A nova Lei de Licitações surge como um verdadeiro Código Nacional de Contratações Públicas e dedicou o Capítulo XII ao tema dos meios alternativos de resolução de controvérsias, entre seus artigos 151 a 154.
O ano de 2021 começou movimentado no mundo do Direito Administrativo. Depois de tanta espera – afinal, o projeto da nova Lei de Licitações teve seu início em 1995 -, a notícia de que a Lei nº 14.133/2021 seria sancionada no dia 01/04/2021 mais parecia uma daquelas costumeiras pegadinhas do dia da mentira. Por sorte, não era. Publicada em edição extra do Diário Oficial da União, a Lei nº 14.133/2021 surge como um verdadeiro Código Nacional de Contratações Públicas, isso porque unifica, em um único instrumento normativo, diversas regras constantes em diplomas legais e infralegais que serviam para regulamentar os procedimentos licitatórios e os contratos administrativos.
De todo modo, e embora se reconheçam seus méritos, para muitos administrativistas a nova Lei de Licitações deixou a desejar. Reproduz o mesmo DNA burocrático e demasiadamente formalista da Lei nº 8.666/93, e chega a soar, em alguns momentos, muito mais uma atualização da antiga Lei do que propriamente uma nova Lei de Licitações.
No que se refere aos meios alternativos de resolução de controvérsias, a nova Lei de Licitações dedicou o Capítulo XII ao tema, entre seus artigos 151 a 154. De maneira geral, não apresenta nenhuma grande inovação. Reproduz instrumentos tradicionais de autocomposição e heterocomposição no âmbito privado e já previstos em outras regulamentações administrativas. Ainda assim, é inegável o seu mérito ao positivar, enfim, uma cláusula geral autorizativa dos meios alternativos de resolução de controvérsias, deixando expressamente previsto que a administração pública pode valer-se desses mecanismos.
No seu artigo 151 a Lei nº 14.133/2021 menciona alguns dos meios alternativos de resolução de controvérsias que poderão ser utilizados:
Art. 151. Nas contratações regidas por esta Lei, poderão ser utilizados meios alternativos de prevenção e resolução de controvérsias, notadamente a conciliação, a mediação, o comitê de resolução de disputas e a arbitragem.
Como se pode perceber, a Lei nº 14.133/2021 exemplificou os seguintes mecanismos de resolução de conflitos: a conciliação, a mediação, o comitê de resolução de disputas (dispute boards) e – tema deste breve artigo de opinião – a arbitragem. A grande questão é que sobre este último mecanismo, a arbitragem, a nova Lei de Licitações o previu de maneira genérica, sendo insuficiente em vários aspectos e perdendo a chance de regulamentar inúmeros pontos importantes.
A Lei nº 14.133/2021, no parágrafo único do artigo 151, no artigo 152 e no artigo 154, trata o tema da arbitragem nos seguintes termos:
Art. 151 […]
Parágrafo único. Será aplicado o disposto no caput deste artigo às controvérsias relacionadas a direitos patrimoniais disponíveis, como as questões relacionadas ao restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, ao inadimplemento de obrigações contratuais por quaisquer das partes e ao cálculo de indenizações.
Art. 152. A arbitragem será sempre de direito e observará o princípio da publicidade.
[…]
Art. 154. O processo de escolha dos árbitros, dos colegiados arbitrais e dos comitês de resolução de disputas observará critérios isonômicos, técnicos e transparentes.
Da redação acima, conclui-se que a Lei nº 14.133/2021 enfrenta, em resumo, três temas atinentes à arbitragem no âmbito da Administração Pública: (i) a questão da arbitrabilidade objetiva e dos direitos disponíveis; (ii) o princípio da publicidade vinculado ao procedimento arbitral; e (iii) a necessidade de que a arbitragem seja de direito. Ocorre que se trata de previsões insuficientes para a procedimentalização desses aspectos. Como já adianta o título deste artigo, muito mais do que dizer, no que se refere ao tema da arbitragem, a Lei nº 14.133/2021 infelizmente se destaca por aquilo que silenciou.
Nesse ponto são válidas as reflexões realizadas por mim ao abordar a Nova Lei de Licitações, quando esta ainda era o Projeto de Lei nº 4253/2020 do Senado Federal. Naquela ocasião destaquei:
Apesar de o Projeto de Lei nº 4253/2020 trazer que as questões passíveis de serem resolvidas serão as que envolvem direitos patrimoniais disponíveis e, até mesmo, ilustrar algumas dessas situações, não apresenta qualquer definição mais específica do que deve ser considerado como um “direito disponível”. Da mesma forma, embora o Projeto de Lei nº 4253/2020 destaque que a arbitragem observará o princípio da publicidade, não apresenta qualquer indicativo de que maneira essa publicidade deve se dar na prática. O ponto envolvendo a escolha dos árbitros segue o mesmo caminho. Ainda que o projeto da nova lei de licitações apresente que precisam ser observados critérios “isonômicos”, “técnicos” e “transparentes”, não se tem qualquer explicação adicional do que o Legislador entende por um processo de escolha com essas características[1].
