
Pregão: o que você precisa saber sobre essa modalidade de licitação?
Desde que instituído, o pregão revolucionou o ambiente de negócios entre particulares e o Estado brasileiro, sendo hoje a modalidade de licitação que mais movimenta recursos públicos, segundo dados disponibilizados no Portal de Compras do Governo Federal.
Diante da importância do tema, o presente artigo tem o intuito de sintetizar as principais informações sobre o pregão, tratando dos seus aspectos gerais, da legislação aplicada, do conceito de bens e serviços comuns, da obrigatoriedade desta modalidade e, em especial, das mudanças promovidas pela Lei nº 14.133/2021, a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (NLLCA).
Aspectos gerais
Criado em maio de 2000 e consolidado pela Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002, o pregão surgiu como uma modalidade de licitação para aquisição de bens e serviços comuns.
Exterior ao rol do art. 22 da Lei nº 8.666/1993, esta modalidade visava à facilitação do procedimento licitatório pela Administração Pública no âmbito da União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Poucos anos depois, em 31 de maio de 2005, o Decreto nº 5.450 disciplinou a forma eletrônica do pregão, dando início a uma verdadeira revolução operacional nas contratações públicas de bens e serviços comuns. Atualmente, o pregão eletrônico é regulamentado pelo Decreto nº 10.024/2019.
Em linhas gerais, a modalidade trouxe relevante aprimoramento dos procedimentos licitatórios, traduzindo-se especialmente em maior simplificação e celeridade nas contratações públicas. Em pouco tempo o pregão tornou-se a modalidade de licitação mais utilizada em todos os âmbitos da Administração Pública.
Hoje em dia, as contratações precedidas de pregão consubstanciam, proporcionalmente, o maior valor de contratações no país. Segundo dados disponibilizados no Painel de Compras do Governo Federal, no período compreendido entre janeiro de 2018 e julho de 2022, os contratos administrativos celebrados a partir de pregão movimentaram R$ 691.069.053.295,25, valor que representa aproximadamente 81% da verba total destinada às contratações públicas no período.[1]Fonte: http://paineldecompras.economia.gov.br/processos-compra. Acesso em: 8 ago. 2022.
Após quase vinte anos, a experiência mostrou-se amplamente exitosa, tendo sido uma das fontes de inspiração da Lei nº 14.133/2021.
Legislação aplicável
Atualmente, o pregão é regido tanto pela Lei nº 10.520/2002 quanto pela Lei nº 14.133/2021, a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (NLLCA). Ao realizar a licitação, o órgão deverá indicar no Edital o diploma legal que o certame obedecerá.
Em termos infralegais, no âmbito federal, o pregão é regulado pelo Decreto nº 3.555/2000, na modalidade presencial, e pelo já citado Decreto nº 10.024/2019, na sua modalidade eletrônica. Nos âmbitos estaduais e municipais, é comum que o respectivo ente federativo tenha sua própria regulamentação.
Inovando em relação ao regime da Lei nº 8.666/1993, a Lei nº 14.133/2021 previu o pregão e passou a discipliná-lo integralmente no seu texto. No entanto, as regras estabelecidas pela NLLCA somente passarão a reger a modalidade de modo exclusivo após a revogação da Lei nº 10.520/2002, o que deverá ocorrer em abril de 2023, conforme a regra de transição do art. 193 da referida Lei nº 14.133/2021.
A Lei das Estatais (Lei nº 13.303/2016), por sua vez, indica a adoção preferencial da modalidade pregão para a aquisição de bens e serviços comuns, remetendo ao procedimento da Lei nº 10.520/2002 e, agora, da Lei nº 14.133/2021.
Embora a Lei nº 8.666/1993 não trate expressamente da modalidade pregão, é preciso mencionar que a Lei nº 10.520/2002 reconhece a aplicação subsidiária deste regime normativo ao pregão.
Bens e serviços comuns
Para compreender a modalidade pregão, faz-se necessário entender o conceito de bens e serviços comuns. Isso porque, como já mencionado, o pregão é a modalidade de licitação destinada à aquisição de bens e serviços comuns (artigo 1º da Lei nº 10.520/2002 e artigo 6º, inciso XLI, da Lei nº 14.133).
A fim de ilustrar este conceito, os exemplos mais frequentes de bens comuns são canetas, lápis, borrachas, café, açúcar, cadeiras, veículos, ar-condicionado; já serviços comuns seriam serviços como manutenção de veículos, colocação de piso, serviços terceirizados, pintura de paredes, etc.
A Lei 10.520/2002 trouxe um conceito de bens e serviços comuns que foi repetido na Lei nº 14.133/2021, conforme se pode ler a seguir:
Lei n. 10.520/2002
Art. 1º Para aquisição de bens e serviços comuns, poderá ser adotada a licitação na modalidade de pregão, que será regida por esta Lei.
Parágrafo único. Consideram-se bens e serviços comuns, para os fins e efeitos deste artigo, aqueles cujos padrões de desempenho e qualidade possam ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais no mercado.
Lei nº 14.133/2021
Art. 6º Para os fins desta Lei, consideram-se:
XIII – bens e serviços comuns: aqueles cujos padrões de desempenho e qualidade podem ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais de mercado;
Por conseguinte, bens e serviços comuns são conceitos definidos em função de duas características, quais sejam:
i) padrões de desempenho e qualidade que podem ser objetivamente definidos em edital; e
ii) especificações usuais no mercado, por meio das quais o objeto pode ser descrito.
Sendo assim, para a definição de “bens e serviços comuns” não é relevante o valor do bem e serviço a ser adquirido, podendo ser de qualquer valor, uma vez que a lei não define valores mínimos ou máximos. Tampouco é relevante a complexidade envolvida nos bens e serviços, desde que seja possível descrevê-los na sua padronização e estejam disponíveis no mercado.[2]Conforme Acórdão 2172/2008 Plenário do TCU, citado em: BRASIL. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. Licitações e contratos: orientações e jurisprudência do TCU. 4.ed. Brasília: TCU, … Continue reading
Vale ressaltar, ainda, que a Lei nº 14.133/2021 faculta à Administração Pública a utilização da modalidade pregão para “serviços comuns de engenharia” (art. 29, parágrafo único, da Lei nº 14.133/2021).[3]Art. 6º, XXI – […] a) serviço comum de engenharia: todo serviço de engenharia que tem por objeto ações, objetivamente padronizáveis em termos de desempenho e qualidade, de … Continue reading Ou seja, ao lado de bens e serviços comuns, a Lei nº 14.133/2021 adiciona a definição de “serviço comum de engenharia”, para o qual a modalidade pregão é facultada – enquanto que para bens e serviços comuns, o pregão é obrigatório.
Obrigatoriedade do Pregão
Atualmente, tanto o Decreto nº 10.024/2019 quanto a Lei nº 14.133/2021 determinam a obrigatoriedade do pregão.
Mais especificamente, o Decreto nº 10.024/2019, que disciplina a matéria no âmbito da administração pública federal, determina que a utilização da modalidade pregão na forma eletrônica é obrigatória (art. 1º, §1º), sendo a forma presencial admitida apenas excepcionalmente, mediante prévia justificativa da autoridade competente, devendo ser comprovada a inviabilidade técnica ou a desvantagem para a administração na realização da forma eletrônica (art. 1º, §4º). Essa regra atinge também os demais entes federativos quando da aquisição de bens e serviços comuns por meio de recursos da União decorrentes de transferências voluntárias (como convênios e contratos de repasse, conforme art. 1º, §3º).[4]Leia-se o teor do art. 1º do Decreto nº 10.024/2019: Art. 1º […] 1º A utilização da modalidade de pregão, na forma eletrônica, pelos órgãos da administração pública federal … Continue reading
A Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, por sua vez, tornou obrigatória a modalidade do pregão para toda a Administração Pública – não apenas União, mas também Estados, Distrito Federal e Municípios – conforme o seu âmbito de abrangência. Assim, dispôs a NLLCA:
Art. 6º Para os fins desta Lei, consideram-se:
[…]XLI – pregão: modalidade de licitação obrigatória para aquisição de bens e serviços comuns, cujo critério de julgamento poderá ser o de menor preço ou o de maior desconto;
Também na NLLCA, o pregão deve ocorrer preferencialmente sob a forma eletrônica, sendo excepcionalmente admitida a forma presencial, desde que motivada (conforme a previsão geral, no art. 17, §2º, da NLLCA).
