivem a intenção de recurso. Em nosso entender, essa flexibilização é um avanço da legislação, uma vez que, não raramente, é possível encontrar certames nos quais os pregoeiros confundem a análise de existência de motivação com a análise do próprio mérito recursal, por vezes até rejeitando sumariamente a intenção de recurso sob a justificativa de que o futuro recurso seria ou deveria ser indeferido.
Pode-se supor, no entanto, que mesmo não havendo a imposição legal de motivação da intenção de recurso, não será difícil encontrar editais de licitação regidos pela Lei nº 14.133/2021 com essa exigência, sobretudo se forem aproveitadas as minutas elaboradas no antigo regime. Embora a imposição desta obrigação (motivar a intenção de recurso) nos editais da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos possa ser considerada como uma regra ilegal, é importante uma leitura atenta de cada instrumento convocatório para obter vantagem estratégica na competição.
A rejeição sumária da manifestação de intenção de recurso
Ainda que não haja mais necessidade de motivar a intenção de recorrer, é possível que o pregoeiro ou a comissão de licitação venham a rejeitar sumariamente a intenção de recurso, por entender, por exemplo, que essa manifestação não observou o prazo fixado em edital.
É evidente, no entanto, que as autoridades administrativas não estão isentas do cometimento de falhas e equívocos também em relação a este juízo de admissibilidade das manifestações de intenção de recurso. Neste cenário, como deve agir o licitante que eventualmente teve sua intenção de recurso sumariamente rejeitada? Entendemos que há mais de uma forma de provocar o órgão licitante para corrigir essa decisão.
De acordo com a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, o recurso hierárquico é cabível apenas nos casos elencados no inciso I do artigo 165, sendo o pedido de reconsideração o instrumento subsidiário, para os casos em que não é cabível o recurso hierárquico. Desta forma, uma possibilidade é a interposição de um pedido de reconsideração por parte da licitante, fundado no inciso II do artigo 165 da Lei nº 14.133/2021, dirigido ao próprio agente ou à comissão responsável pela condução do certame, no qual requer a admissão da manifestação de intenção de recurso, pelos fundamentos que entender adequados.
Esse pedido pode ser formalizado em documento próprio, logo após a cientificação da rejeição da intenção de recurso, ou mesmo imediatamente, na própria sessão de licitação – em sendo presencial a sessão, o pedido pode ser feito oralmente, com o devido registro em ata; sendo realizada virtualmente, o pedido pode ser formalizado por meio do chat ou outro meio que permita a comunicação com o órgão.
Outra possibilidade, que pode ser adotada tanto de forma autônoma quanto na hipótese de indeferimento do pedido de reconsideração, é a apresentação de um pedido de reforma da decisão que inadmitiu a intenção de recurso (e a consequente abertura do prazo recursal), com base no direito constitucional de petição (art. 5º, inciso XXXIV, alínea “a”, da Constituição Federal), dirigida à autoridade hierarquicamente superior ao pregoeiro ou à comissão de licitação.
Embora possuam pleno embasamento jurídico, a prática advocatícia mostra que essas duas formas de provocação da Administração têm suas chances de sucesso diminuídas se não forem julgadas de forma célere, conforme avança o processo licitatório para além da fase recursal.
Sendo assim, uma terceira forma de provocação do órgão licitante é a própria interposição do recurso administrativo, no prazo que seria conferido caso a manifestação da intenção de recurso tivesse sido aceita. Com efeito, nesta peça recursal a licitante pode incluir capítulo próprio para demonstrar as razões de fato e/ou de direito que demonstram a inadequação da rejeição sumária da intenção de recurso (isto é, as razões pelas quais a manifestação deveria ter sido admitida), com o consequente pedido de reforma da decisão e recebimento das razões recursais.
Essa última solução, que pode ser adotada de forma isolada ou cumulativamente com as demais, apresenta-se também como uma forma de compelir a Administração a analisar as razões de recurso da licitante e, assim, corrigir eventual ilegalidade ocorrida no processo. Isso porque, ainda que o órgão continue a entender que a manifestação de intenção de recurso não deveria ser admitida, estando diante de eventual ilegalidade na condução do certame, os gestores públicos têm o dever de corrigi-la.
Como se observa, são diversas as mudanças e inovações trazidas pela Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos e, assim, as empresas e profissionais que desejam entrar e/ou se manter no mercado de licitações públicas devem, necessariamente, buscar atualização sobre este novo e importante diploma legal. Acompanhe nosso site para ter acesso a mais conteúdo sobre licitações e, em caso de dúvidas, não deixe de contatar um dos nossos advogados especialistas na área.