Sem qualquer pretensão de exaurir o tema, mas sim possibilitar discussões sobre o assunto, neste breve texto faz-se um exercício oposto ao usual: pontua-se abaixo não aquilo que a nova Lei de Licitações disse sobre a Arbitragem, mas sim o que ela não disse (mas deveria ter dito).
A Lei nº 14.133/2021 não especificou quais as matérias que se enquadram dentro da categoria de direitos disponíveis. Embora preveja no parágrafo único do seu artigo 151 que “Será aplicado o disposto no caput deste artigo às controvérsias relacionadas a direitos patrimoniais disponíveis, como as questões relacionadas ao restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro do contrato, ao inadimplemento de obrigações contratuais por quaisquer das partes e ao cálculo de indenizações”, chegando a exemplificar algumas matérias passíveis de serem resolvidas pela via arbitral, essa exemplificação é insuficiente. Ao apresentar previsões genéricas, a Lei nº 14.133/2021 perde a chance de, se não colocar fim nelas, pelo menos diminuir em muito as controvérsias que se originam de discussões envolvendo a arbitrabilidade objetiva.
Mais do que isso, não é como se a nova Lei de Licitações surgisse em um cenário em que outras leis ou mesmo administrativistas estudiosos da arbitragem já não tivessem enfrentado o tema e, por sua vez, apresentado listas muito mais robustas com as matérias passíveis de serem arbitradas e que poderiam ser utilizadas como exemplo pela Lei nº 14.133/2021.
Em âmbito normativo, por exemplo, tem-se o Decreto Federal nº 10.025/2019, que no seu artigo 2º estabeleceu que, entre outras, consideram-se controvérsias sobre direitos patrimoniais disponíveis as que envolvam: (i) questões relacionadas à recomposição do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos; (ii) o cálculo de indenizações decorrentes de extinção ou de transferência do contrato de parceria; e (iii) o inadimplemento de obrigações contratuais por quaisquer das partes.
Em âmbito doutrinário, por sua vez, retira-se da obra Curso Prático de arbitragem e administração pública, dos autores Gustavo Justino de Oliveira e Felipe Faiwichow Estefam, outra lista com matérias que seriam passíveis de serem resolvidas por meio da arbitragem. Para os autores, seriam arbitráveis:
- os termos sacramentados no contrato administrativo, pelas cláusulas regulamentares que são aquelas que disciplinam o modo e a forma da prestação do serviço;
- as cláusulas econômico-financeiras e monetárias que são aquelas que tratam da equação econômico-financeira do contrato;
- as hipóteses em que se assegura a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro, pois dizem respeito ao aspecto econômico do contrato;
- as consequências patrimoniais advindas do uso das prerrogativas administrativas determinadas em cláusulas exorbitantes que afetem direitos do particular, especialmente as relacionadas ao dever de indenizar e recompor o equilíbrio econômico-financeiro.[2]
Como se pode observar, tanto o exemplo legislativo do Decreto Federal nº 10.025/2019, como o apresentado pelos autores supramencionados, trazem listas mais robustas, caminho que poderia ter sido adotado pela nova Lei de Licitações e que daria maior segurança jurídica ao instituto. Não foi, porém, o que aconteceu. Nesse ponto, a Lei nº 14.133/21 se omitiu.
Dando sequência à análise daquilo que a nova Lei de Licitações não disse, também se perdeu a oportunidade de procedimentalizar a aplicação do princípio da publicidade dos atos da Administração Pública vinculado ao instituto da arbitragem. Isso porque, há muito, quando se trata do princípio da publicidade no âmbito dos procedimentos arbitrais, a discussão deixou de ser sobre a necessidade da publicidade em arbitragens que envolvam a Administração Pública – é consenso que os processos arbitrais que envolvam ente estatal não podem ser sigilosos -, mas, sim, sobre como essa publicidade pode e deve se perfectibilizar na prática. Também sobre esse aspecto a Lei nº 14.133/21 deixa de se pronunciar.
A nova Lei de Licitações perde a oportunidade de responder uma série de questionamentos, tais como: (i) quais documentos do processo arbitral deverão ser públicos? (ii) quais atos do procedimento arbitral se submeteriam à exigência da publicidade? e, mais importante, (iii) as câmaras arbitrais e os seus regulamentos também devem ser públicos quando envolverem a Administração Pública? Igualmente nesse caso, tanto a doutrina, quanto leis anteriores, incluindo-se, regulamentos de câmaras, já enfrentaram essas discussões e poderiam ter servido de inspiração para a Lei nº 14.133/21.
Gustavo da Rocha Schmidt, em sua obra Arbitragem na Administração Pública traz à tona a discussão sobre aquele a quem compete o dever de publicidade, ou seja, se seria este um dever exclusivamente estatal ou uma previsão a ser seguida também pelos árbitros e entidades responsáveis por gerir o procedimento arbitral[3]. O autor informa que, no começo, o entendimento predominante era que esse dever de publicidade devia recair unicamente sobre o Poder Público, em razão de a câmara arbitral configurar-se como uma mera prestadora de serviços. No entanto, a partir das normativas mais recentes, como a da Lei nº 13.129/15, houve alteração desse cenário[4]. Atualmente, o entendimento é de que o Poder Público, árbitros e câmaras arbitrais devem trabalhar em conjunto para dar efetividade a essa transparência que é exigida em processos arbitrais que envolvam o Poder Público[5].