Diferenças procedimentais da Nova Lei de Licitações em relação à Lei nº 10.520/2002
Como já se pôde antever, a NLLCA faz deferência à modalidade do pregão e à experiência adquirida no antigo sistema de licitações e contratos administrativos, tendo absorvido as principais características provenientes da Lei nº 10.520/2002 e do Decreto nº 10.024/2019 – normas essas que regulamentavam esta modalidade de licitação no regime que será derrogado.
A demonstrar esta deferência, os exemplos de semelhança são vários, dos quais se pode citar, notadamente, a precedência da fase de julgamento sobre a habilitação e a preferência da condução do certame por apenas uma pessoa (agente de contratação), sendo permitida a designação de uma equipe de apoio.
A NLLCA determina ainda, por exemplo, no seu art. 29, que o pregão e a concorrência seguem o rito procedimental comum, previsto no art. 17, devendo a primeira modalidade ser adotada sempre que o objeto possuir padrões de desempenho e qualidade que possam ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais de mercado. Igualmente, a nova lei estabelece que o pregão não se aplica às contratações de serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual e de obras e serviços de engenharia, exceto os serviços comuns de engenharia (art. 29, parágrafo único, da NLLCA).
Por outro lado, são poucas as diferenças procedimentais trazidas pela NLLCA para a modalidade pregão, em relação à legislação anterior. Vejamos, então, algumas dessas inovações.
A primeira delas diz respeito à adjudicação, que não aparece literalmente como uma etapa na NLLCA (art. 17), à diferença do que ocorre no Decreto nº 10.024/19 (art. 6º, VIII). Embora o ato de adjudicar não seja citado pela nova lei como uma etapa, a adjudicação – ou seja, a atribuição do objeto licitado – deverá ocorrer no mesmo ato da homologação, a ser feito pela autoridade superior, independente se houver ou não recurso (art. 71, IV, NLLCA).
Essa alteração elimina a distinção feita pelo Decreto nº 10.024/19 entre a adjudicação feita pelo pregoeiro, quando não há recurso (art. 17, IX), e a adjudicação feita pela autoridade superior, quando houver recurso (art. 13, V). Pela NLLCA, a adjudicação não existe mais como uma etapa formal, ocorrendo apenas materialmente quando da homologação pela autoridade superior (art. 71, IV, NLLCA).
A NLLCA alterou, também, o prazo mínimo para a apresentação das propostas. Enquanto a Lei nº 10.520/02 determina o prazo não inferior a 8 dias úteis para a apresentação das propostas, contado a partir da publicação do aviso (art. 4º, V, Lei nº 10.520/02), a NLLCA determina o prazo de 8 dias úteis para a aquisição de bens e 10 dias úteis para a aquisição de serviços comuns e de obras e serviços comuns de engenharia, ambos os prazos contados a partir da data de divulgação do edital de licitação (art. 55, I, a, e II, a, da Lei nº 14.133/21). Sendo assim, a NLLCA cria prazos diferentes para a apresentação de propostas para bens (8 dias úteis) e serviços (10 dias úteis) a serem licitados por pregão.
Outra modificação diz respeito à fase de julgamento da proposta, após a disputa de lances e antes da habilitação, na qual passa a ser expressamente possível, desde que previsto em edital, a análise de conformidade do bem ou serviço ofertado pelo licitante provisoriamente vencedor, mediante homologação de amostra, exame de conformidade, prova de conceito e outros testes.
O intuito, com isso, é antecipar a comprovação da aderência da melhor proposta às especificações definidas no termo de referência ou no projeto básico (art. 17, § 3º, da NLLCA), prática que já ocorre licitamente no âmbito de vigência da Lei nº 10.520/2002, mas agora passa a ser expressamente permitida.
Por fim, merece menção, também, a previsão insculpida no art 31, § 1º, da NLLCA, que, tratando da necessidade de contratação de leiloeiro pela Administração, determina expressamente a adoção de credenciamento ou de licitação na modalidade pregão. Optando-se pelo pregão, a Administração deve adotar o critério de julgamento de maior desconto para as comissões a serem cobradas, utilizando como parâmetro máximo os percentuais definidos na lei que regula a profissão de leiloeiro, e observados os valores dos bens a serem leiloados.
Essas são, portanto, algumas das alterações procedimentais trazidas pela NLLCA em relação à legislação anterior do pregão (Lei nº 10.520/02 e Decreto nº 10.024/19). Ainda existem dúvidas se haverá ou não regulamentação, por decreto, do procedimento do pregão conforme a NLLCA. É muito provável que sim. De todo modo, as premissas e as diretrizes foram fixadas pelo novo diploma e encontram-se vigentes e aptas para utilização por todos os níveis da Administração Pública.
Considerações finais
Desde a sua instituição, o pregão revolucionou o ambiente de negócios com o Poder Público, sendo hoje a modalidade de licitação que proporcionalmente mais movimenta recursos públicos, segundo dados disponibilizados no Portal de Compras do Governo Federal.
Diante da importância do tema, buscou-se sintetizar as principais informações sobre o pregão, elencando seus aspectos gerais, a legislação aplicada, tratando do conceito de bens e serviços comuns, e explicando a sua obrigatoriedade.
Nada obstante, tendo a mudança paradigmática promovida pela Lei nº 14.133/2021, a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, buscou-se apresentar como o pregão foi impactado pelo novo regime normativo, ressaltando-se a dimensão das suas semelhanças e os principais pontos de contraste.
Embora seja um procedimento simplificado, a participação em licitações na modalidade pregão pode gerar dúvidas e dificuldades até mesmo para os licitantes mais experientes, sem mencionar as hipóteses em que o recurso administrativo ou a judicialização fazem-se necessários. Nestes casos, o melhor caminho será sempre buscar o auxílio de profissionais da advocacia capacitados e que podem oferecer soluções para as suas demandas.
Referências[+]
↑1 | Fonte: http://paineldecompras.economia.gov.br/processos-compra. Acesso em: 8 ago. 2022. |
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↑2 | Conforme Acórdão 2172/2008 Plenário do TCU, citado em: BRASIL. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. Licitações e contratos: orientações e jurisprudência do TCU. 4.ed. Brasília: TCU, Secretaria-Geral da Presidência. Senado Federal, Secretaria Especial de Editoração e Publicações, 2010, p. 47. |
↑3 | Art. 6º, XXI – […] a) serviço comum de engenharia: todo serviço de engenharia que tem por objeto ações, objetivamente padronizáveis em termos de desempenho e qualidade, de manutenção, de adequação e de adaptação de bens móveis e imóveis, com preservação das características originais dos bens; |
↑4 | Leia-se o teor do art. 1º do Decreto nº 10.024/2019: Art. 1º […]
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Como funciona a etapa preparatória de uma licitação pública: definição dos aspectos da contratação
Diferente do que se imagina, as contratações públicas não têm início com a publicação do Edital. O processo licitatório é um procedimento extenso e dividido em fases, que tem início com a chamada etapa preparatória da contratação pública.
Esta etapa preparatória é destinada a identificar a existência de interesse público na contratação pretendida e a planejar as futuras etapas da contratação.
Depois de elaborados os estudos prévios que justificam e fundamentam a necessidade de contratação pública, a Administração também deve definir aspectos práticos do processo licitatório (caso a seleção do particular não ocorra diretamente, por dispensa ou inexigibilidade de licitação pública). São eles: o edital do certame, a modalidade licitatória, a motivação das condições exigidas no edital e a motivação sobre o momento da divulgação do orçamento da licitação (art. 18, V, VIII, IX e XI da Lei 14.133/2021).
A seguir serão apresentadas as regras e novidades trazidas pela Nova Lei de Licitações a respeito dos aspectos práticos definidos na fase preparatória da licitação pública, além de outros instrumentos de preparação disponíveis à administração pública.
Definição dos aspectos da licitação
A elaboração do edital (art. 18, V) é parte essencial do planejamento do processo licitatório. É este instrumento que regulamentará todo o procedimento após encerrada a fase preparatória da licitação e ao qual estarão vinculados tanto os licitantes quanto a própria Administração. Para tanto, o edital da licitação deve conter (art. 25):
- o objeto da licitação;
- as regras relativas à convocação;
- regras relativas ao julgamento;
- regras relativas à habilitação;
- regras relativas aos recursos e às penalidades da licitação;
- regras relativas à fiscalização e à gestão do contrato;
- regras relativas à entrega do objeto;
- regras relativas às condições de pagamento.
Além de prever todas as regras que orientarão a licitação, a etapa de elaboração do Edital na fase preparatória também deve apresentar a motivação circunstanciada das condições do edital (art. 18, IX). Ou seja, devem ser justificadas as exigências do edital, como, por exemplo, requisitos de qualificação técnica, regras de pontuação e julgamento das propostas e regras para participação de consórcios.