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Read MoreA nova regulamentação da prescrição no TCU
Quem atua no mercado de contratações públicas sabe bem da importância de estar atento às diretrizes estabelecidas pelos Tribunais de Contas. Com a missão de contribuir para o aperfeiçoamento da Administração Pública, os Tribunais de Contas possuem, entre outras atribuições, a competência de fiscalizar os contratos administrativos e até mesmo de aplicar sanções caso constate a ocorrência de irregularidades. Diante disso, evidencia-se o papel de protagonismo assumido por essa instituição no ambiente de negócios com o Poder Público.
Nesse sentido, uma das principais questões a serem conhecidas sobre os Tribunais de Contas são os prazos prescricionais que delimitam a sua atuação. Isso porque, como se sabe, a fiscalização dos contratos e a aplicação de sanções não pode, em regra, se estender indefinidamente no tempo. Deve haver um limite temporal para que os Tribunais de Contas atuem e, ultrapassado esse limite, a adoção de qualquer medida voltada ao ressarcimento ou à aplicação de sanções será impedida pelo instituto da prescrição.
A ideia é que, assim, aqueles que mantêm relações com o Poder Público tenham o mínimo de segurança jurídica e previsibilidade, evitando, por exemplo, o risco de ser surpreendido com a aplicação de uma sanção relativa a uma situação ocorrida muitos anos antes, a respeito da qual, muitas vezes, sequer é possível se defender de modo minimamente adequado em razão do decurso do tempo.
Apesar disso, durante muitos anos, não havia clareza sobre quais eram os limites temporais para a atuação dos Tribunais de Contas, haja vista a inexistência de qualquer previsão legal expressa sobre isso. Para sanar esse problema, em 11 de outubro de 2022, o Tribunal de Contas da União (TCU) publicou a Resolução nº 344, em que se regulamenta a prescrição para a determinação de ressarcimento e a aplicação de sanções em processos de competência deste Tribunal.
A Resolução nº 344, de 11 de outubro de 2022, do TCU
Em síntese, a Resolução nº 344 do TCU reconhece que os prazos prescricionais dos processos em curso neste Tribunal devem observar as regras estabelecidas na Lei Federal nº 9.873/1999. Isso significa, na prática, que as pretensões para a aplicação de sanções e para a determinação de ressarcimento ao erário prescrevem, regra geral, no prazo de cinco anos, contados:
- Da data em que deveria ter ocorrido a prestação de contas, no caso de omissão em relação a esse dever;
- Da data em que a prestação de contas ao órgão competente efetivamente ocorreu;
- Do recebimento de denúncia ou representação pelo TCU ou pelos órgãos de controle interno, nos processos dessa natureza;
- Da data em que se tomou ciência de irregularidade ou dano, quando constatados em fiscalização do TCU, dos órgãos de controle interno ou dos próprios órgãos ou entidades em que ocorreram.
- Do dia em que tiver cessado a permanência ou a continuidade nas irregularidades dessa natureza.
Nada obstante, é possível que, em determinadas situações, esse prazo prescricional seja interrompido, isto é, que ele seja reiniciado. As situações previstas na regulamentação do TCU como marcos interruptivos são:
- Notificação, oitiva, citação ou audiência do responsável, inclusive por edital;
- Qualquer ato inequívoco de apuração do fato;
- Qualquer ato inequívoco de tentativa de solução conciliatória;
- Decisão condenatória recorrível.
Vale reiterar, nesse sentido, que a regulamentação não prevê um número máximo de interrupções na contagem do prazo, o que significa que, na ocorrência das hipóteses listadas acima, o prazo prescricional será sucessivamente reiniciado. Além disso, tratando-se de fatos coincidentes ou que possuam relação com a irregularidade ou dano apurado, mas que estejam em processos diversos, a incidência de marcos interruptivos pode ser aproveitada em ambos os processos.
Também é possível que, durante determinadas situações, o prazo prescricional seja suspenso e, após, retomado do momento em que parou. Segundo a regulamentação do TCU, os prazos prescricionais ficarão suspensos quando:
- Enquanto estiver vigente decisão judicial que determine a suspensão do processo, a paralisação da apuração do dano ou da irregularidade ou que obste a execução de condenação;
- Durante o sobrestamento do processo, desde que não tenha sido provocado pelo TCU, mas por fatos alheios a sua vontade, fundamentadamente demonstrados na decisão que determinar esse sobrestamento;
- Durante o prazo conferido pelo TCU para pagamento de dívida (art. 12, § 2º, da Lei nº 8.443/1992);
- Enquanto estiver ocorrendo o parcelamento de valores ou o desconto parcelado de dívida nos vencimentos, salários ou proventos do responsável;
- No período em que, a juízo do TCU, se justificar a suspensão quanto a fatos abrangidos em Acordo de Leniência, Termo de Cessação de Conduta, Acordo de Não Persecução Cível, Acordo de Não Persecução Penal ou instrumento análogo;
- Sempre que o processo se prolongar por razão imputável unicamente ao responsável.
