O Registro de Preços na Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos
No mercado de contratações públicas, uma prática muito comum é a celebração ou a adesão a uma ata de registro de preços. Por meio deste documento, a Administração Pública e um potencial fornecedor ou prestador de serviços formalizam um compromisso de contratação futura. O conjunto de procedimentos que antecede este compromisso de contratação futura é chamado de sistema de registro de preços.
Para compreender o funcionamento deste modelo, imagine-se que a Administração Pública precise contratar determinado bem ou serviço, mas que não consiga estimar, com precisão, quando efetivamente precisará deste bem ou serviço e em qual quantidade. É justamente neste contexto que se faz oportuno o registro de preços, como uma forma de garantir que, quando a demanda surgir, a Administração Pública possa ser imediatamente atendida na medida das suas necessidades.
A título de exemplo, considere-se que o Poder Público tem o dever de fornecer determinado medicamento à população, mas que a sua demanda varia, de modo que, comprando em excesso, corre-se o risco de que decorra o prazo de validade antes a distribuição desses medicamentos, enquanto, se comprar em quantidade insuficiente, tem-se o risco de não atender à demanda. No caso, o que pode fazer o Poder Público é celebrar uma ata de registro de preços, na qual bastará estimar a quantidade máxima da sua demanda, e o particular se vinculará à obrigação de fornecer o medicamento até essa quantidade máxima durante o período de vigência deste compromisso.
Diante dessa situação, vemos a importância do registro de preços para a Administração Pública brasileira. Não por outro motivo, ao tratar do tema, a Lei nº 14.133/2021 – a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos – trouxe uma série de novidades, buscando potencializar as vantagens do registro de preços. Neste artigo, abordaremos os principais pontos do registro de preços na Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos.
A possibilidade de estabelecer preços diferentes para o mesmo bem ou serviço
Um primeiro ponto relevante sobre a regulamentação do registro de preços é a possibilidade de que o potencial fornecedor ou prestador de serviço estabeleça preços distintos para o mesmo bem ou serviço. Essa possibilidade é delimitada pela Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos para situações específicas, previstas no art. 82, III. São elas:
- Quando o objeto contratado for entregue em locais diferentes;
- Em razão da forma e do local de acondicionamento;
- Em razão do tamanho do lote;
- Por outros motivos justificados no processo.
Em todas essas situações, é natural que o potencial fornecedor ou prestador de serviço tenha um incremento em seus custos para atender a Administração Pública. Reconhecendo essa situação, a Nova Lei de Licitações permitiu expressamente o oferecimento de preços distintos. Todavia, sendo o caso, é recomendável que o edital referente à contratação preveja expressamente tal possibilidade, e que o potencial fornecedor ou prestador de serviço justifique a variação dos preços no processo de contratação.
Possibilidade de proposta em quantitativo inferior ao máximo previsto no edital
Outro ponto da regulamentação do registro de preços na Nova Lei de Licitações que também se relaciona com as propostas oferecidas pelos potenciais fornecedores ou prestadores de serviços diz respeito à possibilidade de que o proponente se vincule a um quantitativo inferior ao máximo previsto no edital.
Sobre isso, é importante compreender que, no sistema de registro de preços, o quantitativo previsto no edital e na própria ata de registro de preços é apenas um limite máximo, e não vincula a Administração Pública, que poderá contratar somente na medida do que for necessário para atender a sua demanda durante o prazo de vigência do compromisso celebrado.
Todavia, nem sempre o fornecedor ou prestador de serviço que pode oferecer os melhores preços tem capacidade para se comprometer com o quantitativo máximo definido em edital. Diante disso, a Nova Lei de Licitações admitiu expressamente a possibilidade de que sejam oferecidas propostas em quantidade inferior àquela prevista no edital. Contudo, sendo o caso, recomenda-se que isso somente seja feito se expressamente autorizado no próprio edital.
O sistema de registro de preços para obras e serviços de engenharia
A Nova Lei de Licitações também trouxe uma importante novidade ao permitir, expressamente, a utilização do sistema de registro de preços para contratações envolvendo obras e serviços de engenharia. Essa possibilidade é abordada nos arts. 82, § 2º, e 85 desta Lei, que estabelece as seguintes condições:
Realização prévia de pesquisa de mercado;
- Seleção de acordo com os procedimentos previstos em regulamento;
- Desenvolvimento de rotina de controle;
- Atualização periódica dos preços registrados;
- Definição do período de validade do registro de preços;
- Inclusão, em ata, do licitante que aceitar cotar preços iguais aos do licitante vencedor na sequência de classificação e inclusão do licitante que mantiver sua proposta original;
- Existência de projeto padronizado, sem complexidade técnica e operacional;
- Necessidade permanente ou frequente de obra ou do serviço contratado.
O sistema de registro de preços nas hipóteses de contratação direta
A Nova Lei de Licitações também inovou na regulamentação do regime do sistema de registro de preços ao permitir a utilização desta modelagem para contratações diretas, isto é, por inexigibilidade ou dispensa de licitação. Essa permissão consta tanto no art. 6º, XLVI e XLVII, quanto no artigo 82, § 6º, desta Lei.
Nesse sentido, em que pese a Lei nº 8.666/1993 não vedasse expressamente a aplicação do sistema de registro de preços para contratações diretas, ela também não autorizava essa prática, havendo, portanto, uma omissão legislativa. Ao regulamentar o tema em âmbito federal, o Decreto nº 7.892/2013 manteve a lacuna legislativa.
Por isso é que, neste contexto, a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos inova ao autorizar expressamente a possibilidade de usar o sistema de registro de preços nas hipóteses de dispensa ou inexigibilidade de licitação.
O aumento do prazo máximo de vigência das atas de registro de preços
Quanto ao prazo de vigência das atas de registro de preços, a Nova Lei de Licitações previu que esse prazo é de um ano, mas que é possível a sua prorrogação por mais um ano, desde que comprovada a vantajosidade do preço registrados. Sendo assim, passa a ser possível a extensão do prazo de validade de ata de registro de preços pelo período de até dois anos.
Vale sempre notar, todavia, que a vigência da ata de registro de preços não se confunde com a vigência dos contratos celebrados a partir dela, que podem durar para além do prazo de validade da ata.
Obrigatoriedade da contratação
Outro ponto relevante sobre a regulamentação do registro de preços na Nova Lei de Licitações diz respeito à vinculação da Administração Pública à contratação por meio da ata de registro de preços. Isso porque, conforme o art. 83 desta Lei, a Administração não estará obrigada a contratar o bem ou serviço constante em ata de registro de preços daquele fornecedor ou prestador de serviço, podendo realizar licitação específica para tanto, desde que justifique essa escolha.
A possibilidade e os limites para a adesão ou “carona” no Sistema de Registro de Preços
A possibilidade de adesão ou “carona” no sistema de registro de preços também foi alvo de regulamentação pela Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, que tratou do tema no art. 86, § 2º. A regulamentação impõe as seguintes condições para a adesão de órgãos ou entidades administrativas não participantes da ata de registro de preços:
- Apresentação de justificativa da vantagem da adesão;
- Demonstração de que os valores registrados estão compatíveis com aqueles praticados no mercado;
- Prévias consulta e aceitação do órgão ou entidade gerenciadora da ata e do fornecedor ou prestador de serviços.
Nessa linha, também é importante compreender os limites para a adesão em ata de registro de preços. No caso, esses limites se baseiam no quantitativo máximo registrado na ata em que ocorrerá a adesão. Um desses limites diz respeito à quantidade máxima de cada item registrado em ata que poderá ser adquirido pelo órgão ou entidade aderente, que não poderá superar a metade do quantitativo máximo registrado em ata. Além disso, no total, somando-se todas as adesões, não se poderá adquirir mais do que o dobro do quantitativo máximo registrado em ata.
Para ilustrar, imagine-se que um órgão celebrou uma ata de registro de preços para adquirir 100 unidades de determinado bem. Por óbvio, este órgão gerenciador da ata não poderá superar o quantitativo máximo nela previsto. Quanto aos órgãos ou entidades que tenham interesse em aderir a esta ata, eles poderão fazer, cada qual, até o limite de 50 unidades. Ao todo, os órgãos ou entidades aderentes não poderão superar o limite de 200 unidades. Supondo-se que cada aderente adquirisse 10 unidades, seria possível realizar até 20 adesões a partir da mesma ata, observadas as demais condições legais.
Considerações finais
Como visto, a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos traz uma série de novidades importantes para o sistema de registro de preços. Além dos pontos apresentados neste artigo, vale mencionar, também, a previsão dos critérios de julgamento da licitação, que deverão ser de menor preço ou maior desconto sobre tabela, e a possibilidade de alteração de preços registrados em ata, e de licitação por registro de preços sem prévia estimativa do quantitativo máximo, hipótese em que deverá ser previsto o valor máximo a ser despendido em contratações.
Diante de um cenário repleto de inovações legislativas, é importante que o fornecedor ou prestador de serviços que costuma participar de atas de registro de preços esteja atento e ciente das novidades, sejam aquelas trazidas na Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, ou mesmo na regulamentação específica do tema por cada órgão ou entidade administrativa, a fim de que possa aperfeiçoar suas práticas comerciais, garantindo mais segurança e eficiência.
Read MoreCartel em licitação pública: quais as penalidades?
Alguma vez você, licitante, já se sentiu prejudicado ou até mesmo “perseguido” por um determinado grupo em algum certame público? Por mais que isso possa ser um desdobramento natural do caráter competitivo das licitações públicas, é sempre recomendável analisar todas as evidências à disposição para se certificar que você não tenha sido vítima de um cartel.
Os cartéis são acordos entre concorrentes para combinar o aumento de preços, a divisão de mercado, a exclusão de licitantes do certame ou outras práticas pré-acordadas com o objetivo de frustrar o caráter competitivo de uma licitação pública. Segundo estimativas da OCDE, os cartéis geram um sobrepreço estimado entre 10% e 20%, em comparação com os preços de um mercado competitivo, razão pela qual são uma das práticas mais danosas contra a sociedade no âmbito das contratações públicas.
Em uma licitação, os concorrentes devem atuar de forma independente e empreender esforços individuais para ofertar a melhor proposta possível para a administração pública. Tanto é verdade que a Nova Lei de Licitações incluiu em seu artigo 5º o princípio da competitividade, que visa assegurar a justa competição entre os concorrentes.
Em razão da gravidade da prática, os cartéis são proibidos por diversas leis e esferas diferentes. Abaixo serão apresentadas as possíveis penalidades aplicadas contra licitantes punidos pelo crime de cartel em licitação pública.
Penalidades administrativas
A nova lei de licitações (Lei 14.133/2021) prevê expressamente a responsabilização administrativa de licitantes que adotem a prática de “atos ilícitos com vistas a frustrar os objetivos da licitação” (artigo 155, inciso XI). Nestes casos, a depender da gravidade da situação e das peculiaridades do caso concreto (artigo 156), poderão ser aplicadas as seguintes penalidades administrativas:
- advertência;
- multa;
- impedimento de licitar e contratar;
- declaração de inidoneidade para licitar ou contratar.
Estas penalidades administrativas são aplicadas diretamente pelo órgão contratante da licitação pública afetada, a partir da instauração de processo administrativo contra o(s) licitante(s) responsabilizado(s).
Adicionalmente, a repressão aos cartéis em licitação também está prevista na Lei 12.529/2011, que estrutura o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência. Este diploma legal (artigo 36, §3º, inciso I, alínea ‘a’) prevê expressamente a vedação à prática de “acordar, combinar, manipular ou ajustar com concorrente, sob qualquer forma, preços, condições, vantagens ou abstenção em licitação pública”. Nestes casos, a responsabilização é levada a cabo pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), autoridade responsável pela defesa da ordem econômica e concorrencial.
Nos casos processados pelo tribunal administrativo do CADE, as penalidades podem ser, conforme artigo 38 da Lei 12.529/2011, as seguintes:
- À empresa: multa de 0,1% a 20% do valor do faturamento bruto da empresa, grupo ou conglomerado, no último exercício anterior à instauração do processo administrativo, no ramo de atividade empresarial em que ocorreu a infração.
- Aos administradores da empresa: se direta ou indiretamente envolvidos com o ilícito podem ser condenados a pagar uma multa entre 1% a 20% daquela aplicada à empresa.
- Outras penas acessórias: a publicação em meia página, às expensas do infrator, em jornal indicado na decisão, de extrato da decisão condenatória por prazo indeterminado em lei; a proibição de contratar com instituições financeiras oficiais e participação em licitação da administração pública por prazo não inferior a 5 anos; inscrição no Cadastro Nacional de Defesa do Consumidor; a proibição de exercer o comércio em nome próprio ou como representante de pessoa jurídica pelo prazo de até 5 anos, entre outros
Os critérios para a penalização de cartelistas pelo CADE leva em conta os critérios dispostos no artigo 45 da Lei 12.529/2011. Entre eles, cita-se a avaliação da gravidade, da boa-fé do infrator e da vantagem auferida pela prática anticoncorrencial.
Penalidades criminais
Além da responsabilização administrativa demonstrada acima, a prática de cartel pode ser configurada como crime, conforme previsão do código penal brasileiro. O crime de cartel já era previsto genericamente no art. 4º da lei 8.137/90, que define crimes contra a ordem econômica. No âmbito das licitações públicas, a Lei 8.666/93 previa em seu artigo 90 o crime de frustrar ou fraudar o caráter competitivo das licitações públicas, com pena de 2 a 4 anos, além de multa.
