A regulamentação do termo de referência na administração pública federal pela IN CGNOR/ME nº 81, de 25 de Novembro de 2022
Com a iminência do fim do período de transição entre o antigo regime de contratações públicas e a Lei nº 14.133/2021, a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, uma série de aspectos desta Lei têm sido objeto de regulamentação por parte dos entes que compõem a Administração Pública.
É exatamente nesse contexto que, em 25 de novembro de 2022, foi publicada a Instrução Normativa CGNOR/ME nº 81, que trata da elaboração do termo de referência no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional, e que também dispõe sobre a utilização do Sistema TR digital.
Em síntese, essa regulamentação federal institucionaliza o Sistema TR digital e traz diretrizes gerais a serem observadas na elaboração do termo de referência pela Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional, bem como por órgãos e entidades da administração estadual, distrital ou municipal, direta ou indireta, quando executarem recursos da União decorrentes de transferências voluntária.
Mas o que é termo de referência? E quais são as diretrizes trazidas pela IN CGNOR/ME nº 81/2022?
Em linhas gerais, o termo de referência é um documento no qual a Administração Pública apresenta, aos potenciais interessados, informações detalhadas acerca do produto ou do serviço que pretende contratar. Como o próprio nome já diz, é neste documento que são estabelecidas as referências acerca do bem a ser fornecido ou do serviço a ser prestado.
Trata-se de um documento que deve ser elaborado durante a etapa de planejamento das contratações, e que deve ser publicado em conjunto com o instrumento convocatório. Nesse sentido, a respeito do conteúdo deste documento, em seu art. 6º, XXIII, a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos estabeleceu que o termo de referência deverá contemplar os seguintes elementos descritivos:
- Definição do objeto, incluindo sua natureza, os quantitativos, o prazo do contrato e, se for o caso, a possibilidade de prorrogação;
- Fundamentação da contratação, utilizando-se do teor dos estudos técnicos preliminares;
- Descrição da solução como um todo;
- Requisitos da contratação;
- Modelo de execução do objeto, ou seja, definição de como o contrato deverá produzir os resultados pretendidos;
- Modelo de gestão do contrato, que descreve como a execução será acompanhada e fiscalizada;
- Critérios de medição e de pagamento;
- Forma e critérios de seleção do fornecedor;
- Estimativas do valor da contratação, acompanhadas dos preços unitários referenciais, das memórias de cálculo e dos documentos que lhe dão suporte;
- Adequação orçamentária.
Diante dessas exigências, o que faz o que faz a Instrução Normativa CGNOR/ME nº 81, de 25 de novembro de 2022, é complementar a abordagem da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos sobre os elementos descritivos que compõem o termo de referência, trazendo diretrizes para a elaboração deste documento. Mais especificamente, a regulamentação acrescenta as seguintes exigências para a elaboração de termos de referência:
- Na definição do objeto, além da natureza, dos quantitativos, do prazo do contrato e de eventual possibilidade de prorrogação, deverá ser apresentada (i) a especificação do bem ou do serviço, preferencialmente conforme o catálogo eletrônico de padronização de compras, serviços e obras (Portaria nº 938, de 2 de fevereiro de 2022), observados os requisitos de qualidade, rendimento, compatibilidade, durabilidade e segurança; (ii) a indicação dos locais de entrega dos produtos e das regras para recebimento provisório e definitivo, quando for o caso; (iii) a especificação da garantia exigida e das condições de manutenção e assistência técnica, quando for o caso;
- Quando não houver estudo técnico preliminar, exige-se que a fundamentação deverá seja realizada mediante justificativa do mérito da contratação e do quantitativo pretendido;
- Na descrição da solução, além de considerar todo o ciclo de vida do objeto, o termo de referência deverá dar preferência a arranjos inovadores em sede de economia circular;
- No tocante à forma e critérios de seleção de fornecedor, dispõe-se que sempre se deverá optar pelo critério de julgamento de técnica e preço quando a avaliação e a ponderação da qualidade técnica das propostas que superarem os requisitos mínimos estabelecidos no edital forem relevantes aos fins da Administração;
- Quanto à estimativa do valor da contratação, faz-se referência à Instrução Normativa nº 65, de 7 de julho de 2021;
- A respeito da adequação orçamentária, indica-se ser ela prescindível quando se tratar de sistema de registro de preços;
Além disso, a IN CGNOR/ME nº 81/2022 formaliza a necessidade de que o termo de referência demonstre a vinculação entre a contratação e o Plano de Contratações Anual do órgão ou entidade administrativa contratante, indicando o alinhamento entre este negócio e o planejamento desenvolvido para cada exercício.
Ainda quanto ao termo de referência, a regulamentação federal em comento destaca as hipóteses em que a elaboração deste documento será dispensada, quais sejam, (i) contratação que mantenha condições definidas em edital de licitação deserta ou fracassada ocorrida há menos de 1 ano; (ii) adesão em ata de registro de preços, nas quais o estudo técnico preliminar deverá apresentar as principais informações sobre a contratação; e (iii) prorrogação de contratos de serviço e fornecimento contínuos.
No mais, a IN CGNOR/ME nº 81/2022 dispõe que o termo de referência deverá ser elaborado no Sistema TR Digital, cedido pelo Governo Federal aos órgãos e entidades administrativos da União, dos Estados, dos Municípios e do Distrito Federal, sendo resguardada a opção de utilizar ferramenta informatizada própria, desde as demais regras e procedimentos desta Instrução Normativa sejam atendidos.
O que é o Sistema TR Digital? Por que ele foi criado? O que a IN CGNOR/ME nº 81/2022 diz sobre ele?
Como dito inicialmente, além de trazer diretrizes para a elaboração do termo de referência, a IN CGNOR/ME nº 81, de 25 de novembro de 2022, também institucionaliza o Sistema TR Digital, que consiste em uma ferramenta informatizada voltada à elaboração do termo de referência, integrante da plataforma do Sistema Integrado de Administração de Serviços Gerais (SIASG) e disponibilizada pelo Governo Federal.
Em outras palavras, o Sistema TR Digital se caracteriza como uma ferramenta tecnológica cujo principal objetivo é aumentar a eficiência na elaboração do termo de referência pela Administração Pública. Da mesma forma que o Sistema ETP Digital, regulamentado pela IN nº 40, de 22 de maio de 2020, e que auxilia na elaboração dos estudos técnicos preliminares, trata-se de uma ferramenta que busca se valer da tecnologia para aperfeiçoar a atuação administrativa na etapa de planejamento das contratações.
Na prática, o Sistema TR Digital disponibilizará, aos seus usuários, modelos de termo de referência desenvolvidos pela Câmara Nacional de Modelos da Advocacia-Geral da União e instituídos pela Secretaria de Gestão do Ministério da Economia, facilitando a adaptação desses modelos para que sejam ajustados às especificidades de cada contratação e apresentando campos para o preenchimentos dos elementos essenciais em cada termo de referência.
Dessa forma, ao institucionalizar o Sistema TR Digital, a IN CGNOR/ME nº 81, de 25 de novembro de 2022, pretende padronizar os termos de referência e, assim, tornar a elaboração desses documentos uma atividade mais eficiente, tanto sob a perspectiva da celeridade, com o aproveitamento das minutas disponibilizadas, quanto da qualidade do documento produzido, que estará alinhado com os modelos utilizados como parâmetro.
Cabe reforçar, no entanto, que a adesão ao Sistema TR Digital é obrigatória apenas para os órgãos e entidades da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional, sendo que os demais órgãos e entidades estaduais, distritais ou municipais poderão utilizar ferramenta informatizada própria, desde que atendidas as regras e procedimentos previstos.
Por fim, destaca-se que o Sistema TR Digital ainda está em fase de desenvolvimento, e que a primeira versão desta ferramenta deve ser disponibilizada ao longo do primeiro trimestre de 2023. Portanto, até que este Sistema esteja disponível, os órgãos e entidades administrativas poderão utilizar outra ferramenta eletrônica com a única condição de que, ao final, juntem a respectiva documentação ao sistema de controle e movimentação de processos administrativos eletrônico oficial.
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Read MoreAnulação do certame licitatório: o que diz a lei e a jurisprudência?
No Direito, a “anulação” é um tema que está sempre relacionado à verificação da ocorrência de alguma ilegalidade que não possa ser corrigida sem grave prejuízo. Em licitações, a anulação é o ato pelo qual a Administração Pública aponta a ocorrência de uma ilegalidade (vício) e, em razão disso, determina o desfazimento parcial ou integral do certame.
Mas não são todos os vícios que resultam automaticamente na anulação de um processo licitatório. Alguns vícios podem possuir a natureza de mera irregularidade, sem prejuízos materiais ou consequências drásticas sobre a continuidade do procedimento. Nesses casos, deve a Administração buscar reparar tais defeitos de procedimento. Dessa forma, a anulação ocorrerá somente nos casos em que os vícios impliquem consequências graves e substanciais, com o potencial de invalidar todo o andamento do certame.
Neste texto, veremos como a Nova Lei de Licitações lida com a anulação e como esta disciplina legal se relaciona com alguns precedentes jurisprudenciais que já abordavam o tema.
1. A anulação na Nova Lei de Licitações:
Como dito anteriormente, a anulação de uma licitação deve ocorrer apenas diante dos denominados “vícios insanáveis”. Isto é, diante daqueles vícios que não são passíveis de serem corrigidos e que, por isso, inviabilizam a legalidade do certame como um todo ou o seu aproveitamento para a futura etapa de contratação.
Assim, segundo a Lei nº 14.133/2021, diante de uma irregularidade, a Administração deve, primeiro, buscar corrigir o vício, e somente se não for possível tal correção, deve lançar mão de um ato de anulação. Esse é o teor do art. 71 da Lei nº 14.133/2021, vejamos:
Art. 71. Encerradas as fases de julgamento e habilitação, e exauridos os recursos administrativos, o processo licitatório será encaminhado à autoridade superior, que poderá:
I – determinar o retorno dos autos para saneamento de irregularidades;
[…]
III – proceder à anulação da licitação, de ofício ou mediante provocação de terceiros, sempre que presente ilegalidade insanável; […]
O exame dos “erros” que podem ou não resultar em anulação do certame deve ser feito pela autoridade superior, que, no caso, também é a autoridade competente para adjudicar o objeto e homologar a licitação. Esse exame faz parte do “controle interno” que a própria Administração realiza sobre os atos que pratica. Contudo, vale lembrar que a anulação de uma licitação também pode ser feita tanto pelo Poder Judiciário quanto pelo Tribunal de Contas competente da respectiva esfera.
Mas, atenhamo-nos, aqui, ao controle interno da própria Administração. Isso porque, ao verificar a ocorrência de algum problema, a autoridade superior deve determinar o retorno do processo para o refazimento do ato manchado por uma irregularidade. Porém, identificando a impossibilidade dessa correção (saneamento), a autoridade superior, de ofício ou a pedido, poderá anular a licitação, no todo ou em parte, a fim de que tal vício não comprometa a integridade dos resultados do certame futuramente.
A excepcionalidade na anulação de um certame respeita o princípio segundo o qual não deve ser reconhecida a nulidade quando não há dano às partes envolvidas ou ao objeto chancelado pelo procedimento (o que a doutrina jurídica chama de “pas de nullité sans grief”).
Assim, a lei dispõe que nesses casos de anulação deve ser garantida a prévia manifestação dos interessados, a fim de que se dê voz sobre a gravidade da irregularidade identificada. Essa previsão demonstra que a anulação é medida que resguarda o interesse das próprias partes envolvidas, de modo que a não concessão de oportunidade prévia para manifestação pode ser, inclusive, uma irregularidade sobre o ato de anulação.
Vale ressaltar que o ato de anulação é também, ele próprio, passível de ser objeto de recurso administrativo, no prazo de três dias úteis, contados da data de intimação ou de lavratura da ata, conforme redação do art. 165, I, d, da Lei nº 14.133/2021.
2. Precedentes jurisprudenciais
Feitas essas considerações, nos cabe comentar um pouco sobre alguns casos já enfrentados pela jurisprudência e que podem seguir orientando o tema na vigência da Nova Lei de Licitações.
Um bom exemplo diz respeito à anulação de licitações após a adjudicação do objeto e a homologação do certame. De forma ilustrativa, imagine um caso em que a parte impetra Mandado de Segurança para pedir a anulação da licitação, porém, antes que o processo judicial seja efetivamente julgado, ocorre a homologação da licitação e a adjudicação do objeto em favor da licitante vencedora.
Foi diante de um caso assim que o Superior Tribunal de Justiça afastou o argumento de que a adjudicação do objeto da licitação ocasionaria, automaticamente, na perda do objeto da ação (Mandado de Segurança), em que se tratava da ocorrência de vícios no certame licitatório. Assim, o STJ fixou o entendimento de que a apreciação de eventuais ilegalidades não pode ser afastada do Poder Judiciário, em qualquer tempo, sendo possível, inclusive, determinar-se a anulação da licitação mesmo após o seu encerramento. [1]ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL. CIVIL. LICITAÇÃO. TÉCNICA E PREÇO. JULGAMENTO. RECURSO ADMINISTRATIVO. PROJETO EXECUTIVO NA TRANSPOSIÇÃO DO RIO SÃO FRANCISCO. MINISTRO DE ESTADO DA INTEGRAÇÃO … Continue reading
Há, no entanto, casos em que os órgãos de controle, ao ponderar sobre as consequências práticas de suas decisões, acabam por não interferir nas escolhas administrativas, especialmente quando estas podem importar em anulação de uma licitação ou prejudicar um contrato administrativo em execução. Isto é, existem casos em que os órgãos de controle, e a própria Administração Pública, podem, excepcionalmente, optar pela convalidação das irregularidades ocorridas, porque esta atitude se apresenta como mais favorável ao interesse público.
O Tribunal de Contas da União já enfrentou caso similar em que se verificou que, embora tenha ocorrido uma série de falhas em relação à publicidade e à competitividade do certame, ainda assim, o procedimento resultou na celebração de contratos com preços vantajosos para a Administração. [2]No seu voto, o Ministro Relator consignou que: Não há, portanto, razão para anular os referidos contratos, uma vez que foram avençados a preços vantajosos para a administração e não se … Continue reading
Esse precedente do TCU revela que, a depender da gravidade dos erros identificados na licitação e dos resultados atingidos por esse procedimento, a anulação nem sempre é a melhor medida a ser tomada. Em outras palavras, diante de uma irregularidade que poderia ter sido saneada, porém, tendo a licitação alcançado o resultado almejado, mediante a celebração de um Contrato vantajoso à Administração, os vícios identificados poderão ser convalidados, mantendo a contratação feita em favor do interesse público.