Atualmente também já se vislumbra o surgimento de previsões em decretos e regulamentos de câmaras que determinam como essas entidades devem se comportar em relação ao dever de publicidade. Em pesquisa realizada pelos já citados autores Gustavo Justino de Oliveira e Felipe Faiwichow Estefam, os pesquisadores levantaram que o Decreto nº 46.245/2018 do estado do Rio de Janeiro, no § 3º do seu artigo 13, estabelece que são públicas “as petições, os laudos periciais e as decisões dos árbitros de qualquer natureza”. Por sua vez, a Lei nº 19.477/2011 do estado de Minas Gerais, que dispõe sobre a adoção do juízo arbitral para a solução de litígio em que o Estado seja parte, determina em seu artigo 6º que a arbitragem deverá ser “instaurada mediante processo público”. Tem-se ainda a previsão do Decreto nº 10.025/2019, que prescreve, no inciso IV do seu artigo 3º, que “as informações sobre o processo de arbitragem serão públicas, ressalvadas aquelas necessárias à preservação de segredo industrial ou comercial e aquelas consideradas sigilosas pela legislação brasileira”.[6] [7] [8]
Perfilhando os mesmos entendimentos acima, vários regulamentos de câmaras arbitrais brasileiras já trazem previsão para a publicidade efetivar-se na prática. A título de exemplo, citam-se os artigos 12.1, 12.2 e 12.3 da Câmara de Mediação e Arbitragem Empresarial – CAMARB; a Resolução nº 3/2018 da Fiesp/Ciesp; e a Resolução Administrativa nº 15/2016 da Câmara de Comércio Brasil-Canadá – CCBC[9].
Como se pode observar, a forma como a publicidade deve se dar nos procedimentos arbitrais envolvendo a Administração Pública ainda exige inúmeras regulamentações. É por essa razão que se destaca que a Lei nº 14.133/2021 falhou ao apresentar previsão tão superficial, e sem especificar a forma pela qual se deve perfectibilizar a publicidade na prática.
Igualmente, nada disse a Lei nº 14.133/21 sobre as Convenções Arbitrais. Temas como a escolha dos árbitros e das Câmaras arbitrais foram ignorados pela nova Lei. Embora todos esses assuntos sejam questões que estão intimamente ligadas à autonomia das partes, em um contexto de arbitragem com entes públicos, e muito em razão do dever de motivação dos atos administrativos, a nova Lei de Licitações perdeu a chance de apresentar, pelo menos, orientações sobre a forma como se deve dar a escolha dos árbitros e das câmaras arbitrais, o que inclusive traria maior segurança jurídica às partes.
Veja que também nesse caso não se trata de temas inéditos. O já citado Decreto Federal nº 10.025/2019 dedica todo o seu capítulo VII a abordar os critérios que devem ser levados em conta pela Administração ao definir a escolha da câmara arbitral[10], e já no capítulo seguinte (capítulo VIII) faz o mesmo quanto à escolha dos árbitros.[11]
A Doutrina também já enfrentou os assuntos acima.
Gustavo da Rocha Schmidt, tendo por base as previsões do Decreto nº 8.546/2015 e da Lei Mineira de Arbitragem, no que se refere à escolha de câmaras arbitrais pelos entes públicos, aborda a possibilidade de indicar parâmetros mínimos que devem ser observados nessa escolha. Lista o autor como critérios mínimos: (i) comprovação de prévia e efetiva experiência na gestão de procedimentos arbitrais; (ii) que a instituição arbitral possua a infraestrutura necessária para a gestão de procedimentos arbitrais, como sala de audiência com tecnologia e salas de apoio para testemunhas e peritos[12]. Por fim, relata como muito bem equilibrada a disciplina contida no artigo 14 do Decreto Estadual nº 46.245/2018 do estado do Rio de Janeiro:
DO CADASTRAMENTO DO ÓRGÃO ARBITRAL INSTITUCIONAL
Art. 14 – O órgão arbitral institucional, nacional ou estrangeiro, deverá ser previamente cadastrado junto ao Estado do Rio de Janeiro e atender aos seguintes requisitos:
I – disponibilidade de representação no Estado do Rio de Janeiro;
II – estar regularmente constituído há, pelo menos, cinco anos;
III – estar em regular funcionamento como instituição arbitral;
IV – ter reconhecida idoneidade, competência e experiência na administração de procedimentos arbitrais, com a comprovação na condução de, no mínimo, quinze arbitragens no ano calendário anterior ao cadastramento.
1º – Caberá à Procuradoria Geral do Estado do Rio de Janeiro cadastrar os órgãos arbitrais institucionais, observados os requisitos previstos neste artigo.
2º – O cadastramento a que se refere o caput não se sujeita a prazo certo e determinado, podendo qualquer órgão arbitral institucional, a qualquer tempo, postular o seu cadastramento perante o Estado do Rio de Janeiro.