No entanto, a Nova Lei de Licitações fez alteração no código penal para incluir previsão expressa do crime de fraude à licitação, agora inserido no artigo 337-F do Código Penal, com a seguinte redação:
Art. 337-E. Admitir, possibilitar ou dar causa à contratação direta fora das hipóteses previstas em lei:
Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.
Assim, os administradores responsáveis pelas empresas condenadas pela prática de cartel também podem ser responsabilizados criminalmente, a partir da investigação e atuação do Ministério Público e da Polícia Civil.
Penalidades cíveis
Por fim, ainda é possível a responsabilização cível pela prática anticoncorrencial. Nestes casos, de acordo com o artigo 47 da Lei 12.529/2011, os prejudicados, por si ou pelos legitimados referidos no artigo 82 da Lei 8.078, de 11 de setembro de 1990, poderão ingressar em juízo para, em defesa de seus interesses individuais ou individuais homogêneos, obter a cessação de práticas que constituam infração à ordem econômica, bem como o recebimento de indenização por perdas e danos sofridos. Tal ação independe da abertura ou resultado de processo administrativo por parte do Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência – SBDC, que não será suspenso em virtude do ajuizamento de ação.
Como se vê, a prática de cartelização é uma das infrações mais graves no âmbito das licitações públicas, e pode ser penalizada de formas diferentes e cumulativas. Para evitar prejuízos e prevenir o ilícito, uma das melhores práticas é a elaboração de um Programa de Integridade para a empresa licitante, com o objetivo de assegurar as melhores práticas profissionais para a empresa e a prevenção de ilícitos administrativos e criminais.
Em caso de dúvida sobre como agir frente a uma situação de violações concorrenciais em licitações públicas, não deixe de consultar um advogado especializado no tema para uma assessoria jurídica experiente e qualificada!
Read MoreRESUMO: Principais novidades da Nova Lei de Licitações
Nos textos anteriores desta série sobre a Concorrência Pública, tratamos das etapas dessa modalidade no âmbito da Nova Lei de Licitações (Lei nº 14.133/2021) e, também, das novidades que devem ser levadas em consideração por quem estuda a matéria ou quer participar de licitações.
Dessa forma, com o intuito de facilitar a compreensão sobre o que a Nova Lei de Licitações trouxe para a modalidade Concorrência, resumimos a seguir as principais novidades que não podem ser ignoradas:
1) A alteração do processo de definição da modalidade licitatória, de sorte que a seleção da modalidade Concorrência passa a ter mais foco maior nas características do objeto licitado e menos nos critérios exclusivamente financeiros (como era na Lei nº 8.666/1993).
2) No âmbito da Nova Lei de Licitações, a Concorrência não é mais modalidade obrigatória para as hipóteses de aquisição e alienação de bens imóveis, concessão de direito real de uso e licitações internacionais.
3) A alienação de bens imóveis pela Administração Pública, inclusive os pertencentes às autarquias e às fundações, não dependerá mais de Concorrência, mas da existência de interesse público devidamente justificado, de autorização legislativa e de licitação apenas na modalidade Leilão.
4) A Nova Lei de Licitações, ao tratar da licitação internacional, não faz menção à modalidade de licitação exigida, diferentemente da Lei nº 8.666/1993. O que há é a determinação de que o edital esteja ajustado às diretrizes da política monetária e do comércio exterior, bem como adequado às exigências dos órgãos competentes.
5) Os critérios de julgamento “maior retorno econômico” e “maior desconto” podem ser adotados na Concorrência regida pela Nova Lei de Licitações, sendo que o “maior retorno econômico” será utilizado exclusivamente nas hipóteses em que se pretende contratar por meio de “contrato de eficiência”.
6) A Nova Lei de Licitações equiparou o rito procedimental da Concorrência e do Pregão, que no campo da Lei nº 8.666/1993 eram vistos como antagônicos. Tanto a Concorrência como o Pregão seguirão o rito procedimental comum previsto, que consolida a até então chamada “inversão de fases” como padrão nas licitações, de modo que a fase de habilitação ocorrerá, via de regra, depois do julgamento das propostas.
7) Independentemente da sequência de fases adotada (seja a regra geral, seja a “nova” inversão de fase, com a habilitação antes do julgamento), a Nova Lei de Licitações adota a fase recursal una. Isto é, não haverá mais a possibilidade de interpor recursos ao final de cada fase, como é o padrão da Lei nº 8.666/1993.
8) Além da fase recursal una, existem duas outras novidades no que toca à fase recursal: o novo prazo para recurso é de 3 (três) dias úteis (em comparação com os cinco dias úteis da Lei nº 8.666/1993) e, para recorrer, o licitante deverá manifestar tempestivamente a sua intenção, sob pena de preclusão.
Você possui alguma outra dúvida ou sugestão em relação ao tema? Entre em contato conosco por meio do e-mail contato@schiefler.adv.br, para que um dos nossos advogados especialistas na área de Licitações Públicas possa lhe atender.
Read MoreO que são e como funcionam os robôs de lances no pregão eletrônico?
O uso da tecnologia tem impactado todos os segmentos profissionais e todos os mercados, e não seria diferente com o mercado público de licitações. Dentre os principais usos que se faz de mecanismos informacionais nas licitações está a utilização de sistemas tecnológicos para apoio à participação em pregões em ambiente virtual, o chamado “pregão eletrônico”.
O pregão consiste numa modalidade de licitação para aquisição de bens e serviços comuns em que os particulares apresentam uma oferta de preço inicial e, na sequência, a partir de critérios estabelecidos no edital e em decreto, podem ofertar lances de preços menores para que, ao final, vença aquele que apresentar o menor preço. Em suma, o pregão funciona como um leilão, mas em vez de as ofertas serem majoradas (maior preço), os licitantes devem minorá-las (menor preço).
Desde 2005, a partir do Decreto nº 5.450/2005, este procedimento passou a ser realizado também em ambiente virtual, de forma a reduzir os custos de participação e ampliar o número de potenciais fornecedores. Conforme as regras deste Decreto, os licitantes poderiam apresentar lances sucessivos, desde que inferiores aos últimos encaminhados por eles próprios no sistema, sendo vedada a oferta de lances iguais, prevalecendo aquele ofertado antes.
Em um determinado momento do certame, o pregoeiro poderia decidir pelo encerramento desta fase, momento em que todos os licitantes receberiam um “aviso de fechamento iminente dos lances”. Imediatamente após esta etapa, o sistema era disponibilizado novamente para que fossem ofertados novos lances num período de até 30 minutos, que poderia se encerrar aleatoriamente, a qualquer tempo, pelo próprio sistema.
Neste contexto de encerramento aleatório da fase de lances das licitações, surgiram os “robôs” para auxílio aos particulares.
O que são e quais as vantagens do uso de robôs no pregão eletrônico
Os robôs adotados pelos licitantes em pregões eletrônicos são softwares que apresentam lances de forma automatizada durante a sessão pública, viabilizando que os lances sejam apresentados de forma mais rápida, em frações de segundo, e com a menor diferença possível para a última oferta, reduzindo os valores de forma automatizada como, por exemplo, diminuindo o valor em R$ 10,00 a cada novo lance.
Este mecanismo propiciava três grandes benefícios:
(i) Aumentava a probabilidade de que a última oferta apresentada fosse a daquele licitante usuário do robô, uma vez que a apresentação de nova oferta se dá em milésimos de segundo;
(ii) Viabilizava que a oferta fosse reduzida na menor margem possível, mantendo um preço quase idêntico ao da oferta anterior e;
(iii) Evitava erros de digitação do valor da oferta durante a realização do certame.
Como o encerramento do pregão era realizado de forma aleatória (ou seja, a fase de lances poderia ser encerrada a qualquer momento), assegurar que a última proposta era a sua numa velocidade quase instantânea significava uma importante vantagem competitiva.
A utilização dos robôs, contudo, sofreu importantes alterações após a edição do Decreto nº 10.024/2019, que revogou o Decreto nº 5.450/2005. As alterações se deram, em especial, pela identificação de que o uso de robô não contribuía para que se alcançasse o menor valor, uma vez que as reduções eram mínimas em relação ao lance anterior.
A primeira modificação que impactou o uso dos robôs é a previsão que permite o estabelecimento de um quantitativo mínimo para considerar legítima a redução dos valores (§ 3º do artigo 30 do Decreto 10.024/2019).
Por exemplo, os editais podem passar a prever que só serão válidos os lances que observaram uma redução de, ao menos, R$ 100,00. Assim, nesse exemplo, se a melhor oferta apresentada na licitação for de R$ 90.000,00, um novo lance só será valido se for de R$ 89.900,00.
Mas a principal mudança foi na metodologia da fase de lances do pregão eletrônico. Se antes, após o encerramento da fase inicial de recebimento de lances, iniciava um novo período para recebimento de ofertas que perdurava por um tempo aleatório, até o máximo de 30 minutos, sob o regime do novo decreto isso mudou.
O Decreto nº 10.024/2019 incorporou a previsão, em seu artigo 31, de que os pregões eletrônicos podem adotar os modos de disputa aberto e aberto e fechado. No modo de disputa aberto, a etapa de lances terá duração de 10 minutos e, após o transcurso desse período, ela será prorrogada automaticamente enquanto houver lances sendo ofertados nos últimos 2 minutos da disputa. Assim, caso tenha havido novo lance, há uma prorrogação que perdura por mais 2 minutos até que se deixe de ofertar novos lances nesse período, encerrando a disputa, como previsto no artigo 32 do Decreto, embora ainda seja possível que o pregoeiro admita o reinício da etapa de envio de lance para alcançar menor preço, desde que devidamente justificado.
Já no modo de disputa aberto e fechado, regulamentando no artigo 33 do Decreto, a etapa de envio de lances adota o prazo de 15 minutos de duração. Findo este período, o sistema disponibiliza um aviso de fechamento desta etapa e se inicia uma fase de disputa aleatória de até 10 minutos, podendo ser encerrada a qualquer tempo.
Ao se encerrar este período no tempo aleatoriamente estabelecido, o sistema seleciona o autor da melhor proposta e todos os demais que apresentaram valores até 10% superiores a este lance a ofertarem, de modo sigiloso, uma proposta final, que deve contemplar seu melhor preço possível. Caso não haja ao menos 3 licitantes para esta fase “fechada” (por exemplo, se as demais ofertas forem superiores a 10% do menor preço ofertado), os autores dos melhores lances serão selecionados, até o limite de 3 licitantes, para que apresentem sua melhor oferta de modo fechado e sigiloso – e caso eles não apresentem, então serão selecionados os autores dos lances subsequentes até viabilizar a realização desta etapa nos moldes previstos, se possível.
Esta modificação de sistemática dificulta que um licitante, por meio do uso de um robô, consolide sua vitória apenas por um lance mais rápido e com diferença ínfima de valor, que poderia ser coberta por outra licitante, caso houvesse tempo disponível. Como na fase aberta o sistema sempre reabre o período de 2 minutos ao se apresentar uma nova proposta, fica reduzida a vantagem do uso de um lance imediato e minimamente inferior prévio ao fechamento do sistema, pois todos os demais licitantes terão a possibilidade de apresentar uma nova oferta, reiniciando a contagem do período de 2 minutos.
Por sua vez, no modo de disputa aberto e fechado, o risco da vitória apenas por uso de robô é reduzida em decorrência da etapa fechada, na qual os licitantes desconhecem as ofertas dos demais concorrentes e não há propriamente uma disputa em tempo real. Como a oferta é sigilosa e única, as funcionalidades do robô são inúteis para alcançar a vitória – embora possam ser ligeiramente úteis no período aleatório para se alcançar as três melhores classificações.
Diante da edição desse novo Decreto, o próprio Governo Federal deliberou por revogar a Instrução Normativa nº 3/2011, que previa a adoção de alguns procedimentos para a operacionalização do pregão eletrônico, inclusive relacionados à prevenção ao uso dos robôs. Esta revogação formalizou o reconhecimento de que esta prevenção ao uso dos robôs se tornou desnecessária, uma vez que o Decreto nº 10.024/2019 regulamenta suficientemente a questão.
Considerando essas mudanças, os benefícios do uso dessa tecnologia para vencer os certames em decorrência somente da velocidade da oferta dos lances e da redução mínima dos valores foram substancialmente reduzidos. Contudo, além dessas vantagens, o uso de robôs também contempla outras que ainda perduram.
Uma dessas vantagens é viabilizar a participação em uma multiplicidade de licitações ao mesmo tempo com um número inferior de funcionários. Ao programar o robô, definindo quais os menores preços a serem ofertados em cada licitação, o próprio software acompanha os lances e vai progressivamente reduzindo a oferta até alcançar o patamar mínimo já previamente estabelecido, evitando a necessidade de contratação de diversos profissionais para acompanhar cada uma das licitações.
Por reconhecer que ainda existem vantagens relevantes oferecidas por esses softwares de lançamento automático de lances, há uma pluralidade de empresas especializadas em licitações que disponibilizam aos interessados o uso desses robôs, como os disponibilizados pela empresa Effecti, Lance Fácil, Siga Pregão e R-Licitações. Em comum, elas prometem viabilizar a automatização de envios de lances, cadastrando as licitações de interesse e os valores mínimos possíveis, de modo a tornar a participação humana durante a realização do pregão substancialmente reduzida.