Vale salientar que essa lógica, inclusive, foi absorvida pela Nova Lei de Licitações, no seu art. 147, parágrafo único, que prevê expressamente que caso a anulação não se revele medida de acordo com o interesse público, “o poder público deverá optar pela continuidade do contrato e pela solução da irregularidade por meio de indenização por perdas e danos, sem prejuízo da apuração de responsabilidade e da aplicação de penalidades cabíveis”.
3. O que fazer diante de um ato de anulação?
Como se pode ver, o ato de anulação possui tanto o aspecto de proteção da lisura do procedimento licitatório e do objeto a ser contrato, quanto o aspecto de prestar atenção aos resultados da licitação e da contratação, quando não se está diante de uma ilegalidade insanável. Isto é, entre as possibilidades de correção do vício e anulação, quando na esfera administrativa, ou entre as possibilidades de convalidação do vício e anulação, quando na esfera judicial ou de controle de contas, deve haver sempre um juízo de ponderação sobre o interesse público e o interesse das partes envolvidas.
Nestes casos, a existência ou não de dano em razão do vício deve ser aferida mediante o diálogo da Administração Pública, ou órgãos de controle, com as partes interessadas. Assim, diante de uma irregularidade ou uma anulação de certame, existem uma série de medidas legais que o particular poderá adotar. Como, por exemplo:
- pedido administrativo de nulidade;
- prévia manifestação ao ato de anulação;
- recurso administrativo em face de ato anulação;
- representação junto ao Tribunal de Contas;
- ação judicial.
Todas essas são medidas que o particular pode lançar mão para argumentar acerca da existência ou extensão de um dano por irregularidade no procedimento. Para a boa utilização de todos esses instrumentos, é indispensável o acompanhamento de um profissional capacitado na área.
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Referências[+]
↑1 | ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL. CIVIL. LICITAÇÃO. TÉCNICA E PREÇO. JULGAMENTO. RECURSO ADMINISTRATIVO. PROJETO EXECUTIVO NA TRANSPOSIÇÃO DO RIO SÃO FRANCISCO. MINISTRO DE ESTADO DA INTEGRAÇÃO NACIONAL. CONSULTORIA. PRELIMINAR DE ILEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM REJEITADA. PRELIMINAR DE DECADÊNCIA. REJEITADA. PRELIMINAR DE PERDA DE OBJETO. NÃO ACOLHIDA. PRELIMINAR DE AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. NÃO ACATADA. ALEGADAS INFORMAÇÕES PRIVILEGIADAS. NÃO COMPROVAÇÃO. PRETENSA SUBJETIVIDADE DO EDITAL. JULGAMENTO MOTIVADO. VIOLAÇÃO À ISONOMIA. INOCORRÊNCIA. OFENSA AO ART. 9º, I, DA LEI 8.666/93. INEXISTENTE. AUSÊNCIA DE DIREITO LÍQUIDO E CERTO. 1. Cuida-se de mandado de segurança impetrado contra decisão de Ministro de Estado que negou provimento ao recurso administrativo interposto contra o julgamento de proposta técnica de licitação para contratação de consultoria para formulação de parte de projeto executivo para obra de grande escala (Transposição do Rio São Francisco). […] 4. A Corte Especial do STJ já acordou que “a superveniente adjudicação não importa na perda de objeto do mandado de segurança, pois se o certame está eivado de nulidades, estas também contaminam a adjudicação e posterior celebração do contrato” (AgRg na SS 2.370/PE, Rel. Min. Ari Pargendler, Corte Especial, DJe 23.9.2011). No mesmo sentido: REsp 1.128.271/AM, Rel. Min; Castro Meira, Segunda Turma, DJe 25.11.2009; e REsp 1.059.501/MG, Rel. Min; Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 10.9.2009. Rejeitada a preliminar. […] (MS n. 12.892/DF. STJ. Primeira Seção. Relator: Min. Humberto Martins. Julgado em: 26/2/2014. Publicado em: 11/3/2014). |
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↑2 | No seu voto, o Ministro Relator consignou que: Não há, portanto, razão para anular os referidos contratos, uma vez que foram avençados a preços vantajosos para a administração e não se vislumbra risco de dano ao erário na sua execução. Em casos como o ora analisado, em que se verifica a ocorrência de falhas em relação ao procedimento licitatório, notadamente em relação à publicidade e competitividade, há que se sopesar outros princípios que regem o agir administrativo sob pena de a atuação do poder público ocasionar um dano maior que aquele que visava a combater. Muitas vezes, embora contendo vícios, a opção da convalidação do ato irregular é a que melhor atende à administração e ao interesse público. (Acórdão 1.823/2017. TCU. Plenário. Relator: Min. Walton Alencar Rodrigues. Julgado em: 23/8/2017. Publicado em: 4/9/2017) |
Sistema de registro de preços: o que é e quais são as hipóteses de cabimento?
I. Do que se trata o Sistema de Registro de Preços?
O Sistema de Registro de Preços (SRP) é um instrumento utilizado pela Administração Pública para registrar o preço de produtos e serviços que poderão ser contratados, no futuro, durante a vigência de um determinado período. Em termos práticos, o SRP não se trata de uma modalidade licitatória, mas de um conjunto de procedimentos (artigo 78, IV, da Nova Lei de Licitações) que auxilia a Administração Pública a formalizar um pré-contrato, na forma de uma Ata de Registro de Preços. O SRP permite, portanto, uma expectativa de contratação, sem, contudo, obrigar a Administração a contratar (Artigo 82 da Nova Lei de Licitações).
Na Ata de Registro de Preços serão registrados o objeto, os preços, os fornecedores, os órgãos participantes e as condições a serem praticadas. O prazo de vigência da Ata de Registro de Preços será de 1 (um) ano e poderá ser prorrogado, por igual período, desde que comprovado o preço vantajoso (artigo 84 da Nova Lei de Licitações).
Trata-se, portanto, de um sistema que possui o objetivo de simplificar e agilizar o processo de aquisição de bens e serviços, evitando que a Administração realize sucessivas licitações para compras de um mesmo produto. Por meio desse procedimento, o particular deverá fornecer determinados bens ou prestar serviços durante período de vigência da Ata, sob demanda da Administração, a partir de preços definidos na licitação ou na contratação direta.
Imagine-se uma hipótese em que a prefeitura de determinado município necessita comprar cadeiras para as escolas, mas, por alguma circunstância técnica, como a inexatidão quanto ao número de alunos matriculados naquele ano, desconhece a quantidade exata que precisará. Nesse caso, a municipalidade pode adotar o Sistema de Registro de Preços. Caso a demanda exceda o estimado para a primeira compra, a prefeitura pode utilizar, ainda, se dentro do período de vigência, a Ata de Registro de Preços para adquirir um novo lote, sem a necessidade de realizar um novo procedimento licitatório.
Assim, mediante a utilização do Sistema de Registro de Preços (SRP), a Administração Pública poderá lançar uma licitação e receber propostas provenientes de particulares interessados, cabendo-lhe escolher aquela mais vantajosa. Contudo, diferentemente da maioria dos processos licitatórios, em que a Administração busca a contratação imediata, o SRP, como regra, visa formalizar os parâmetros para uma contratação futura.
Vale destacar que o SRP poderá ser compartilhado entre diversos órgãos e entidades públicas. Em uma mesma Ata de Registro de Preços, poderão ser contemplados mais de um órgão ou entidade públicos como beneficiários, que tiverem o interesse na aquisição do mesmo objeto. Isso garante uma economia em escala, visto que diversos órgãos poderão adquirir em conjunto produtos e serviços por meio da mesma Ata de Registro de Preços, reduzindo custos operacionais e o número de licitações. No exemplo acima citado, no qual a prefeitura utiliza-se do Registro de Preços para a compra futura de cadeiras para escolas do município, outros órgãos ou entidades interessados no mesmo objeto poderiam também compartilhar a Ata de Registro de Preços.
II. Quais as hipóteses de cabimento do Sistema de Registro de Preços?
De modo geral, o SRP é um procedimento cabível diante de circunstâncias em que (Art. 3°, Decreto Nº 7.892/2013):
a) há a necessidade de contratações frequentes;
b) há interesse no parcelamento de fornecimentos ou na remuneração de serviços por unidade de medida ou em regime de tarefa;
c) diversos órgãos ou entidades possuem interesse comum em contratar o mesmo objeto (compras compartilhadas); ou
d) o quantitativo do objeto é inexato.
A hipótese descrita na alínea “a” é a situação clássica e originária em que o SRP é aplicado. Trata-se de bens e serviços que o Poder Público necessitará corriqueiramente, mas em quantidades variáveis. Já as hipóteses das alíneas “b”, “c” e “d” vêm sendo cada vez mais frequentes e denotam situações em que a Administração possui uma demanda imediata, não sendo necessariamente um caso de contratação futura. Diante de alguma dessas hipóteses, portanto, a Administração Pública assinará uma Ata de Registro de Preços, e, sempre que houver necessidade, durante a vigência dessa Ata, contratará o particular detentor da melhor proposta, conforme a classificação formalizada no documento.
Por fim, vale destacar que o SRP não é aplicável a todas as modalidades de contratação. A Nova Lei de Licitações estabelece duas modalidades licitatórias em que o SRP poderá ser aplicado: no pregão ou na concorrência (artigo 6º, XLV), mediante registro formal de preços relativos à prestação de serviços, a obras e à aquisição e locação de bens para contratações futuras. Ainda, é possível que o procedimento seja utilizado em hipóteses de contratação direta, qual seja, nas hipóteses de inexigibilidade e de dispensa de licitação, para a aquisição de bens ou para a contratação de serviços por mais de um órgão ou entidade (artigo 82, §6 da Nova Lei de Licitações).
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Read MoreContratos administrativos de inovação: os diversos instrumentos para a contratação de novas tecnologias pelo Poder Público
A inovação tecnológica na Administração Pública é imprescindível. Diariamente o Estado se depara com novas necessidades e problemas, muitos dos quais os gestores públicos sequer têm plena consciência de existirem e para os quais, na mesma proporção, os agentes privados avançam em pesquisa e desenvolvimento para criar novas soluções.
Pode-se dizer que contratar inovação tecnológica no âmbito público é algo desafiador, mas que precisa ser feito, sob pena de completa paralisia. Se a Administração não inovar, ela será cada vez mais ineficiente.
A grande questão a ser respondida aqui não é por que contratar, e sim como contratar a inovação. Não deveria ser assim, mas o como contratar é, muitas vezes, um grande desafio enfrentado pelos gestores públicos e, também, pelos agentes privados que têm a capacidade de fornecer novas soluções, mas que não conhecem o emaranhado jurídico que rege a contratações públicas no Brasil.
Neste breve texto, analisaremos alguns dos instrumentos jurídicos que permitem a contratação de soluções inovadoras e disruptivas pela Administração Pública.
Regra geral: contrato administrativo “convencional” precedido de licitação ou contratação direta
A regra geral das contratações públicas é a realização de procedimento licitatório, quando o objeto a ser licitado pode ser suficientemente detalhado no instrumento convocatório. Assim, a depender do nível de complexidade da tecnologia inovadora a ser empregada e a capacidade de especificação do objeto pela Administração, a contratação de soluções inovadoras mostra-se possível mediante o uso da modalidades licitatórias da Lei nº 8.666/1993 ou da Lei nº 14.133/2021 (Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos).
Os produtos de prateleira (off-the-shelf), por exemplo, ainda que utilizem tecnologias inovadoras (como inteligência artificial, mas de menor complexidade), induzem a contratação à utilização das modalidades licitatórias[1]CENTRO PARA A QUARTA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL. Guia de Contratações Públicas de Inteligência Artificial. [S.L.]: Centro Para A Quarta Revolução Industrial, 2022. p. 31. Disponível em: … Continue reading, como o pregão e a concorrência. Neste artigo você encontra as principais características dessas modalidades.
Em linhas gerais, quando a solução pretendida for conhecida e puder ser especificada pela Administração, esta pode valer-se da licitação para selecionar o fornecedor, tendo como critério o melhor preço (pregão ou concorrência), melhor técnica (concorrência) ou, ainda, a cumulação de melhor técnica e preço (concorrência).
Para elaborar o instrumento convocatório e os estudos técnicos da licitação, a Administração pode valer-se do Procedimento de Manifestação de Interesse – PMI, sendo este um procedimento auxiliar pelo qual a Administração pode solicitar à iniciativa privada, mediante chamamento público, a realização de estudos, investigações, levantamentos e projetos de soluções inovadoras que contribuam com questões de relevância pública (artigo 81 da Lei nº 14.133/2021), cuja participação pode ser limitada a startups.
Se não for possível a realização de certame licitatório, seja pela impossibilidade de fixação de critérios objetivos, seja pela inexistência de competição no mercado para determinado objeto, a Administração pode valer-se da contratação por inexigibilidade de licitação, contratando diretamente determinado fornecedor (artigo 25 da Lei nº 8.666/1993 e artigo 74 da Lei nº 14.133/2021).
Com a evolução do modelo comercial do software as a service, é cada vez mais comum que existam serviços tecnológicos prestados com exclusividade. A Lei nº 14.133/2021, diferentemente do que fazia a Lei nº 8.666/1993, passou a prever de forma expressa a inexigibilidade de licitação para a contratação de prestador de serviços com exclusividade, cenário em que as partes devem atentar-se aos requisitos a serem atendidos para que a contratação direta (sem licitação) seja legítima, tal como a forma de comprovação da adequação do preço e a efetiva exclusividade da solução.
Independentemente da forma como tem origem a contratação, tratando-se o objeto de um serviço, o contrato terá um prazo de, no máximo, 5 anos quando tiver por base a Lei nº 8.666/1993 (art. 57, inciso II)[2]Art. 57. A duração dos contratos regidos por esta Lei ficará adstrita à vigência dos respectivos créditos orçamentários, exceto quanto aos relativos: II – à prestação de serviços … Continue reading ou de 10 anos quando fundamentado na Lei nº 14.133/2021 (art. 108)[3]Art. 108. A Administração poderá celebrar contratos com prazo de até 10 (dez) anos nas hipóteses previstas nas alíneas “f” e “g” do inciso IV e nos incisos V, VI, XII e XVI do caput do … Continue reading, observada a possibilidade de fixação de um prazo de 15 anos quando o contrato previr a “operação continuada de sistemas estruturantes de tecnologia da informação” (art. 144 da Lei nº 14.133/2021).