De mais a mais, para além do prazo prescricional geral, que é de cinco anos, há, também, a modalidade de prescrição intercorrente, que incide quando o processo ficar paralisado por mais de três anos aguardando-se o julgamento ou o despacho pelo TCU. No caso, esse prazo de prescrição intercorrente se interrompe com a ocorrência de qualquer ato que evidencie o andamento regular do processo, excetuados os atos que não interfiram de modo relevante no curso das apurações, como pedidos de vista, juntada de procurações, emissão de certidões, entre outros.
Por fim, a Resolução nº 344 do TCU diz que, muito embora a incidência de prescrição obste a imposição de sanção e de ressarcimento ao erário, nos casos em que a matéria for relevante, ainda assim é possível o julgamento das contas, a adoção de determinações, recomendações ou outras providências destinadas à reorientar a atuação administrativa.
De modo geral, pode-se afirmar que a regulamentação do tema traz maior segurança jurídica e previsibilidade para aqueles que mantêm relações com o Poder Público, assegurando que eventual fiscalização ou aplicação de sanções ocorra dentro de um prazo proporcional, sem prejudicar o exercício das garantias ao contraditório e à ampla defesa.
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Read MoreTudo que você precisa saber para planejar a sucessão empresarial familiar
A sucessão empresarial é um dos maiores desafios que uma empresa familiar enfrenta ao longo da sua história. De acordo com dados extraídos do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no Brasil, as empresas com perfil familiar correspondem a 90% dos negócios e são elas as responsáveis por 65% do Produto Interno Bruto (PIB) do País.
Embora os números sejam surpreendentes, uma pesquisa realizada pela PwC revela que apenas ⅓ das empresas familiares sobrevivem à passagem para a segunda geração e apenas 12% sobrevivem após a terceira geração familiar. A explicação para este alto índice é, quase sempre, a ausência de um plano de sucessão definido, principalmente para posições estratégicas.
Diante deste cenário alarmante, fundadores e pessoas que ocupam cargos estratégicos dentro de empresas familiares têm tratado, com cada vez mais frequência, este tema.
Mas afinal, o que é considerado uma empresa familiar?
Entre o amplo universo das empresas existentes, destacam-se algumas organizações que trazem certa peculiaridade: sua existência está fortemente atrelada por uma família ou um grupo de famílias. Assim, a existência da empresa e das atividades empresariais mostra-se intimamente relacionada não só a questões de cunho empresarial, como também ao ambiente doméstico.
A vida da empresa (passado, presente e futuro) não está restrita aos seus estabelecimentos ou negócios, ela avança sobre a vida da família. Há quem diga que se trata de uma desvantagem, já que empresas familiares podem ser vítimas de conflitos que são estranhos ao objeto social ou ao meio econômico inserido. Outros, afirmam que o sucesso destas empresas estaria, justamente, calcado na condição familiar.
Independentemente de qual lado se esteja, não se pode negar aquilo o que os números mostram: a importância das empresas familiares não só para as famílias envolvidas, como também para toda a sociedade e para a economia do País.
No que consiste a sucessão empresarial familiar e quais suas problemáticas?
Não considerar, permanentemente, a necessidade de sucessão nas empresas familiares é um erro bastante comum e, como visto, cobra um preço alto e, por vezes, fatal, para essas empresas.
A falta de uma perspectiva permanente de sucessão está na raiz de crises reiteradamente enfrentadas por atividades negociais familiares, sejam elas de microempresas ou grandes grupos.
Sem sombra de dúvidas, a sucessão empresarial familiar é, senão o maior, um dos maiores desafios deste tipo de negócio. Para conduzi-la com êxito, é necessário que haja um estudo técnico e qualificado de quais herdeiros irão assumir funções dentro da empresa. Quanto mais cedo os sucessores começarem a sua preparação, mais aptos estarão para atuar em funções estratégicas e de gestão.