Mas, afinal, agora que já está claro para que serve o uso dos robôs, permanece a dúvida: é lícito o uso de programa computacional para automatização de lances? O que já decidiram os Tribunais a esse respeito?
Mas é lícito? Decisões sobre os usos dos robôs em pregões
O entendimento dos tribunais brasileiros diverge a respeito da (i)licitude dos robôs em pregões eletrônicos.
Contudo, após o advento do Decreto nº 10.024/2019, o posicionamento dos órgãos de controle tendeu a reconhecer a legalidade do uso da tecnologia. O Ministro Relator André de Carvalho, no Acórdão 2791/2019-TCU-Segunda Câmara, concluiu que, desde que respeitadas as regras básicas do certame licitatório e observado o tempo entre lances, a utilização de robôs não representa irregularidade dos licitantes.
O conselheiro também destaca a ausência de proibição legal expressa da utilização de programas para oferta de lances. Com base nesse entendimento, o Conselheiro Relator Raimundo Carreiro também se manifestou favoravelmente à utilização de robôs em licitações
Este entendimento de que a utilização de novas tecnologias é inerente ao avanço digital vivenciado pela sociedade atual parece contribuir para a construção de uma visão favorável à utilização de programas de automatização de lances.
Read MoreDireto ao ponto: o que mudou na Concorrência com a Nova Lei de Licitações?
A Nova Lei de Licitações Públicas e de Contratos Administrativos (Lei n.º 14.133/2021), vigente desde 1.º de abril de 2021, preservou, em partes, a matéria das normas jurídicas da Lei n.º 8.666/1993. Mesmo assim, promoveu, também, um sem-número de alterações — ou, verdadeiramente, inovações — com relação à Antiga Lei de Licitações Públicas e de Contratos Administrativos.
Dentre essas inovações, destacam-se aquelas referentes à Concorrência, modalidade de licitação prevista pelo artigo 22, I, da Lei n.º 8.666/1993 e pelo artigo 28, II, da Nova Lei de Licitações Públicas e de Contratos Administrativos.
Assim, para esclarecer todos os pontos em que a velha Lei e a nova Lei divergem entre si, listamos, abaixo, as principais mudanças promovidas pela Nova Lei de Licitações Públicas e de Contratos Administrativos na modalidade de licitação pública concorrência:
1. A alteração do processo de definição da modalidade licitatória, de sorte que a seleção da modalidade Concorrência passa a ter mais foco maior nas características do objeto licitado e menos nos critérios exclusivamente financeiros (como era na Lei nº 8.666/1993).
2. No âmbito da Nova Lei de Licitações, a Concorrência não é mais modalidade obrigatória para as hipóteses de aquisição e alienação de bens imóveis, concessão de direito real de uso e licitações internacionais.
3. A alienação de bens imóveis pela Administração Pública, inclusive os pertencentes às autarquias e às fundações, não dependerá mais de Concorrência, mas da existência de interesse público devidamente justificado, de autorização legislativa e de licitação apenas na modalidade Leilão.
4. A Nova Lei de Licitações, ao tratar da licitação internacional, não faz menção à modalidade de licitação exigida, diferentemente da Lei nº 8.666/1993. O que há é a determinação de que o edital esteja ajustado às diretrizes da política monetária e do comércio exterior, bem como adequado às exigências dos órgãos competentes.
5. Os critérios de julgamento “maior retorno econômico” e “maior desconto” podem ser adotados na Concorrência regida pela Nova Lei de Licitações, sendo que o “maior retorno econômico” será utilizado exclusivamente nas hipóteses em que se pretende contratar por meio de “contrato de eficiência”.
6. A Nova Lei de Licitações equiparou o rito procedimental da Concorrência e do Pregão, que no campo da Lei nº 8.666/1993 eram vistos como antagônicos. Tanto a Concorrência como o Pregão seguirão o rito procedimental comum previsto, que consolida a até então chamada “inversão de fases” como padrão nas licitações, de modo que a fase de habilitação ocorrerá, via de regra, depois do julgamento das propostas.
7. Independentemente da sequência de fases adotada (seja a regra geral, seja a “nova” inversão de fase, com a habilitação antes do julgamento), a Nova Lei de Licitações adota a fase recursal una. Isto é, não haverá mais a possibilidade de interpor recursos ao final de cada fase, como é o padrão da Lei nº 8.666/1993.
8. Além da fase recursal una, existem duas outras novidades no que toca à fase recursal: o novo prazo para recurso é de 3 (três) dias úteis (em comparação com os cinco dias úteis da Lei nº 8.666/1993) e, para recorrer, o licitante deverá manifestar tempestivamente a sua intenção, sob pena de preclusão.
Você possui alguma outra dúvida ou sugestão em relação ao tema? Entre em contato conosco por meio do e-mail contato@schiefler.adv.br, para que um dos nossos advogados especialistas na área de Licitações Públicas possa lhe atender.
Read MoreSessão de licitação: noções gerais e dicas de preparação
Uma preparação bem feita para participar de licitações envolve necessariamente a compreensão de como se portar durante uma sessão. É nestes eventos em que a competitividade do certame se aflora, ocorrendo a verdadeira disputa entre todos os licitantes.
Em síntese, as sessões públicas de um procedimento licitatório são as reuniões convocadas pela Administração Pública, em que os representantes desta e os participantes da licitação praticam os atos necessários para a realização e prosseguimento do certame. Ou seja, são nas sessões públicas que os concorrentes se reúnem, presencial ou virtualmente, para apresentar os mais variados documentos exigidos pelo edital, efetuar lances e averiguar o resultado de julgamentos, assim como indicar algum tipo de irregularidade existente nos documentos e/ou propostas uns dos outros, quando identificada durante a sua realização.
As sessões não são mais o momento de aquecimento para a licitação (concepção das propostas ou organização dos documentos de habilitação, por exemplo), mas sim o momento em que a disputa está verdadeiramente em andamento, e qualquer falha pode significar um imenso prejuízo ao licitante.
Embora nada se equipare à experiência de participação propriamente dita, e ainda que cada sessão de licitação tenha suas potenciais particularidades, existem dicas de preparação e noções gerais que trarão mais segurança ao licitante.
Preparar-se adequadamente para a participação nas sessões públicas de uma licitação é fundamental para mitigar o risco de cometer alguma irregularidade e, consequentemente, também, para aumentar a probabilidade de se sagrar vencedor do certame.
Um licitante bem preparado, munido de documentos em conformidade com o edital e conhecedor das disposições do instrumento convocatório da licitação, além de garantir a sua plena participação, pode apontar eventuais irregularidades cometidas pelos outros licitantes ao longo de todo o procedimento, com o intuito de possivelmente retirá-los da competição pelo não atendimento às regras essenciais do certame.
Para realizar uma preparação adequada para essas sessões, é importante entender as etapas que compõem uma licitação e o que se espera de cada uma delas, sendo possível, assim, compreender para onde os esforços de preparação devem ser direcionados em cada sessão a ser realizada.
O processo licitatório é dividido em diferentes fases, iniciando-se desde antes da divulgação do edital do certame, na chamada fase preparatória, e finalizando-se somente após o momento da homologação do contrato à licitante vencedora e a assinatura do contrato.
Tais fases podem envolver tanto a atuação da própria Administração Pública, ao proferir uma decisão, por exemplo, quanto a atividade dos próprios licitantes, participando ativamente do procedimento por meio da entrega de documentos, propostas ou lances, necessários para a plena competição no certame.
A Nova Lei de Licitações, em seu artigo 17, se ocupou de especificar cada uma das etapas do procedimento licitatório, como pode ser observado a seguir:
Art. 17. O processo de licitação observará as seguintes fases, em sequência:
I – preparatória;
II – de divulgação do edital de licitação;
III – de apresentação de propostas e lances, quando for o caso;
IV – de julgamento;
V – de habilitação;
VI – recursal;
VII – de homologação.
Durante estas etapas, especialmente as de apresentação de propostas e lances, de julgamento e de habilitação, a Administração lança mão de sessões públicas para receber documentos e, também, para divulgar análises e resultados.
De acordo com o artigo 17, § 2º, da Nova Lei de Licitações, essas sessões, que devem ser sempre públicas, também devem ser preferencialmente realizadas de modo eletrônico. As sessões presenciais, que eram a regra por ocasião da Lei nº 8.666/1993, ficam, então, relegadas às hipóteses excepcionais e, para serem realizadas, demandam decisão administrativa motivada. Mesmo nesses casos excepcionais, as sessões presenciais devem ser registradas sempre em atas e gravadas em vídeo e em áudio (17, §§ 2º e 5º, da Lei nº 14.133/2021).
Com tudo isso em mente, é evidente que o conhecimento do licitante sobre noções gerais de preparação para as sessões públicas – como agir, quais documentos apresentar, quando contestar um ato ou documento de outro licitante – é um elemento essencial para potencializar o sucesso no certame.
Adiante, destacamos algumas noções gerais e dicas preparatórias sobre as fases de apresentação de propostas e lances, de julgamento e de habilitação, momentos em que o grau de competitividade se mostra mais acentuado e em que é mais rotineiro existirem sessões públicas específicas para tanto.
I. PREMISSA GERAL: A LEITURA ATENTA DO EDITAL
Antes de adentrar nos detalhes sobre as sessões de cada uma das fases destacadas para análise, é importante estabelecer uma premissa geral que pode ser aplicada durante a preparação de qualquer sessão pública de licitação.
Tal premissa consiste na verificação e leitura atenta do edital antes da participação em qualquer sessão, identificando as peculiaridades previstas no instrumento convocatório para a sessão específica que se pretende participar.
O edital é o documento que estabelece as regras que deverão ser observadas tanto pelos licitantes quanto pela Administração Pública, representando uma espécie de “manual” e de “pauta” a ser seguida e respeitada durante todo o processo licitatório, inclusive nas sessões – isso se deve ao princípio da vinculação ao edital, extremamente importante no campo das licitações e contratos administrativos.
Dessa forma, se existe alguma vedação expressa determinada pelo edital, tal proibição deve ser respeitada a todo o momento durante o certame. Se é realizada alguma exigência em relação à documentação ou à forma como devem ser apresentadas as propostas, tal exigência deve ser atendida por todos os licitantes e pela Administração Pública.
Nesse momento inicial, é indispensável estudar o edital para compreender cada uma das normas editalícias e a relação delas entre si, bem como a adequação das propostas, tanto técnicas quanto de preços.
Dentre as variadas técnicas disponíveis para estudar os editais das licitações públicas, pode-se destacar a elaboração de formulários, fichamentos e “checklists”, de anotações e de ordenações dos itens e dos subitens do edital de acordo com as suas temáticas. Trata-se, na verdade, de um trabalho de organização e classificação do conteúdo do edital, que não raramente trata de temas similares de forma esparsa em seu corpo.
Além disso, é comum a existência de editais que preveem em seu conteúdo a realização de um número determinado de sessões públicas, para cada etapa do certame, incluindo até mesmo uma espécie de pauta cronológica sobre o que será tratado na ocasião.
Por exemplo, a depender de sua finalidade, o próprio edital pode prever procedimentos que serão realizados em cada sessão, como: identificar os representantes das licitantes, verificar o cumprimento das condições de participação a partir dos termos do edital, receber os envelopes das propostas, conferir se tais envelopes estão em conformidade com o edital, disponibilizá-los para exame e rubrica dos licitantes presentes, proclamar o resultado do julgamento, realizar a negociação de condições mais vantajosas, realizar a consulta em cadastros públicos para verificar eventual impeditivo na participação dos licitantes, etc.
Diante disso tudo, é importante ter a compreensão de que o estudo do edital, preferencialmente, deve ser acompanhado de profissionais e consultores com conhecimentos jurídicos, que tenham experiência sobre a legislação aplicável à licitação (a exemplo da Lei nº 8.666/1993, da Lei nº 14.133/2021 e de eventuais leis especiais) e da jurisprudência existente sobre licitações e contratos administrativos.
É também por meio do estudo e da revisão contínuas do edital que os eventuais erros, os vícios, as omissões e as contradições do edital podem ser identificados, os quais devem ser comunicados à Administração tempestivamente, na forma de pedidos de esclarecimentos ou de impugnações, por exemplo.
Estudar e revisitar o edital durante todo o procedimento licitatório, especialmente no processo de preparação para a realização das sessões, consiste, portanto, numa premissa essencial e imprescindível para todo e qualquer licitante.
II. FASE DE APRESENTAÇÃO DE PROPOSTAS E LANCES
A fase de apresentação de propostas e lances representa o momento em que o licitante apresentará à Administração Pública qual é a oferta que tem para o objeto da licitação. O recebimento das propostas (como regra, mas não obrigatoriamente) e a apresentação de lances pelos licitantes ocorrem durante uma sessão pública da licitação.
Nesta fase, as ofertas a serem apresentadas pelos licitantes poderão ser mantidas em sigilo, permanecendo assim até a sessão pública estipulada pelo edital para a sua abertura e análise (modo de disputa fechado, com a apresentação de uma única “proposta”, ou então a “primeira proposta” no modo de disputa aberto), ou então, podem ter o seu conteúdo tornado público e disponível de imediato, na própria sessão (tradicional no modo de disputa aberto, em que ocorre a apresentação sequencial de “lances”).