Também nesta fase deve ser definida a modalidade de licitação, o critério de julgamento e o modo de disputa que serão adotados na etapa de seleção da proposta vencedora. Indo além, a Lei também exige que seja demonstrada a adequação e eficiência dos parâmetros escolhidos para a seleção da melhor proposta. Conforme a NLLCA, a Administração Pública pode optar pelos seguintes parâmetros:
Além das modalidades de licitação elencadas, a Administração ainda pode se valer dos procedimentos auxiliares: credenciamento, pré-qualificação, procedimento de manifestação de interesse, sistema de registro de preços e registro cadastral (art. 28, § 1º, e art. 78).
E, ainda, é necessário definir o momento de divulgação do orçamento da licitação. A princípio, a NLLCA assegura a publicidade dos atos praticados no processo licitatório (art. 13), incluindo o orçamento da contratação pública. Contudo, o artigo 24 da mesma lei traz exceção, nos seguintes termos:
Art. 24. Desde que justificado, o orçamento estimado da contratação poderá ter caráter sigiloso, sem prejuízo da divulgação do detalhamento dos quantitativos e das demais informações necessárias para a elaboração das propostas, e, nesse caso:
I – o sigilo não prevalecerá para os órgãos de controle interno e externo;
Parágrafo único. Na hipótese de licitação em que for adotado o critério de julgamento por maior desconto, o preço estimado ou o máximo aceitável constará do edital da licitação.
Desta forma, a Administração possui discricionariedade para definir se o orçamento da contratação pública será ou não sigiloso, desde que justifique a opção adotada (art. 18, XI).
Definição dos aspectos contratuais
Ainda na fase preparatória, além das regras para a etapa de seleção da melhor proposta, a Administração Pública também deve definir as regras para a execução do contrato administrativo. Nesse sentido, deve ser estabelecido, além de outras particularidades do caso concreto, as seguintes condições:
- de execução e pagamento (art. 18, III);
- das garantias exigidas e ofertadas (art. 18, III);
- das condições de recebimento (art. 18, III); e
- o regime de fornecimento de bens de prestação de serviços ou de execução de obras e serviços de engenharia (art. 18, VII)
A definição dos referidos parâmetros será registrada na minuta contratual, que deve ser anexada ao edital do certame (art. 18, VI) e divulgada em sítio eletrônico oficial (art. 25, § 3º).
Análise de riscos
Buscando a otimização das chances de sucesso nos projetos e ganho de eficiência nas contratações públicas, o gerenciamento de riscos ganhou destaque na Lei nº 14.133/2021. Em seu artigo 18, inciso X, essa lei determina que na fase preparatória de todas as licitações deve haver a análise dos riscos que possam comprometer o sucesso da licitação e a boa execução contratual, com apoio na ideia de accountability pública[1]De acordo com o Referencial Básico de Gestão de Riscos do TCU, accountability pública é a “obrigação que têm as pessoas, físicas ou jurídicas, públicas ou privadas, às quais se tenha … Continue reading.
A análise ou avaliação de riscos (risk assessment) e a implementação de medidas para diminuir a probabilidade e os impactos dos riscos negativos (ameaças) ou aumentar a probabilidade e o impacto dos riscos positivos (oportunidades) integram a ideia de gerenciamento de riscos (risk management) de todo o sistema de contratação dos órgãos públicos. Trata-se, essencialmente, de uma atividade de planejamento, que permite à Administração identificar e tratar os riscos nas licitações e nos contratos.
Com efeito, a análise de riscos fornece insumos tanto para que a Administração possa melhorar, construir, gerir e fiscalizar a licitação, assim como para construir a matriz de riscos do contrato, sendo esta uma cláusula contratual que distribui riscos e responsabilidades, em relação ao objeto da contratação, entre a Administração e o futuro contratado.
Neste ponto, é válido o destaque de que a análise de riscos de que trata o artigo 18, inciso X, não se confunde com a matriz de riscos[2]NIEBUHR, Joel de Menezes. Fase preparatória das licitações. In: NIEBUHR, Joel de Menezes (Coord.). Nova lei de licitações e contratos administrativos. 2. ed. Curitiba: Zênite, 2021. p. 80-95.. A análise está em um plano mais amplo e envolve todos os riscos da licitação e da contratação, sendo uma atividade de planejamento e gerenciamento da organização (órgão ou entidade) e dos projetos. A matriz de riscos é um documento/cláusula contratual, decorrente da análise de riscos que distribui riscos apenas do contrato e define o seu equilíbrio econômico-financeiro inicial.
Para exemplificar essa distinção, imagine-se que na etapa de análise de riscos, a Administração verifique, entre outros, estes três riscos:
- risco de que empresas de um determinado ramo com número reduzido de agentes econômicos (players) atuem em conjunto (conluio) para frustrar a competição;
- risco de que ocorra perda de informações em razão de diversas substituições do fiscal do contrato em longo da execução contratual; e
- risco de furto dos materiais da obra durante a execução contratual.
Neste cenário hipotético, o primeiro risco levará a Administração a elaborar regras no instrumento convocatório para coibir atos colusivos contra a licitação pelos futuros licitantes. O segundo risco fará a Administração estabelecer diretrizes internas para que os fiscais do contrato documentem adequadamente as ocorrências durante a execução contratual, evitando a perda de informações. Já o terceiro risco levará a Administração a fixar, na matriz de riscos do contrato, quem será a parte (contratante ou contratada) responsável por garantir a segurança dos materiais da obra, e se haverá direito ao reequilíbrio contratual na ocorrência de furtos[3]O critério de eficiência na alocação de riscos, de acordo com o advogado Lucas Hellmann, do escritório Schiefler Advocacia, tem como primeiro parâmetro alocar o risco “à parte que tem … Continue reading. Veja-se que todos os riscos foram levantados na fase de análise de riscos, mas somente o terceiro é um risco contratual a ser previsto na matriz de riscos do contrato.
Por fim, destaca-se que, embora a análise de riscos seja obrigatória para todas as contratações, a elaboração da matriz de riscos é obrigatória apenas para os contratos estimados de grande vulto (acima de R$ 200 milhões) e para as contratações integradas e semi-integradas (art. 22, § 3º) sendo, portanto, facultativa para os demais contratos. Esse instrumento será detidamente analisado posteriormente.
Audiência e consulta pública
Na fase de planejamento a Administração poderá convocar audiência pública, presencial ou a distância, sobre a licitação que pretende realizar, com disponibilização prévia de informações pertinentes, inclusive de estudo técnico preliminar e elementos do edital de licitação, e com possibilidade de manifestação de todos os interessados.
De igual modo, a Administração também poderá submeter a licitação a prévia consulta pública, mediante a disponibilização de seus elementos a todos os interessados, que poderão formular sugestões, por escrito, no prazo fixado.
O traço distintivo entre a audiência pública e a consulta pública é que, na primeira, os participantes podem se manifestar oralmente em relação ao processo licitatório, enquanto que, na segunda, as manifestações ocorrem por escrito e de modo assíncrono. De acordo com a Nova Lei de Licitações, nenhuma das duas formas de interação entre a Administração e os particulares é obrigatória.
Análise jurídica e publicidade da contratação
A fase de planejamento tem encerramento com o encaminhamento do processo ao órgão de assessoramento jurídico da Administração, que realizará controle prévio de legalidade mediante análise jurídica da contratação (art. 53), seja para as licitações assim como para as contratações diretas, acordos, termos de cooperação, convênios, ajustes, adesões a atas de registro de preços, outros instrumentos congêneres e de seus termos aditivos (art. 53, § 4º).
Essa análise jurídica é dispensada apenas nas hipóteses previamente definidas pela autoridade jurídica máxima competente, que deverá considerar o baixo valor, a baixa complexidade da contratação, a entrega imediata do bem ou a utilização de minutas de editais e instrumentos contratuais padronizados pelo órgão de assessoramento jurídico (art. 53, § 5º).
Por fim, encerrada a instrução do processo sob os aspectos técnico e jurídico, é feita a publicidade do edital de licitação, em seu inteiro teor e com todos os seus anexos, no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP), conforme determina o artigo 54 da NLLCA. Além da publicação do edital no PNCP, sendo facultada a publicação no site oficial do órgão ou entidade, é obrigatória a publicação de extrato do edital no Diário Oficial da União, do Estado, do Distrito Federal ou do Município, ou, no caso de consórcio público, do ente de maior nível entre eles, bem como em jornal diário de grande circulação (art. 54, § 1º).