Grandes companhias como Magazine Luiza, WEG, Óticas Diniz, MRV e Pague Menos, possuem, hoje, jovens sucessores em cargos estratégicos – até mesmo em posição de comando – que conquistaram grande respeito do mercado. Isso se deu porque as novas gerações foram levadas, no momento adequado, para experimentar a organização empresarial familiar, ocupando postos em sua estrutura funcional, sendo preparados para a sucessão.
Em outros exemplos, os herdeiros foram preparados não para a administração ou gestão do negócio, mas para assumir uma posição de sócio consciente e ativo que, desta forma, beneficia-se da atuação de administradores profissionais que se encarregam do dia a dia da sociedade.
Não se pode descartar, também, a possibilidade de se arquitetar uma sucessão mista, na qual sejam combinados quadros familiares e profissionais.
No entanto, é necessário que esta sucessão seja feita de maneira premeditada e, principalmente, organizada. Isso porque é possível a geração de conflitos familiares e societários dentro da organização, principalmente durante o período de transição, advindo do processo de sucessão.
A troca geracional pode produzir transformações na cultura organizacional da empresa, gerando problemáticas que variam de acordo com o período de transição. A passagem da primeira geração para a segunda poderá induzir a uma primeira crise de sucessão, a qual consiste na descentralização do poder de decisão do fundador e a alteração do ciclo de liderança.
Além disso, as trocas geracionais que sucedem a primeira poderão produzir outros conflitos internos e externos com elementos organizacionais, profissionais e identitários da empresa. Daí o motivo pelo qual a sucessão deve ser realizada de maneira premeditada e, principalmente, ordenada.
Como planejar a sucessão empresarial familiar?
O planejamento da sucessão empresarial familiar garante o melhor desenvolvimento dos sucessores e sucedidos, o alinhamento de expectativas e estratégias entre as gerações empresariais, possibilitando a manutenção organizada do negócio familiar e mitigando a existência de conflitos e crises empresariais e/ou familiares.
Para que isso ocorra, tem-se algumas estratégias que podem ser utilizadas para auxiliar a sucessão empresarial familiar, como:
- Criação de um Conselho Administrativo: é um órgão de deliberação colegiada que objetiva acolher parentes que podem ser de núcleos familiares diferentes, nos debates sobre o futuro da empresa. O conselho de administração poderá desempenhar também funções macro-estratégicas, visando a longevidade dos negócios.
- Criação de um Conselho Familiar: constitui uma instância formal, institucionalizada, para manter um canal aberto entre a família e a empresa, buscando preservar a cultura familiar e seus valores. Em regra, o conselho familiar não tem voto em assembleia ou reunião de sócios e as deliberações não vinculam ou obrigam a administração societária.
- Elaboração de Protocolo Familiar: trata-se de um acordo firmado entre todos os membros da família. Seu conteúdo contém a história da família empresária, seus valores e princípios, deveres e direitos, com regras específicas e claras sobre o relacionamento entre os membros da família e entre estes e a empresa. Este documento tem como base a tradição e o legado moral dos fundadores, buscando fortalecer os princípios orientadores da família e da empresa familiar.
- A revisão periódica do contrato social e do acordo de sócios/quotistas: sugere-se que haja uma constante revisão das cláusulas previstas no contrato social e no acordo de sócios/quotistas da empresa familiar, com atualizações necessárias que atinjam, direta ou indiretamente, as relações familiares e societárias.
- Elaboração de uma escritura pública declaratória e/ou diretivas antecipadas de vontade: a elaboração deste tipo de documento perante um tabelião pode minimizar impactos em caso de falta de discernimento futuro daquele que gerencia e/ou administra a empresa familiar. O documento pode dispor sobre questões de cunho patrimonial bem como existencial.
Independentemente da forma com que a sucessão empresarial é realizada ou quais instrumentos são utilizados, fato é que uma sucessão premeditada não causa surpresas, podendo ser preparada, executada e testada com redobrada atenção. Permite, também, que haja rotinas de preparação dos sucessores, como a sua admissão prévia na sociedade, submetendo-lhe a um rodízio de funções (job rotation) e, consequentemente, fazendo com que conheçam o negócio por diversas perspectivas e estejam prontos a assumir cargos de liderança no momento adequado.
Por fim, é possível combinar instrumentos societários com os institutos ligados ao Direito de Família e Sucessões para estruturar condições adequadas para a manutenção e longevidade destas empresas familiares.