A depender da modalidade e do modo de disputa, os cuidados especiais para as sessões que envolvem essa etapa do procedimento licitatório devem ser voltados para a questão dos prazos de entrega das propostas, assim como para os lances ou propostas apresentados em si.
Por exemplo, é comum que o licitante proponha inicialmente os valores máximos ou mínimos permitidos pelo edital de acordo com os critérios de julgamento adotados pela licitação pública (artigo 33 da Lei nº 14.133/2021). Esta estratégia, contudo, somente é cabível quando o licitante tem a possibilidade de, posteriormente, melhorar a sua oferta durante a sessão (como ocorre no modo de disputa aberto, por exemplo, no pregão), ou, então, embora seja raro, quando a apresentação de um determinado valor em sua oferta já é suficiente para atingir a nota máxima alcançável na licitação.
Esses exemplos demonstram que há estratégias para a preparação de propostas adequadas e competitivas, a despeito do caráter sigiloso e secreto das propostas concorrentes, e isso deve ser considerado quando da elaboração das propostas a serem apresentadas e da preparação para a participação nas sessões públicas.
Ademais, nesta fase, a prévia análise aprofundada do edital é ainda mais essencial, pois é com base nas regras previstas no referido documento que podem ser apontadas, durante a sessão, as eventuais irregularidades das propostas apresentadas por outros licitantes.
Se a proposta não atendeu à forma exigida (exemplo: apresentar documentos soltos em vez de encadernados), se ela é inexequível frente à realidade dos preços praticados no mercado, se não corresponde a algum requisito do objeto licitado, se houve identificação do licitante em uma proposta que deveria ser apócrifa, todos esses elementos podem ser trazidos à baila no momento da sessão pública a ser realizada nesta fase.
É possível e até mesmo recomendável nessas ocasiões, especialmente no âmbito da Nova Lei de Licitações (que prevê a hipótese de preclusão do direito recursal), que o representante da licitante peça que seja registrado em ata a existência de possível irregularidade na proposta da empresa concorrente.
Além disso, como a fase apresentação das propostas, como regra, no âmbito da Nova Lei de Licitações (art. 17), é a primeira etapa após a divulgação do edital, normalmente nesta sessão, ou imediatamente antes dela, ocorrerá o credenciamento de representantes (que não se confunde com a etapa de habilitação da empresa e nem com o procedimento auxiliar previsto no art. 79 da nova lei), que atuarão em nome da empresa licitante durante o certame.
Nesse sentido, sobretudo se a sessão for presencial (pois, no ambiente eletrônico, o credenciamento ocorre a partir do próprio login e senha de acesso), é essencial analisar previamente qual a documentação exigida pelo edital para efetuar tal credenciamento, sendo recomendável a organização prévia de documentos, independentemente de a empresa estar diante de licitação em andamento ou não.
Alguns exemplos de organização prévia são: procuração pública ou particular autenticada em cartório com prazo determinado, outorgando poderes a um ou alguns representantes que costumam representar a empresa; contrato social atualizado; certificado digital (padrão ICP-Brasil) de algum representante da empresa para evitar surpresas quando a licitação ocorrer no meio digital e tal assinatura for exigida pelo edital, etc.
Ao agir assim em quaisquer das etapas da licitação, com organização prévia de documentos e informações que usualmente são solicitadas em certames públicos, a empresa estará preparada para participar de sessões públicas e mitigará o risco de ser surpreendida por exigências comuns.
Em resumo, portanto, o licitante deve se preparar atentando-se às exigências do edital, observando a possível existência de pauta preestabelecida, os prazos (não somente o dia, mas também os horários) para entrega da proposta ou realização de lances e fazer uma revisão da sua proposta, buscando adequá-la às imposições editalícias sem margens para erros.
III. FASE DE JULGAMENTO
A fase de julgamento das propostas será aquela responsável pela classificação ou desclassificação de determinado licitante, com base na proposta apresentada, para seguir regularmente no certame, bem como pela atribuição de uma classificação entre as propostas classificadas e em conformidade com o edital.
Basicamente, será essa a fase que determinará a ordem das propostas mais bem classificadas e que, caso os licitantes autores sejam habilitados, as propostas vencedoras e as suas respectivas classificações.
Nas sessões que envolvem essa fase, é necessário atentar-se aos critérios de julgamento considerados pela Administração Pública, por meio da análise da sua aplicação correta a cada uma das propostas, de forma isonômica e sem causar distorções desproporcionais (especialmente em certames cujo critério de julgamento envolve a técnica).
Assim, no ato de preparação para tais sessões, é importante rememorar as causas de desclassificação de uma proposta, previstas tanto no edital como na Nova Lei de Licitações (art. 59). Dentre estes critérios, podem ser motivos para a desclassificação de uma proposta, ainda que virtualmente classificada em primeiro lugar: (i) a existência de vícios insanáveis, (ii) a desobediência às especificações técnicas do edital e (iii) a apresentação de preços inexequíveis ou acima do orçamento estimado.
Ademais, é importante ainda atentar-se aos critérios de desempate das propostas, garantindo que sejam respeitados. Estes critérios estarão previstos tanto no edital como na legislação aplicável, sendo que, na Nova Lei de Licitações (art. 60), alguns exemplos que podem ser adotados são os seguintes: (i) disputa final com apresentação de nova proposta pelos licitantes empatados, (ii) avaliação do desempenho contratual prévio dos licitantes, (iii) desenvolvimento de ações de equidade entre homens e mulheres no ambiente de trabalho, e (iv) desenvolvimento de programa de integridade.
Na sessão pública realizada para o fim de julgamento das propostas, que pode até ser a mesma destinada ao recebimento das propostas (especialmente quando o critério de julgamento adotado é exclusivamente financeiro), também são pertinentes as orientações que foram indicadas como premissa geral e para a sessão de entrega das propostas e de lances.
IV. FASE DE HABILITAÇÃO
A fase de habilitação corresponde à etapa em que se verifica se o licitante possui os documentos e conjunto de informações suficientes e necessários para demonstrar sua capacidade de realizar o objeto da licitação.
A preparação para as sessões que envolvem essa fase é essencial, pois qualquer erro ou inobservância de exigência contida no edital poderá implicar na inabilitação do licitante, retirando-o da competição.
Como essa fase envolve essencialmente a entrega de documentos, a preparação para a sessão pública referente a ela deve envolver um processo intenso de revisão documental, inclusive aos seus prazos de validade (normalmente constantes de certidões).
Em primeiro lugar, deve-se observar se todos os documentos exigidos estão à disposição e devidamente separados para serem apresentados. Os documentos de habilitação são divididos em diferentes segmentos, conforme o art. 62 da Nova Lei de Licitações: (i) jurídico, (ii) técnico, (iii) fiscal, social e trabalhista, e (iv) econômico-financeiro.
Para que uma empresa seja considerada habilitada, ela precisa atender a todos esses critérios.
Ato contínuo, é importante observar a forma como tais documentos devem ser apresentados e se estão em conformidade com o exigido no edital, isto é, se devem ser apresentados os documentos originais, em cópia autenticada ou em cópia simples, com a exibição dos documentos originais na sessão, para fins de comparação por algum membro da comissão, por exemplo.
Usualmente, exige-se, também, a assinatura dos documentos pelos representantes legais da licitante e, especialmente quanto aos documentos referentes à capacidade econômico-financeira, exige-se, também, a assinatura de profissional contábil credenciado perante o órgão de classe respectivo. Tudo isso deve ser considerado previamente pela licitante e inserido na fase de preparação da licitante para participar da licitação pública.
Ou seja, uma recomendação bastante importante para empresas que participam recorrentemente de licitações, ou que possuem interesse em participar, é ter previamente organizada a documentação atualizada que normalmente são exigidas nos certames (por exemplo, contrato social atualizado, balanços e demonstrações contábeis, atestados de capacidade técnica assinados com firma reconhecida), assim como uma metodologia interna definida para facilitar a obtenção de certidões fiscais, trabalhistas e de falência.
Considerando que a Nova Lei de Licitações formalizou em seu conteúdo a até então chamada “inversão de fases”, com a etapa de habilitação ocorrendo, via de regra, ao final do certame, após o julgamento e classificação das propostas, a sessão pública de habilitação se torna um dos momentos mais importantes do processo licitatório, pois qualquer equívoco pode macular a vitória dos licitantes classificados.
V. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como visto, as sessões públicas de uma licitação correspondem ao momento em que o certame se concretiza e a competitividade se aflora, sendo nelas que as licitantes apresentam as propostas que competirão entre si e demonstram sua qualificação e aptidão para participar do certame e executar o objeto do contrato pretendido.
Estar preparado para tais sessões, portanto, é importante para assegurar a regular participação no certame, além de indicar eventuais irregularidades que podem eventualmente favorecer a posição classificatória da empresa.
A maioria das sessões de licitação pública transcorre normalmente, sem a necessidade de que o representante do licitante faça alguma intervenção extraordinária.
Independentemente disso, ainda a título de dica preparatória, saiba que é muito comum que o representante, durante a sessão, obtenha informações a respeito do modo e tempo para obtenção de cópias da documentação apresentada pelas demais licitantes. Isso é relevante para que eventual irregularidade seja identificada e, assim, para que eventual recurso seja interposto.
Também é relativamente comum que o agente de contratação, pregoeiro ou comissão questione se as empresas presentes abrem mão do direito de recurso. Neste caso, o recomendável é que a empresa não renuncie ao direito de recurso sem, antes, avaliar a documentação apresentada pelos seus concorrentes. Portanto, sob o ponto de vista jurídico, dificilmente haverá segurança em abrir mão do direito recursal ainda durante a sessão de licitação, pois, neste momento, ainda não foi possível analisar com calma a documentação dos concorrentes.
As dicas constantes neste texto representam passos essenciais para se preparar adequadamente para as sessões das licitações em geral, aumentando a capacidade competitiva das licitantes que as seguem.
Você possui alguma outra dúvida ou sugestão em relação ao tema? Entre em contato conosco por meio do e-mail contato@schiefler.adv.br, para que um dos nossos advogados especialistas na área de Licitações possa lhe atender.
Read MoreAs etapas da Concorrência na Nova Lei de Licitações
A Concorrência, modalidade de licitação com previsão no art. 6º, inciso XXXVIII, art. 28, inciso II, e art. 29 da Lei nº 14.133/2021 (NLLCA), é caracterizada pela completude de seus procedimentos, sendo composta por várias etapas, e contando com diversos possíveis critérios de julgamento.
À luz da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, a modalidade Concorrência pode ser subdividida em 9 etapas, são elas: (i) Credenciamento de representantes; (ii) Apresentação das propostas; (iii) Abertura das propostas; (iv) Julgamento e classificação; (v) Modos de disputa; (vi) Negociação; (vii) Habilitação; (viii) Recursos; e (ix) Homologação.
Por tratar-se de modalidade complexa, o presente artigo abordará cada uma de suas etapas para, de forma objetiva e clara, explicar suas principais especificidades.
(i) Credenciamento de representantes:
Como a Concorrência é uma modalidade composta por diversas etapas e sessões públicas, que normalmente são realizadas em datas distintas e para diferentes propósitos (recebimento das propostas, divulgação do julgamento, habilitação, etc.), é comum que ocorra, quando da abertura do certame (1ª sessão pública), o ato de credenciamento de representantes das empresas licitantes.
Neste ato, que não possui correspondência com o procedimento auxiliar “credenciamento” (art. 79 da Nova Lei de Licitações), o representante da empresa interessada em participar da licitação comprova à Comissão de Contratação que possui poderes para agir em nome da pessoa jurídica, mediante a apresentação de documento de identificação pessoal e, a depender do caso, de procuração pública ou particular e do ato constitutivo da empresa (contrato social).
Ao agir assim, a empresa licitante poderá ser representada no certame pela pessoa credenciada, nos termos do ato que lhe outorgou poderes. Exemplificativamente, estes poderes podem compreender (e normalmente compreendem) a assinatura e a apresentação de propostas e documentos, a participação nas sessões públicas, a interposição de recursos e a negociação de preços e condições, bem como, de forma genérica, a assinatura de quaisquer documentos e a prática de todos os atos indispensáveis para a regular participação da empresa no certame.
Ainda que o credenciamento de um representante não seja um requisito obrigatório para que uma empresa interessada possa participar da licitação, é um ato extremamente importante para que a licitante consiga praticar atos de seu interesse e defender os seus direitos durante as etapas do certame.
(ii) Apresentação das propostas:
A forma com que ocorre a etapa de apresentação das propostas técnicas e de preços pode depender de como a Concorrência está sendo realizada, isto é, se no formato eletrônico ou presencial. No âmbito das licitações regidas pela Lei nº 8.666/1993, esta modalidade de licitação ocorria quase que inteiramente de forma presencial, salvo a divulgação de alguns atos e comunicações no sítio eletrônico do órgão, por e-mail ou no diário oficial.
Agora, com o advento da NLLCA, ficou nítida a opção do legislador em privilegiar os processos administrativos eletrônicos[1]Sobre a tramitação eletrônica de processos administrativos, ver: SCHIEFLER, Eduardo André Carvalho. Processo Administrativo Eletrônico. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2019., ou seja, a tramitação eletrônica dos processos licitatórios. A nova lei é clara e expressa: utilizando-se do termo “preferencialmente” (art. 12, inciso VI, e art. 17, § 2º), a regra passa a ser o formato eletrônico, e a exceção se torna a forma presencial, que deve ser sempre motivada.