3º – Considera-se representação a existência de local apropriado, que funcione como protocolo para recebimento de peças e documentos da arbitragem.
4º – A disponibilidade da representação compreende o oferecimento, sem custo adicional para as partes, dos serviços operacionais necessários para o regular desenvolvimento da arbitragem, tais como local para realização de audiências, e secretariado.
Já Bruno Lopes Mega, ao abordar o assunto da escolha dos árbitros, inclusive comentando as leis existentes sobre o tema, destaca que:
alguns critérios objetivos podem orientar essa escolha, como fazem expressamente, por exemplo, os Estados de Minas Gerais e de Pernambuco, ao exigirem que o árbitro deve ‘deter conhecimento técnico compatível com a natureza do contrato’ (art. 5º, II, da Lei nº 12.477/2011 de Minas Gerais e art. 4º, II da Lei nº 15.627/2015 de Pernambuco) e o Estado de São Paulo, ao exigir que, nas parcerias público-privadas, ‘os árbitros deverão ser escolhidos dentre os vinculados a instituições especializadas na matéria e de reconhecida idoneidade’ (art. 11, parágrafo único, da Lei nº 11.688/2004 do Estado de São Paulo)[13].
Prossegue o autor que, além dos critérios objetivos, deveriam ser incorporados critérios subjetivos, como o da imparcialidade e o da ausência de impedimentos, bem como o dispositivo para limitar a indicação a grupos de árbitros com certas características, como, segundo o exemplo do autor, o de ser professor universitário[14] ou profissional com alguma especialização naquele assunto que será arbitrado.
Como se pode ver, também no que tange à escolha das câmaras arbitrais e dos árbitros, havia muito a ser dito pela nova Lei de Licitações. Esta, contudo, ficou em silêncio.
Existe um ditado popular que diz que “o peixe morre pela boca”. Uma das interpretações desse ditado é que devemos ter cuidado com aquilo que falamos porque podemos acabar engolindo um anzol que nos lançaram. A nova Lei de Licitações, no que tange ao tema da arbitragem, não corre esse risco. Como pouco fala, é muito improvável que acabe engolindo qualquer anzol. O problema é que o silêncio foi tanto, que existe o risco de ela nem mesmo chegar a ser lançada no mar. Aguardemos os próximos capítulos!
[1] PREVE, Murillo. Meios Alternativos de Resolução de Controvérsias. In: Joel de Menezes Niebuhr (org). (Org.). Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 1ª ed. Curitiba: Zênite, 2020, p. 130.
[2] OLIVEIRA, G. J. de; ESTEFAM, F. F. Curso prático de arbitragem e administração pública. São Paulo: Thomson Reuters, 2019, p. 61.
[3] ROCHA SCHMIDT, Gustavo. Arbitragem na Administração Pública. Curitiba, Juruá, 2018, p. 59.
[4] Idem, ibidem, p. 59-60.
[5] Trecho retirado de capítulo escrito por este mesmo autor na obra PREVE, Murillo. Meios Alternativos de Resolução de Controvérsias. In: Joel de Menezes Niebuhr (org). Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 1ª ed. Curitiba: Zênite, 2020, p. 126-139.
[6] Informações retiradas de pesquisa realizada por: OLIVEIRA, G. J. de; ESTEFAM, F. F. Curso prático de arbitragem e administração pública. São Paulo: Thomson Reuters, 2019, p. 61.
[7] Sobre esse tema, ainda apresentam Gustavo Justino de Oliveira e Felipe Faiwichow Estefam que “Para evitar controvérsias acerca do grau de publicidade, é prudente que no início do processo arbitral seja determinado o que será publicado pela Administração, à luz do regime jurídico aplicável. Surgindo conflitos entre as partes quanto a tal tema, ante o princípio da competência-competência (art. 8º, parágrafo único, da LA) e o art. 13 da LA, a controvérsia deve ser resolvida pelo árbitro”. (OLIVEIRA, G. J. de; ESTEFAM, F. F. Curso prático de arbitragem e administração pública. São Paulo: Thomson Reuters, 2019, p. 61).
[8] Trecho extraído de capítulo escrito por este autor na obra PREVE, Murillo. Meios Alternativos de Resolução de Controvérsias. In: Joel de Menezes Niebuhr (org). (Org.). Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 1ª ed. Curitiba: Zênite, 2020, p. 126-139.
[9] Idem.
[10] CAPÍTULO VII
DO CREDENCIAMENTO E DA ESCOLHA DA CÂMARA ARBITRAL
Art. 10. O credenciamento da câmara arbitral será realizado pela Advocacia-Geral da União e dependerá do atendimento aos seguintes requisitos mínimos:
I – estar em funcionamento regular como câmara arbitral há, no mínimo, três anos;
II – ter reconhecidas idoneidade, competência e experiência na condução de procedimentos arbitrais; e
III – possuir regulamento próprio, disponível em língua portuguesa.
- 1º O credenciamento de que trata o caput consiste em cadastro das câmaras arbitrais para eventual indicação futura em convenções de arbitragem e não caracteriza vínculo contratual entre o Poder Público e as câmaras arbitrais credenciadas.