Catálogo eletrônico de padronização
Uma inovação trazida pela Nova Lei de Licitação e Contratos Administrativos é a previsão de criação do catálogo eletrônico de padronização de compras, serviços e obras pelos órgãos do Poder Público, instrumento que deverá ser utilizado em licitações cujo critério de julgamento seja o de menor preço ou o de maior desconto e conterá a documentação e os procedimentos próprios da fase interna de licitações, assim como as especificações dos respectivos objetos (art. 19, § 1º). A não utilização do catálogo só é permitida quando devidamente justificada (art. 19, § 2º).
Desta forma, se forem utilizadas as informações do catálogo para subsidiar a licitação, a Administração é dispensada de produzir nova documentação na fase de preparação da licitação. A existência e o efetivo uso de um catálogo eletrônico de padronização leva potencial disruptivo em relação à sistemática anterior, uma vez que a pretensão é que toda a fase de preparatória da licitação seja, no que for possível, padronizada, diminuindo significativamente os esforços casuísticos de planejamento.
Ponto de atenção é que, embora o artigo 19, § 1º, da NLLCA genericamente afirme que o catálogo conterá “toda a documentação e os procedimentos próprios da fase interna de licitações”, é indispensável que a Administração descreva detalhadamente, em todos os processos de contratação (com ou sem a utilização do Catálogo), a necessidade da contratação, considerado o problema a ser resolvido sob a perspectiva do interesse público (elemento integrante do estudo técnico preliminar), uma vez que essa é uma informação própria de cada caso e processo.
No âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional, o catálogo eletrônico de padronização de compras, serviços e obras é regulamentado pela Portaria SEGES/ME nº 938/2022.
Plano de contratações anual
De acordo com o caput do artigo 18 da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, a fase preparatória do processo licitatório é caracterizada pelo planejamento e deve compatibilizar-se com o plano de contratações anual (PAC), sempre que elaborado[4]Instrumento cuja origem remonta à Instrução Normativa nº 1/2018 (já revogada), da Secretaria de Gestão do extinto Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, posteriormente … Continue reading.
Na Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, o plano de contratações anual foi incorporado em seu artigo 12, inciso VII, mas é o artigo 5º do Decreto Federal nº 10.947/2022 – diploma que regulamenta o instrumento no âmbito federal – que melhor aponta os objetivos do PAC. São eles:
- racionalizar as contratações das unidades administrativas de sua competência, por meio da promoção de contratações centralizadas e compartilhadas, a fim de obter economia de escala, padronização de produtos e serviços e redução de custos processuais;
- garantir o alinhamento com o planejamento estratégico, o plano diretor de logística sustentável e outros instrumentos de governança existentes;
- subsidiar a elaboração das leis orçamentárias;
- evitar o fracionamento de despesas; e
- sinalizar intenções ao mercado fornecedor, de forma a aumentar o diálogo potencial com o mercado e incrementar a competitividade.
Assim, o plano de contratações anual se afigura como um instrumento que busca concretizar, a um só tempo, diversos princípios das licitações e contratos públicos, como o do planejamento, da eficiência, da transparência, da segurança jurídica, da eficácia, da competitividade, da celeridade, da economicidade e do desenvolvimento nacional sustentável, todos encartados no artigo 5º da Lei nº 14.133/2021.
Neste sentido, ainda que o artigo 12, inciso VII, da NLLCA afirme que “a partir de documentos de formalização de demandas, os órgãos responsáveis pelo planejamento de cada ente federativo poderão, na forma de regulamento, elaborar plano de contratações anual”, a elaboração do plano se trata “de um ‘poder-dever’, na medida em que prestigia toda a principiologia afeta às contratações públicas, compreendendo mecanismo estratégico importante para a eficiência administrativa”[5]Consultoria Zênite. Plano de Contratações Anual: mecanismo estratégico das contratações públicas, agora regulamentado pelo Decreto nº 10.947/2022. Curitiba: 2022. Disponível em: … Continue reading, como pontua a Consultoria Zênite.
Ademais, de acordo com o mesmo inciso VII do artigo 12 da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, cabe aos entes federativos regulamentarem o plano de contratações anual, de acordo com as características e peculiaridades locais.
Na esfera federal, essa regulamentação foi feita pelo supramencionado Decreto Federal nº 10.947/2022, que estabelece requisitos, diretrizes e regras para a elaboração do PAC, com destaque para a obrigatoriedade da elaboração do plano no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, inclusive para as contratações diretas e com recursos oriundos de empréstimos e doações (art. 6º, I e II), excetuando-se as contratações elencadas no art. 7º; e a fixação de uma data limite para a realização do plano (até a primeira quinzena de maio de cada exercício, em relação às contratações pretendidas para o exercício subsequente).
Conclusão
Conhecer a etapa preparatória de uma licitação é essencial para qualquer licitante que busque ingressar no mercado de vendas públicas com segurança e garantir o sucesso do negócio.
O conhecimento das diretrizes planejadas pelo poder público garantem também a organização e o planejamento da empresa licitante para atender ao futuro contrato administrativo, além de permitir a verificação da legalidade do processo licitatório.
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Referências[+]
↑1 | De acordo com o Referencial Básico de Gestão de Riscos do TCU, accountability pública é a “obrigação que têm as pessoas, físicas ou jurídicas, públicas ou privadas, às quais se tenha confiado recursos públicos, de assumir as responsabilidades de ordem fiscal, gerencial e programática que lhes foram conferidas, e de informar a sociedade e a quem lhes delegou essas responsabilidades sobre o cumprimento de objetivos e metas e o desempenho alcançado na gestão dos recursos públicos. É, ainda, obrigação imposta a uma pessoa ou entidade auditada de demonstrar que administrou ou controlou os recursos que lhe foram confiados em conformidade com os termos segundo os quais eles lhe foram entregues” (BRASIL. Tribunal de Contas da União. Referencial básico de gestão de riscos. Brasília: Tribunal de Contas da União, 2018). |
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↑2 | NIEBUHR, Joel de Menezes. Fase preparatória das licitações. In: NIEBUHR, Joel de Menezes (Coord.). Nova lei de licitações e contratos administrativos. 2. ed. Curitiba: Zênite, 2021. p. 80-95. |
↑3 | O critério de eficiência na alocação de riscos, de acordo com o advogado Lucas Hellmann, do escritório Schiefler Advocacia, tem como primeiro parâmetro alocar o risco “à parte que tem capacidade de, a um menor custo, prevenir a ocorrência do evento indesejado ou de promover o evento desejável ou, ainda, de controlar as consequências da sua materialização”. Sendo assim, no caso de furtos em obras, esse risco deve ser, via de regra, alocado ao particular, pois “é a parte que, a custo mais baixo, pode implementar medidas para evitar a ocorrência desses eventos” (HELLMANN, Lucas. A alocação eficiente de riscos contratuais conforme a Lei nº 14.133/2021: por um método de repartição de responsabilidades com a manutenção do equilíbrio econômico financeiro dos contratos administrativos. 2021. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Direito) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2021. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/228676. Acesso em 21 mar. 2022). |
↑4 | Instrumento cuja origem remonta à Instrução Normativa nº 1/2018 (já revogada), da Secretaria de Gestão do extinto Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, posteriormente substituída pela Instrução Normativa nº 1/2019, da Secretaria de Gestão do Ministério da Economia. |
↑5 | Consultoria Zênite. Plano de Contratações Anual: mecanismo estratégico das contratações públicas, agora regulamentado pelo Decreto nº 10.947/2022. Curitiba: 2022. Disponível em: https://zenite.blog.br/plano-de-contratacoes-anual-mecanismo-estrategico-das-contratacoes-publicas-agora-regulamentado-pelo-decreto-no-10-947-2022/. Acesso em: 21 mar. 2022. |

Como funciona a etapa preparatória de uma licitação pública: estudos preliminares
A licitação é o processo administrativo típico por meio do qual a Administração Pública seleciona o particular com quem celebrará um contrato administrativo. Por meio deste contrato, a Administração Pública obriga-se a adquirir ou vender um bem, ou a receber a prestação de um serviço, ou então a promover a delegação de uma atividade de utilidade pública. Trata-se de um processo complexo e dividido em fases, que tem início com a fase preparatória.
A fase preparatória é caracterizada pelo planejamento da contratação pretendida pelo órgão ou entidade pública. É a pedra fundamental de qualquer processo licitatório (ou processo de contratação direta, que ocorre por meio de dispensa ou inexigibilidade de licitação) e a maior responsável pelo sucesso do futuro contrato. Afinal de contas, é durante o planejamento da licitação pública que são levantadas e definidas as informações técnicas e financeiras essenciais para que a execução contratual ocorra conforme o esperado.