Prova disso é que, no art. 17, § 5º, a nova lei qualifica expressamente a forma presencial como “hipótese excepcional de licitação”, assim como determina, como regra, que “a sessão pública de apresentação de propostas deverá ser gravada em áudio e vídeo, e a gravação será juntada aos autos do processo licitatório depois de seu encerramento”..
Dessa forma, a etapa de apresentação das propostas técnicas e/ou de preços (a depender do critério de julgamento adotado na licitação) também está relacionada com a forma do processo administrativo de contratação pública, se “eletrônico” ou se “presencial”.
Quando a entrega das propostas deve ocorrer presencialmente, em sessão pública, o representante da empresa nada mais faz do que literalmente entregar o envelope contendo os documentos da proposta à Comissão, ao passo que no formato eletrônico possivelmente será exigido do licitante o cadastro prévio em um sistema que permita o envio de arquivos eletrônicos, a exemplo do Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP), no caso dos certames do Governo Federal regulados pela Nova Lei de Licitações.
(iii) Abertura das propostas:
No que toca à etapa de abertura das propostas, é essa ocasião que permite a comparação das propostas dos licitantes, e por sua vez o julgamento e a classificação das propostas mais vantajosas para a Administração, a depender do critério selecionado e previsto em edital.
Em algumas situações, após o recebimento e abertura das propostas, a Administração segue a uma rodada de aposição de rubricas nos conteúdos dos invólucros, pois o julgamento propriamente dito das propostas não acontecerá instantaneamente. É possível até mesmo que determinados envelopes não sejam abertos nesta ocasião, sendo que, nesses casos, as rubricas são adicionadas aos fechos dos envelopes. Em casos como esses, o resultado do julgamento das propostas é divulgado em data futura, previamente designada, em sessão pública específica para tal intento.
Isto ocorre normalmente nas hipóteses de propostas técnicas (em que o critério de julgamento é o “melhor técnica” ou “técnica e preço”), justamente porque é preciso haver tempo hábil para a análise das propostas apresentadas pelos licitantes.
Por outro lado, quando se está diante de uma Concorrência com propostas exclusivamente de preços, ou de critérios técnicos simplificados de julgamento, a abertura e o julgamento das propostas pode ocorrer no mesmo ato ou dia da entrega dos envelopes pelas empresas.
(iv) Julgamento e classificação:
Na Concorrência regida pela Lei nº 8.666/1993, os critérios de julgamento foram, por muito tempo, chamados de “tipos” de licitação, que poderiam ser: (i) o de menor preço; (ii) a de melhor técnica; (iii) a de técnica e preço; e (iv) a de maior lance ou oferta (nos casos de alienação de bens ou concessão de direito real de uso). Estes critérios estão previstos nos incisos do art. 45 da Lei nº 8.666/1993.
Na NLLCA, por sua vez, os critérios de julgamento das propostas apresentadas em sede de Concorrência podem ser diversos, a exemplo: (i) do menor preço; (ii) da melhor técnica ou conteúdo artístico; (iii) da técnica e preço; (iv) do maior retorno econômico; e (v) do maior desconto. Estas possibilidades estão previstas nos incisos do art. 6º, inciso XXXVIII, da Lei nº 14.133/2021, sendo que os os critérios (iv) maior retorno econômico e (v) maior desconto são novidades para a modalidade Concorrência.
A etapa de julgamento, assim como as demais etapas que compõem um processo licitatório, depende da modalidade adotada e, naturalmente, do critério de julgamento.
Dessa forma, como salientado acima, o julgamento das propostas pode dar-se de maneira mais objetiva nas hipóteses em que a classificação será estruturada de acordo com propostas mais vantajosas em termos exclusivamente financeiros (menor preço ou maior desconto, por exemplo).
No que diz respeito às concorrências públicas cujos critérios de julgamento envolvem a técnica, é bastante usual que tal etapa seja antecedida de uma análise por uma comissão de avaliadores (como no caso das licitações de serviços de publicidade, regidas pela Lei nº 12.232/2010), de modo que, posteriormente, uma sessão pública é agendada para a divulgação da classificação final. A propósito, de acordo com a NLLCA (art. 37), a atribuição de notas a quesitos de natureza qualitativa obrigatoriamente deve ocorrer por banca designada para tal fim, ou seja, por uma comissão de avaliadores.
É no momento do julgamento que pode haver a desclassificação de propostas que contiverem vícios insanáveis ou apresentem preços inexequíveis ou acima do orçamento estimado para a contratação, nos termos das hipóteses previstas nos incisos do art. 59 da Lei nº 14.133/2021.
Também é nesse momento que pode ocorrer um empate entre duas ou mais propostas consideradas como mais vantajosas à Administração, de acordo com o critério de julgamento adotado. Nessa situação, serão aplicados os critérios de desempate compreendidos pelo art. 60 da Lei nº 14.133/2021, que envolvem a apresentação de novas propostas, a avaliação de desempenho contratual prévio de licitantes, a análise de ações de equidade entre homens e mulheres no ambiente de trabalho e a avaliação de programas de integridade dos licitantes, dentre outros critérios.
(v) Modos de disputa:
Aqui há uma novidade importante na NLLCA: o modo de disputa em licitação que é conduzida pela modalidade Concorrência. De maneira específica, o art. 56 da Nova Lei de Licitações dispõe que a disputa na Concorrência pode ser realizada no modo aberto (lances sequenciais) ou fechado (proposta única, apresentada sem o conhecimento das demais propostas), ou mediante a combinação de ambas.
O modo aberto é a “hipótese em que os licitantes apresentarão suas propostas por meio de lances públicos e sucessivos, crescentes ou decrescentes”, enquanto o modo fechado é a “hipótese em que as propostas permanecerão em sigilo até a data e hora designadas para sua divulgação”.
De acordo com a NLLCA, e diferentemente do que ocorre na Lei nº 8.666/1993, os critérios de julgamento de “menor preço” e de “maior desconto” não podem ser realizados a partir do modo de disputa fechado. Ou seja, vedou-se o uso do modo de disputa fechado (apresentação sigilosa de proposta única, a ser aberta e comparada com as demais propostas) quando o critério de julgamento estiver unicamente vinculado a uma questão de preço. Por outro lado, e provavelmente em razão de uma pretendida simplificação do procedimento, a disputa aberta (lances sequenciais) é vedada nas hipóteses em que o julgamento se dará por meio do critério de julgamento técnica e preço.
(vi) Negociação:
Uma vez definida a proposta vencedora, o órgão licitante poderá negociar por condições mais vantajosas à Administração com o primeiro colocado. Em caso de impasse na negociação, será adotado procedimento idêntico e sucessivo com os demais licitantes classificados.
Nas Concorrências Públicas regidas pela Lei nº 8.666/1993, a etapa de negociação pode ocorrer, por exemplo, no âmbito das licitações cujo critério de julgamento é o de “melhor técnica”, nos termos do seu art. 46, § 1º. Embora não haja disposição expressa pela Lei nº 8.666/1993, a etapa de negociação também é admitida em outras modalidades de licitação, entendimento sustentado pelo Acórdão nº 1401/2014, da 2ª Câmara do Tribunal de Contas da União (TCU).
Por outro lado, a negociação conforme as regras da NLLCA (art. 61) não depende do critério de julgamento, sendo inviável apenas nos casos em que o valor a ser pago é predefinido no edital. Mais do que isso, a Lei nº 14.133/2021 também estabelece que a competência para realizar a negociação é do agente de contratação ou da comissão de contratação, na forma de regulamento. Também consigna, em prol da publicidade e da formalidade dos processos administrativos, que o resultado da negociação será divulgado e anexado aos autos do processo licitatório (art. 61, § 2º).
A bem da verdade, na prática, as negociações em licitação costumam acontecer mediante simples barganha por parte da Administração, que questiona se o particular está disposto a diminuir o preço de sua proposta, mas sem resultar em alterações nas especificações do objeto a ser executado. Essas alterações, se acontecerem, devem necessariamente melhorar a economicidade da contratação, sob a perspectiva pública, ou então aumentar os encargos do particular, mas nunca diminuí-los (por exemplo, seria possível obter em negociação uma redução de preços ou um prazo menor de entrega de um produto à Administração, mas não seria possível conceder ao particular um prazo superior).
(vii) Habilitação:
A etapa de habilitação, de acordo com o art. 62 da Nova Lei de Licitações, é “a fase da licitação em que se verifica o conjunto de informações e documentos necessários e suficientes para demonstrar a capacidade do licitante de realizar o objeto da licitação”.
A habilitação é categorizada em “jurídica”, “técnica”, “fiscal, social e trabalhista” e “econômico-financeira”, cada qual com sua relevância para o processo de contratação pública e com critérios próprios de avaliação, conforme o edital.
No que se refere ao momento em que ocorre a etapa de habilitação das licitantes, a Nova Lei de Licitações proporcionou uma alteração substancial em comparação com o regime da Lei nº 8.666/1993: a inversão das fases de habilitação e de julgamento das propostas.
Até o advento da Lei nº 14.133/2021, que aproximou o rito procedimental da concorrência pública e do pregão, ambas as modalidades possuíam ritos distintos, em especial no que toca ao momento de averiguação da habilitação dos licitantes.
Enquanto no rito da Concorrência (estipulado pela Lei nº 8.666/1993) a etapa de habilitação ocorre no início do processo licitatório, de sorte que apenas os licitantes devidamente habilitados podem apresentar propostas, no rito do Pregão apenas se verifica o atendimento aos critérios de habilitação das licitantes cujas propostas não foram desclassificadas – sendo que, em alguns casos, analisa-se a habilitação apenas da primeira colocada (conforme permitido pelo art. 63, inciso II, da Lei nº 14.133/2021).
A Nova Lei de Licitações, contudo, formalizou a comentada “inversão de fases” como padrão do rito procedimental das licitações públicas no seu novo regime de contratações. O art. 29 da Lei nº 14.133/2021 determina que tanto a concorrência pública como o pregão seguirão o rito procedimental comum previsto no art. 17, o qual prevê que a etapa de habilitação ocorrerá, via de regra, depois do julgamento das propostas.
Esta alteração é vista como uma forma de tornar o procedimento mais célere, pois, como regra, “será exigida a apresentação dos documentos de habilitação apenas pelo licitante vencedor”, conforme preceitua o inciso II do artigo 63. Ainda assim, é uma regra passível de flexibilização, se comprovado que a antecipação da fase de habilitação é positiva, nos termos do § 1º do art. 17 da NLLCA.
(viii) Recursos:
Outra novidade advinda da nova lei diz respeito à fase recursal una, razão pela qual não mais poderão ser interpostos recursos ao final de cada fase, como é o padrão da Lei nº 8.666/1993. Nesse sentido, caso o licitante de uma concorrência pública tenha o interesse de interpor recurso contra o julgamento da sua proposta técnica, por exemplo, será preciso aguardar as demais etapas, inclusive de habilitação, para interpor o recurso ao final do certame.
Isso é o que está disposto no teor do art. 165 da Lei nº 14.133/2021, que prevê um prazo de 3 (três) dias úteis para a interposição de recurso contra o julgamento das propostas ou o ato de habilitação ou inabilitação de licitante, dentre outras hipóteses (para situações não previstas no art. 165, inciso I, é cabível o pedido de reconsideração, nos termos do inciso II).
Independentemente de o licitante ter interposto recurso (inciso I) ou apresentado pedido de reconsideração (inciso II), o art. 168 da Lei nº 14.133/2021 garante o efeito suspensivo do ato ou da decisão recorrida, até que a autoridade competente por apreciar os argumentos do licitante profira decisão.
Destaca-se, contudo, que a ventilada fase recursal una diz respeito apenas a estas duas hipóteses recursais, nos termos do § 1º do art. 165 da Lei nº 14.133/2021. Em ambos os casos, como dito, os licitantes não poderão interpor o recurso imediatamente, mas deverão manifestar imediatamente a intenção de recorrer, sob pena de preclusão (tal como ocorre com o pregão no regime anterior ao advento da Nova Lei de Licitações). O prazo recursal se iniciará após a etapa de habilitação ou, na hipótese de inversão de fases, depois do julgamento das propostas.
De acordo com o § 2º do art. 165 da nova lei, o recurso deve ser dirigido à autoridade que praticou o ato ou proferiu a decisão impugnada, a qual terá a oportunidade de se retratar do seu posicionamento em até 3 (três) dias úteis. Caso haja a reconsideração, a autoridade deverá encaminhar o recurso com a sua motivação para o seu superior hierárquico, o qual terá até 10 (dez) dias úteis para apreciar o recurso.
(ix) Homologação:
Por fim, quanto ao momento de homologação do certame, tal procedimento está previsto no art. 71, inciso IV, da Lei nº 14.133/2021, segundo o qual, após o encerramento das fases de julgamento, de habilitação e recursal, a autoridade competente poderá adjudicar o objeto e homologar a licitação.
Vale observar que o certame somente poderá ser adjudicado e homologado caso a autoridade administrativa não verifique a existência de irregularidades que exijam o retorno dos autos para saneamento (art. 71, inciso I), não revogue a licitação por motivo de conveniência e oportunidade, baseado em fato superveniente (inciso II), ou não identifique uma ilegalidade insanável e anule o certame (inciso III). Em quaisquer desses casos, a autoridade deverá motivar o seu posicionamento.