- 2º A Advocacia-Geral da União disciplinará a forma de comprovação dos requisitos estabelecidos no caput e poderá estabelecer outros para o credenciamento das câmaras arbitrais.
Art. 11. A convenção de arbitragem poderá estipular que a indicação da câmara arbitral que administrará o procedimento arbitral será feita pelo contratado, dentre as câmaras credenciadas na forma prevista no art. 10.
- 1º A administração pública federal poderá, no prazo de quinze dias, manifestar objeção à câmara escolhida, hipótese em que a parte que solicitou a instauração da arbitragem indicará outra câmara credenciada, no prazo de quinze dias, contado da data da comunicação da objeção.
- 2º A indicação da câmara arbitral escolhida e a sua eventual objeção serão feitas por correspondência dirigida à outra parte, ainda que a cláusula compromissória estabeleça que esta escolha será promovida logo após a celebração do contrato de parceria.
- 3º A câmara arbitral indicada poderá ser substituída antes do início da arbitragem, desde que com a anuência de ambas as partes, independentemente da celebração de termo aditivo ao contrato de parceria.
[11] CAPÍTULO VIII
DA ESCOLHA DOS ÁRBITROS
Art. 12. Os árbitros serão escolhidos nos termos estabelecidos na convenção de arbitragem, observados os seguintes requisitos mínimos:
I – estar no gozo de plena capacidade civil;
II – deter conhecimento compatível com a natureza do litígio; e
III – não ter, com as partes ou com o litígio que lhe for submetido, relações que caracterizem as hipóteses de impedimento ou suspeição de juízes, conforme previsto na Lei nº 13.105, de 2015 – Código de Processo Civil, ou outras situações de conflito de interesses previstas em lei ou reconhecidas em diretrizes internacionalmente aceitas ou nas regras da instituição arbitral escolhida.
Parágrafo único. O ingresso no País de árbitros e equipes de apoio residentes no exterior, exclusivamente para participação em audiências de procedimentos arbitrais com sede no País, é hipótese de visita de negócios, nos termos do disposto no § 3º do art. 29 do Decreto nº 9.199, de 20 de novembro de 2017, respeitados os prazos de estada e as demais condições da legislação de imigração aplicável.
[12]ROCHA SCHMIDT, Gustavo. Arbitragem na Administração Pública. Curitiba, Juruá, 2018, p. 70-72.
[13] MEGAN, Bruno Lopes. Arbitragem e Administração Pública. Fundamentos Teóricos e Soluções Práticas. Belo Horizonte: Fórum, 2019, p. 220.
[14] Idem.
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No último final de semana o Advogado Murillo Preve atuou como árbitro na VI CAEMP (Competição de Arbitragem Empresarial). Murillo arbitrou os times da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, PUC-RS e Universidade Federal Fluminense.
A CAEMP é uma competição realizada pela Escola de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul e é uma simulação de corte arbitral nos moldes da prática internacional de moot court, na qual as equipes inscritas devem apresentar, escrita e oralmente, defesas para os requerimentos de ambas as partes diante de um caso hipotético, disponibilizado pela Comissão Organizadora.
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Organizado exclusivamente pelos estudantes do curso de Direito da UFSC, o evento foi realizado na semana passada e reuniu, este ano de maneira online, milhares de participantes e os principais juristas do país, sendo reconhecido nacionalmente como o maior congresso gratuito de Direito do Brasil.
As aulas integraram o curso "O que muda com a Nova Lei de Licitações", da Zênite Informação, em que foram abordadas diversas questões práticas sobre a esperada Nova Lei de Licitações.
Nesta terça-feira (2/3/2021), o advogado Gustavo Schiefler abordou diversas questões práticas sobre a esperada Nova Lei de Licitações, cujo Projeto de Lei está em vias de ser encaminhado para a sanção do Presidente da República.
As aulas integraram o curso “O que muda com a Nova Lei de Licitações”, da Zênite Informação. Em dois turnos, Gustavo Schiefler apresentou, a aproximadamente 600 participantes, as principais diferenças existentes nas etapas da licitação, incluindo questões sobre as modalidades, o Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP), a publicidade do edital, os prazos mínimos, os critérios de julgamento e os modos de disputa da projetada Nova Lei de Licitações.
Read MoreO entendimento majoritário dos Tribunais é de que o professor universitário, casado com servidor público federal que foi deslocado no interesse da Administração, pode ser removido para outra instituição de ensino, pois o cargo de professor universitário pertence a um quadro único vinculado ao MEC.
Eduardo Schiefler[1]
O deslocamento de servidores públicos pelo território brasileiro é uma prática administrativa bastante comum. Por conta das necessidades da Administração Pública, que variam em grau e gênero, os gestores públicos costumam lançar mão de deslocamentos de ofício (ex officio) para satisfazer o interesse público. É o caso do deslocamento no interesse da Administração.
Diante dessa realidade, cuja intensidade pode ter relação com a gradual escassez de novos concursos públicos, surge uma questão de extrema relevância: se o servidor deslocado possuir um cônjuge/companheiro também servidor público, surge a ele o direito de ser removido para fins de acompanhamento? A resposta é positiva[2], independentemente do interesse da Administração e, inclusive, nas hipóteses em que não há coabitação prévia entre os cônjuges servidores.