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Read MoreTJRJ reconhece direito à nomeação de candidatos de concurso da transpetro aprovados em cadastro de reserva
No dia 31/05/2021, a 13ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) negou provimento ao recurso de apelação interposto pela Transpetro e manteve sentença proferida pela 28ª Vara Cível da Comarca da Capital, que julgou procedente a ação ajuizada por candidatos aprovados em cadastro de reserva de concurso público da Transpetro para o cargo de Contador Júnior (RJ) para que avançassem às etapas posteriores do certame.
No caso, foi comprovada a ocorrência de terceirização indevida de atividades que deveriam ser desempenhadas pelos candidatos aprovados no concurso em questão, se estes fossem nomeados ao cargo. Dessa forma, configurou-se a preterição arbitrária e imotivada pela administração, fazendo surgir o direito à nomeação dos candidatos aprovados no concurso.
Em seu voto, o Desembargador Relator reconheceu que “Durante o prazo de validade do certame, a apelante celebrou contrato de terceirização de mão de obra, para “prestação de serviços de execução contábil e fiscal”. O “memorial descritivo” indica que o trabalho deve ser realizado por 40 profissionais (fls. 211/218). Esse quantitativo de servidores não concursados, portanto, gera direito subjetivo à nomeação dos recorridos, conforme reconhecido pela sentença.” (grifo nosso).
A REGRA DO CONCURSO PÚBLICO E A PRETERIÇÃO DE CANDIDATOS
A Constituição Federal estabelece que a aprovação prévia em concurso público é a regra para a investidura em cargo ou emprego público. Na prática, isso significa que as atividades públicas devem ser desempenhadas por servidores aprovados em concurso público, ressalvadas as exceções previstas em lei – como no caso dos cargos em comissão, por exemplo.
A ideia, com isso, é garantir que o provimento de cargos públicos esteja alinhado com os princípios da isonomia, da impessoalidade e da moralidade administrativa. Por essas razões, havendo a demanda de pessoal e disponibilidade orçamentária, a Administração Pública deve sempre buscar a realização de concurso público ou, se houver candidatos aprovados aguardando a nomeação, a convocação destes.
Aplicando essa regra, o Supremo Tribunal Federal (STF) fixou o Tema 784, que consolida três hipóteses em que o candidato pode acionar o Poder Judiciário para que seja reconhecido o seu direito à nomeação. Nessas hipóteses, ocorre o que o STF denominou como “preterição arbitrária e imotivada por parte da administração, caracterizada por comportamento tácito ou expresso do Poder Público capaz de revelar a inequívoca necessidade de nomeação”. São elas:
- Quando a aprovação ocorrer dentro do número de vagas do edital;
- Quando houver preterição na nomeação por não observância da ordem de classificação;
- Quando surgirem novas vagas, ou for aberto novo concurso durante a validade do certame anterior, e ocorrer a preterição de candidatos aprovados fora das vagas de forma arbitrária e imotivada por parte da administração.
Vale ressaltar, como expressamente reconhecido pelo STF, que a ocorrência de preterição beneficia tanto candidatos aprovados dentro do número de vagas quanto candidatos em cadastro de reserva, desde que seja comprovado que o candidato foi diretamente prejudicado, e que a sua nomeação deixou de ocorrer em razão da preterição promovida pela administração.
O CASO CONCRETO
No presente caso, os candidatos foram aprovados em cadastro de reserva de concurso público promovido pela Transpetro para o cargo de Contador Júnior (RJ). Todavia, diante da demanda de pessoal para o desempenho das atribuições deste cargo, em vez de nomear os candidatos aprovados em concurso, a Transpetro decidiu contratar funcionários terceirizados, burlando, assim, a regra do concurso público.
Em virtude disso, os candidatos aprovados no certame e diretamente prejudicados pela terceirização das atividades do cargo propuseram ação judicial. O processo foi distribuído para a 28ª Vara Cível da Comarca da Capital que, em primeira instância, julgou procedentes os pedidos formulados pelos candidatos, determinando a sua nomeação ao cargo para o qual foram aprovados em cadastro de reserva. Inclusive, uma das candidatas foi imediatamente convocada, enquanto os demais foram admitidos para convocação, conforme as suas respectivas classificações.
Na sentença, o magistrado afirmou que, “embora a mera aprovação em concurso público não atribua ao demandante direito à contratação, a contratação a título precário de mão-de-obra terceirizada, como ocorreu na hipótese, faz surgir o direito subjetivo público à contratação dos concursados em condição de suplentes, conforme previsto no Edital, em razão da fraude à Constituição da República e à lei, como forma de evitar a burla à obrigatoriedade do concurso público.” (grifo nosso).