Inclusive, uma auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) em 2019[1]BRASIL. Tribunal de Contas da União. Auditoria Operacional Sobre Obras Paralisadas. Brasília: Tribunal de Contas da União, 2018. Disponível em: … Continue reading, a partir de um levantamento de mais de 38 mil contratos de obras públicas financiadas com recursos federais, verificou-se que o Brasil possuía mais de 14 mil obras paralisadas ou inacabadas, o que representava cerca de 37,5% de todas as obras contratadas e ainda não concluídas. O mesmo estudo apontou que 47% das paralisações (dentre os contratos do Programa de Aceleração do Crescimento) foram motivadas por problemas técnicos, e 10% por problemas financeiros. Ou seja, mais da metade das obras estava paralisada diretamente em razão de deficiências no planejamento (técnico e/ou financeiro) das contratações.
Tais dados demonstram a importância da fase preparatória das contratações públicas e os grandes impactos negativos que um planejamento deficitário gera à própria Administração, assim como aos contratados e, principalmente, à sociedade, que paga por um produto, serviço ou obra que não é entregue adequadamente.
A Lei nº 14.133/2021 (Nova Lei de Licitação e Contratos Administrativos) parte desse diagnóstico e, diferentemente da Lei nº 8.666/1993, dá grande atenção à fase preparatória da licitação, elevando a etapa de planejamento ao patamar de princípio jurídico (embora se qualifique, em verdade, como uma diretriz) e estabelecendo procedimentos mínimos que devem ser realizados pelos gestores públicos, notadamente a partir do seu artigo 18.
Neste texto, veremos os principais aspectos e os estudos preliminares exigidos na fase preparatória da licitação de acordo com a Nova Lei de Licitação e Contratos Administrativos.
ESTUDO TÉCNICO PRELIMINAR
Um processo de contratação pública, seja ele com ou sem uma licitação, tem sua origem quando a Administração identifica uma necessidade, interna (em relação à infraestrutura do órgão/entidade) ou externa (em relação aos cidadãos e à comunidade), e constata que possivelmente deverá firmar um contrato com algum particular para suprir essa necessidade.
Para descobrir a melhor solução técnica e jurídica para suprir essa necessidade verificada, a Administração precisa analisá-la e detalhá–la pormenorizadamente, o que é feito com o estudo técnico preliminar (ETP). Este documento se destina à investigação e ao levantamento de informações sobre a melhor solução contratual para o caso concreto, podendo levar a uma conclusão positiva ou negativa sobre a contratação.
O estudo técnico preliminar é, portanto, o ponto de partida da contratação, sendo conceituado pelo artigo 6º, XX, da NLLCA como o “documento constitutivo da primeira etapa do planejamento de uma contratação que caracteriza o interesse público envolvido e a sua melhor solução e dá base ao anteprojeto, ao termo de referência ou ao projeto básico a serem elaborados caso se conclua pela viabilidade da contratação”. Contudo, é no artigo 18 da mesma lei em que estão regulamentadas as suas características e conteúdo.
O objetivo do ETP é formalizar, em documento integrante e obrigatório do processo licitatório, as conclusões obtidas na fase de planejamento da licitação. O documento deve conter o problema identificado pela Administração pública que se pretende resolver com a licitação e a possível solução que se deseja alcançar com a contração pública. Estes insumos permitem avaliar a viabilidade técnica e econômica da contratação com maior concretude.
Conforme o parágrafo 1º do artigo 18, para que se atinja o objetivo desejado, o estudo técnico preliminar deve conter:
- descrição da necessidade da contratação, considerado o problema a ser resolvido sob a perspectiva do interesse público;
- demonstração da previsão da contratação no plano de contratações anual – instrumento que será melhor analisado a seguir -, sempre que elaborado, de modo a indicar o seu alinhamento com o planejamento da Administração;
- requisitos da contratação;
- estimativas das quantidades para a contratação, acompanhadas das memórias de cálculo e dos documentos que lhes dão suporte, que considerem interdependências com outras contratações, de modo a possibilitar economia de escala;
- levantamento de mercado, que consiste na análise das alternativas possíveis, e justificativa técnica e econômica da escolha do tipo de solução a contratar;
- estimativa do valor da contratação, acompanhada dos preços unitários referenciais, das memórias de cálculo e dos documentos que lhe dão suporte, que poderão constar de anexo classificado, se a Administração optar por preservar o seu sigilo até a conclusão da licitação;
- descrição da solução como um todo, inclusive das exigências relacionadas à manutenção e à assistência técnica, quando for o caso;
- justificativas para o parcelamento ou não da contratação;
- demonstrativo dos resultados pretendidos em termos de economicidade e de melhor aproveitamento dos recursos humanos, materiais e financeiros disponíveis;
- providências a serem adotadas pela Administração previamente à celebração do contrato, inclusive quanto à capacitação de servidores ou de empregados para fiscalização e gestão contratual;
- contratações correlatas e/ou interdependentes;
- descrição de possíveis impactos ambientais e respectivas medidas mitigadoras, incluídos requisitos de baixo consumo de energia e de outros recursos, bem como logística reversa para desfazimento e reciclagem de bens e refugos, quando aplicável;
- posicionamento conclusivo sobre a adequação da contratação para o atendimento da necessidade a que se destina.
O ideal é que a Administração busque elaborar o estudo técnico preliminar com o maior nível de detalhamento possível. Contudo, dos requisitos elencados acima, são obrigatórios: a descrição da necessidade de contratação, as estimativas de quantidades a serem contratadas, a estimativa de valor da contratação, a justificativa para parcelamento ou não do valor total e o posicionamento conclusivo sobre a adequação da contratação para o atendimento da necessidade (alíneas ‘a’, ‘d’, ‘f’, ‘h’ e ‘m’), conforme previsto pelo artigo 18, § 2º, devendo a Administração justificar a impossibilidade de explicitar as demais informações.
De forma adicional, a Instrução Normativa SEGES nº 58/2022[2]Disponível em: … Continue reading regulamenta a elaboração do ETP em nível federal e traz esclarecimentos sobre o disposto na Nova Lei de Licitações.
Em outras palavras, o ETP é o documento em que a Administração realiza uma investigação sobre as diferentes alternativas disponíveis para a contratação, sendo que, ao final, elegerá uma delas, a qual servirá como base para a elaboração do termo de referência, anteprojeto, projeto básico e/ou projeto executivo, conforme o caso. Além disso, o estudo técnico preliminar é o documento que servirá como base para a elaboração do anteprojeto, do termo de referência e/ou do projeto básico.
TERMO DE REFERÊNCIA, ANTEPROJETO, PROJETO BÁSICO E PROJETO EXECUTIVO
Ainda na fase de planejamento, a partir do estudo técnico preliminar (ETP), a Administração deve definir exatamente qual o objeto a ser contratado para atender as necessidades encontradas. Isto será detalhado no termo de referência, anteprojeto, projeto básico e/ou projeto executivo. A definição de qual(is) documento(s) será(ão) elaborado(s) depende da natureza do objeto a ser licitado.
Para a contratação de bens e serviços, o termo de referência é o documento necessário, cujo conteúdo deve abarcar, no mínimo, os seguintes elementos (art. 6, XXIII):
- definição do objeto, incluídos sua natureza, os quantitativos, o prazo do contrato e, se for o caso, a possibilidade de sua prorrogação;
- fundamentação da contratação, que consiste na referência aos estudos técnicos preliminares correspondentes ou, quando não for possível divulgar esses estudos, no extrato das partes que não contiverem informações sigilosas;
- descrição da solução como um todo, considerado todo o ciclo de vida do objeto;
- requisitos da contratação;
- modelo de execução do objeto, que consiste na definição de como o contrato deverá produzir os resultados pretendidos desde o seu início até o seu encerramento;
- modelo de gestão do contrato, que descreve como a execução do objeto será acompanhada e fiscalizada pelo órgão ou entidade;
- critérios de medição e de pagamento;
- forma e critérios de seleção do fornecedor;
- estimativas do valor da contratação, acompanhadas dos preços unitários referenciais, das memórias de cálculo e dos documentos que lhe dão suporte, com os parâmetros utilizados para a obtenção dos preços e para os respectivos cálculos, que devem constar de documento separado e classificado;
- adequação orçamentária.
Em se tratando de aquisição de bens, a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos estabelece que os itens de consumo adquiridos para suprir as demandas das estruturas da Administração Pública deverão ser de qualidade comum, isto é, não superior à necessária para cumprir as finalidades às quais se destinam, vedada a aquisição de artigos de luxo (art. 20). A definição do que são os “artigos de luxo” é delegada aos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário de cada ente federativo, por meio de regulamento próprio – no âmbito do Poder Executivo Federal, a regulamentação é feita pelo Decreto nº 10.818/2021.