Trata-se de previsão específica do artigo 36, parágrafo único, inciso III, alínea “a”, do Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União (Lei Federal nº 8.112/1990), segundo a qual o servidor poderá ser removido, a pedido e independentemente do interesse da Administração, “para acompanhar cônjuge ou companheiro, também servidor público civil ou militar, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, que foi deslocado no interesse da Administração”[3].
Acontece que o instituto da remoção ganha novos contornos quando se está diante de Professores de uma Instituição Federal de Ensino. Isto é, professores de Universidades Federais ou de Institutos Federais, que possuem personalidade e autonomia jurídica próprias e que estão distribuídos por todas as regiões do País.
Este detalhe é importante e recebeu a atenção de quem vos escreve em razão de uma peculiaridade contida na Lei Federal nº 8.112/1990, que comumente é questionada nas ações judiciais que pleiteiam a remoção do professor universitário para outra instituição de ensino. Isto porque no artigo 36 da norma, que regulamenta os requisitos do instituto da remoção de servidor público, existe a previsão de que essa espécie de deslocamento (remoção) somente ocorrerá no âmbito do mesmo quadro, com ou sem mudança de sede.
Em uma primeira análise, seria possível cogitar que a norma impediria a remoção de professores entre Universidades Federais distintas, uma vez que, à primeira vista, pode-se pensar que cada instituição possui um quadro de pessoal próprio e que o ingresso em um deles exige a aprovação em concurso público. Contudo, esta não é a interpretação adotada por parcela majoritária dos Tribunais brasileiros.
Explica-se.
Sem dúvidas, a interpretação de que a remoção de professores seria vedada no âmbito das universidades federais impactaria sobremaneira a finalidade do instituto da remoção para acompanhamento de cônjuge/companheiro, previsto no artigo 36 justamente para fazer frente à discricionariedade (legítima, diga-se de passagem) da Administração Pública em deslocar os seus servidores para assegurar o interesse público.
Imagine-se a situação de um casal de servidores públicos em que um dos cônjuges é deslocado (por redistribuição ou remoção ex officio) para outro ponto do território nacional. Em tese, não haveria dúvidas sobre o surgimento ao outro cônjuge do direito de acompanhar. Contudo, se o cônjuge do servidor deslocado for professor universitário, a depender do local para o qual houve o deslocamento, o professor estaria impossibilitado de acompanhá-lo se se aplicasse o entendimento de que cada instituição federal de ensino possui um quadro de pessoal próprio.
Em atenção a essa peculiaridade, a jurisprudência pátria se consolidou no sentido de que “O cargo de professora de Universidade Federal pode e deve ser interpretado, ainda que unicamente para fins de aplicação do art. 36, § 2º, da Lei 8.112/1990, como pertencente a um quadro de professores federais, vinculado ao Ministério da Educação”[4].
O entendimento majoritário dos Tribunais brasileiros, entre eles o Superior Tribunal de Justiça (STJ), responsável pela uniformização da intepretação das leis federais, é de que o professor universitário, casado com servidor público federal que foi deslocado no interesse da Administração, pode ser removido para outra instituição de ensino, pois o cargo de professor universitário pertence a um quadro único de professores federais, vinculado ao Ministério da Educação (MEC), ainda que para fins exclusivamente do instituto da remoção, cf. artigo 36 da Lei nº 8.112/1990.
Nesse sentido, para que um professor universitário seja removido para acompanhar cônjuge, é preciso preencher os seguintes requisitos: (1) existência de um vínculo matrimonial, ou equivalente, (2) ambos os cônjuges/companheiros devem ser servidores públicos e (3) o deslocamento do cônjuge deve ter sido realizado no interesse da Administração. Atendidas estas exigências legais, é plenamente possível que um professor de instituição federal de ensino seja removido para outra, eis que a interpretação mais aceita nos Tribunais é a de que esse cargo pertence a um quadro único de professores federais vinculado ao MEC.
Ocorre que esse entendimento não é compartilhado pelas instituições de ensino, as quais não estão, é verdade, vinculadas à jurisprudência do Poder Judiciário, uma vez que, regra geral, a esfera administrativa é autônoma da judicial. Além disso, o próprio Ministério da Educação possui normativas internas que vedam a remoção de professores entre universidades distintas. Invariavelmente, esta discussão acaba sendo levada aos montes para o Poder Judiciário, que passa a ter a palavra final do caso concreto.
Recentemente, no fim do mês de junho de 2020, o Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) deu provimento a um recurso interposto e reconheceu expressamente a possibilidade de remover professor entre universidades distintas, pois a interpretação mais correta é a de que o cargo pertence a um mesmo quadro vinculado ao Ministério da Educação. Confira-se a ementa do julgado, no qual tive a honra de participar como advogado da causa:
ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. SERVIDOR PÚBLICO. REMOÇÃO PARA ACOMPANHAMENTO DE CÔNJUGE. DEFERIMENTO DA TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA REQUERIDA. PRESENÇA DOS REQUISITOS. RECURSO PROVIDO. […]
3. No caso dos autos, há fumus boni iuris, porquanto o cargo de professor de Universidade Federal pode e deve ser interpretado como pertencente a um mesmo quadro de professores federais, vinculado ao Ministério da Educação, ainda que unicamente para fins de aplicação do artigo 36 da Lei n. 8.112/90. Precedentes.