É certo, no entanto, que embora a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos tenha avançado na modernização do regime contratual administrativo, a utilização do regime convencional de contratação “apresenta limitações jurídicas e econômicas que fragilizam os incentivos para o desenvolvimento de tecnologias emergentes”[4]CENTRO PARA A QUARTA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL. Guia de Contratações Públicas de Inteligência Artificial. [S.L.]: Centro Para A Quarta Revolução Industrial, 2022. p. 31. Disponível em: … Continue reading, tais como a menor flexibilidade para alterações contratuais, a pequena margem de negociação com fornecedores e a rigidez para alocação de direitos de propriedade intelectual.
Assim, o regime jurídico brasileiro prevê, em normas esparsas, outros instrumentos capazes de viabilizar a contratação de soluções tecnológicas inovadoras para o Poder Público.
Encomenda Tecnológica – ETEC
A modelagem contratual consistente em encomenda tecnológica é um mecanismo de estímulo à Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (PD&I) que pode ser adotado nas situações em que a Administração se depara com um problema cuja solução ainda não está disponível no mercado, ou não é conhecida, e o seu desenvolvimento envolve risco tecnológico, conforme artigo 20 da Lei nº 10.973/2004 (Lei da Inovação)[5]Art. 20. Os órgãos e entidades da administração pública, em matéria de interesse público, poderão contratar diretamente ICT, entidades de direito privado sem fins lucrativos ou empresas, … Continue reading.
O Guia de Contratações Públicas de Inteligência Artificial, elaborado pelo Centro para a Quarta Revolução Industrial (C4IR) do Brasil, define, resumidamente, a encomenda tecnológica da seguinte maneira:
A encomenda tecnológica é uma hipótese de dispensa de licitação que permite ao Poder Público contratar diretamente a realização de atividades de PD&I voltadas à solução de problema técnico específico ou à obtenção de produto, serviço ou processo inovador, quando o objeto envolver risco tecnológico. A encomenda permite o desenvolvimento de novas tecnologias por meio de compras pré-comerciais, que não existem no momento da demanda, e favorece grande flexibilidade de negociação e oportunidades de interação com fornecedores para a definição do objeto contratual. Caso bem sucedida, é permitida a contratação do mesmo fornecedor para o fornecimento em escala do objeto da encomenda (scale up).[6]CENTRO PARA A QUARTA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL. Guia de Contratações Públicas de Inteligência Artificial. [S.L.]: Centro Para A Quarta Revolução Industrial, 2022. p. 30. Disponível em: … Continue reading
Ademais, consoante a cartilha elaborada pelo Laboratório de Inovação do Tribunal de Contas da União, o uso deste instrumento é cabível em situações específicas, em que a solução para determinado problema vivenciado pelo Poder Público ainda não foi desenvolvimento pelos agentes de mercado ou não estão à disposição por meio de relações comerciais comuns, não sendo possível medir o risco do desconhecimento de como a tecnologia se comporta no problema em questão:
– Aplica-se a ETEC quando há uma falha de mercado, cuja solução depende de pesquisa e desenvolvimento e apresenta incerteza devido ao risco tecnológico e à complexidade intrínseca da atividade de P&D.
– Na ETEC, a legislação pressupõe que o Estado assume grande parte do risco tecnológico, tendo em vista o incentivo à inovação e o interesse no desenvolvimento da solução, pois a iniciativa privada não se interessa em arcar com a totalidade do risco, o que deixaria o problema sem a devida solução.
– É necessário apresentar a motivação da escolha por contratar o desenvolvimento da solução por meio de ETEC, cabendo ao contratante realizar análise das alternativas possíveis
– Mesmo que existam soluções, elas não estão disponíveis ao contratante por meio de relações comerciais comuns, e não é possível medir o risco do desconhecimento de como a tecnologia se comporta no problema em questão.[7]TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. Encomenda Tecnológica (ETEC). Brasília: Tribunal de Contas da União, 2020. Disponível em: https://portal.tcu.gov.br/encomenda-tecnologica-etec.htm. Acesso em: 25 … Continue reading
Ainda, é válido destacar que “o risco tecnológico pode derivar não apenas de tecnologias novas (“new to the world” ou “new to the market”), mas também da integração inédita de diferentes tecnologias já disponíveis no mercado”, conforme o Guia de Alternativas Jurídicas e de Boas Práticas para Contratações de Inovação no Brasil, do Banco Interamericano de Desenvolvimento[8]BANCO INTERAMERICANO DE DESENVOLVIMENTO. Guia de Alternativas Jurídicas e Boas Práticas para Compras de Inovação no Brasil. Washington, D.C: Banco Interamericano de Desenvolvimento, 2022. p. 58. … Continue reading.
Assim, o elemento central que sustenta a contratação de solução como encomenda tecnológica é a existência de risco tecnológico, sobre o qual já tivemos a oportunidade de nos manifestar:
O risco tecnológico prevê que o processo de criação de determinada tecnologia carregue como variável o fato de que o conhecimento técnico-científico, na ocasião da decisão pelo seu desenvolvimento, possa ser insuficiente para assegurar a conclusão do projeto com êxito. Aquilo que está sendo contratado pode não ser alcançável sob o ponto de vista tecnológico ou, ainda, mesmo que isso seja teoricamente viável, a obtenção de todas as funcionalidades previstas, no tempo que a necessidade administrativa pede, não o é. Em suma, para que a Encomenda Tecnológica seja juridicamente viável, deve existir alguma variável de 30 incerteza que leve à conclusão de que existe um risco tecnológico na contratação.[9]SCHIEFLER, Gustavo Henrique Carvalho Schiefler. A contratação direta de Encomenda Tecnológica: quando há risco tecnológico, instrumento jurídico permite o investimento público em inovação … Continue reading
Neste sentido, de acordo com o artigo 2º, inciso III, do Decreto Federal nº 9.283/2018 (que regulamenta a Lei de Inovação Tecnológica em âmbito federal), o risco tecnológico envolve a “possibilidade de insucesso no desenvolvimento de solução, decorrente de processo em que o resultado é incerto em função do conhecimento técnico-científico insuficiente à época em que se decide pela realização da ação”.
Já no âmbito do Governo do Estado de São Paulo, conforme previsão do Decreto Estadual nº 62.817/2017, “considera-se como atividade que envolve risco tecnológico aquela em que haja incerteza na obtenção de resultados em conformidade com padrões de desempenho almejado, em virtude de limitações no estado da técnica para adequada execução ou especificação” (art. 52, § 2º). Para além dessas características, este regulamento estadual exemplifica o desenvolvimento de soluções com Inteligência Artificial como uma hipótese de solução com risco tecnológico, como prevê no seu § 4º do artigo 52:
4º – inclui-se ainda, dentre as atividades que envolvem risco tecnológico, o desenvolvimento de produtos ou serviços que requerem a oferta, operação continuada e efetiva adoção por usuários, havendo incertezas sobre o atingimento de padrões de desempenho almejado, tais como serviços desenvolvidos por meio de tecnologia de inteligência artificial que demandam ganho de massa crítica de informações captadas por meio do uso efetivo dos serviços por seu público alvo.
Deve-se pontuar, novamente, que a encomenda tecnológica envolve a contratação de pesquisa e desenvolvimento. Assim, a empresa é contratada primeiramente para pesquisar e desenvolver o produto, serviço ou processo inovador que a Administração pretende obter, sendo remunerada para tanto. Se o produto, serviço ou processo inovador for aprovado (isto é, alcançar os objetivos estabelecidos em projeto), a empresa pode ser contratada para fornecê-lo, também por meio de dispensa de licitação – seja com a formalização de um novo contrato específico ou mesmo sem a necessidade da celebração de outro instrumento contratual, na forma do artigo 20, § 4º, da Lei Federal nº 10.973/2004[10]§ 4º O fornecimento, em escala ou não, do produto ou processo inovador resultante das atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação encomendadas na forma do caput poderá ser contratado … Continue reading.
Ademais, as Leis nº 8.666/1993 e nº 14.133/2021 preveem, dentre as hipóteses de dispensa de licitação, as contratações que tem por objetivo concretizar o disposto na Lei de Inovação Tecnológica (Lei nº 10.973/2004), desde que observados os princípios gerais desta. As previsões estão contidas no artigo 24, inciso XXXI[11]Art. 24. É dispensável a licitação: XXXI – nas contratações visando ao cumprimento do disposto nos arts. 3º, 4º, 5º e 20 da Lei no 10.973, de 2 de dezembro de 2004, observados os … Continue reading e artigo 75, inciso V[12]Art. 75. É dispensável a licitação: V – para contratação com vistas ao cumprimento do disposto nos arts. 3º, 3º-A, 4º, 5º e 20 da Lei nº 10.973, de 2 de dezembro de 2004, observados … Continue reading, respectivamente.
Tanto a Lei de Inovação Tecnológica (Lei nº 10.973/2004) quanto seu diploma regulamentar federal (Decreto nº 9.283/2018), não especificam, detalhadamente, o procedimento a ser adotado para a contratação de encomenda tecnológica. No entanto, sendo esta uma hipótese de dispensa de licitação, devem ser observadas as formalidades mínimas previstas para essa forma de contratação direta previstas na Lei nº 8.666/1993 ou na Lei nº 14.133/2021.
Ademais, existem também algumas boas práticas destinadas à preservação dos princípios norteadores da atuação administrativa, como o da publicidade, impessoalidade e moralidade. Neste sentido, é possível que a contratação de encomenda tecnológica seja precedida da realização de um procedimento competitivo simplificado, aberto a todos os interessados, tendo por base um Termo de Referência em que são descritas as necessidades da Administração, “de modo a permitir que os interessados identifiquem a natureza do problema técnico existente e a visão global do produto, do serviço ou do processo inovador passível de obtenção, dispensadas as especificações técnicas do objeto devido à complexidade da atividade de pesquisa, desenvolvimento e inovação ou por envolver soluções inovadoras não disponíveis no mercado” (art. 27, § 3º, do Decreto Federal nº 9.283/2018).
Vale ressaltar que nos instrumentos convocatórios para essa espécie de contratação, a Administração define “somente os requisitos mínimos de desempenho, características físicas e interfaces necessárias, mas não a rota tecnológica a ser seguida, visto que esta será apresentada nos projetos dos possíveis interessados”, além de indicar “o que será considerado sucesso da solução, mediante descrição do resultado a ser buscado”[13]TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. Encomenda Tecnológica (ETEC). Brasília: Tribunal de Contas da União, 2020, p. 8. Disponível em: https://portal.tcu.gov.br/encomenda-tecnologica-etec.htm. Acesso em: … Continue reading.
Já a escolha do contratado, nestes casos, conforme o artigo 27, § 8º, inciso II, do Decreto Federal nº 9.283/2018, é orientada para a maior probabilidade de alcance do resultado pretendido pelo contratante, e não necessariamente para o menor preço ou custo, podendo o órgão contratante utilizar, como fatores de escolha, a competência técnica, a capacidade de gestão, as experiências anteriores, a qualidade do projeto apresentado e outros critérios significativos de avaliação.
Nos termos dos artigos 31 e 32 do mesmo diploma legal[14]Art. 31. O fornecimento, em escala ou não, do produto, do serviço ou do processo inovador resultante das atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação encomendadas na forma estabelecida … Continue reading, bem como, o artigo 20, § 4º, da Lei 10.973/2004[15]§ 4º O fornecimento, em escala ou não, do produto ou processo inovador resultante das atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação encomendadas na forma do caput poderá ser contratado … Continue reading, o contrato ainda poderá prever a possibilidade de fornecimento do produto ou processo inovador resultante das atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação encomendadas. Este fornecimento pode se dar mediante a formalização de um novo contrato decorrente do primeiro, ou ocorrer no próprio contrato de encomenda, sem a necessidade da celebração de outro instrumento contratual.
Por fim, o prazo de vigência do contrato para fornecimento da solução desenvolvida, se esta for um serviço, reger-se-á pelas regras aplicáveis aos contratos de prestação de serviços comuns, sendo de, no máximo, 5 anos para a contratação que tem como base a Lei nº 8.666/1993 (art. 57, inciso II) ou de 10 anos para aquela feita com base na Lei nº 14.133/2021 (art. 108).
Contrato Público para Solução Inovadora – CPSI
Em junho de 2021 foi sancionada a Lei Complementar nº 182/2021, que institui o Marco Legal das Startups e do Empreendedorismo Inovador. Dentre as suas inovações, há uma nova modelagem licitatória e contratual para resolver demandas públicas que exijam solução inovadora com emprego de tecnologia, prevista nos seus artigos 12 a 15.
O Guia de Contratações Públicas de Inteligência Artificial assim define o instrumento previsto neste novo diploma:
A modalidade especial de licitação pretende selecionar os licitantes – startups ou não – que apresentem a melhor solução para o problema veiculado no edital, dispensada a descrição de especificações técnicas pela Administração.
Os vencedores celebram o Contrato Público para Solução Inovadora (CPSI), que permite a realização de testes remunerados, em ambiente real. Caso a solução inovadora apresentada pelo proponente se revele bem-sucedida, a Administração pode celebrar um contrato de fornecimento, com vigência e valores limitados, com o proponente que alcançar as metas do CPSI.[16]CENTRO PARA A QUARTA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL. Guia de Contratações Públicas de Inteligência Artificial. [S.L.]: Centro Para A Quarta Revolução Industrial, 2022. p. 31. Disponível em: … Continue reading
Com efeito, de acordo com o artigo 13 da Lei Complementar nº 182/2021:
Art. 13. A administração pública poderá contratar pessoas físicas ou jurídicas, isoladamente ou em consórcio, para o teste de soluções inovadoras por elas desenvolvidas ou a ser desenvolvidas, com ou sem risco tecnológico, por meio de licitação na modalidade especial regida por esta Lei Complementar.
1º A delimitação do escopo da licitação poderá restringir-se à indicação do problema a ser resolvido e dos resultados esperados pela administração pública, incluídos os desafios tecnológicos a serem superados, dispensada a descrição de eventual solução técnica previamente mapeada e suas especificações técnicas, e caberá aos licitantes propor diferentes meios para a resolução do problema.