Ademais, buscando dar concretude ao princípio do desenvolvimento nacional sustentável, o artigo 26 da NLLCA autoriza a Administração a estabelecer margem de preferência para bens manufaturados e serviços nacionais que atendam a normas técnicas brasileiras (ou para bens manufaturados e serviços originários de Estados Partes do Mercado Comum do Sul – Mercosul, desde que haja reciprocidade com o país de origem) e bens reciclados, recicláveis ou biodegradáveis, conforme regulamento. Tal margem de preferência poderá ser de até 10% sobre o preço dos bens e serviços que não se enquadrem nessa qualidade (art. 26, § 1º, II) e de até 20% se os bens manufaturados nacionais e serviços nacionais forem resultantes de desenvolvimento e inovação tecnológica no País, definidos conforme regulamento do Poder Executivo federal (art. 26, § 2º).
Vale destacar, contudo, que, embora a fixação de margens de preferência em relação à procedência dos objetos já fosse prevista na Lei nº 8.666/1993, a sua adoção é bastante rara nas licitações, sobretudo porque implica a possibilidade de contratação mais custosa aos órgãos e entidades.
Já para a contratação de obras e serviços de engenharia, a NLCCA prevê que o processo de contratação deve ser instruído, alternativa ou cumulativamente, pelos projetos básico e executivo e pelo anteprojeto. A necessidade de elaboração de cada documento dependerá do regime de execução eleito pela Administração.
O projeto básico é o documento que apresenta o conjunto de elementos necessários e suficientes, com nível de precisão adequado, para definir e dimensionar a(s) obra(s) ou o(s) serviço(s) objeto(s) da licitação, elaborado com base nas indicações dos estudos técnicos preliminares. Seu objetivo é assegurar a viabilidade técnica e o adequado tratamento do impacto ambiental do empreendimento e possibilitar a avaliação do custo da obra e a definição dos métodos e do prazo de execução. Tal documento deve conter, no mínimo, os seguintes elementos (art. 6º, XXV):
- levantamentos topográficos e cadastrais, sondagens e ensaios geotécnicos, ensaios e análises laboratoriais, estudos socioambientais e demais dados e levantamentos necessários para execução da solução escolhida;
- soluções técnicas globais e localizadas, suficientemente detalhadas, de forma a evitar, por ocasião da elaboração do projeto executivo e da realização das obras e montagem, a necessidade de reformulações ou variantes quanto à qualidade, ao preço e ao prazo inicialmente definidos;
- identificação dos tipos de serviços a executar e dos materiais e equipamentos a incorporar à obra, bem como das suas especificações, de modo a assegurar os melhores resultados para o empreendimento e a segurança executiva na utilização do objeto, para os fins a que se destina, considerados os riscos e os perigos identificáveis, sem frustrar o caráter competitivo para a sua execução;
- informações que possibilitem o estudo e a definição de métodos construtivos, de instalações provisórias e de condições organizacionais para a obra, sem frustrar o caráter competitivo para a sua execução;
- subsídios para montagem do plano de licitação e gestão da obra, compreendidos a sua programação, a estratégia de suprimentos, as normas de fiscalização e outros dados necessários em cada caso;
- orçamento detalhado do custo global da obra, fundamentado em quantitativos de serviços e fornecimentos propriamente avaliados, não sendo obrigatório para os regimes de execução integrada e semi-integrada, e obrigatório para os demais.
Com base em todas as informações coletadas nos estudos e no projeto básico, é elaborado o projeto executivo, compreendido como o conjunto de elementos necessários e suficientes à execução completa da obra, com o detalhamento das soluções previstas no projeto básico, a identificação de serviços, de materiais e de equipamentos a serem incorporados à obra, bem como suas especificações técnicas, de acordo com as normas técnicas pertinentes (art. 6º, XXVI).
Contudo, que a elaboração dos projetos básico e executivo pode ser dispensada ou transferida da Administração ao particular futuro contratado, a depender da natureza do objeto e do regime de execução contratual eleito. Isso porque, se no estudo técnico preliminar for constatado que a necessidade pode ser atendida pela contratação de obras e serviços comuns de engenharia[3]De acordo com a alínea “a” do inciso XXI do artigo 6º da NLLCA, serviço comum de engenharia é “todo serviço de engenharia que tem por objeto ações, objetivamente padronizáveis em termos … Continue reading, a especificação do objeto poderá ser realizada apenas em termo de referência ou em projeto básico, dispensada a descrição detalhada da solução no ETP ou a elaboração de outros projetos – e desde que seja demonstrada a inexistência de prejuízo para a aferição dos padrões de desempenho e qualidade almejados (art. 18, § 3º).
Além disso, se for adotado o regime de execução semi-integrada, a Administração também é dispensada de elaborar o projeto executivo, o qual ficará à cargo do futuro contratado – sendo permitida a alteração de determinados pontos do projeto básico, previamente identificados pela Administração.
Por outro lado, se o regime adotado for o de execução integrada, ambos os projetos básico e executivo serão de responsabilidade do futuro contratado. Neste caso, a Administração deve disponibilizar o anteprojeto, que é, de acordo com a definição trazida pelo artigo 6º, inciso XXIV, a peça técnica com todos os subsídios necessários à elaboração do projeto básico, devendo conter, no mínimo, os seguintes elementos:
- demonstração e justificativa do programa de necessidades, avaliação de demanda do público-alvo, motivação técnico-econômico-social do empreendimento, visão global dos investimentos e definições relacionadas ao nível de serviço desejado;
- condições de solidez, de segurança e de durabilidade;
- prazo de entrega;
- estética do projeto arquitetônico, traçado geométrico e/ou projeto da área de influência, quando cabível;
- parâmetros de adequação ao interesse público, de economia na utilização, de facilidade na execução, de impacto ambiental e de acessibilidade;
- proposta de concepção da obra ou do serviço de engenharia;
- projetos anteriores ou estudos preliminares que embasaram a concepção proposta;
- levantamento topográfico e cadastral;
- pareceres de sondagem;
- memorial descritivo dos elementos da edificação, dos componentes construtivos e dos materiais de construção, de forma a estabelecer padrões mínimos para a contratação.
Destaca-se, por fim, que nas contratações integradas e semi-integradas, os riscos decorrentes de fatos supervenientes à contratação associados à escolha da solução de projeto pelo contratado deverão ser alocados como de sua responsabilidade na matriz de riscos (art. 22, § 4º).
Ou seja, na contratação semi-integrada, o contratado é responsável pelas soluções técnicas que ele mesmo definiu no projeto executivo, ficando a Administração responsável, via de regra, pelas soluções definidas no projeto básico. Já na contratação integrada, o particular é responsável pelas soluções dos projetos básico e executivo, restando a Administração responsável pelos riscos decorrentes das soluções por ela fixadas no anteprojeto. A lógica aqui é que “a parte que elabora o projeto e define as soluções a serem adotadas deve arcar com os riscos associados, pois ela é, em primeira análise, a parte capaz de evitar esses riscos, elaborando adequadamente os estudos técnicos”[4]HELLMANN, Lucas. A alocação eficiente de riscos contratuais conforme a Lei nº 14.133/2021: por um método de repartição de responsabilidades com a manutenção do equilíbrio econômico … Continue reading.
CONCLUSÃO
Dando diretrizes práticas ao planejamento da licitação, a Lei nº 14.133/2021 prevê com maior riqueza de detalhes que a lei anterior (Lei nº 8.666/1993) a fase preparatória da licitação, trazendo definições e regramentos específicos para os diversos tipos de estudos preparatórios para a contratação pública.
As referidas etapas preparatórias são de extrema importância não apenas para a Administração Pública, mas também para as empresas que pretendem realizar contratos administrativos. A adequação com as diretrizes planejadas pelo poder público e o conhecimento integral do planejamento da contratação são fatores essenciais para o sucesso do negócio.