4. O risco de dano também se faz presente, na medida em que a decisão inicial de concessão da tutela de urgência foi reconsiderada quase um ano após a agravante ser lotada em cargo efetivo de professor no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Brasília, como consequência da remoção autorizada.
5. Presentes os requisitos ensejadores da concessão da tutela provisória de urgência, no caso. Precedente.
6. Agravo de instrumento provido.[5]
Assim, a partir do entendimento de que professores de instituições federais de ensino distintas pertencem a um quadro único de professores federais, vinculado ao MEC, torna-se pleno o atendimento do requisito, previsto no artigo 36 da Lei nº 8.112/1990, de que a remoção só pode ocorrer no âmbito do mesmo quadro. Entretanto, como visto, é incomum a aplicação voluntária deste entendimento pela Administração Pública, sendo necessária, muitas vezes, a propositura de ação judicial para concretizar o direito de ser removido para acompanhar cônjuge.
[1] Eduardo Schiefler – Advogado no escritório Schiefler Advocacia. Mestrando em Direito pela Universidade de Brasília (UnB). Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Integrante do Grupo de Estudos em Direito Público (GEDIP/UFSC). Integrante do Grupo de Pesquisa em Direito, Racionalidade e Inteligência Artificial (DRIA.UnB). Autor do livro “Processo Administrativo Eletrônico” (2019) e de artigos acadêmicos, especialmente na área de Direito Administrativo e Tecnologia.
[2] Para além do direito de ser removido para acompanhar cônjuge, o deslocamento também gera o direito de obter licença por motivo de afastamento de cônjuge, previsto no artigo 84 da Lei Federal nº 8.112/1990. Cf. Servidor Público cujo cônjuge foi deslocado possui direito à licença (https://schiefler.adv.br/servidor-publico-cujo-conjuge-foi-deslocado-possui-direito-a-licenca/).
[3] Art. 36. Remoção é o deslocamento do servidor, a pedido ou de ofício, no âmbito do mesmo quadro, com ou sem mudança de sede.
Parágrafo único. Para fins do disposto neste artigo, entende-se por modalidades de remoção: […]
III – a pedido, para outra localidade, independentemente do interesse da Administração:
a) para acompanhar cônjuge ou companheiro, também servidor público civil ou militar, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, que foi deslocado no interesse da Administração;
[4] STJ, REsp 1833604/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/10/2019.
[5] TRF-3, AI 5031708-94.2019.4.03.0000. Relator Desembargador Federal Hélio Nogueira. Publicado em 30/06/2020.
Read MoreSe for tornada sem efeito a nomeação de candidato mais bem classificado e dentro do número de vagas, os candidatos subsequentes deverão ser nomeados, pois a sua mera expectativa se convolará em direito subjetivo à nomeação.
Giovanna Gamba[1]
Eduarda Militz[2]
Os concursos públicos, como se sabe, são regidos por Edital próprio que estabelece todas as regras e condições para o acontecimento do certame. As fases do concurso, os critérios de avaliação, o conteúdo das questões e o número de vagas ofertadas são alguns dos dispositivos previstos nesse documento.
Nesse sentido, os candidatos, quando aprovados no concurso público, podem se classificar dentro das vagas previstas para provimento imediato e, também, nas vagas para cadastro de reserva. Aqueles que se classificarem dentro do número de vagas terão direito subjetivo à nomeação e serão, em regra, nomeados pela Administração Pública até o fim do prazo de validade do certame. Já aqueles classificados fora do número de vagas, ou seja, em cadastro de reserva, terão mera expectativa de direito.
Eventualmente, e por razões diversas, alguns candidatos aprovados dentro do número de vagas e efetivamente nomeados têm sua posse não perfectibilizada, seja por opção dos próprios candidatos (desistência), seja por decisão administrativa, como o não preenchimento dos requisitos do edital. Nesses casos, a nomeação é tornada sem efeito e a vaga deve ser preenchida pelos candidatos aprovados nas classificações seguintes.
Se o candidato subsequente àquele que teve a nomeação tornada sem efeito estava, inicialmente, classificado fora do número de vagas previsto, a mera expectativa de direito se convola em direito subjetivo à nomeação, dada a necessidade inequívoca da Administração de preencher a vaga em aberto, necessidade esta manifestada pela convocação do candidato que acabou não sendo nomeado.
Ou seja, na hipótese de desistência (ou qualquer outro motivo que torne sem efeito a nomeação) de candidatos mais bem classificados e dentro do número de vagas em concurso público, os próximos candidatos da lista classificatória têm direito subjetivo à nomeação.