Como se observa, nesta modalidade especial de licitação, a solução a ser desenvolvida pode ou não conter risco tecnológico, elemento obrigatório para realizar a contratação de encomenda tecnológica, vista anteriormente.
Por se tratar de uma modalidade de licitação, a Administração deve observar as regras e procedimentos específicos previstos na Lei Complementar nº 182/2021, tais como o prazo mínimo de 30 dias para a apresentação de propostas, a contar da publicação do edital (art. 13, § 2º), a composição da comissão julgadora (art. 13, § 3º), os critérios de julgamento (art. 13, § 4º) e demais regras previstas no diploma legal.
Encerrada a licitação, a Administração deve firmar com a(s) proponente(s) selecionada(s) o Contrato Público para Solução Inovadora (CPSI), o qual deve constar, no mínimo (art. 14, § 1º, da Lei Complementar nº 182/2021):
I – as metas a serem atingidas para que seja possível a validação do êxito da solução inovadora e a metodologia para a sua aferição;
II – a forma e a periodicidade da entrega à administração pública de relatórios de andamento da execução contratual, que servirão de instrumento de monitoramento, e do relatório final a ser entregue pela contratada após a conclusão da última etapa ou meta do projeto;
III – a matriz de riscos entre as partes, incluídos os riscos referentes a caso fortuito, força maior, risco tecnológico, fato do príncipe e álea econômica extraordinária;
IV – a definição da titularidade dos direitos de propriedade intelectual das criações resultantes do CPSI; e
V – a participação nos resultados de sua exploração, assegurados às partes os direitos de exploração comercial, de licenciamento e de transferência da tecnologia de que são titulares.
O Contrato Público para Solução Inovadora tem seu prazo de vigência limitado a 12 meses, prorrogável por mais um período de até 12 meses (art. 14 da Lei Complementar nº 182/2021), e pode ser firmado por um valor máximo de R$ 1.600.000,00, devendo ser adotado, obrigatoriamente, algum(ns) dos critérios de pagamento no § 3º do artigo 14 da Lei Complementar nº 182/2021[17]§ 3º A remuneração da contratada deverá ser feita de acordo com um dos seguintes critérios: I – preço fixo; II – preço fixo mais remuneração variável de incentivo; III – … Continue reading, observadas ainda as demais regras estabelecidas nos §§ 4º a 8º da mesma lei[18]§ 4º Nas hipóteses em que houver risco tecnológico, os pagamentos serão efetuados proporcionalmente aos trabalhos executados, de acordo com o cronograma físico-financeiro aprovado, observado o … Continue reading.
Ao fim do Contrato Público para Solução Inovadora, de forma similar ao que ocorre com a encomenda tecnológica, a Administração poderá celebrar com a mesma contratada, sem nova licitação, contrato para o fornecimento do produto, do processo ou da solução resultante do CPSI ou, se for o caso, para integração da solução à infraestrutura tecnológica ou ao processo de trabalho da administração pública (art. 15 da Lei Complementar nº 182/2021).
A vigência do contrato de fornecimento será limitada a 24 meses, prorrogável por mais um período de até 24 meses, e terá seu valor limitado a R$ 8.000.000,00, incluídas as eventuais prorrogações (art. 15, §§ 2º e 3º, da Lei Complementar nº 182/2021).
Diálogo Competitivo
Uma das grandes novidades da Lei nº 14.133/2021 foi a previsão de uma nova modalidade de licitação: o diálogo competitivo, que poderá ser utilizado, especialmente, para a celebração de contratos de natureza complexa, nos cenários em que a Administração não consiga definir sozinha a solução que melhor atenderá uma necessidade pública. Aliás, o artigo 32, inciso I, alínea “a” da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos traz expressamente os casos em que o objeto envolva inovação tecnológica ou técnica como uma das hipóteses de utilização do diálogo competitivo.
As principais características dessa nova modalidade de licitação foram abordadas nesta publicação.
Resumidamente, quanto à sistemática do diálogo competitivo, em um primeiro momento a Administração deve publicar um edital contendo o problema vivenciado e as necessidades que busca solucionar, abrindo a possibilidade para que os agentes de mercado proponham soluções, dentro das regras e exigências já definidas. Em sequência, a Administração deverá então manter diálogos com as proponentes para entender as propostas apresentadas e, ao final, deverá identificar a solução que melhor atenda às suas necessidades, em decisão fundamentada.
Identificada a solução, a Administração deverá dar início à fase competitiva com a divulgação de edital contendo a especificação da solução escolhida e os critérios objetivos a serem utilizados para seleção da proposta mais vantajosa. Nesta etapa, todos os participantes da fase de diálogo poderão apresentar proposta para executar o projeto selecionado, as quais serão julgadas mediante critério de aceitabilidade previamente definido pelo órgão.
O diálogo competitivo, como se observa, em grande medida se assemelha ao Procedimento de Manifestação de Interesse, mencionado no início deste texto. No entanto, a diferença principal entre os institutos é que, pelo PMI, a Administração apenas coleta as possíveis soluções e precisa estabelecer, em um novo processo, a contratação (por licitação ou por compra direta). O diálogo competitivo, por outro lado, agrupa essas duas ações em um único processo.
Ressalta-se que o contrato administrativo oriundo do diálogo competitivo deverá reger-se exclusivamente pela Lei nº 14.133/2021, sendo seu prazo de duração máximo de 5 anos, prorrogáveis por igual período (art. 106 e 107)[19]Art. 106. A Administração poderá celebrar contratos com prazo de até 5 (cinco) anos nas hipóteses de serviços e fornecimentos contínuos, observadas as seguintes diretrizes: I – a … Continue reading.
Parceria decorrente de oportunidade de negócio (empresas estatais)
Outra possível modelagem contratual é encontrada na Lei nº 13.303/2016, que trata das contratações nas empresas públicas e sociedades de economia mista e suas subsidiárias (as chamadas empresas estatais): a parceria empresarial decorrente de oportunidades de negócio. Tal instrumento é previsto no artigo 28, § 3º, inciso II, e § 4º deste diploma, com a seguinte redação:
§ 3º São as empresas públicas e as sociedades de economia mista dispensadas da observância dos dispositivos deste Capítulo[20]Capítulo I – Das Licitações. nas seguintes situações:
[…] II – nos casos em que a escolha do parceiro esteja associada a suas características particulares, vinculada a oportunidades de negócio definidas e específicas, justificada a inviabilidade de procedimento competitivo.
§ 4º Consideram-se oportunidades de negócio a que se refere o inciso II do § 3º a formação e a extinção de parcerias e outras formas associativas, societárias ou contratuais, a aquisição e a alienação de participação em sociedades e outras formas associativas, societárias ou contratuais e as operações realizadas no âmbito do mercado de capitais, respeitada a regulação pelo respectivo órgão competente.
O § 3º, inciso II, como se observa, estabelece, de maneira ampla, determinados requisitos para permitir o afastamento da licitação nesta espécie de contratação por empresas estatais. Tais requisitos se vinculam tanto às características do parceiro quanto às do próprio objeto da parceria, bem como à inviabilidade de procedimento competitivo. O Tribunal de Contas da União (TCU), ao explorar o tema no Acórdão nº 2.488/2018, buscou trazer clareza à redação legal, elencando objetivamente os requisitos para a formalização da parceria:
- O empreendimento deve ser obrigatoriamente relacionado com o desempenho de atribuições inerentes ao objeto social da empresa estatal envolvida;
- Deve estar configurada uma efetiva oportunidade de negócio, nos moldes do art. 28, § 4º, da Lei das Estatais;
- Demonstração da vantagem comercial para a estatal;
- Comprovação de que o parceiro escolhido apresenta condições que demonstram sua superioridade em relação às demais empresas que atuam naquele mercado (diferenciais qualitativos e quantitativos); e
- Demonstração da inviabilidade de procedimento competitivo, servindo a esse propósito, por exemplo, a pertinência e a compatibilidade de projetos de longo prazo, a comunhão de filosofias empresariais, a complementaridade das necessidades e a ausência de interesses conflitantes.
Para viabilizar a parceria, esta deve ser definida com clareza e exatidão, por meio da descrição detalhada do seu escopo e objeto, apresentando, necessariamente, singularidades que a diferenciem das operações normais da estatal. Nesse sentido, é essencial que a dispensa seja justificável em razão das vantagens trazidas pela oportunidade de negócio em parceria, seja com relação à adequação à realidade da empresa, seja com relação aos custos e benefícios técnicos e econômicos que surgirão a partir dessa parceria.
É de suma importância, assim, que o contrato de parceria decorrente de oportunidade de negócio não seja utilizado como um “substituto” do contrato de prestação de serviços, em burla à licitação, mas, pelo contrário, que ele efetivamente traga vantagem comercial e tenha uma relação de custos e benefícios que justifique a dispensa de procedimento licitatório. Isso porque, se as circunstâncias do caso concreto indicarem que a empresa estatal teria mais benefícios simplesmente subcontratando os serviços para os quais não detém capacidade de produção, o estabelecimento de parceria não se justifica.
Para justificar o estabelecimento de parceria com uma empresa privada, ainda, deve-se comprovar que há necessidade de um tal grau de união entre as partes que não há como ser atingido por meio de um contrato de simples prestação de serviços. Alguns dos fatores que podem ser utilizados como justificativa para a parceria são a necessidade de cooperação continuada, a conjunção empresarial de esforços, a integração logística, o aprendizado de know-how, a transferência de tecnologia[21]BRITO, Thiago da Cunha. As parcerias decorrentes de oportunidades de negócio na Lei das Estatais. Disponível em: … Continue reading, dentre outros.
Um último requisito que deve ser comprovado para viabilizar a contratação por meio do estabelecimento de parceria nos termos expostos é a justificativa de inviabilidade de competição. Esse tema é um tanto controvertido na doutrina e jurisprudência nacionais, pois há uma corrente que defende que a comunhão de filosofias empresariais (ou affectio societatis) entre a estatal e a empresa privada parceira é justificativa suficiente para a escolha do parceiro, disso decorrendo a impossibilidade de procedimento competitivo no estabelecimento de parcerias em oportunidades de negócio[22]ASSIS, Luiz Eduardo Altenburg. Oportunidades de Negócio na Lei das Estatais – as parcerias e outras formas associativas entre empresas estatais e empresas privadas. Lumen Juris, Rio de … Continue reading. O já citado Acórdão nº 2.488/2018 do TCU adotou esse entendimento ao considerar hígidos e justificáveis os argumentos referentes à comunhão de filosofias empresariais e à complementaridade das necessidades como capazes de demonstrar a inviabilidade de procedimento competitivo.
Por outro lado, há quem sustente que a fundamentação baseada única e exclusivamente no conceito subjetivo de affectio societatis não é suficiente para justificar a escolha do agente econômico, por risco de afronta aos princípios da isonomia e da impessoalidade.
De qualquer forma, merece apontamento que, se for verificada a existência de uma pluralidade de potenciais parceiros, a estatal pode estabelecer um procedimento simplificado (não licitatório), a partir de um chamamento público, destinado a viabilizar a escolha.
Ademais, vale trazer dois entendimentos firmados na I Jornada de Direito Administrativo, realizada pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho da Justiça Federal:
Enunciado nº 27: A contratação para celebração de oportunidade de negócios, conforme prevista pelo art. 28, § 3º, II, e § 4º da Lei nº 13.303/2016 deverá ser avaliada de acordo com as práticas do setor de atuação da empresa estatal. A menção à inviabilidade de competição para concretização da oportunidade de negócios deve ser entendida como impossibilidade de comparação objetiva, no caso das propostas de parceria e de reestruturação societária e como desnecessidade de procedimento competitivo, quando a oportunidade puder ser ofertada a todos os interessados.
Enunciado nº 30: A ‘inviabilidade de procedimento competitivo’ prevista no art. 28, §3º, inc. II, da Lei nº 13.303/2016 não significa que, para a configuração de uma oportunidade de negócio, somente poderá haver apenas um interessado em estabelecer uma parceria com a empresa estatal. É possível que, mesmo diante de mais de um interessado, esteja configurada a inviabilidade de procedimento competitivo.
Sobre o prazo de duração de tal contrato, observa-se que a regra geral é a celebração pelo prazo de até 5 anos, nos termos do artigo 71 da Lei nº 13.303/2016, havendo, porém, a possibilidade de prolongar-se esse período caso o projeto proposto venha a integrar o plano de negócios e investimentos da empresa estatal, nos termos do inciso I do art. 71, ou, ainda, mediante a comprovação de que a pactuação por prazo superior a 5 anos é prática rotineira de mercado, como previsto no inciso II do mesmo artigo.
Extra: E como o particular pode apresentar sua solução inovadora ao Poder Público?
Embora a escolha da forma de contratação recaia aos gestores públicos, é certo que os particulares podem estabelecer legítimas comunicações com o Poder Público, de forma a colaborar com a construção de uma modelagem contratual que melhor se adeque às necessidades administrativas.
O diálogo entre a Administração e os agentes de mercado não é só possível como também encontra expressa previsão legal, conforme artigo 18, inciso V, da Lei nº 14.133/2021[23]Art. 18. A fase preparatória do processo licitatório é caracterizada pelo planejamento e deve compatibilizar-se com o plano de contratações anual de que trata o inciso VII do caput do art. 12 … Continue reading. Antes da promulgação da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, em agosto de 2020, a partir de uma proposta de enunciado apresentada por Gustavo Schiefler, foi aprovado, na I Jornada de Direito Administrativo do Conselho da Justiça Federal:
Enunciado nº 29: A Administração Pública pode promover comunicações formais com potenciais interessados durante a fase de planejamento das contratações públicas para a obtenção de informações técnicas e comerciais relevantes à definição do objeto e elaboração do projeto básico ou termo de referência, sendo que este diálogo público-privado deve ser registrado no processo administrativo e não impede o particular colaborador de participar em eventual licitação pública, ou mesmo de celebrar o respectivo contrato, tampouco lhe confere a autoria do projeto básico ou termo de referência.
Neste sentido, as empresas que tenham interesse em apresentar sua solução inovadora ao Poder Público, ou manifestar seu interesse em promover pesquisas sobre possíveis soluções, podem se valer de instrumentos como a Manifestação de Interesse Privado – MIP para estabelecer comunicações com órgãos públicos.