Você possui alguma outra dúvida ou sugestão em relação ao tema? Entre em contato conosco por meio do e-mail contato@schiefler.adv.br, para que um dos nossos advogados especialistas na área de Licitações Públicas possa lhe atender.
Referências[+]
↑1 | Sobre a tramitação eletrônica de processos administrativos, ver: SCHIEFLER, Eduardo André Carvalho. Processo Administrativo Eletrônico. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2019. |
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Pregão: o que você precisa saber sobre essa modalidade de licitação?
Desde que instituído, o pregão revolucionou o ambiente de negócios entre particulares e o Estado brasileiro, sendo hoje a modalidade de licitação que mais movimenta recursos públicos, segundo dados disponibilizados no Portal de Compras do Governo Federal.
Diante da importância do tema, o presente artigo tem o intuito de sintetizar as principais informações sobre o pregão, tratando dos seus aspectos gerais, da legislação aplicada, do conceito de bens e serviços comuns, da obrigatoriedade desta modalidade e, em especial, das mudanças promovidas pela Lei nº 14.133/2021, a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (NLLCA).
Aspectos gerais
Criado em maio de 2000 e consolidado pela Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002, o pregão surgiu como uma modalidade de licitação para aquisição de bens e serviços comuns.
Exterior ao rol do art. 22 da Lei nº 8.666/1993, esta modalidade visava à facilitação do procedimento licitatório pela Administração Pública no âmbito da União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Poucos anos depois, em 31 de maio de 2005, o Decreto nº 5.450 disciplinou a forma eletrônica do pregão, dando início a uma verdadeira revolução operacional nas contratações públicas de bens e serviços comuns. Atualmente, o pregão eletrônico é regulamentado pelo Decreto nº 10.024/2019.
Em linhas gerais, a modalidade trouxe relevante aprimoramento dos procedimentos licitatórios, traduzindo-se especialmente em maior simplificação e celeridade nas contratações públicas. Em pouco tempo o pregão tornou-se a modalidade de licitação mais utilizada em todos os âmbitos da Administração Pública.
Hoje em dia, as contratações precedidas de pregão consubstanciam, proporcionalmente, o maior valor de contratações no país. Segundo dados disponibilizados no Painel de Compras do Governo Federal, no período compreendido entre janeiro de 2018 e julho de 2022, os contratos administrativos celebrados a partir de pregão movimentaram R$ 691.069.053.295,25, valor que representa aproximadamente 81% da verba total destinada às contratações públicas no período.[1]Fonte: http://paineldecompras.economia.gov.br/processos-compra. Acesso em: 8 ago. 2022.
Após quase vinte anos, a experiência mostrou-se amplamente exitosa, tendo sido uma das fontes de inspiração da Lei nº 14.133/2021.
Legislação aplicável
Atualmente, o pregão é regido tanto pela Lei nº 10.520/2002 quanto pela Lei nº 14.133/2021, a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (NLLCA). Ao realizar a licitação, o órgão deverá indicar no Edital o diploma legal que o certame obedecerá.
Em termos infralegais, no âmbito federal, o pregão é regulado pelo Decreto nº 3.555/2000, na modalidade presencial, e pelo já citado Decreto nº 10.024/2019, na sua modalidade eletrônica. Nos âmbitos estaduais e municipais, é comum que o respectivo ente federativo tenha sua própria regulamentação.
Inovando em relação ao regime da Lei nº 8.666/1993, a Lei nº 14.133/2021 previu o pregão e passou a discipliná-lo integralmente no seu texto. No entanto, as regras estabelecidas pela NLLCA somente passarão a reger a modalidade de modo exclusivo após a revogação da Lei nº 10.520/2002, o que deverá ocorrer em abril de 2023, conforme a regra de transição do art. 193 da referida Lei nº 14.133/2021.
A Lei das Estatais (Lei nº 13.303/2016), por sua vez, indica a adoção preferencial da modalidade pregão para a aquisição de bens e serviços comuns, remetendo ao procedimento da Lei nº 10.520/2002 e, agora, da Lei nº 14.133/2021.
Embora a Lei nº 8.666/1993 não trate expressamente da modalidade pregão, é preciso mencionar que a Lei nº 10.520/2002 reconhece a aplicação subsidiária deste regime normativo ao pregão.
Bens e serviços comuns
Para compreender a modalidade pregão, faz-se necessário entender o conceito de bens e serviços comuns. Isso porque, como já mencionado, o pregão é a modalidade de licitação destinada à aquisição de bens e serviços comuns (artigo 1º da Lei nº 10.520/2002 e artigo 6º, inciso XLI, da Lei nº 14.133).
A fim de ilustrar este conceito, os exemplos mais frequentes de bens comuns são canetas, lápis, borrachas, café, açúcar, cadeiras, veículos, ar-condicionado; já serviços comuns seriam serviços como manutenção de veículos, colocação de piso, serviços terceirizados, pintura de paredes, etc.
A Lei 10.520/2002 trouxe um conceito de bens e serviços comuns que foi repetido na Lei nº 14.133/2021, conforme se pode ler a seguir:
Lei n. 10.520/2002
Art. 1º Para aquisição de bens e serviços comuns, poderá ser adotada a licitação na modalidade de pregão, que será regida por esta Lei.
Parágrafo único. Consideram-se bens e serviços comuns, para os fins e efeitos deste artigo, aqueles cujos padrões de desempenho e qualidade possam ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais no mercado.
Lei nº 14.133/2021
Art. 6º Para os fins desta Lei, consideram-se:
XIII – bens e serviços comuns: aqueles cujos padrões de desempenho e qualidade podem ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais de mercado;
Por conseguinte, bens e serviços comuns são conceitos definidos em função de duas características, quais sejam:
i) padrões de desempenho e qualidade que podem ser objetivamente definidos em edital; e
ii) especificações usuais no mercado, por meio das quais o objeto pode ser descrito.
Sendo assim, para a definição de “bens e serviços comuns” não é relevante o valor do bem e serviço a ser adquirido, podendo ser de qualquer valor, uma vez que a lei não define valores mínimos ou máximos. Tampouco é relevante a complexidade envolvida nos bens e serviços, desde que seja possível descrevê-los na sua padronização e estejam disponíveis no mercado.[2]Conforme Acórdão 2172/2008 Plenário do TCU, citado em: BRASIL. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. Licitações e contratos: orientações e jurisprudência do TCU. 4.ed. Brasília: TCU, … Continue reading
Vale ressaltar, ainda, que a Lei nº 14.133/2021 faculta à Administração Pública a utilização da modalidade pregão para “serviços comuns de engenharia” (art. 29, parágrafo único, da Lei nº 14.133/2021).[3]Art. 6º, XXI – […] a) serviço comum de engenharia: todo serviço de engenharia que tem por objeto ações, objetivamente padronizáveis em termos de desempenho e qualidade, de … Continue reading Ou seja, ao lado de bens e serviços comuns, a Lei nº 14.133/2021 adiciona a definição de “serviço comum de engenharia”, para o qual a modalidade pregão é facultada – enquanto que para bens e serviços comuns, o pregão é obrigatório.
Obrigatoriedade do Pregão
Atualmente, tanto o Decreto nº 10.024/2019 quanto a Lei nº 14.133/2021 determinam a obrigatoriedade do pregão.
Mais especificamente, o Decreto nº 10.024/2019, que disciplina a matéria no âmbito da administração pública federal, determina que a utilização da modalidade pregão na forma eletrônica é obrigatória (art. 1º, §1º), sendo a forma presencial admitida apenas excepcionalmente, mediante prévia justificativa da autoridade competente, devendo ser comprovada a inviabilidade técnica ou a desvantagem para a administração na realização da forma eletrônica (art. 1º, §4º). Essa regra atinge também os demais entes federativos quando da aquisição de bens e serviços comuns por meio de recursos da União decorrentes de transferências voluntárias (como convênios e contratos de repasse, conforme art. 1º, §3º).[4]Leia-se o teor do art. 1º do Decreto nº 10.024/2019: Art. 1º […] 1º A utilização da modalidade de pregão, na forma eletrônica, pelos órgãos da administração pública federal … Continue reading
A Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, por sua vez, tornou obrigatória a modalidade do pregão para toda a Administração Pública – não apenas União, mas também Estados, Distrito Federal e Municípios – conforme o seu âmbito de abrangência. Assim, dispôs a NLLCA:
Art. 6º Para os fins desta Lei, consideram-se:
[…]XLI – pregão: modalidade de licitação obrigatória para aquisição de bens e serviços comuns, cujo critério de julgamento poderá ser o de menor preço ou o de maior desconto;
Também na NLLCA, o pregão deve ocorrer preferencialmente sob a forma eletrônica, sendo excepcionalmente admitida a forma presencial, desde que motivada (conforme a previsão geral, no art. 17, §2º, da NLLCA).
Diferenças procedimentais da Nova Lei de Licitações em relação à Lei nº 10.520/2002
Como já se pôde antever, a NLLCA faz deferência à modalidade do pregão e à experiência adquirida no antigo sistema de licitações e contratos administrativos, tendo absorvido as principais características provenientes da Lei nº 10.520/2002 e do Decreto nº 10.024/2019 – normas essas que regulamentavam esta modalidade de licitação no regime que será derrogado.
A demonstrar esta deferência, os exemplos de semelhança são vários, dos quais se pode citar, notadamente, a precedência da fase de julgamento sobre a habilitação e a preferência da condução do certame por apenas uma pessoa (agente de contratação), sendo permitida a designação de uma equipe de apoio.
A NLLCA determina ainda, por exemplo, no seu art. 29, que o pregão e a concorrência seguem o rito procedimental comum, previsto no art. 17, devendo a primeira modalidade ser adotada sempre que o objeto possuir padrões de desempenho e qualidade que possam ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais de mercado. Igualmente, a nova lei estabelece que o pregão não se aplica às contratações de serviços técnicos especializados de natureza predominantemente intelectual e de obras e serviços de engenharia, exceto os serviços comuns de engenharia (art. 29, parágrafo único, da NLLCA).
Por outro lado, são poucas as diferenças procedimentais trazidas pela NLLCA para a modalidade pregão, em relação à legislação anterior. Vejamos, então, algumas dessas inovações.
A primeira delas diz respeito à adjudicação, que não aparece literalmente como uma etapa na NLLCA (art. 17), à diferença do que ocorre no Decreto nº 10.024/19 (art. 6º, VIII). Embora o ato de adjudicar não seja citado pela nova lei como uma etapa, a adjudicação – ou seja, a atribuição do objeto licitado – deverá ocorrer no mesmo ato da homologação, a ser feito pela autoridade superior, independente se houver ou não recurso (art. 71, IV, NLLCA).
Essa alteração elimina a distinção feita pelo Decreto nº 10.024/19 entre a adjudicação feita pelo pregoeiro, quando não há recurso (art. 17, IX), e a adjudicação feita pela autoridade superior, quando houver recurso (art. 13, V). Pela NLLCA, a adjudicação não existe mais como uma etapa formal, ocorrendo apenas materialmente quando da homologação pela autoridade superior (art. 71, IV, NLLCA).
A NLLCA alterou, também, o prazo mínimo para a apresentação das propostas. Enquanto a Lei nº 10.520/02 determina o prazo não inferior a 8 dias úteis para a apresentação das propostas, contado a partir da publicação do aviso (art. 4º, V, Lei nº 10.520/02), a NLLCA determina o prazo de 8 dias úteis para a aquisição de bens e 10 dias úteis para a aquisição de serviços comuns e de obras e serviços comuns de engenharia, ambos os prazos contados a partir da data de divulgação do edital de licitação (art. 55, I, a, e II, a, da Lei nº 14.133/21). Sendo assim, a NLLCA cria prazos diferentes para a apresentação de propostas para bens (8 dias úteis) e serviços (10 dias úteis) a serem licitados por pregão.
Outra modificação diz respeito à fase de julgamento da proposta, após a disputa de lances e antes da habilitação, na qual passa a ser expressamente possível, desde que previsto em edital, a análise de conformidade do bem ou serviço ofertado pelo licitante provisoriamente vencedor, mediante homologação de amostra, exame de conformidade, prova de conceito e outros testes.
O intuito, com isso, é antecipar a comprovação da aderência da melhor proposta às especificações definidas no termo de referência ou no projeto básico (art. 17, § 3º, da NLLCA), prática que já ocorre licitamente no âmbito de vigência da Lei nº 10.520/2002, mas agora passa a ser expressamente permitida.
Por fim, merece menção, também, a previsão insculpida no art 31, § 1º, da NLLCA, que, tratando da necessidade de contratação de leiloeiro pela Administração, determina expressamente a adoção de credenciamento ou de licitação na modalidade pregão. Optando-se pelo pregão, a Administração deve adotar o critério de julgamento de maior desconto para as comissões a serem cobradas, utilizando como parâmetro máximo os percentuais definidos na lei que regula a profissão de leiloeiro, e observados os valores dos bens a serem leiloados.