Este entendimento é predominante na jurisprudência pátria. Em caso julgado pelo Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF-3) houve, inclusive, a desistência de mais de um candidato, e ainda assim, sucessivamente, houve preenchimento das vagas subsequentes. Veja:
No caso dos autos, essa é a hipótese. Os documentos dos autos demonstram que a parte autora concorreu ao cargo de técnico de suporte administrativo para a região de Ribeirão Preto – SP, para o qual foi disponibilizada uma vaga, conforme edital (fl. 40 da inicial). Nesse certame, o autor foi aprovado em quinto lugar, tendo os quatro candidatos anteriores renunciado ao cargo. Nesse sentido, malgrado a renúncia do quarto colocado ter sido feita poucos dias antes da expiração do concurso, a requerida não justifica o fato de ter demorado tanto para iniciar os procedimentos de convocação e posse. Essa circunstância, pois, enquadra-se na mesma situação dos precedentes acima mencionados, pois “devidamente comprovado que os recorrentes foram aprovados dentro do número de vagas existentes no edital do concurso e que, expirado o prazo de validade do certame, não foram nomeados, nem houve, por parte da Administração, a declinação de motivos supervenientes de excepcional circunstância para não fazê-lo, impõe-se o acolhimento da pretensão recursal” (RMS 26.013/MS).[3]
Isso ocorre porque, uma vez que o edital do concurso público é lançado, com a previsão de um número determinado de vagas, cria-se uma expectativa legítima para com os candidatos de que haverá número de posses em conformidade com o número de vagas já previamente estabelecido. Além disso, há presunção de que todos os custos para realização de certame são justificados com o provimento de novos cargos em conformidade com a necessidade manifestada pela Administração, de modo que os cargos de provimento efetivo, previstos no edital do concurso, deverão ser preenchidos durante o prazo de vigência do certame, havendo candidatos aprovados. É o que esclarece o Supremo Tribunal Federal (STF) no julgado abaixo:
ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. DESISTÊNCIA DE CANDIDATO CONVOCADO PARA PREENCHIMENTO DE VAGA PREVISTA NO EDITAL. DIREITO SUBJETIVO DO CANDIDATO CLASSIFICADO IMEDIATAMENTE APÓS. EXISTÊNCIA. DEMONSTRAÇÃO DA NECESSIDADE E DO INTERESSE DA ADMINISTRAÇÃO.
1. A desistência de candidatos aprovados dentro do número de vagas previsto no edital do certame resulta em direito do próximo classificado à convocação para a posse ou para a próxima fase do concurso, conforme o caso.
2. É que a necessidade e o interesse da administração no preenchimento dos cargos ofertados está estabelecida no edital de abertura do concurso e a convocação do candidato que, logo após desiste, comprova a necessidade de convocação do próximo candidato na ordem de classificação. A repeito: RE 643674 AgR, Relator Min. Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, DJe-168; ARE 675202 AgR, Relator Min. Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, DJe-164. 3. Agravo regimental não provido.[4]
Nesse sentido, destaca-se no posicionamento dos Tribunais tanto a defesa da expectativa dos candidatos criada pelo Edital do concurso, no sentido da obrigatoriedade, em regra, do preenchimento das vagas previstas pela Administração, quanto a defesa do interesse da própria Administração Pública de fazer valer os gastos com o lançamento e gerenciamento do certame, de modo a satisfazer a necessidade identificada pelo órgão quando do planejamento do concurso público.
Assim, o candidato que se encontra nessa situação (qual seja, de aprovado fora do número de vagas, mas que, com as nomeações de candidatos mais bem classificados não perfectibilizadas, passou a figurar dentro das vagas previstas no edital), poderá pleitear a sua nomeação por meio de uma ação judicial – ou até mesmo por um requerimento administrativo apresentado diretamente ao órgão/entidade administrativa.
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[1] Giovanna Gamba – Advogada no escritório Schiefler Advocacia. Mestranda em direito do estado na USP, bolsista da University Studies Abroad Consortium para intercâmbio na Universidade de Nevada, Estados Unidos, e monitora do programa FGV Law.
[2] Eduarda Militz – Estagiária no escritório Schiefler Advocacia. Graduanda, atualmente na quarta fase, do curso de Direito da Universidade Federal de Santa Catarina. Foi assessora e gerente na Empresa Júnior de Direito Locus Iuris.
[3] TRF-3 – RI: 00031961320154036311 SP, Relator: JUIZ(A) FEDERAL ANGELA CRISTINA MONTEIRO, Data de Julgamento: 07/02/2019, 4ª TURMA RECURSAL DE SÃO PAULO, Data de Publicação: e-DJF3 Judicial DATA: 14/02/2019
[4] STJ, AgRg no RMS 48.266/TO, Rel. Ministro BENEDITO GONÇALVES, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/08/2015
Read MoreGiovanna realizará seus estudos na área de Direito do Estado, subárea Teoria do Estado, tratando do tema de políticas públicas e corrupção.
A advogada Giovanna Gamba foi aprovada e ingressou, no segundo semestre de 2019, no mestrado do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade de São Paulo (USP), sob orientação da Prof. Dra. Maria Paula Dallari Bucci, autora de diversas obras na área de Direito e Políticas Públicas.
Giovanna realizará seus estudos na área de Direito do Estado, subárea Teoria do Estado, tratando do tema de políticas públicas e corrupção.
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