E, nessa mesma linha, seguiu: “Ainda que a contratação se submeta ao poder discricionário da Administração, constata-se, in casu, que a contratação pela ré de terceirizados para o exercício de funções que pressupõem a formação superior em Ciências Contábeis só vem a confirmar a existência de vagas e a necessidade dos referidos serviços.” (grifos nossos).
Diante disso, a Transpetro interpôs recurso de apelação, levando a matéria à apreciação da 13ª Câmara Cível do TJRJ. Todavia, a referida Corte negou provimento ao recurso interposto, mantendo a sentença proferida em seus integrais termos.
As decisões foram baseadas nas provas e fundamentos apresentados pelo escritório Schiefler Advocacia.
Read MoreÉ devido o pagamento de aluguel pelo ex-cônjuge que permanece com posse integral do imóvel antes da partilha dos bens
O Tribunal de Justiça de Santa Catarina determinou a fixação de aluguel pelo uso exclusivo do imóvel por um dos ex-cônjuges antes da realização da partilha dos bens. A ação foi patrocinada pelo escritório Schiefler Advocacia.
A decisão reconheceu que a separação ou o divórcio do casal encerra automaticamente a comunhão de bens e buscou evitar o enriquecimento ilícito daquele que permanece na posse do bem antes da partilha.
Nas palavras do julgador, “tendo em vista que a agravada permanece na posse exclusiva do bem imóvel que é patrimônio comum do casal e que será futuramente objeto de partilha, faz jus o agravante ao recebimento de indenização pelo uso exclusivo do imóvel que também é seu”.
A decisão está de acordo com a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça relacionada ao assunto e também com a doutrina especializada sobre o tema:
“AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. AÇÃO DE ARBITRAMENTO DE ALUGUEL DE COISA COMUM CUMULADA COM COBRANÇA. SEPARAÇÃO JUDICIAL. POSSE SOBRE IMÓVEL COMUM EXERCIDA EXCLUSIVAMENTE POR UM DOS CONDÔMINOS. FIXAÇÃO DE ALUGUEL. POSSIBILIDADE. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. AGRAVO INTERNO DESPROVIDO.
1.“Com a separação ou divórcio do casal, cessa o estado de comunhão de bens, de modo que, mesmo nas hipóteses em que ainda não concretizada a partilha do patrimônio, é permitido a um dos ex-cônjuges exigir do outro, a título de indenização, a parcela correspondente à metade da renda de um aluguel presumido, se houver a posse, uso e fruição exclusiva do imóvel por um deles.” (REsp n. 1.375.271/SP, relatora Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 21/9/2017, DJe de 2/10/2017 […] 3. Agravo interno a que se nega provimento..
Com esta medida, o ex-cônjuge passará a receber valor mensal, a título de aluguel, até que a partilha dos bens do casal seja concluída.
O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.
Read MoreProblemas mais comuns que levam à inabilitação de licitantes
I. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A análise de documentação de concorrentes pode definir a vitória de uma licitante, pois a partir dela é possível que se encontrem vícios que levem à inabilitação de outras licitantes ou à desclassificação de suas propostas. Portanto, é crucial que empresas que costumam participar de certames estejam atentas às principais hipóteses de inabilitação ou de desclassificação de propostas e às discussões jurídicas ligadas aos temas.
Este artigo apresentará as hipóteses mais comuns de inabilitação de licitantes.
De início, vale esclarecer a diferença entre a inabilitação de licitantes e a desclassificação de propostas.
A inabilitação diz respeito à própria pessoa da licitante, ou seja, características econômicas, financeiras, técnicas e/ou jurídicas que fazem com que a licitante não possa participar de determinado certame. Por seu turno, a desclassificação diz respeito à proposta apresentada pela licitante, ou seja, em que pese habilitada a participar da licitação, a proposta ofertada é inadequada em relação aos critérios previstos em lei ou no edital.
II. PROBLEMAS MAIS COMUNS QUE LEVAM À INABILITAÇÃO DE LICITANTES
Os problemas mais comuns que levam à inabilitação de licitantes dizem respeito (i) à ausência de demonstração de qualificação técnica; (ii) à existência de irregularidades fiscais; (iii) à ausência de comprovação de capacidade econômico-financeira; e (iv) a erro na habilitação jurídica.