Essas são, portanto, algumas das alterações procedimentais trazidas pela NLLCA em relação à legislação anterior do pregão (Lei nº 10.520/02 e Decreto nº 10.024/19). Ainda existem dúvidas se haverá ou não regulamentação, por decreto, do procedimento do pregão conforme a NLLCA. É muito provável que sim. De todo modo, as premissas e as diretrizes foram fixadas pelo novo diploma e encontram-se vigentes e aptas para utilização por todos os níveis da Administração Pública.
Considerações finais
Desde a sua instituição, o pregão revolucionou o ambiente de negócios com o Poder Público, sendo hoje a modalidade de licitação que proporcionalmente mais movimenta recursos públicos, segundo dados disponibilizados no Portal de Compras do Governo Federal.
Diante da importância do tema, buscou-se sintetizar as principais informações sobre o pregão, elencando seus aspectos gerais, a legislação aplicada, tratando do conceito de bens e serviços comuns, e explicando a sua obrigatoriedade.
Nada obstante, tendo a mudança paradigmática promovida pela Lei nº 14.133/2021, a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, buscou-se apresentar como o pregão foi impactado pelo novo regime normativo, ressaltando-se a dimensão das suas semelhanças e os principais pontos de contraste.
Embora seja um procedimento simplificado, a participação em licitações na modalidade pregão pode gerar dúvidas e dificuldades até mesmo para os licitantes mais experientes, sem mencionar as hipóteses em que o recurso administrativo ou a judicialização fazem-se necessários. Nestes casos, o melhor caminho será sempre buscar o auxílio de profissionais da advocacia capacitados e que podem oferecer soluções para as suas demandas.
Referências[+]
↑1 | Fonte: http://paineldecompras.economia.gov.br/processos-compra. Acesso em: 8 ago. 2022. |
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↑2 | Conforme Acórdão 2172/2008 Plenário do TCU, citado em: BRASIL. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. Licitações e contratos: orientações e jurisprudência do TCU. 4.ed. Brasília: TCU, Secretaria-Geral da Presidência. Senado Federal, Secretaria Especial de Editoração e Publicações, 2010, p. 47. |
↑3 | Art. 6º, XXI – […] a) serviço comum de engenharia: todo serviço de engenharia que tem por objeto ações, objetivamente padronizáveis em termos de desempenho e qualidade, de manutenção, de adequação e de adaptação de bens móveis e imóveis, com preservação das características originais dos bens; |
↑4 | Leia-se o teor do art. 1º do Decreto nº 10.024/2019: Art. 1º […]
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Como funciona a etapa preparatória de uma licitação pública: definição dos aspectos da contratação
Diferente do que se imagina, as contratações públicas não têm início com a publicação do Edital. O processo licitatório é um procedimento extenso e dividido em fases, que tem início com a chamada etapa preparatória da contratação pública.
Esta etapa preparatória é destinada a identificar a existência de interesse público na contratação pretendida e a planejar as futuras etapas da contratação.
Depois de elaborados os estudos prévios que justificam e fundamentam a necessidade de contratação pública, a Administração também deve definir aspectos práticos do processo licitatório (caso a seleção do particular não ocorra diretamente, por dispensa ou inexigibilidade de licitação pública). São eles: o edital do certame, a modalidade licitatória, a motivação das condições exigidas no edital e a motivação sobre o momento da divulgação do orçamento da licitação (art. 18, V, VIII, IX e XI da Lei 14.133/2021).
A seguir serão apresentadas as regras e novidades trazidas pela Nova Lei de Licitações a respeito dos aspectos práticos definidos na fase preparatória da licitação pública, além de outros instrumentos de preparação disponíveis à administração pública.
Definição dos aspectos da licitação
A elaboração do edital (art. 18, V) é parte essencial do planejamento do processo licitatório. É este instrumento que regulamentará todo o procedimento após encerrada a fase preparatória da licitação e ao qual estarão vinculados tanto os licitantes quanto a própria Administração. Para tanto, o edital da licitação deve conter (art. 25):
- o objeto da licitação;
- as regras relativas à convocação;
- regras relativas ao julgamento;
- regras relativas à habilitação;
- regras relativas aos recursos e às penalidades da licitação;
- regras relativas à fiscalização e à gestão do contrato;
- regras relativas à entrega do objeto;
- regras relativas às condições de pagamento.
Além de prever todas as regras que orientarão a licitação, a etapa de elaboração do Edital na fase preparatória também deve apresentar a motivação circunstanciada das condições do edital (art. 18, IX). Ou seja, devem ser justificadas as exigências do edital, como, por exemplo, requisitos de qualificação técnica, regras de pontuação e julgamento das propostas e regras para participação de consórcios.
Também nesta fase deve ser definida a modalidade de licitação, o critério de julgamento e o modo de disputa que serão adotados na etapa de seleção da proposta vencedora. Indo além, a Lei também exige que seja demonstrada a adequação e eficiência dos parâmetros escolhidos para a seleção da melhor proposta. Conforme a NLLCA, a Administração Pública pode optar pelos seguintes parâmetros:
Além das modalidades de licitação elencadas, a Administração ainda pode se valer dos procedimentos auxiliares: credenciamento, pré-qualificação, procedimento de manifestação de interesse, sistema de registro de preços e registro cadastral (art. 28, § 1º, e art. 78).
E, ainda, é necessário definir o momento de divulgação do orçamento da licitação. A princípio, a NLLCA assegura a publicidade dos atos praticados no processo licitatório (art. 13), incluindo o orçamento da contratação pública. Contudo, o artigo 24 da mesma lei traz exceção, nos seguintes termos:
Art. 24. Desde que justificado, o orçamento estimado da contratação poderá ter caráter sigiloso, sem prejuízo da divulgação do detalhamento dos quantitativos e das demais informações necessárias para a elaboração das propostas, e, nesse caso:
I – o sigilo não prevalecerá para os órgãos de controle interno e externo;
Parágrafo único. Na hipótese de licitação em que for adotado o critério de julgamento por maior desconto, o preço estimado ou o máximo aceitável constará do edital da licitação.
Desta forma, a Administração possui discricionariedade para definir se o orçamento da contratação pública será ou não sigiloso, desde que justifique a opção adotada (art. 18, XI).
Definição dos aspectos contratuais
Ainda na fase preparatória, além das regras para a etapa de seleção da melhor proposta, a Administração Pública também deve definir as regras para a execução do contrato administrativo. Nesse sentido, deve ser estabelecido, além de outras particularidades do caso concreto, as seguintes condições:
- de execução e pagamento (art. 18, III);
- das garantias exigidas e ofertadas (art. 18, III);
- das condições de recebimento (art. 18, III); e
- o regime de fornecimento de bens de prestação de serviços ou de execução de obras e serviços de engenharia (art. 18, VII)
A definição dos referidos parâmetros será registrada na minuta contratual, que deve ser anexada ao edital do certame (art. 18, VI) e divulgada em sítio eletrônico oficial (art. 25, § 3º).
Análise de riscos
Buscando a otimização das chances de sucesso nos projetos e ganho de eficiência nas contratações públicas, o gerenciamento de riscos ganhou destaque na Lei nº 14.133/2021. Em seu artigo 18, inciso X, essa lei determina que na fase preparatória de todas as licitações deve haver a análise dos riscos que possam comprometer o sucesso da licitação e a boa execução contratual, com apoio na ideia de accountability pública[1]De acordo com o Referencial Básico de Gestão de Riscos do TCU, accountability pública é a “obrigação que têm as pessoas, físicas ou jurídicas, públicas ou privadas, às quais se tenha … Continue reading.
A análise ou avaliação de riscos (risk assessment) e a implementação de medidas para diminuir a probabilidade e os impactos dos riscos negativos (ameaças) ou aumentar a probabilidade e o impacto dos riscos positivos (oportunidades) integram a ideia de gerenciamento de riscos (risk management) de todo o sistema de contratação dos órgãos públicos. Trata-se, essencialmente, de uma atividade de planejamento, que permite à Administração identificar e tratar os riscos nas licitações e nos contratos.
Com efeito, a análise de riscos fornece insumos tanto para que a Administração possa melhorar, construir, gerir e fiscalizar a licitação, assim como para construir a matriz de riscos do contrato, sendo esta uma cláusula contratual que distribui riscos e responsabilidades, em relação ao objeto da contratação, entre a Administração e o futuro contratado.
Neste ponto, é válido o destaque de que a análise de riscos de que trata o artigo 18, inciso X, não se confunde com a matriz de riscos[2]NIEBUHR, Joel de Menezes. Fase preparatória das licitações. In: NIEBUHR, Joel de Menezes (Coord.). Nova lei de licitações e contratos administrativos. 2. ed. Curitiba: Zênite, 2021. p. 80-95.. A análise está em um plano mais amplo e envolve todos os riscos da licitação e da contratação, sendo uma atividade de planejamento e gerenciamento da organização (órgão ou entidade) e dos projetos. A matriz de riscos é um documento/cláusula contratual, decorrente da análise de riscos que distribui riscos apenas do contrato e define o seu equilíbrio econômico-financeiro inicial.
Para exemplificar essa distinção, imagine-se que na etapa de análise de riscos, a Administração verifique, entre outros, estes três riscos:
- risco de que empresas de um determinado ramo com número reduzido de agentes econômicos (players) atuem em conjunto (conluio) para frustrar a competição;
- risco de que ocorra perda de informações em razão de diversas substituições do fiscal do contrato em longo da execução contratual; e
- risco de furto dos materiais da obra durante a execução contratual.
Neste cenário hipotético, o primeiro risco levará a Administração a elaborar regras no instrumento convocatório para coibir atos colusivos contra a licitação pelos futuros licitantes. O segundo risco fará a Administração estabelecer diretrizes internas para que os fiscais do contrato documentem adequadamente as ocorrências durante a execução contratual, evitando a perda de informações. Já o terceiro risco levará a Administração a fixar, na matriz de riscos do contrato, quem será a parte (contratante ou contratada) responsável por garantir a segurança dos materiais da obra, e se haverá direito ao reequilíbrio contratual na ocorrência de furtos[3]O critério de eficiência na alocação de riscos, de acordo com o advogado Lucas Hellmann, do escritório Schiefler Advocacia, tem como primeiro parâmetro alocar o risco “à parte que tem … Continue reading. Veja-se que todos os riscos foram levantados na fase de análise de riscos, mas somente o terceiro é um risco contratual a ser previsto na matriz de riscos do contrato.
Por fim, destaca-se que, embora a análise de riscos seja obrigatória para todas as contratações, a elaboração da matriz de riscos é obrigatória apenas para os contratos estimados de grande vulto (acima de R$ 200 milhões) e para as contratações integradas e semi-integradas (art. 22, § 3º) sendo, portanto, facultativa para os demais contratos. Esse instrumento será detidamente analisado posteriormente.
Audiência e consulta pública
Na fase de planejamento a Administração poderá convocar audiência pública, presencial ou a distância, sobre a licitação que pretende realizar, com disponibilização prévia de informações pertinentes, inclusive de estudo técnico preliminar e elementos do edital de licitação, e com possibilidade de manifestação de todos os interessados.
De igual modo, a Administração também poderá submeter a licitação a prévia consulta pública, mediante a disponibilização de seus elementos a todos os interessados, que poderão formular sugestões, por escrito, no prazo fixado.
O traço distintivo entre a audiência pública e a consulta pública é que, na primeira, os participantes podem se manifestar oralmente em relação ao processo licitatório, enquanto que, na segunda, as manifestações ocorrem por escrito e de modo assíncrono. De acordo com a Nova Lei de Licitações, nenhuma das duas formas de interação entre a Administração e os particulares é obrigatória.
Análise jurídica e publicidade da contratação
A fase de planejamento tem encerramento com o encaminhamento do processo ao órgão de assessoramento jurídico da Administração, que realizará controle prévio de legalidade mediante análise jurídica da contratação (art. 53), seja para as licitações assim como para as contratações diretas, acordos, termos de cooperação, convênios, ajustes, adesões a atas de registro de preços, outros instrumentos congêneres e de seus termos aditivos (art. 53, § 4º).
Essa análise jurídica é dispensada apenas nas hipóteses previamente definidas pela autoridade jurídica máxima competente, que deverá considerar o baixo valor, a baixa complexidade da contratação, a entrega imediata do bem ou a utilização de minutas de editais e instrumentos contratuais padronizados pelo órgão de assessoramento jurídico (art. 53, § 5º).
Por fim, encerrada a instrução do processo sob os aspectos técnico e jurídico, é feita a publicidade do edital de licitação, em seu inteiro teor e com todos os seus anexos, no Portal Nacional de Contratações Públicas (PNCP), conforme determina o artigo 54 da NLLCA. Além da publicação do edital no PNCP, sendo facultada a publicação no site oficial do órgão ou entidade, é obrigatória a publicação de extrato do edital no Diário Oficial da União, do Estado, do Distrito Federal ou do Município, ou, no caso de consórcio público, do ente de maior nível entre eles, bem como em jornal diário de grande circulação (art. 54, § 1º).
Catálogo eletrônico de padronização
Uma inovação trazida pela Nova Lei de Licitação e Contratos Administrativos é a previsão de criação do catálogo eletrônico de padronização de compras, serviços e obras pelos órgãos do Poder Público, instrumento que deverá ser utilizado em licitações cujo critério de julgamento seja o de menor preço ou o de maior desconto e conterá a documentação e os procedimentos próprios da fase interna de licitações, assim como as especificações dos respectivos objetos (art. 19, § 1º). A não utilização do catálogo só é permitida quando devidamente justificada (art. 19, § 2º).