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Referências[+]
↑1 | BRASIL. Tribunal de Contas da União. Auditoria Operacional Sobre Obras Paralisadas. Brasília: Tribunal de Contas da União, 2018. Disponível em: https://portal.tcu.gov.br/biblioteca-digital/auditoria-operacional-sobre-obras-paralisadas.htm. Acesso em: 9 mar. 2022. |
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↑2 | Disponível em: https://www.gov.br/compras/pt-br/acesso-a-informacao/legislacao/instrucoes-normativas/instrucao-normativa-seges-no-58-de-8-de-agosto-de-2022#:~:text=AGOSTO%20DE%202022-,INSTRU%C3%87%C3%83O%20NORMATIVA%20SEGES%20N%C2%BA%2058%2C%20DE%208%20DE%20AGOSTO%20DE,sobre%20o%20Sistema%20ETP%20digital |
↑3 | De acordo com a alínea “a” do inciso XXI do artigo 6º da NLLCA, serviço comum de engenharia é “todo serviço de engenharia que tem por objeto ações, objetivamente padronizáveis em termos de desempenho e qualidade, de manutenção, de adequação e de adaptação de bens móveis e imóveis, com preservação das características originais dos bens”. |
↑4 | HELLMANN, Lucas. A alocação eficiente de riscos contratuais conforme a Lei nº 14.133/2021: por um método de repartição de responsabilidades com a manutenção do equilíbrio econômico financeiro dos contratos administrativos. 2021. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Direito) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2021. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/228676. Acesso em: 21 mar. 2022. |
O texto versa sobre o Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP) e os principais pontos que permeiam a dificuldade na sua aplicabilidade.
O advogado Gustavo Schiefler estreou, no último domingo (23/05/2021), na nova coluna do site Conjur: Público & Pragmático. O seu primeiro texto, intitulado “É recomendável aplicar a nova Lei de Licitações na pendência do PNCP?”, versa sobre o Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP) e os principais pontos que permeiam a dificuldade na sua aplicabilidade, oferecendo diretrizes e soluções aos impasses. Acesse em: https://www.conjur.com.br/2021-mai-23/publico-pragmatico-recomendavel-aplicar-lei-licitacoes-pendencia-pncp
A coluna Público & Pragmático recebe textos aos domingos e segue sob a curadoria do Prof. Gustavo Justino de Oliveira (USP e IDP).
Read MoreA exposição ocorreu no evento Judiciário Exponencial.
O advogado Gustavo Schiefler participou, hoje (13/5/2021), do evento Judiciário Exponencial, proferindo palestra sobre a contratação direta de Encomenda Tecnológica (art. 19, §2º-A, V, da Lei da Inovação). Em sua apresentação, Gustavo Schiefler enfatizou o potencial disruptivo desta modelagem contratual, vocacionada a resolver problemas concretos da Administração Pública que dependam de um desenvolvimento tecnológico ainda inexistente ou indisponível, em que exista risco tecnológico.
Contando com a participação de mais de 40 integrantes de Tribunais brasileiros, Schiefler destacou a existência de um importante precedente contratual, que pode servir como referência para novas contratações semelhantes: a encomenda tecnológica realizada pelo Supremo Tribunal Federal em 2019, para o desenvolvimento de um módulo integrante do PJe com inteligência artificial. Para quem se interessa pelo tema, Gustavo Schiefler recomendou a obra “Contratação de Inovação na Justiça – com os avanços do Marco Legal de Ciência, Tecnologia e Inovação” (2020), da qual é autor de dois capítulos, onde trata não somente da Encomenda Tecnológica como também de outras formas de contratar tecnologia.
Participaram também do evento, como expositores, os Drs. Ademir Piccoli (organizador do Judiciário Exponencial), Nathália Domingues Oliveira Barbosa (assessora do NIT/UFMG), Thiago de Andrade Vieira (Diretor de Tecnologia da Informação do CNJ) e Rafael Bitencourt (Líder de Práticas de Contratação de Nuvem em Governo da AWS).
Read MoreO novo marco consolida importantes flexibilizações e simplificações procedimentais, sobretudo no âmbito do uso de tecnologias da informação, que devem facilitar, na prática, a condução dos procedimentos licitatórios.
No dia 1º de abril de 2021, foi sancionada e publicada no Diário Oficial da União a Lei nº 14.133/2021, que unifica o regime jurídico sobre licitações e contratos administrativos no Brasil. A “Nova Lei de Licitações” inaugura e protagoniza uma era digital no âmbito das contratações públicas brasileiras, estabelecendo-se como um esperado paradigma normativo, sobretudo devido à defasagem sistêmica da Lei nº 8.666/93 e demais normas que historicamente regem as licitações e contratos administrativos.
Em síntese, a Lei nº 14.133/2021 consolida em um único diploma normativo o regime jurídico aplicável às licitações e contratos administrativos, sendo que, antes disso, as normas legais encontravam-se distribuídas entre disposições contidas na Lei Geral de Licitações (Lei nº 8.666/93), na Lei do Pregão (Lei nº 10.520/2002) e, extraordinariamente, na Lei nº 12.462/11, que dispõe sobre o Regime Diferenciado de Contratações (RDC). O novo diploma traz importantes aperfeiçoamentos para o âmbito das contratações públicas, consolidando boas práticas, introduzindo novos institutos e corrigindo falhas pontuais do sistema licitatório brasileiro, ainda que siga uma sistemática muito similar à antiga (em processo de substituição) Lei nº 8.666/93.
Com 194 artigos, a Lei nº 14.133/2021 visa a ocupar a posição de “lei geral”, propondo-se a ser um diploma consolidado e exauriente sobre o tema. Dentre seus cinco títulos, a lei inclui não apenas disposições acerca das licitações e dos contratos administrativos propriamente ditos, como também tipifica infrações e prevê as respectivas sanções, realizando, inclusive, modificações no Código de Processo Civil, no Código Penal e na Lei das Parcerias Público-Privadas (Lei nº 11.079/2004).
A Nova Lei de Licitações foi aprovada e publicada após quase 25 anos de discussões e tramitação, entre idas e vindas nas comissões parlamentares, uma vez que o Projeto de Lei nº 4.253/2020, que deu origem à atual Lei nº 14.133/2021, consiste, em realidade, em Substitutivo da Câmara dos Deputados aos Projetos de Lei do Senado nº 163/95 e nº 559/2013.
Novidades da Nova Lei de Licitações
Pensada com o objetivo de adaptar os mecanismos licitatórios e contratuais à realidade contemporânea, que é voltada ao universo de atividades em âmbito eletrônico, e visando, sobretudo, a acompanhar a dinâmica atual das relações contratuais da Administração, a Nova Lei de Licitações trouxe um grupo de novidades voltadas aos procedimentos eletrônicos e instrumentos digitais, como, por exemplo:
- A criação do Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP), ainda a ser instituído, que terá por objetivo operacionalizar e concentrar informações sobre licitações e contratos administrativos. O portal em questão ficará responsável, ainda, pela divulgação centralizada de todos os atos licitatórios dos órgãos e entidades da Administração direta, autárquica e fundacional da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;
- Licitação em meio eletrônico como a regra geral para todos os certames e, caso seja realizada de forma presencial, a imposição de que as sessões sejam gravadas em áudio e vídeo.
Além da necessidade de acompanhar o desenvolvimento tecnológico, um dos fios condutores do novo marco licitatório foi um visível esforço para que a Administração Pública mantenha-se em consonância com as melhores práticas contemporâneas, seguindo o que atualmente está pacificado na jurisprudência e em normativas infralegais. Nesse sentido, foram inseridos diversos dispositivos na Lei nº 14.133/2021 que têm por objetivo prestigiar a simplificação e o formalismo moderado nas contratações, racionalizando procedimentos e sedimentando práticas contratuais já existentes, mas que não possuíam, até então, previsão legal no regime ordinário. Nesse contexto, destacam-se as seguintes alterações:
- Incorporação, no novo diploma, de práticas e procedimentos não previstos nem regulamentados pela Lei nº 8.666/1993, como a contratação por credenciamento, a pré-qualificação do objeto ou de interessados, o procedimento de manifestação de interesse (PMI) e o registro cadastral unificado (art. 78 e ss.);
- Protagonismo à etapa de planejamento das licitações públicas, com destaque para o estudo técnico preliminar (art. 18);
- Maior flexibilização das hipóteses de dispensa de licitação, bem como a adequação dos exemplos de inexigibilidade (art. 75);
- Previsão de contratação de bens e também de serviços exclusivos, indicando formas mais flexíveis para viabilizar a comprovação de exclusividade, além da suavização na comprovação da notória especialização (art 74);
- Alteração do prazo e vigência de contratos de serviços ou fornecimentos contínuos, ou sob regime de fornecimento e prestação de serviço associado: de até 5 anos, prorrogáveis por até 10 anos (art. 105 e ss.);
- Antecipação dos efeitos do termo aditivo (art. 132);
- Possibilidade de afastamento do dever de elaborar parecer jurídico em razão do valor, complexidade ou padronização das contratações (art. 53, §5º);
- Diretrizes em favor do saneamento de vícios e critérios para decisão sobre a preservação da avença ou declaração de nulidade do contrato (art. 12, III, art. 59, I e V, art. 71, III, e art. 147).