II.1) Inabilitação de licitantes por ausência de demonstração de qualificação técnica
A qualificação técnica é dividida em “qualificação técnico-profissional” e “qualificação técnico-operacional”. A inabilitação de licitantes pela não demonstração de qualificação técnica decorre, na maioria dos casos, de insuficiência de atestados de capacidade técnica (ACTs). Esse tipo de habilitação é mais restrito em licitações voltadas à contratação de obras e serviços de engenharia, sobretudo porque nesses casos não poderá ser aplicada a exceção que permite a substituição dos documentos tradicionais de qualificação técnico-profissional e de qualificação técnico-operacional por “outra prova de que o profissional ou a empresa possui conhecimento técnico e experiência prática na execução de serviço de características semelhantes” (artigo 67, §3º, da Lei nº 14.133/21).
Abaixo serão apresentadas algumas regras e posicionamentos jurisprudenciais referentes à inabilitação de licitantes por ausência de demonstração de qualificação técnica.
Primeiro: em regra, será possível que licitantes somem os seus atestados para fins de comprovação da qualificação técnico-operacional [Acórdão 2291/2021. RA 000.910/2011-2. Relator Bruno Dantas. Data da sessão 22/09/2021]. A vedação ao somatório somente será possível caso a natureza e a complexidade técnica da obra ou do serviço mostrem indispensáveis tal restrição [Acórdão 1095. Representação 000.056/2018-9. Relator Augusto Nardes. Data da sessão 16/05/2018]. Exemplo de licitação com maior complexidade, que permitiria a vedação ao somatório de atestados, seria o caso de terceirização de mão de obra.
Segundo: não é possível que licitantes comprovem a sua qualificação técnico-operacional por meio da simples apresentação de notas fiscais referentes a prestação de serviços anteriores [TJ-RJ – MS: 00018871920208190000, Relator: Des(a). FABIO DUTRA, Data de Julgamento: 11/05/2021, PRIMEIRA C MARA CÍVEL, Data de Publicação: 15/10/2021].
Terceiro: em licitações de engenharia, não será possível que licitantes sejam inabilitadas tecnicamente pelo simples fato de a obra executada anteriormente ser de valor inferior, salvo se este requisito estiver expressamente previsto em edital [TJ-RS – AC: 50390797220198210001 RS, Relator: Marco Aurélio Heinz, Data de Julgamento: 22/04/2021, Vigésima Primeira Câmara Cível, Data de Publicação: 03/05/2021].
Quarto: em regra não será possível a transferência do acervo técnico da pessoa física (colaboradores) para a pessoa jurídica (licitante). Por exemplo, uma licitante não poderá se valer do acervo técnico de seus engenheiros para comprovar a sua capacidade técnico operacional. Isso porque a capacidade técnico operacional não se confunde com a capacidade técnico profissional de licitantes [TJ-SP – AC: 10003200720208260075 SP 1000320-07.2020.8.26.0075, Relator: José Maria Câmara Junior, Data de Julgamento: 16/03/2021, 8ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 16/03/2021].
Quinto: nos casos de contratação sob o regime de empreitada integral, nos quais haja previsão de subcontratação de parte relevante do objeto licitado, é permitido que a Administração exija apenas a comprovação de capacidade técnica da empresa que vier a ser subcontratada [Acórdão 2021/2020. Relatório de Auditoria 015.490/2019-0. Relatora Anna Arraes. Data da Sessão 05/08/2020].
II.2) Inabilitação de licitantes por irregularidades fiscais
Em licitações, os interessados devem comprovar regularidade perante a Fazenda federal, estadual e/ou municipal do domicílio ou da sede da licitante. A comprovação de regularidade fiscal também pode se tornar um grande empecilho aos licitantes que possuem débitos com o fisco e, portanto, não podem emitir as certidões negativas de débitos.
A situação pode se tornar mais complicada em casos de emissões de certidões negativas junto aos municípios. Isso porque cada ente municipal possui uma forma específica de realizar a emissão de certidões. Nesses casos, não raro a emissão de certidão negativa de dívidas ativas é feita com a respectiva procuradoria municipal, ao passo que a certidão negativa de débitos não inscritos em dívida ativa, com as respectivas secretarias de fazenda municipal.
Abaixo são apresentados alguns exemplos de discussões jurisprudenciais sobre a temática.
Primeiro: ainda que previsto em edital, não será juridicamente viável a exigência de apresentação de declarações de regularidade fiscal de estabelecimentos matriz e filial, em atenção ao disposto no artigo 127, inciso II, do CTN [TJ-SP – AI: 20283494720218260000 SP 2028349-47.2021.8.26.0000, Relator: Décio Notarangeli, Data de Julgamento: 05/05/2021, 9ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 05/05/2021].