Conclusão
Como se observa, para além dos regimes tradicionais de contratação pública, o ordenamento jurídico brasileiro estabelece, em normas esparsas, instrumentos capazes de viabilizar a contratação de soluções inovadoras e disruptivas para o Poder Público. Em determinadas situações, a contratação se mostra possível mediante apenas um desses instrumentos e, em outras, a solução pode ser contratada por diferentes caminhos.
As empresas e profissionais que desejam entrar e/ou se manter no mercado de licitações públicas devem buscar atualização sobre o tema e, em especial, o novo regime de licitações e contratos iniciado com a Lei nº 14.133/2021. Acompanhe nosso site para ter acesso a mais conteúdo sobre licitações e contratos administrativos e, se tiver alguma dúvida, entre em contato e um dos nossos advogados especialistas na área irá lhe atender.
Artigo atualizado em 6 de outubro de 2022.
Referências[+]
↑1 | CENTRO PARA A QUARTA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL. Guia de Contratações Públicas de Inteligência Artificial. [S.L.]: Centro Para A Quarta Revolução Industrial, 2022. p. 31. Disponível em: https://ideiagov.sp.gov.br/guia-de-contratacoes-publicas-de-inteligencia-artificial/. Acesso em: 25 jul. 2022 |
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↑2 | Art. 57. A duração dos contratos regidos por esta Lei ficará adstrita à vigência dos respectivos créditos orçamentários, exceto quanto aos relativos:
II – à prestação de serviços a serem executados de forma contínua, que poderão ter a sua duração prorrogada por iguais e sucessivos períodos com vistas à obtenção de preços e condições mais vantajosas para a administração, limitada a sessenta meses; |
↑3 | Art. 108. A Administração poderá celebrar contratos com prazo de até 10 (dez) anos nas hipóteses previstas nas alíneas “f” e “g” do inciso IV e nos incisos V, VI, XII e XVI do caput do art. 75 desta Lei. |
↑4 | CENTRO PARA A QUARTA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL. Guia de Contratações Públicas de Inteligência Artificial. [S.L.]: Centro Para A Quarta Revolução Industrial, 2022. p. 31. Disponível em: https://ideiagov.sp.gov.br/guia-de-contratacoes-publicas-de-inteligencia-artificial/. Acesso em: 25 jul. 2022. |
↑5 | Art. 20. Os órgãos e entidades da administração pública, em matéria de interesse público, poderão contratar diretamente ICT, entidades de direito privado sem fins lucrativos ou empresas, isoladamente ou em consórcios, voltadas para atividades de pesquisa e de reconhecida capacitação tecnológica no setor, visando à realização de atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação que envolvam risco tecnológico, para solução de problema técnico específico ou obtenção de produto, serviço ou processo inovador. |
↑6 | CENTRO PARA A QUARTA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL. Guia de Contratações Públicas de Inteligência Artificial. [S.L.]: Centro Para A Quarta Revolução Industrial, 2022. p. 30. Disponível em: https://ideiagov.sp.gov.br/guia-de-contratacoes-publicas-de-inteligencia-artificial/. Acesso em: 25 jul. 2022. |
↑7 | TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. Encomenda Tecnológica (ETEC). Brasília: Tribunal de Contas da União, 2020. Disponível em: https://portal.tcu.gov.br/encomenda-tecnologica-etec.htm. Acesso em: 25 jul. 2022. |
↑8 | BANCO INTERAMERICANO DE DESENVOLVIMENTO. Guia de Alternativas Jurídicas e Boas Práticas para Compras de Inovação no Brasil. Washington, D.C: Banco Interamericano de Desenvolvimento, 2022. p. 58. Disponível em: https://publications.iadb.org/pt/contratacoes-de-inovacao-guia-de-alternativas-juridicas-e-de-boas-praticas-para-contratacoes-de. Acesso em: 25. jul. 2022. |
↑9 | SCHIEFLER, Gustavo Henrique Carvalho Schiefler. A contratação direta de Encomenda Tecnológica: quando há risco tecnológico, instrumento jurídico permite o investimento público em inovação sem a necessidade de fazer licitação .In: PICCOLI, Ademir (org.). Contratação de Inovação na Justiça: com os avanços do Marco Legal de Ciência, Tecnologia e Inovação. São Paulo: Vidaria Livros, 2020. |
↑10 | § 4º O fornecimento, em escala ou não, do produto ou processo inovador resultante das atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação encomendadas na forma do caput poderá ser contratado mediante dispensa de licitação, inclusive com o próprio desenvolvedor da encomenda, observado o disposto em regulamento específico. |
↑11 | Art. 24. É dispensável a licitação:
XXXI – nas contratações visando ao cumprimento do disposto nos arts. 3º, 4º, 5º e 20 da Lei no 10.973, de 2 de dezembro de 2004, observados os princípios gerais de contratação dela constantes. |
↑12 | Art. 75. É dispensável a licitação:
V – para contratação com vistas ao cumprimento do disposto nos arts. 3º, 3º-A, 4º, 5º e 20 da Lei nº 10.973, de 2 de dezembro de 2004, observados os princípios gerais de contratação constantes da referida Lei; |
↑13 | TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. Encomenda Tecnológica (ETEC). Brasília: Tribunal de Contas da União, 2020, p. 8. Disponível em: https://portal.tcu.gov.br/encomenda-tecnologica-etec.htm. Acesso em: 25 jul. 2022. |
↑14 | Art. 31. O fornecimento, em escala ou não, do produto, do serviço ou do processo inovador resultante das atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação encomendadas na forma estabelecida neste Decreto poderá ser contratado com dispensa de licitação, inclusive com o próprio desenvolvedor da encomenda.
Parágrafo único. O contrato de encomenda tecnológica poderá prever opção de compra dos produtos, dos serviços ou dos processos resultantes da encomenda. Art. 32. Quando o contrato de encomenda tecnológica estabelecer a previsão de fornecimento em escala do produto, do serviço ou do processo inovador, as partes poderão celebrar contrato, com dispensa de licitação, precedido da elaboração de planejamento do fornecimento, acompanhado de termo de referência com as especificações do objeto encomendado e de informações sobre: I – a justificativa econômica da contratação; II – a demanda do órgão ou da entidade; III – os métodos objetivos de mensuração do desempenho dos produtos, dos serviços ou dos processos inovadores; e IV – quando houver, as exigências de certificações emitidas por instituições públicas ou privadas credenciadas. |
↑15 | § 4º O fornecimento, em escala ou não, do produto ou processo inovador resultante das atividades de pesquisa, desenvolvimento e inovação encomendadas na forma do caput poderá ser contratado mediante dispensa de licitação, inclusive com o próprio desenvolvedor da encomenda, observado o disposto em regulamento específico. |
↑16 | CENTRO PARA A QUARTA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL. Guia de Contratações Públicas de Inteligência Artificial. [S.L.]: Centro Para A Quarta Revolução Industrial, 2022. p. 31. Disponível em: https://ideiagov.sp.gov.br/guia-de-contratacoes-publicas-de-inteligencia-artificial/. Acesso em: 25 jul. 2022. |
↑17 | § 3º A remuneração da contratada deverá ser feita de acordo com um dos seguintes critérios:
I – preço fixo; II – preço fixo mais remuneração variável de incentivo; III – reembolso de custos sem remuneração adicional; IV – reembolso de custos mais remuneração variável de incentivo; ou V – reembolso de custos mais remuneração fixa de incentivo. |
↑18 | § 4º Nas hipóteses em que houver risco tecnológico, os pagamentos serão efetuados proporcionalmente aos trabalhos executados, de acordo com o cronograma físico-financeiro aprovado, observado o critério de remuneração previsto contratualmente.
§ 5º Com exceção das remunerações variáveis de incentivo vinculadas ao cumprimento das metas contratuais, a administração pública deverá efetuar o pagamento conforme o critério adotado, ainda que os resultados almejados não sejam atingidos em decorrência do risco tecnológico, sem prejuízo da rescisão antecipada do contrato caso seja comprovada a inviabilidade técnica ou econômica da solução. § 6º Na hipótese de a execução do objeto ser dividida em etapas, o pagamento relativo a cada etapa poderá adotar critérios distintos de remuneração. § 7º Os pagamentos serão feitos após a execução dos trabalhos, e, a fim de garantir os meios financeiros para que a contratada implemente a etapa inicial do projeto, a administração pública deverá prever em edital o pagamento antecipado de uma parcela do preço anteriormente ao início da execução do objeto, mediante justificativa expressa. § 8º Na hipótese prevista no § 7º deste artigo, a administração pública certificar-se-á da execução da etapa inicial e, se houver inexecução injustificada, exigirá a devolução do valor antecipado ou efetuará as glosas necessárias nos pagamentos subsequentes, se houver. |
↑19 | Art. 106. A Administração poderá celebrar contratos com prazo de até 5 (cinco) anos nas hipóteses de serviços e fornecimentos contínuos, observadas as seguintes diretrizes:
I – a autoridade competente do órgão ou entidade contratante deverá atestar a maior vantagem econômica vislumbrada em razão da contratação plurianual; II – a Administração deverá atestar, no início da contratação e de cada exercício, a existência de créditos orçamentários vinculados à contratação e a vantagem em sua manutenção; III – a Administração terá a opção de extinguir o contrato, sem ônus, quando não dispuser de créditos orçamentários para sua continuidade ou quando entender que o contrato não mais lhe oferece vantagem. § 1º A extinção mencionada no inciso III do caput deste artigo ocorrerá apenas na próxima data de aniversário do contrato e não poderá ocorrer em prazo inferior a 2 (dois) meses, contado da referida data. § 2º Aplica-se o disposto neste artigo ao aluguel de equipamentos e à utilização de programas de informática. Art. 107. Os contratos de serviços e fornecimentos contínuos poderão ser prorrogados sucessivamente, respeitada a vigência máxima decenal, desde que haja previsão em edital e que a autoridade competente ateste que as condições e os preços permanecem vantajosos para a Administração, permitida a negociação com o contratado ou a extinção contratual sem ônus para qualquer das partes. |
↑20 | Capítulo I – Das Licitações. |
↑21 | BRITO, Thiago da Cunha. As parcerias decorrentes de oportunidades de negócio na Lei das Estatais. Disponível em: https://thiagocbrito.jusbrasil.com.br/artigos/872967173/as-parcerias-decorrentes-de-oportunidades-de-negocio-na-lei-das-estatais. |
↑22 | ASSIS, Luiz Eduardo Altenburg. Oportunidades de Negócio na Lei das Estatais – as parcerias e outras formas associativas entre empresas estatais e empresas privadas. Lumen Juris, Rio de Janeiro, 2019, p. 279. |
↑23 | Art. 18. A fase preparatória do processo licitatório é caracterizada pelo planejamento e deve compatibilizar-se com o plano de contratações anual de que trata o inciso VII do caput do art. 12 desta Lei, sempre que elaborado, e com as leis orçamentárias, bem como abordar todas as considerações técnicas, mercadológicas e de gestão que podem interferir na contratação, compreendidos:
V – levantamento de mercado, que consiste na análise das alternativas possíveis, e justificativa técnica e econômica da escolha do tipo de solução a contratar; |
As principais mudanças da Lei nº 14.133/2021 nos contratos administrativos
A Lei nº 14.133/2021, a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, trouxe inúmeras inovações ao regime de contratações públicas no Brasil, aliadas à positivação em lei de diversas orientações dos órgãos de controle externo, principalmente o Tribunal de Contas da União (TCU), e procedimentos antes encontrados apenas em normas infralegais.
Em artigo anterior, que você encontra aqui, abordamos as principais regras da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos a respeito do processo licitatório. Agora, neste breve texto, você conhecerá as principais mudanças em relação à fase de execução contratual neste novo regime legal.
Neste breve texto, você irá encontrar as principais mudanças da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos relacionadas ao procedimento licitatório.
Novas regras sobre os prazos de vigência dos contratos
Pode-se afirmar que a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos buscou dar especial atenção à fase de execução dos contratos administrativos, completando lacunas e alterando regras anteriores que se mostraram pouco adequadas à dinamicidade das relações negociais modernas.
Uma grande mudança ocorreu em relação ao regime das contratações de serviços contínuos, que, sob a Lei nº 8.666/93, costumam ser celebradas em contratos de 12 meses, prorrogáveis até 60 meses e, excepcionalmente, até 72 meses. Com a Lei nº 14.133/2021, passou-se a se admitir também os contratos de fornecimentos contínuos – ou seja, contratos de longo prazo também para o fornecimento de bens, e não apenas para serviços contínuos.
A NLLCA também simplificou os prazos contratuais: para serviços e fornecimentos contínuos, ou sob regime de fornecimento com prestação de serviço contínuo, ou ainda, para o aluguel de equipamentos e utilização de programas de informática, o prazo inicial máximo é de 5 anos, prorrogáveis até 10 anos (arts. 106 e 107), não havendo necessidade de celebrar por períodos menores, com prorrogações sucessivas.
Ainda em relação a prazos de vigência, para contratos com origem em dispensa de licitação nas áreas de inovação e de transferência de tecnologia de defesa e de saúde, o prazo é de 10 anos (art. 108); para contratos que gerem receitas à Administração e contratos de eficiência (que geram economia), a sua vigência pode chegar a 35 anos (art. 110); já para o contrato que previr a operação continuada de sistemas estruturantes de tecnologia da informação, a vigência máxima poderá ser de 15 anos (art. 114).
Com efeito, para os contratos por escopo, isto é, cujo objeto não é de prestação continuada, a vigência contratual será automaticamente prorrogada quando seu objeto não for concluído no período firmado no contrato (art. 111), hipótese em que, se o atraso ocorrer por culpa do contratado, este responderá pela mora, admitida a opção pela rescisão contratual por parte da Administração. Com isso, resolve-se a antiga polêmica, presente na Lei nº 8666/93, relacionada com os casos em que há a extinção do prazo de vigência antes do término da execução contratual – situação em que, majoritariamente, considera-se que o contrato se encerrou.
Possibilidade de adoção de meios alternativos de prevenção e resolução de disputas (art. 151)
A NLLCA previu expressamente a possibilidade de que o contrato administrativo adote meios alternativos de prevenção e resolução de disputas, especificamente a conciliação, a mediação, o comitê de resolução de disputas (popularmente conhecido como dispute board) e a arbitragem.
Além disso, em prestígio à consensualidade e, especialmente, por força do artigo 26 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (LINDB), é juridicamente possível, atualmente, que eventuais controvérsias surgidas durante o contrato administrativo sejam resolvidas por meio de uma negociação seguida de acordo, para eliminar irregularidade, incerteza jurídica ou situação contenciosa.