A Nova Lei de Licitações repete algumas modalidades de licitação já conhecidas, como o pregão, a concorrência, o concurso e o leilão, sendo que o rito licitatório é inteiramente inspirado na experiência do pregão (com fase recursal única e habilitação após o julgamento). Ao lado das modalidades conhecidas, a Lei nº 14.133/2021 prevê ainda uma nova modalidade específica para o desenvolvimento de soluções durante o certame: o diálogo competitivo. No novo diploma foram extintas, porém, as modalidades de convite e tomada de preços, previstas na antiga Lei Geral de Licitações.
Ademais, é digna de nota a preocupação do novo diploma com a sustentabilidade, que teve sua importância majorada por meio de previsões específicas, como a contida no artigo 144 da Lei nº 14.133/2021, que permite o estabelecimento de remuneração variável vinculada ao desempenho do contratado, inclusive com base em critérios de sustentabilidade ambiental.
O dever de integridade também ocupa posição de destaque no texto da nova lei, uma vez que passa a ser obrigatória a existência de programa de integridade pelo licitante no caso de contratações de obras, serviços e fornecimentos de grande vulto (superior a duzentos milhões de reais), conforme dispõe o art. 25, § 4º, além de ser utilizada como critério de desempate (art. 60) e atenuante de eventuais sanções impostas (art. 156, §1º).
Cumpre destacar, ainda, algumas novidades pontuais, como a criação da figura do “agente de contratação”, em substituição à comissão de licitação, e as alterações em matéria criminal, uma vez que a nova lei acrescentou doze tipos penais ao Código Penal. A propósito, a Lei nº 14.133/2021 revogou e substituiu, desde a sua publicação, os crimes previstos na Lei nº 8.666/93.
Aplicação da Nova Lei de Licitações
A Nova Lei de Licitações entrou em vigor na data de sua publicação, porém permanece sendo de uso facultativo até o marco temporal de 1º de abril de 2023, quando serão oficialmente revogadas a Lei nº 8.666/93 (atual Lei Geral de Licitações), a Lei nº 10.520/2002 (Lei do Pregão) e os arts. 1º a 47-A da Lei nº 12.462/2011 (que tratam do Regime Diferenciado de Contratações – RDC).
Durante esses dois anos de transição e adaptação, será possível utilizar, em licitações e contratos administrativos, alternativamente, ou a Nova Lei de Licitações ou o regime definido pelas normas do regime em substituição, sendo vedada a combinação de regimes.
Dos vetos presidenciais
Dentre os 26 vetos presidenciais apresentados, que ainda devem ser analisados pelo Congresso Nacional, destacam-se os seguintes:
- Foi vetado o dispositivo que previa que a empresa contratada por órgão público deverá divulgar em seu site próprio, após a licitação, o teor dos contratos assinados.
- Foi vetada a disposição acerca de autorização conferida aos estados, municípios e distrito federal para estabelecer margem de preferência para produtos fabricados em seus territórios;
- Foi vetado o dispositivo que determinava ao órgão público o depósito em conta dos recursos necessários antes do início da execução de cada etapa da obra;
- Foi vetada a obrigatoriedade de os Municípios realizarem divulgação complementar de suas contratações mediante publicação de extrato de edital de licitação em jornal diário de grande circulação local;
- Foi vetada a obrigatoriedade de limitação dos valores de referência dos itens de consumo dos três Poderes nas esferas federal, estadual, distrital e municipal aos valores de referência do Poder Executivo federal.
Conclusões
De modo geral, ainda que a Nova Lei de Licitações não possa ser considerada especialmente inovadora, pois, como mencionado, se orienta por uma lógica similar à da Lei nº 8.666/93, é possível afirmar que o novo marco consolida importantes flexibilizações e simplificações procedimentais, sobretudo no âmbito do uso de tecnologias da informação, que devem facilitar, na prática, a condução dos procedimentos licitatórios.
Nota-se que a Lei nº 14.133/2021 carrega, como característica marcante, a previsão expressa e o detalhamento de diversas práticas licitatórias e contratuais que, embora já existissem na prática administrativa, careciam de positivação em lei. A expectativa é, portanto, que o diploma confira maior segurança jurídica aos licitantes e particulares contratados pela Administração Pública, em mais um importante passo no longo caminho de evolução do Direito Administrativo brasileiro.
Read MoreO curso contempla o regime da Lei nº 8.666/1993 e também da Nova Lei de Licitações (Lei nº 14.133/2021).
Nos dias 12 e 13 de abril de 2021, o advogado Gustavo Schiefler ministrou as duas primeiras aulas do curso “40 vícios mais comuns nas licitações e contratações diretas”, promovido pela Zênite Consultoria e Informação.
Em abordagem que contemplou o regime da Lei nº 8.666/1993 e também da Nova Lei de Licitações (Lei nº 14.133/2021), Gustavo tratou da identificação dos vícios e as consequências no procedimento, assim como dos vícios mais comuns no planejamento da licitação, com foco nos entendimentos do Judiciário e do TCU.
Os principais pontos abordados foram:
- Identificação dos vícios e as consequências no procedimento;
- Entendimentos do Judiciário e do TCU;
- LINDB e a Lei de Licitações;
- Vícios mais comuns no planejamento da licitação;
- Regime atual e novidades pontuais da nova Lei de Licitações;
- Escolha da solução e da modelagem de contratação que melhor atende à necessidade administrativa;
- Definição do objeto;
- Exigência de amostra;
- Reunião do objeto em lotes e divisão em itens;
- Estudo Técnico Preliminar (ETP);
- Pesquisa de preços de mercado de acordo com a IN nº 73/2020 e elaboração de planilhas;
O evento foi promovido pela Escola do Legislativo Deputado Lício Mauro da Silveira.
No dia 5/4/2021, o advogado Gustavo Schiefler ministrou a palestra de abertura do Curso de Licitação e Fiscalização de Contratos dos servidores da Assembleia Legislativa do Estado de Santa Catarina (ALESC), em evento promovido pela Escola do Legislativo Deputado Lício Mauro da Silveira.
No primeiro dia útil após a entrada em vigor da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei Federal nº 14.133/2021), Gustavo Schiefler apresentou os principais destaques deste novo regime de contratações, durante 2 horas-aula, para um público de aproximadamente 70 pessoas. Na palestra, a Nova Lei de Licitações foi abordada em 8 pontos principais. São eles:
- Perguntas básicas sobre a Nova Lei de Licitações;
- Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP);
- Redução de formalidades e adoção de tecnologias;
- Modalidades, Fases e Modos de Disputa;
- Institucionalização dos Diálogos Público-Privados;
- Novidades nas Contratações Diretas;
- Prazo de duração dos Contratos Administrativos;
- Destaques Finais.
A palestra está disponível no YouTube e pode ser conferida no link: https://www.youtube.com/watch?v=P9jxBRjxyG0.
Read MoreO evento, realizado de maneira online, é reconhecido nacionalmente como o maior congresso gratuito de Direito do Brasil.
O advogado Murillo Preve participou como parecerista da Mostra de Pesquisa do XV Congresso Direito UFSC, na área de Direito Administrativo e Gestão Pública. Os temas dos trabalhos apresentados pelos participantes da Mostra trataram de diversos assuntos, como: Requisição Administrativa e Direito à Saúde; Princípio da Publicidade e a pandemia de Covid-19; Antecipação de Pagamentos nas Contratações Públicas; Direito Previdenciários e o Princípio da Eficiência na Administração Pública.
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Organizado exclusivamente pelos estudantes do curso de Direito da UFSC, o evento foi realizado na semana passada e reuniu, este ano de maneira online, milhares de participantes e os principais juristas do país, sendo reconhecido nacionalmente como o maior congresso gratuito de Direito do Brasil.
As aulas integraram o curso "O que muda com a Nova Lei de Licitações", da Zênite Informação, em que foram abordadas diversas questões práticas sobre a esperada Nova Lei de Licitações.
Nesta terça-feira (2/3/2021), o advogado Gustavo Schiefler abordou diversas questões práticas sobre a esperada Nova Lei de Licitações, cujo Projeto de Lei está em vias de ser encaminhado para a sanção do Presidente da República.
As aulas integraram o curso “O que muda com a Nova Lei de Licitações”, da Zênite Informação. Em dois turnos, Gustavo Schiefler apresentou, a aproximadamente 600 participantes, as principais diferenças existentes nas etapas da licitação, incluindo questões sobre as modalidades, o Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP), a publicidade do edital, os prazos mínimos, os critérios de julgamento e os modos de disputa da projetada Nova Lei de Licitações.
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