Segundo: os documentos referentes à comprovação de regularidade fiscal e trabalhista das microempresas e das empresas de pequeno porte somente serão exigidos apenas para efeito de assinatura do contrato, em atenção ao disposto no artigo 42 da Lei Complementar nº 123/2006 [TJ-MG – AI: 10000220194401001 MG, Relator: Júlio Cezar Guttierrez, Data de Julgamento: 19/04/2022, Câmaras Cíveis / 6ª C MARA CÍVEL, Data de Publicação: 27/04/2022].
Terceiro: Em decorrência das dificuldades inerentes à emissão de certidões de regularidade fiscal, não é incomum que surjam situações de razoável dúvida sobre o cumprimento da obrigação editalícia pelas licitantes. Portanto, se existirem elementos que permitam concluir pela regularidade fiscal, a despeito da documentação apresentada pela licitante, a Administração Pública deve diligenciar para esclarecer a situação [TRF-4 – REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL: 50080578920184047000 PR 5008057-89.2018.4.04.7000, Relator: MARGA INGE BARTH TESSLER, Data de Julgamento: 21/05/2019, TERCEIRA TURMA].
II.3) Inabilitação de licitantes por ausência de comprovação de capacidade econômico-financeira
Ainda que em menor medida do que nas duas hipóteses apresentadas nos subtópicos anteriores, a ausência de comprovação de capacidade econômico-financeira pode se tornar um empecilho à habilitação de licitantes, sobretudo em certames de maior complexidade, como por exemplo, nos quais haja a possibilidade de participação de licitantes em consórcio.
Abaixo são apresentados alguns exemplos de discussões jurisprudenciais sobre a temática.
Primeiro: a Administração Pública tem o dever de justificar os índices contábeis exigidos pelo edital convocatório. Inclusive, a Súmula nº 289/2016 do TCU contém a seguinte previsão: “A exigência de índices contábeis de capacidade financeira, a exemplo dos de liquidez, deve estar justificada no processo da licitação, conter parâmetros atualizados de mercado e atender às características do objeto licitado, sendo vedado o uso de índice cuja fórmula inclua rentabilidade ou lucratividade”.
Segundo: na participação em licitação por meio de consórcio de empresas, será permitido o somatório dos índices econômico-financeiros, na proporção da respectiva participação [TJ-SP – Remessa Necessária Cível: 10291331320208260053 SP 1029133-13.2020.8.26.0053, Relator: Maria Olívia Alves, Data de Julgamento: 16/03/2021, 6ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 16/03/2021].
II.4) Inabilitação por erro na habilitação jurídica de licitante
A inabilitação por erro na habilitação jurídica de licitante é a menos comum das quatro hipóteses mencionadas neste breve artigo, justamente porque a maior parte de erros relacionados à habilitação jurídica são meramente formais. A propósito, sobre a inabilitação por erro em habilitação jurídica de licitantes, a Administração Pública deve se atentar à possibilidade de saneamento de meros erros formais [TJ-PR – AI: 00385103220218160000 Maringá 0038510-32.2021.8.16.0000 (Acórdão), Relator: Regina Helena Afonso de Oliveira Portes, Data de Julgamento: 28/11/2021, 4ª Câmara Cível].
Primeiro: é necessário haver compatibilidade entre as atividades previstas no contrato social/estatuto social da licitante e o objeto do certame [Acórdão 503/2021. Representação 029.273/2020-0. Relator Augusto Sherman. Data da sessão 10/03/2021].
Segundo: O ato administrativo que analisa a habilitação jurídica de licitantes não poderá ser fundamentado em formalismo exacerbado. Como exemplos de vedação ao formalismo exacerbado na análise de habilitação jurídica, mencionam-se (i) a impossibilidade de inabilitação de licitantes por divergência entre assinaturas na proposta e no contrato social [Acórdão 5181/2021. Relatório de Auditoria 029.366/2011-9. Relator Walton Alencar Rodrigues. Data da sessão 28/08/2021]; (ii) a impossibilidade de inabilitação de licitantes pela não autenticação do contrato social [TJ-MT 00509037920138110041 MT, Relator: YALE SABO MENDES, Data de Julgamento: 05/07/2021, Segunda Câmara de Direito Público e Coletivo, Data de Publicação: 20/07/2021] e (iii) a impossibilidade de inabilitação de licitantes pela apresentação de documentos sem firma reconhecida [TJ-SP – Remessa Necessária Cível: 10022072320208260270 SP 1002207-23.2020.8.26.0270, Relator: Vera Angrisani, Data de Julgamento: 15/01/2021, 2ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 15/01/2021].
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