Cada meio alternativo de prevenção e resolução de disputas possui aplicabilidade e características próprias, as quais poderão ser oportunamente estudadas de forma aprofundada ao longo da jornada de aprendizado e capacitação em licitações públicas e contratos administrativos.
Possibilidade de antecipação dos efeitos do termo aditivo (art. 132)
A NLLCA inovou significativamente o regime das alterações contratuais ao prever que, em casos de justificada necessidade, a Administração poderá antecipar os efeitos do termo aditivo. Isto significa que o contratado poderá seguir as alterações contratuais determinadas ou pactuadas com a Administração antes mesmo da formalização do termo aditivo. Como limite temporal, nessas circunstâncias, estipulou-se o prazo de 30 dias para a efetiva celebração do termo aditivo.
Esta prática, embora comum no Brasil, é vedada pelo regime da Lei nº 8.666/1993 e sempre foi objeto de controvérsias (como a eventual e posterior negativa da Administração em remunerar o particular, por ter executado antes da formal alteração contratual) e responsabilizações (como sobre os gestores públicos que autorizaram verbalmente a alteração contratual, sem proceder à prévia alteração formal da avença).
Contratação integrada e semi-integrada para obras
Com o objetivo de consolidar as normas de licitações e contratação em apenas um diploma legal, a Lei nº 14.133/2021 também buscou normatizar a contratação integrada, regime de contratação inaugurado pela Lei nº 12.462/2011 (Regime Diferenciado de Contratação), e a contratação semi-integrada, advinda da Lei nº 13.303/2016 (Lei das Estatais).
A título explicativo, cabe apontar que nas contratações por empreitada, conhecido como o regime “convencional”, o contratado assume apenas a execução da obra ou serviço de engenharia, tomando por base os projetos básico executivo fornecidos pela Administração na licitação.
Nas contratações integradas, por sua vez, a licitação é feita com base no anteprojeto de engenharia, de forma que o contratado assume a responsabilidade por elaborar e desenvolver os projetos básico e executivo, definindo as soluções que serão adotadas para executar o objeto, além de todas as atividades compreendidas na execução das obras e serviços de engenharia (fornecer bens ou prestar serviços especiais e realizar montagem, teste, pré-operação e as demais operações necessárias e suficientes para a entrega final do objeto).
Já nas contratações semi-integradas, o projeto básico é fornecido no instrumento convocatório da licitação, assumindo o particular a responsabilidade pelo projeto executivo e pela execução da obra ou serviço, sendo possível alterar determinados trechos do projeto básico, previamente identificados pela Administração.
Destaca-se que, nas contratações integradas e semi-integradas, o contratado assume os riscos decorrentes de fatos supervenientes à contratação associados às escolhas de soluções nos projetos por ele elaborados ou às alterações por ele sugeridas (art. 22, § 4º).
Novas regras de garantia contratual
A Lei nº 14.133/2021 passou a admitir a exigência de garantias contratuais em patamares superiores aos que eram previstos na Lei nº 8.666/1993. Agora, nas contratações de obras, serviços e fornecimentos, a garantia poderá ser de até 5% do valor inicial do contrato, autorizada a majoração desse percentual para até 10%, desde que justificada mediante análise da complexidade técnica e dos riscos envolvidos (art. 98). Já nas contratações de obras e serviços de engenharia de grande vulto (com valor estimado superior a R$ 200 milhões), poderá ser exigida a prestação de garantia, na modalidade seguro-garantia, em percentual equivalente a até 30% do valor inicial do contrato (art. 99).
A NLLCA prevê, também, a possibilidade de exigência de seguro-garantia para obras e serviços de engenharia com cláusula de retomada por parte da seguradora (art. 102), hipótese em que a seguradora deve assumir o objeto contratual e concluir, diretamente ou por subcontratação de terceiros, a execução em caso de inadimplência do contratado. Ademais, se o contratado optar pelo seguro-garantia – com ou sem a cláusula de retomada – para garantir a contratação, o edital deverá fixar prazo mínimo de 1 mês, contado da data de homologação da licitação e anterior à assinatura do contrato, para a prestação dessa garantia (art. 96, § 3º).
A inclusão da matriz de riscos nos editais de licitação e contratos
Entre as inovações do seu extenso rol de dispositivos, a Lei nº 14.133/2021 possibilita que os contratos administrativos para a aquisição de bens e contratação de serviços e obras possam prever uma matriz de alocação de riscos contratuais (art. 22 e art. 103), sendo esta uma cláusula contratual definidora de riscos e de responsabilidades entre as partes, caracterizadora do equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato, em termos de ônus financeiro decorrente de eventos supervenientes à contratação.
Trata-se de instrumento que favorece a eficiência e a segurança jurídica da contratação, estabelecendo, no momento da licitação, os riscos que as partes deverão suportar durante a execução. Assim, na superveniência de qualquer evento que altere as condições de execução do contrato, a matriz de riscos deve ser analisada para se verificar quem é a parte responsável por arcar com as consequências desse evento e se há direito ao reequilíbrio econômico-financeiro do contrato à outra parte.
Destaca-se que a alocação dos riscos entre as partes deve seguir parâmetros de eficiência[1]O advogado Lucas Hellmann, em Trabalho de Conclusão de Concurso de Graduação em Direito (UFSC), abordou os parâmetros metodológicos a serem observados na construção da matriz de riscos de … Continue reading e, na hipótese de materialização de um evento que não foi previsto da matriz de riscos, permanece aplicável o regime jurídico tradicional da teoria da imprevisão, arcando a Administração com as consequências de eventos caracterizados como força maior, caso fortuito ou fato do príncipe ou em decorrência de fatos imprevisíveis ou previsíveis de consequências incalculáveis (art. 124, II, d).
Embora possa ser adotada em qualquer contratação, a matriz de riscos é obrigatória para os contratos de grande vulto (acima de R$ 200 milhões) e para as contratações integradas e semi-integradas (art. 22, § 3º) e, portanto, facultativa para os demais contratos.
Novas hipóteses de causas da extinção contratual (art. 137)
A Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos incluiu novas hipóteses de extinção contratual, não previstas na Lei nº 8.666/1993, quais sejam: a) atraso na obtenção da licença ambiental, ou impossibilidade de obtê-la, ou alteração substancial do anteprojeto que dela resultar, ainda que obtida no prazo previsto; b) atraso na liberação das áreas sujeitas a desapropriação, a desocupação ou a servidão administrativa, ou impossibilidade de liberação dessas áreas; e c) não cumprimento das obrigações relativas à reserva de cargos prevista em lei, bem como em outras normas específicas, para pessoa com deficiência, para reabilitado da Previdência Social ou para aprendiz.
Tais hipóteses somam-se às outras seis previstas no caput do artigo 137, quando a causa para a rescisão contratual é atribuível ao contratado ou por interesse público, e àquelas estabelecidas no parágrafo segundo do mesmo artigo 137, quando a rescisão contratual passa a ser um direito do particular face a alguma conduta atribuível ao órgão contratante – neste tema, destaca-se a possibilidade de suspensão ou extinção do contrato por iniciativa do particular na hipótese de inadimplência da Administração por mais de 2 meses (art. 137, IV, e § 3º, II).
Já o artigo 147 da Lei nº 14.133/2021 prevê a declaração de nulidade do contrato em decorrência de alguma irregularidade constatada no procedimento licitatório ou na execução contratual. Tal previsão já era encontrada na Lei nº 8.666/1993, no entanto, a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos inovou ao prever que a declaração de nulidade só deve ocorrer caso não seja possível o saneamento da irregularidade constatada e, mesmo em caso de vício insanável, deve ser precedida de uma criteriosa análise sobre diversos aspectos elencados exemplificativamente nos incisos do caput do artigo 147:
- impactos econômicos e financeiros e decorrentes do atraso na fruição dos benefícios do objeto do contrato;
- riscos sociais, ambientais e à segurança da população local decorrentes do atraso na fruição dos benefícios do objeto do contrato;
- motivação social e ambiental do contrato;
- custo da deterioração ou da perda das parcelas executadas;
- despesa necessária à preservação das instalações e dos serviços já executados;
- despesa inerente à desmobilização e ao posterior retorno às atividades;
- medidas efetivamente adotadas pelo titular do órgão ou entidade para o saneamento dos indícios de irregularidades apontados;
- custo total e estágio de execução física e financeira dos contratos, dos convênios, das obras ou das parcelas envolvidas;
- fechamento de postos de trabalho diretos e indiretos em razão da paralisação;
- custo para realização de nova licitação ou celebração de novo contrato;
- custo de oportunidade do capital durante o período de paralisação.
Possibilidade de estabelecer remuneração variável (art. 144)
Na contratação de obras, fornecimentos e serviços, inclusive de engenharia, poderá ser estabelecida remuneração variável vinculada ao desempenho do contratado, com base em metas, padrões de qualidade, critérios de sustentabilidade ambiental e prazos de entrega definidos no edital de licitação e no contrato. Quando o objeto do contrato visar à implantação de processo de racionalização de despesas, o pagamento poderá ser ajustado em base percentual sobre o valor economizado (art. 144, § 1º).
Novas regras relacionadas à implantação de programas de integridade
A NLLCA estabelece a obrigatoriedade de implantação de programa de integridade (compliance) pelo licitante vencedor em serviços e fornecimentos de grande vulto (acima de R$ 200 milhões), em até seis meses da celebração do contrato (art. 25, § 4º). Além disso, a existência de um programa de integridade é o quarto critério de desempate entre propostas na fase de julgamento da licitação (art. 60, IV) e deve ser considerada, como atenuante, na dosimetria da pena quando da aplicação de sanções administrativas (art. 155, § 1º, V).
Maior flexibilidade para as Atas de Registro de Preços
Por fim, no que tange ao Sistema de Registro de Preços, a NLLCA trouxe a possibilidade de prorrogação da ata de registro de preços por mais 1 ano após o seu aniversário (art. 84), além de prever expressamente a possibilidade da adesão à ata de registro de preços (o “carona”) (art. 82, VIII) e da sua utilização para para a contratação de bens e serviços, inclusive de obras e serviços de engenharia (art. 82, § 5º).
Conclusão
Como se observa, são diversas as mudanças e inovações trazidas pela Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos e, assim, as empresas e profissionais que desejam entrar e/ou se manter no mercado de licitações públicas devem, necessariamente, buscar atualização sobre este novo e importante diploma legal. Acompanhe nosso site para ter acesso a mais conteúdo sobre licitações e, se tiver alguma dúvida, não deixe de contatar um dos nossos advogados especialistas na área.
Referências[+]
↑1 | O advogado Lucas Hellmann, em Trabalho de Conclusão de Concurso de Graduação em Direito (UFSC), abordou os parâmetros metodológicos a serem observados na construção da matriz de riscos de contratos administrativos regidos pela Lei nº 14.133/2021. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/228676. |
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Compreenda a lógica de um edital de licitação e de seus anexos
Quando se fala no tema licitação pública, um dos documentos mais importantes é, sem dúvida, o edital. O edital de licitação nada mais é do que o instrumento no qual a Administração irá formalizar as condições e exigências licitatórias para a contratação de um determinado produto ou contratação de serviços. Não por outra razão, o edital é conhecido como o documento em que estão registradas “as regras do jogo“.
O edital, caso tenha sido adequadamente redigido, definirá de forma clara o objeto que será licitado, qual será a documentação e experiência mínima exigida dos licitantes, além das condições contratuais aplicáveis ao fornecedor do produto ou do serviço a ser adquirido.
Nessa linha, podem ser listados como propósitos de um edital:
- Dar publicidade oficial à pretensão da Administração e convocar os potenciais interessados;
- Identificar plenamente o escopo do contrato pretendido, de forma vinculante às partes (ou seja, as regras do edital devem refletir exatamente o que será exigido durante o contrato por ambos os contratantes);
- Informar todos os detalhes sobre o procedimento competitivo a ser realizado, incluindo desde o cronograma para as diferentes etapas do certame, as instruções sobre a proposta a ser apresentada e sobre os documentos exigidos para fins de habilitação, além das informações sobre o critério de julgamento das propostas e a fase de recursos;
Assim, por mais que seja óbvio, vale dizer que é indispensável que os profissionais que lidam com processos licitatórios leiam o edital com bastante atenção, compreendendo o significado e a importância de cada uma das previsões ali postas.
Vejamos adiante quais são as informações centrais de um edital e os seus principais pontos de atenção, que devem ser observados por aqueles que trabalham com o tema.
Objeto do edital de licitação
Geralmente presente já nas primeiras páginas do edital, o objeto da licitação é o item que servirá para indicar, exatamente, o que a Administração Pública deseja comprar e/ou contratar. A partir dessa informação, portanto, o potencial licitante poderá aferir se existe compatibilidade com suas atividades comerciais e, posteriormente, em havendo, se possui condições de fornecer aquele produto e/ou serviço. Em resumo, o objeto nada mais é do que uma descrição, de modo conciso, daquilo que a administração deseja contratar.
Vale registrar que a descrição do objeto da licitação, presente no início do edital, costuma ser bem sintética, o que significa que, eventualmente, será insuficiente para se compreender de forma adequada a pretensão da Administração. Na prática, esta descrição inicial serve como primeira informação, sendo indispensável que a análise seja complementada pela descrição que está em anexo ao edital, especificamente no termo de referência ou projeto básico – como se verá mais adiante.
Um exemplo da importância de uma análise completa e atenta do objeto de um edital pode ser retirado de um cenário em que uma Prefeitura, a título de ilustração, deseja comprar uma série de micro-ônibus que serão utilizados para o transporte escolar dos alunos e professores vinculados ao sistema municipal..
Num primeiro momento, o gestor de uma empresa especializada na fabricação de micro-ônibus pode constatar que possui atividade mercantil condizente com o objeto da licitação, e que possui interesse em fornecer à Administração. No entanto, por políticas ambientais e de sustentabilidade do Município, tecnicamente justificadas, a prefeitura especificou no objeto do edital que esses veículos devem ser movidos a energia elétrica ou, no mínimo, devem ser híbridos. Assim, se a empresa deste empreendedor só produz micro-ônibus movidos a óleo diesel ou a gasolina, ela não estará apta a participar do certame. Daí a importância de que o objeto seja analisado em sua completude, já que em um caso como esse, embora aparentemente, em um primeiro momento, sua empresa cumpra com as exigências do Edital, em uma análise mais detalhada do objeto constata-se que não.
De qualquer forma, é importante que ao analisar o objeto de um edital o profissional já esteja atento se aquele objeto, apesar de bem definido e delimitado, não está descrito de uma forma que direcione o certame para uma marca ou um fornecedor específico – exceto, é claro, nos casos tecnicamente justificáveis. É fundamental que o texto do objeto não obste a ampla concorrência e a equidade de oportunidade aos fornecedores/licitantes interessados e aptos ao certame.
Inclusive, caso o licitante verifique que o objeto direciona injustificadamente o certame para um fornecedor específico, ele pode requerer a impugnação do edital (ou adotar outras medidas perante órgãos de controle ou o Judiciário) e, assim, buscar com que seja lançado um novo instrumento convocatório, agora em um processo adequado para a ampla concorrência de interessados.
Os documentos de habilitação
De forma geral, a exigência de documentação de habilitação de empresas licitantes é a forma utilizada pela Administração Pública para garantir que determinado licitante que virá a ser contratado terá aptidão para celebrar um contrato administrativo.
Assim, no que tange à empresa licitante, a análise dos documentos de habilitação necessários para a participação em determinado processo licitatório mostra-se de extrema importância, visto que os documentos podem ser muitos e, caso não organizados com antecedência, podem levar com que a empresa não consiga obtê-los até a data final para entrega.
A habilitação, em regra, podendo mudar de um edital para outro, é formada pela exigência dos seguintes requisitos e documentos:
Habilitação Jurídica
Os documentos exigidos para a habilitação irão envolver a comprovação da existência, da capacidade de contratar e do funcionamento formal e regular da empresa. Geralmente, os documentos que são exigidos para a habilitação jurídica são: ato Constitutivo (contrato social, estatuto social ou requerimento de empresário); todas as alterações ou consolidação do Ato Constitutivo; procuração dos respectivos representantes nas licitações; documentos dos sócios; documentos do Representante Legal; etc.
Regularidade fiscal e trabalhista
Os documentos exigidos para a comprovação da regularidade fiscal e trabalhista são aqueles que irão servir para demonstrar que a empresa não possui dívidas tributárias e/ou trabalhistas, seja na esfera municipal, estadual ou federal. Exemplos de documentos que podem ser exigidos para a habilitação fiscal e trabalhista são: Comprovante de Inscrição no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica; Inscrição Estadual; Inscrição Municipal; Certidão negativa de débitos Federais; Certidão negativa de débitos Estaduais; Certidão negativa de débitos Municipais; Certidão negativa de débitos Trabalhista; Certidão negativa de débitos do FGTS; Certidão negativa de débitos do INSS; etc.
Qualificação técnica
Tratam-se dos requisitos profissionais da empresa, que demonstram a capacidade que a empresa tem de fornecer o produto ou realizar o serviço. Por exemplo, se é uma empresa de engenharia, deve demonstrar que continuamente realiza serviços desse tipo. Um atestado de algum contratante anterior demonstrando que a empresa já realizou serviços similares, de maneira adequada, é um dos meios para comprovação da qualificação técnica. Além disso, outros documentos que podem servir para comprovar a qualificação técnica da empresa são, além do Atestado de Capacidade Técnica Profissional e de Atestado de Capacidade Técnica Operacional, documentos que comprovem inscrição em entidade profissional competente ou Registro em órgão regulamentador.
Qualificação econômico-financeira
Neste item a empresa deve demonstrar que terá capacidade financeira e econômica para cumprir o contrato caso seja a vencedora. É na qualificação econômico-financeira que será demonstrada a adequada saúde financeira da empresa, visando dar segurança à Administração Pública contratante. Exemplos de documentos que podem ser exigidos pelo Edital para comprovar a qualificação econômico-financeira são: Balanço patrimonial; Índices Contábeis; Capital social ou patrimônio líquido; Certidão negativa de Falência; entre outros.
Outros documentos e/ou declarações
Além dos listados acima, podem ser exigidos, a depender do Edital, outros documentos e/ou declarações, tais como: Declaração de que não emprega menores de 18 anos em trabalho noturno, perigoso ou insalubre, nem emprega menores de 16 anos, exceto maiores de 14 anos na condição de aprendiz; Declaração de enquadramento na categoria de ME/EPP; Declaração de Inexistência de Fatos Impeditivos à participação na licitação; entre outras.
De qualquer forma, é bastante importante que a empresa esteja atenta aos “prazos de validade” dos documentos e/ou os “prazos de validade” impostos pelo edital. Grande parte dos documentos listados acima possuem uma data de vencimento e, aqueles que não possuem, geralmente tem essa data estipulada automaticamente pelo próprio instrumento convocatório (por exemplo, 180 dias após a emissão do documento). No mais, grande parte desses documentos fiscais e trabalhistas podem ser extraídos a partir dos portais eletrônicos oficiais do governo.
A questão dos prazos
Um outro ponto que deve ser muito bem observado por aqueles que manejam editais de licitações públicas são os prazos ali dispostos.
A averiguação dos prazos é extremamente importante, essencialmente, por duas razões: primeiramente, porque determina até quando a empresa licitante deverá apresentar todos documentos de habilitação, sua proposta, bem como a data de realização da sessão(ões) pública(s) do certame; em segundo lugar, a verificação dos prazos também é essencial para que se saiba a data final para a realização de pedidos de esclarecimentos e/ou pedido de impugnação ao edital, bem como as datas para que se apresentem recursos aos resultados do certame.
Nesse aspecto, ainda é extremamente importante que se verifique que muitas vezes esses procedimentos e formas para impugnação, pedidos de esclarecimentos ou, até mesmo, recursos, variam de um processo licitatório para outro, seja na forma de protocolo (eletrônico e/ou físico), na contagem dos prazos (em dias úteis ou corridos), dentre outros aspectos formais.
Daí a importância de que cada edital (e seus consequentes prazos) sejam analisados com muito cuidado e de maneira individualizada, garantindo-se assim que todas as informações foram bem compreendidas e que a empresa conseguirá cumprir com todas as exigências e prazos do instrumento convocatório.
Os anexos dos editais de licitação
Em conjunto com o instrumento convocatório (ou seja, em conjunto com o edital), mais especificamente após o seu final, serão anexados documentos complementares cuja função é complementar as informações da licitação. Entre esses anexos, a depender da licitação, estarão documentos como o termo de referência ou o projeto básico, o projeto executivo, a minuta do contrato, os modelos de declarações, o modelo de proposta comercial, dentre outros.
Dentre os documentos aqui listados, destacamos as características principais daqueles que aparecem com mais frequência nos processos licitatórios.
Projeto Básico e/ou Termo de Referência
Embora a legislação denomine “projeto básico” o documento que define as características essenciais do objeto contratual, este mesmo documento, na prática, é frequentemente denominado “termo de referência”, sobretudo quando não se está diante de uma obra ou serviço de engenharia. Assim, para efeitos didáticos deste Módulo, podem ser considerados sinônimos.
O projeto básico ou o termo de referência representam o documento que traduz a essência da contratação. Isso porque é no termo de referência ou no projeto básico que estarão os detalhes e as condições da contratação que será realizada pela Administração Pública.
Não por outra razão, a presença de um termo de referência ou de um projeto básico, como anexo ao edital, é obrigatória para a licitação pública. Segundo a lei, este documento deve ser elaborado a partir de estudos técnicos preliminares (ETP), que reúnam os elementos necessários, e com precisão adequada, para caracterizar o objeto, bem como as demais condições da licitação e da contratação.
De forma geral, estará presente no termo de referência ou projeto básico as seguintes informações: (i) Indicação do objeto; (ii) Justificativa (motivação) da contratação; (iii) Especificação do objeto; (iv) Requisitos necessários; (v) Critérios de aceitabilidade da proposta; (vi) Critérios de aceitabilidade do objeto (recebimento do objeto); (vii) Estimativa do valor da contratação e dotação orçamentária e financeira para a despesa, exceto em caso de aposição de sigilo sobre este orçamento; (viii) Condições de execução (métodos, estratégias e prazos de execução e garantia); (ix) Obrigações das partes envolvidas (contratada e contratante); (x) Gestão do contrato; (xi) Fiscalização do contrato; (xii) Condições de pagamento; (xiii) Vigência do contrato; (xiv) Sanções contratuais; (xv) Orçamento detalhado estimado em planilha com preço unitário e valor global; e (xvi) Cronograma físico-financeiro (se for o caso).
Nessa linha, é importante que os profissionais que atuam com licitações e contratos administrativos fiquem atentos que o projeto básico ou termo de referência, ao tratar da especificação do objeto, não pode ser tão sucinto, de forma a suprimir informações ou detalhes que influenciam no valor da proposta, mas nem excessivo, de modo a conter exigências desnecessárias, que direcionem ou afetem a competitividade do certame. Inclusive, como já adiantado acima, caso se identifique que as especificações do objeto direcionam indevidamente a licitação ou prejudicam a competitividade, o potencial licitante deve, após adequada análise, considerar a possibilidade de impugnar o edital, seja administrativamente ou perante outros órgãos competentes.
Portanto, o que se pode concluir é que a análise do termo de Referência ou projeto básico deve ser feita de maneira minuciosa, garantindo-se dessa forma que todas as especificações desses documentos serão bem compreendidas.
Minuta do Contrato e Modelos de Declarações
Outros documentos que podem aparecer como anexos a um edital de licitação são a minuta do contrato e alguns modelos de declarações, que devem ser assinadas pelos licitantes e anexadas junto aos documentos que comprovam a habilitação da empresa.
No que se refere à minuta do contrato, trata-se de uma reprodução do contrato que será assinado pelo licitante que se sagrar vencedor do certame. Trata-se de um documento a ser necessariamente analisado pela empresa, especialmente porque nele estão reproduzidas as obrigações, os deveres e os direitos do futuro contratado e da Administração Pública.
Já no que se refere aos modelos de declarações, eles são, como o próprio nome já indica, modelos de minutas textuais, que, a depender da orientação dada pelo edital, devem ser preenchidas e assinadas pelos licitantes e anexados juntos aos documentos da proposta ou da habilitação. Geralmente, como visto, são declarações de que não emprega menores de 18 anos em trabalho noturno, perigoso ou insalubre, nem emprega menores de 16 anos, exceto maiores de 14 anos na condição de aprendiz; declaração de enquadramento na categoria de ME/EPP; declaração de Inexistência de Fatos Impeditivos à participação na licitação; entre outras.
Considerações finais
Desse modo, o que fica bem delimitado de todo o cenário desenhado acima é que o profissional que trabalha com processos licitatórios deve dedicar tempo à leitura e compreensão desses documentos, direcionando sua atenção principalmente às regras de conduta e participação do processo licitatório, bem como aos prazos e sanções que surgem em razão do descumprimentos das regras deste instrumento convocatório (tema que será mais bem explorado mais adiante neste Programa).
Read MoreAs comunicações entre o mercado e a Administração na etapa preparatória da contratação pública
As comunicações realizadas entre a Administração Pública e particulares durante a etapa preparatória de uma contratação pública representam um fenômeno equivalente a um tabu no Brasil.
Desconfia-se que a prática é reprovável, seja sob uma perspectiva moral ou legal. Desconfia-se que a prática é proibida, que é imprópria, que é sinônima de direcionamento ilícito de licitação pública. A justificativa para essa percepção é o fato de que, historicamente, muitos escândalos de corrupção descobertos foram estruturados, justamente, a partir de comunicações informais e extraprocessuais, que direcionavam as contratações a determinados particulares, em conluio com gestores públicos.
A verdade, no entanto, é que esses diálogos público-privados ocorrem cotidianamente e são indispensáveis, legítimos e essenciais para o bom desempenho das atividades administrativas e para o sucesso dos processos de contratação pública.
A grande questão é que essas comunicações não podem acontecer de qualquer forma. A preocupação, portanto, é com a forma, ou seja, como essas comunicações devem acontecer, e não se podem acontecer.
1. A Nova Lei de Licitações institucionalizou as comunicações entre o mercado e a Administração Pública
A novidade é que a Lei nº 14.133/2021 institucionalizou diversos institutos de diálogo público-privado durante o processo administrativo contratual, inclusive o levantamento de mercado, como estratégia para se conhecer os produtos disponíveis durante o planejamento da contratação, e a tradicional e diariamente realizada pesquisa de preços com fornecedores.
É preciso deixar claro que as comunicações com o mercado existem porque é natural que os agentes públicos precisem trocar informações com os particulares, seja para conhecer os interesses coincidentes e contrapostos, os riscos, as ofertas e as demandas disponíveis, seja para oferecer ou discutir alguma oportunidade negocial.
Essas comunicações são inevitáveis e serão essenciais sempre quando houver a necessidade de se descobrir uma solução para a administração pública sobre a qual os agentes públicos não possuem o suficiente conhecimento técnico, ou então quando se busca a contratação de uma solução inédita ou personalizada, ou ainda, quando a administração pública busca de forma proativa os potenciais fornecedores para um determinado contrato administrativo.
Nesses casos, o diálogo público-privado é condição para que a solução seja identificada e estruturada. Caso essa comunicação inexista, a administração pública correrá o risco até mesmo de paralisia e ineficiência, pois, incapaz de desenvolver as soluções autonomamente, não poderá satisfazer adequadamente as suas necessidades.
Dentre todos os elementos documentais indicados pela Lei nº 14.133/2021 como integrantes da instrução processual de uma licitação pública, enfatiza-se que houve a consagração de que o planejamento de um procedimento licitatório pode envolver um prévio levantamento de mercado (art. 18, §1º, V, da Lei nº 14.133/2021).
Ou seja, a Lei nº 14.133/2021 reconhece expressamente algo que, apesar de óbvio, costuma ser motivo de muita insegurança: a Administração Pública necessita obter informações de mercado durante o planejamento de suas contratações, para o que deverá empreender diálogos público-privados com potenciais fornecedores, em levantamento de mercado.
2. O reconhecimento da legitimidade dos diálogos público-privados durante a etapa preparatória da licitação
Para quem trabalha com licitação pública, é relevante saber também que, ao menos desde o ano de 2020, a comunidade jurídica brasileira dedicada ao direito administrativo reconhece que essas comunicações entre a Administração Pública e o mercado são legítimas.
Em agosto de 2020, a partir de uma proposta de enunciado apresentada por Gustavo Schiefler, foi aprovado, na I Jornada de Direito Administrativo do Conselho da Justiça Federal, vinculado ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), o seguinte enunciado:
Enunciado nº 29 – I Jornada de Direito Administrativo (CJF/STJ)
A Administração Pública pode promover comunicações formais com potenciais interessados durante a fase de planejamento das contratações públicas para a obtenção de informações técnicas e comerciais relevantes à definição do objeto e elaboração do projeto básico ou termo de referência, sendo que este diálogo público- privado deve ser registrado no processo administrativo e não impede o particular colaborador de participar em eventual licitação pública, ou mesmo de celebrar o respectivo contrato, tampouco lhe confere a autoria do projeto básico ou termo de referência. |
Este enunciado antecipou a regra que pode ser extraída, agora, a partir da previsão na NLLCA, segundo a qual levantamento de mercado é uma etapa inerente ao Estudo Técnico Preliminar (ETP), realizado durante a preparação de uma contratação pública. Isso traz uma proteção adicional aos agentes econômicos que, de boa-fé, contribuem formalmente com o levantamento de mercado realizado para a instrução do processo de contratação pública.
Em projetos contratuais mais complexos, a Administração Pública deve considerar a realização de um procedimento de manifestação de interesse (PMI), também previsto na Lei nº 14.133/2021 (art. 81). Por intermédio do PMI, a participação dos diferentes interessados no projeto de contratação pública acontecerá de forma organizada e regulamentada, sendo que, neste caso, a contribuição dos particulares poderá acontecer de modo mais intenso, incluindo até mesmo as minutas do edital, do termo de referência ou projeto básico e demais documentos.
3. Na prática, como devem ocorrer os diálogos público-privados?
Na prática, se você é um empreendedor, isto significa que:
- Desde que ocorra formalmente, não é proibido se comunicar com a Administração Pública, antes de uma licitação pública, com o intuito comercial, ou seja, em atividade de prospecção, para apresentar informações técnicas sobre os produtos e serviços oferecidos por sua empresa;
- Esses diálogos público-privados devem ser realizados preferencialmente a partir de meios institucionais de comunicação, a exemplo da troca de e-mails com endereços eletrônicos institucionais (fulano@nomedaempresa.com.br e fulano@nomedoorgaopublico.com.br, por exemplo). A orientação é válida tanto para os remetentes como para os destinatários;
- As comunicações devem ser claras, objetivas e completas. Um observador externo, caso leia as comunicações, deve conseguir compreender adequadamente o contexto em que este diálogo está acontecendo. Não é momento para apelidos, demonstração de intimidade, piadas, tampouco é adequado adotar presunções de que o interlocutor sabe do que se está falando;
- Durante as licitações públicas, as comunicações devem ocorrer exclusivamente com a comissão de licitação ou pregoeiro;
Na prática, se você é um agente público, isto significa que:
- É permitido entrar em contato com empresas atuantes na área de interesse para se realizar um levantamento de mercado, a fim de que as alternativas disponíveis para a contratação sejam conhecidas antecipadamente, ainda durante o processo decisório sobre qual será o objeto do futuro contrato;
- Para a melhor instrução do processo e para que sejam legítimas, essas comunicações devem ser registradas e depositadas integralmente no respectivo processo administrativo. Isto também significa que, sempre que possível, os diálogos público-privados devem ocorrer por escrito e que a oralidade (conversas por telefone, reuniões presenciais ou por videoconferência), se não puder ser registrada (gravação, por exemplo), deve ser evitada. Se isto não for possível, ao menos deve existir uma ata ou registro de que tal comunicação ocorreu e qual foi o seu teor;
4. Lembrete final: a cautela a ser adotada em qualquer diálogo público-privado
O exercício de controle sobre a administração pública depende de que os atos administrativos sejam revestidos de forma, para que possam ser resgatados e analisados posteriormente, se necessário. E, como se sabe, a formalização sequencial e encadeada de atos administrativos compõe o processo administrativo: o instrumento em que são registradas as manifestações da administração pública e dos particulares interessados até que seja alcançada uma determinada conclusão.
O processo administrativo é o meio natural de atuação da administração pública, sendo nele registrada toda a memória administrativa. É o necessário instrumento por meio do qual se realiza o controle e se promove publicidade e participação.
A orientação é de que, quando as comunicações ocorrerem por escrito, seja promovida a juntada integral de cópia dessas interlocuções no competente processo administrativo; quando ocorrerem oralmente, que seja reduzido a termo as informações essenciais sobre a comunicação, como a identificação dos interlocutores, o conteúdo das informações intercambiadas, a data e horário em que o diálogo se sucedeu e os meios de comunicação utilizados – sem prejuízo de uma formalização mais fidedigna ao conteúdo das comunicações, por meio do registro integral das comunicações, mediante gravação sonora ou audiovisual[1] O conteúdo deste tópico foi redigido com inspiração em excertos da tese de doutorado de Gustavo Schiefler, publicada pela Editora Lumen Juris, sob o título de Diálogos Público-Privados (2018)..
Uma comunicação fluida e legítima entre agentes públicos e particulares pode ser determinante para o sucesso de uma contratação pública. Como visto, isto pode ocorrer desde a etapa preparatória da licitação pública. Acompanhe nosso site para ter acesso a mais conteúdo sobre licitações e, se tiver alguma dúvida ou solicitação, entre em contato neste link e um dos nossos advogados especialistas na área irá lhe atender.
Referências[+]
↑1 | O conteúdo deste tópico foi redigido com inspiração em excertos da tese de doutorado de Gustavo Schiefler, publicada pela Editora Lumen Juris, sob o título de Diálogos Público-Privados (2018). |
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O que mudou com a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei nº 14.133/2021): as novas regras de licitação
Em 1º de abril de 2021 foi sancionada a Lei nº 14.133, que instituiu a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (NLLCA), substituindo e unificando a matéria tratada em diversas leis editadas nas últimas três décadas sobre contratação pelo Poder Público, sendo aplicada à Administração Pública direta, autárquica e fundacional da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios – excetuando-se, portanto, as empresas públicas, as sociedades de economia mista e as suas subsidiárias, regidas pela Lei nº 13.303/2016.
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Embora as licitações sejam uma prática comum da Administração Pública, o seu entendimento desperta ainda muitas dúvidas para aqueles que se aproximam desse ramo de atuação. Com uma diversidade de modalidades, critérios, condições e regras específicas, é esperado que surjam inseguranças sobre a compreensão do que é o mais comum em licitações. Este texto visa a esclarecer justamente isso: quais são as modalidades mais comuns de licitação? Quais as principais características? Quais as informações básicas que o “iniciante” precisa saber?
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Se você acredita que a sua startup é capaz de oferecer soluções que podem interessar ao Poder Público, mas não tem certeza se vale a pena ingressar nesse mercado, esse texto é para você!
O universo das contratações públicas muitas vezes é sub-explorado por empresas que, apesar de terem muito potencial para crescer nesse meio, não o conhecem o suficiente para terem a segurança de estar fazendo um bom investimento. Neste texto explicaremos de forma simples e didática os motivos pelos quais contratar com o Poder Público pode ser uma ótima opção para startups dos mais diversos ramos.
Mercado Público: uma janela de oportunidades
Antes de mais nada, é importante destacar a fatia de mercado que as contratações públicas representam no Brasil. Por motivos diversos, como, por exemplo, a opção constitucional de atribuir diversas funções sociais ao Estado brasileiro, fato é que a Administração Pública não tem condições econômicas e estruturais de prestar sozinha todos os serviços que lhe foram atribuídos.
Isso acaba levando os entes públicos em geral a contratarem particulares para ajudar a suprir essas demandas, por meio da realização de procedimentos licitatórios ou, em alguns casos, mediante dispensa ou inexigibilidade.
Justamente por isso, as compras públicas acabam representando um percentual significativo do Produto Interno Bruto (PIB) do país, sendo estimado que correspondam, nas últimas duas décadas, a uma média de aproximadamente 12% do PIB brasileiro.
Devido a esse cenário de potenciais contratações com valores expressivos, diversas empresas têm adentrado no mercado de vendas públicas, aproveitando a oportunidade de crescimento que esses contratos podem proporcionar. Um exemplo dessa crescente migração para o mercado das contratações públicas foi a primeira contratação de edtechs via Marco Legal das Startups, para atuar na área da educação pública.
Primeira contratação de edtechs via Marco Legal das Startups
As edtechs, startups voltadas ao desenvolvimento de soluções tecnológicas para o setor da educação, representam o maior segmento de startups no Brasil. No ano de 2022, pela primeira vez, secretarias municipais de educação utilizaram o recente Marco Legal das Startups (Lei Complementar nº 182 de 2021) para viabilizar a contratação de edtechs com o objetivo de implementar melhorias no ensino público, por meio de soluções tecnológicas.
Os sete municípios envolvidos na iniciativa são Guaramiranga/CE, Bonito/PE, Cabrobó/PE, Domingos Mourão/PI, Igarassu/PE, Santa Maria/RS e Volta Redonda/RJ, todos participantes do Programa Impulsionar. As edtechs Jovens Gênios, Aprimora, Eduqo e Portabilis foram selecionadas, assim, a partir de uma avaliação que foi além da simples análise de custo, utilizando-se, também, critérios como a capacidade da solução em responder ao desafio proposto e a experiência do usuário para definir quais startups seriam efetivamente contratadas pelos municípios.
Além da implementação da solução contratada, as edtechs selecionadas pelo Programa Impulsionar também passarão por um processo de aprendizado, contando com um suporte especializado de consultoria jurídica para apoiá-las em processos de compras públicas, bem como participarão de uma aceleração conduzida pelo Quintessa, que realizará um diagnóstico e oferecerá suporte individual com foco no aprimoramento das soluções e do seu modelo de B2G (Business to Government).
É fato que o ensino básico público brasileiro sofre com uma carência estrutural histórica, assim a contratação das referidas edtechs responde à urgente necessidade de adoção de novas estratégias em favor da melhoria da qualidade deste serviço público. Contudo a necessidade de implementação de soluções inovadoras para a melhoria dos serviços públicos, em especial aqueles de cunho social, transcende a seara de atuação das edtechs, representando um mercado em potencial para startups dos mais diversos segmentos.
Com a recente entrada em vigor do Marco Legal das startups, o gestor público passou a poder buscar soluções com base no maior potencial de enfrentamento do déficit do serviço em questão, não mais estando atrelado, unicamente, ao critério de menor preço. Assim, apesar da iniciativa conduzida pelo Programa Impulsionar ter foco na contratação de edtechs via Marco Legal das Startups, essa legislação não se aplica tão somente a esse setor, de modo que as contratações de startups diversas pela Administração Pública devem se intensificar nos próximos anos.
Marco Legal das Startups: uma oportunidade para contratações inovadoras
O Marco Legal das Startups, em vigor desde agosto de 2021, trouxe maior flexibilidade para o processo de contratação das startups pelo Poder Público. Responsável por criar um ambiente regulatório mais amigável ao empreendedorismo inovador, a Lei Complementar nº 182 de 2021 contribuiu para conferir maior segurança jurídica para as startups, proporcionando um estímulo à busca por novos negócios.
De um modo geral, a principal contribuição do Marco Legal sob a perspectiva das contratações públicas foi a instituição de um microssistema próprio para as licitações e contratos administrativos firmados com startups. Esse contrato “especial”, intitulado Contrato Público para Solução Inovadora (CPSI), tem como objetivo materializar o incentivo à inovação e a busca por soluções inovadoras para os problemas públicos.
Para viabilizar o CPSI, instituiu-se um regime licitatório um pouco diferenciado do regime comum, uma vez que, diferente do que ocorre em uma licitação “padrão”, o Marco Legal das startups possibilita que os editais das licitações que tem como objeto a contratação de solução para um problema público possam indicar somente qual é o problema que deve ser solucionado, de modo que os particulares que forem participar da licitação é que serão responsáveis por indicar qual a potencial solução e qual a técnica a ser utilizada.
Consequentemente, a Administração estará diante de propostas desenvolvidas com vistas à inovação e que apresentam variadas formas de suprir as necessidades do Poder Público.
Além disso, como ventilado anteriormente, o critério de seleção das propostas se afasta da “regra geral” dos procedimentos licitatórios, pois no procedimento simplificado voltado às startups não se avalia somente o requisito do preço de forma objetiva, fazendo parte da análise da proposta também outros critérios, como, por exemplo, o grau de desenvolvimento da tecnologia, a viabilidade econômica da proposta ou a demonstração do custo e benefício em relação às demais soluções propostas, dentre outros.
Por fim, outra vantagem trazida pelo Marco Legal das Startups foi a possibilidade de celebração direta (ou seja, sem licitação) de um contrato para o fornecimento da solução resultante do CPSI. Isso porque, uma vez vencedora do certame, a startup assinará o CPSI com prazo de vigência de até 12 meses, sendo possível prorrogar esse período por mais 12 meses, desde que o valor total não ultrapasse R$ 1,6 milhões. Encerrado esse prazo, o Poder Público poderá contratar a startup que desenvolveu a solução para o problema, sem novo procedimento licitatório, por mais 24 meses, podendo prorrogar esse período por mais 24 meses, respeitado o limite de R$ 8 milhões.
Conclusão
Por meio deste artigo, buscamos destacar quão vastas são as possibilidades de contratação entre o Poder Público e startups, demonstrando tratar-se de um mercado muito promissor e lucrativo, que representa 12% do PIB e que anseia, cada dia mais, serviços que startups podem oferecer, bem como os recém aprovados incentivos e facilidades que favorecem este setor do mercado. Como se viu, o ecossistema brasileiro de startups tem sido gradativamente fomentado e incentivado por políticas públicas e leis próprias para o crescimento do setor.
É importante destacar, contudo, que a participação em licitações requer preparo e atenção. As contratações administrativas são reguladas por diversas normas e requisitos, tanto para a Administração Pública quanto para os potenciais fornecedores. Contar com o apoio de uma assistência jurídica especializada em contratações públicas pode fazer toda a diferença para a adequada compreensão das regras e procedimentos licitatórios, organização dos documentos e potencial contratação.
Ficou interessado ou possui alguma dúvida sobre o tema? Entre em contato por meio do nosso e-mail contato@schiefler.adv.br, que um dos nossos advogados especialistas em licitações públicas e contratos poderá atendê-lo(a).
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