Desta forma, se forem utilizadas as informações do catálogo para subsidiar a licitação, a Administração é dispensada de produzir nova documentação na fase de preparação da licitação. A existência e o efetivo uso de um catálogo eletrônico de padronização leva potencial disruptivo em relação à sistemática anterior, uma vez que a pretensão é que toda a fase de preparatória da licitação seja, no que for possível, padronizada, diminuindo significativamente os esforços casuísticos de planejamento.
Ponto de atenção é que, embora o artigo 19, § 1º, da NLLCA genericamente afirme que o catálogo conterá “toda a documentação e os procedimentos próprios da fase interna de licitações”, é indispensável que a Administração descreva detalhadamente, em todos os processos de contratação (com ou sem a utilização do Catálogo), a necessidade da contratação, considerado o problema a ser resolvido sob a perspectiva do interesse público (elemento integrante do estudo técnico preliminar), uma vez que essa é uma informação própria de cada caso e processo.
No âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional, o catálogo eletrônico de padronização de compras, serviços e obras é regulamentado pela Portaria SEGES/ME nº 938/2022.
Plano de contratações anual
De acordo com o caput do artigo 18 da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, a fase preparatória do processo licitatório é caracterizada pelo planejamento e deve compatibilizar-se com o plano de contratações anual (PAC), sempre que elaborado[4]Instrumento cuja origem remonta à Instrução Normativa nº 1/2018 (já revogada), da Secretaria de Gestão do extinto Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, posteriormente … Continue reading.
Na Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, o plano de contratações anual foi incorporado em seu artigo 12, inciso VII, mas é o artigo 5º do Decreto Federal nº 10.947/2022 – diploma que regulamenta o instrumento no âmbito federal – que melhor aponta os objetivos do PAC. São eles:
- racionalizar as contratações das unidades administrativas de sua competência, por meio da promoção de contratações centralizadas e compartilhadas, a fim de obter economia de escala, padronização de produtos e serviços e redução de custos processuais;
- garantir o alinhamento com o planejamento estratégico, o plano diretor de logística sustentável e outros instrumentos de governança existentes;
- subsidiar a elaboração das leis orçamentárias;
- evitar o fracionamento de despesas; e
- sinalizar intenções ao mercado fornecedor, de forma a aumentar o diálogo potencial com o mercado e incrementar a competitividade.
Assim, o plano de contratações anual se afigura como um instrumento que busca concretizar, a um só tempo, diversos princípios das licitações e contratos públicos, como o do planejamento, da eficiência, da transparência, da segurança jurídica, da eficácia, da competitividade, da celeridade, da economicidade e do desenvolvimento nacional sustentável, todos encartados no artigo 5º da Lei nº 14.133/2021.
Neste sentido, ainda que o artigo 12, inciso VII, da NLLCA afirme que “a partir de documentos de formalização de demandas, os órgãos responsáveis pelo planejamento de cada ente federativo poderão, na forma de regulamento, elaborar plano de contratações anual”, a elaboração do plano se trata “de um ‘poder-dever’, na medida em que prestigia toda a principiologia afeta às contratações públicas, compreendendo mecanismo estratégico importante para a eficiência administrativa”[5]Consultoria Zênite. Plano de Contratações Anual: mecanismo estratégico das contratações públicas, agora regulamentado pelo Decreto nº 10.947/2022. Curitiba: 2022. Disponível em: … Continue reading, como pontua a Consultoria Zênite.
Ademais, de acordo com o mesmo inciso VII do artigo 12 da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, cabe aos entes federativos regulamentarem o plano de contratações anual, de acordo com as características e peculiaridades locais.
Na esfera federal, essa regulamentação foi feita pelo supramencionado Decreto Federal nº 10.947/2022, que estabelece requisitos, diretrizes e regras para a elaboração do PAC, com destaque para a obrigatoriedade da elaboração do plano no âmbito da administração pública federal direta, autárquica e fundacional, inclusive para as contratações diretas e com recursos oriundos de empréstimos e doações (art. 6º, I e II), excetuando-se as contratações elencadas no art. 7º; e a fixação de uma data limite para a realização do plano (até a primeira quinzena de maio de cada exercício, em relação às contratações pretendidas para o exercício subsequente).
Conclusão
Conhecer a etapa preparatória de uma licitação é essencial para qualquer licitante que busque ingressar no mercado de vendas públicas com segurança e garantir o sucesso do negócio.
O conhecimento das diretrizes planejadas pelo poder público garantem também a organização e o planejamento da empresa licitante para atender ao futuro contrato administrativo, além de permitir a verificação da legalidade do processo licitatório.
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Referências[+]
↑1 | De acordo com o Referencial Básico de Gestão de Riscos do TCU, accountability pública é a “obrigação que têm as pessoas, físicas ou jurídicas, públicas ou privadas, às quais se tenha confiado recursos públicos, de assumir as responsabilidades de ordem fiscal, gerencial e programática que lhes foram conferidas, e de informar a sociedade e a quem lhes delegou essas responsabilidades sobre o cumprimento de objetivos e metas e o desempenho alcançado na gestão dos recursos públicos. É, ainda, obrigação imposta a uma pessoa ou entidade auditada de demonstrar que administrou ou controlou os recursos que lhe foram confiados em conformidade com os termos segundo os quais eles lhe foram entregues” (BRASIL. Tribunal de Contas da União. Referencial básico de gestão de riscos. Brasília: Tribunal de Contas da União, 2018). |
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↑2 | NIEBUHR, Joel de Menezes. Fase preparatória das licitações. In: NIEBUHR, Joel de Menezes (Coord.). Nova lei de licitações e contratos administrativos. 2. ed. Curitiba: Zênite, 2021. p. 80-95. |
↑3 | O critério de eficiência na alocação de riscos, de acordo com o advogado Lucas Hellmann, do escritório Schiefler Advocacia, tem como primeiro parâmetro alocar o risco “à parte que tem capacidade de, a um menor custo, prevenir a ocorrência do evento indesejado ou de promover o evento desejável ou, ainda, de controlar as consequências da sua materialização”. Sendo assim, no caso de furtos em obras, esse risco deve ser, via de regra, alocado ao particular, pois “é a parte que, a custo mais baixo, pode implementar medidas para evitar a ocorrência desses eventos” (HELLMANN, Lucas. A alocação eficiente de riscos contratuais conforme a Lei nº 14.133/2021: por um método de repartição de responsabilidades com a manutenção do equilíbrio econômico financeiro dos contratos administrativos. 2021. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Direito) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2021. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/228676. Acesso em 21 mar. 2022). |
↑4 | Instrumento cuja origem remonta à Instrução Normativa nº 1/2018 (já revogada), da Secretaria de Gestão do extinto Ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão, posteriormente substituída pela Instrução Normativa nº 1/2019, da Secretaria de Gestão do Ministério da Economia. |
↑5 | Consultoria Zênite. Plano de Contratações Anual: mecanismo estratégico das contratações públicas, agora regulamentado pelo Decreto nº 10.947/2022. Curitiba: 2022. Disponível em: https://zenite.blog.br/plano-de-contratacoes-anual-mecanismo-estrategico-das-contratacoes-publicas-agora-regulamentado-pelo-decreto-no-10-947-2022/. Acesso em: 21 mar. 2022. |
Como funciona a etapa preparatória de uma licitação pública: estudos preliminares
A licitação é o processo administrativo típico por meio do qual a Administração Pública seleciona o particular com quem celebrará um contrato administrativo. Por meio deste contrato, a Administração Pública obriga-se a adquirir ou vender um bem, ou a receber a prestação de um serviço, ou então a promover a delegação de uma atividade de utilidade pública. Trata-se de um processo complexo e dividido em fases, que tem início com a fase preparatória.
A fase preparatória é caracterizada pelo planejamento da contratação pretendida pelo órgão ou entidade pública. É a pedra fundamental de qualquer processo licitatório (ou processo de contratação direta, que ocorre por meio de dispensa ou inexigibilidade de licitação) e a maior responsável pelo sucesso do futuro contrato. Afinal de contas, é durante o planejamento da licitação pública que são levantadas e definidas as informações técnicas e financeiras essenciais para que a execução contratual ocorra conforme o esperado.
Inclusive, uma auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) em 2019[1]BRASIL. Tribunal de Contas da União. Auditoria Operacional Sobre Obras Paralisadas. Brasília: Tribunal de Contas da União, 2018. Disponível em: … Continue reading, a partir de um levantamento de mais de 38 mil contratos de obras públicas financiadas com recursos federais, verificou-se que o Brasil possuía mais de 14 mil obras paralisadas ou inacabadas, o que representava cerca de 37,5% de todas as obras contratadas e ainda não concluídas. O mesmo estudo apontou que 47% das paralisações (dentre os contratos do Programa de Aceleração do Crescimento) foram motivadas por problemas técnicos, e 10% por problemas financeiros. Ou seja, mais da metade das obras estava paralisada diretamente em razão de deficiências no planejamento (técnico e/ou financeiro) das contratações.
Tais dados demonstram a importância da fase preparatória das contratações públicas e os grandes impactos negativos que um planejamento deficitário gera à própria Administração, assim como aos contratados e, principalmente, à sociedade, que paga por um produto, serviço ou obra que não é entregue adequadamente.
A Lei nº 14.133/2021 (Nova Lei de Licitação e Contratos Administrativos) parte desse diagnóstico e, diferentemente da Lei nº 8.666/1993, dá grande atenção à fase preparatória da licitação, elevando a etapa de planejamento ao patamar de princípio jurídico (embora se qualifique, em verdade, como uma diretriz) e estabelecendo procedimentos mínimos que devem ser realizados pelos gestores públicos, notadamente a partir do seu artigo 18.
Neste texto, veremos os principais aspectos e os estudos preliminares exigidos na fase preparatória da licitação de acordo com a Nova Lei de Licitação e Contratos Administrativos.
ESTUDO TÉCNICO PRELIMINAR
Um processo de contratação pública, seja ele com ou sem uma licitação, tem sua origem quando a Administração identifica uma necessidade, interna (em relação à infraestrutura do órgão/entidade) ou externa (em relação aos cidadãos e à comunidade), e constata que possivelmente deverá firmar um contrato com algum particular para suprir essa necessidade.
Para descobrir a melhor solução técnica e jurídica para suprir essa necessidade verificada, a Administração precisa analisá-la e detalhá–la pormenorizadamente, o que é feito com o estudo técnico preliminar (ETP). Este documento se destina à investigação e ao levantamento de informações sobre a melhor solução contratual para o caso concreto, podendo levar a uma conclusão positiva ou negativa sobre a contratação.
O estudo técnico preliminar é, portanto, o ponto de partida da contratação, sendo conceituado pelo artigo 6º, XX, da NLLCA como o “documento constitutivo da primeira etapa do planejamento de uma contratação que caracteriza o interesse público envolvido e a sua melhor solução e dá base ao anteprojeto, ao termo de referência ou ao projeto básico a serem elaborados caso se conclua pela viabilidade da contratação”. Contudo, é no artigo 18 da mesma lei em que estão regulamentadas as suas características e conteúdo.
O objetivo do ETP é formalizar, em documento integrante e obrigatório do processo licitatório, as conclusões obtidas na fase de planejamento da licitação. O documento deve conter o problema identificado pela Administração pública que se pretende resolver com a licitação e a possível solução que se deseja alcançar com a contração pública. Estes insumos permitem avaliar a viabilidade técnica e econômica da contratação com maior concretude.
Conforme o parágrafo 1º do artigo 18, para que se atinja o objetivo desejado, o estudo técnico preliminar deve conter:
- descrição da necessidade da contratação, considerado o problema a ser resolvido sob a perspectiva do interesse público;
- demonstração da previsão da contratação no plano de contratações anual – instrumento que será melhor analisado a seguir -, sempre que elaborado, de modo a indicar o seu alinhamento com o planejamento da Administração;
- requisitos da contratação;
- estimativas das quantidades para a contratação, acompanhadas das memórias de cálculo e dos documentos que lhes dão suporte, que considerem interdependências com outras contratações, de modo a possibilitar economia de escala;
- levantamento de mercado, que consiste na análise das alternativas possíveis, e justificativa técnica e econômica da escolha do tipo de solução a contratar;
- estimativa do valor da contratação, acompanhada dos preços unitários referenciais, das memórias de cálculo e dos documentos que lhe dão suporte, que poderão constar de anexo classificado, se a Administração optar por preservar o seu sigilo até a conclusão da licitação;
- descrição da solução como um todo, inclusive das exigências relacionadas à manutenção e à assistência técnica, quando for o caso;
- justificativas para o parcelamento ou não da contratação;
- demonstrativo dos resultados pretendidos em termos de economicidade e de melhor aproveitamento dos recursos humanos, materiais e financeiros disponíveis;
- providências a serem adotadas pela Administração previamente à celebração do contrato, inclusive quanto à capacitação de servidores ou de empregados para fiscalização e gestão contratual;
- contratações correlatas e/ou interdependentes;
- descrição de possíveis impactos ambientais e respectivas medidas mitigadoras, incluídos requisitos de baixo consumo de energia e de outros recursos, bem como logística reversa para desfazimento e reciclagem de bens e refugos, quando aplicável;
- posicionamento conclusivo sobre a adequação da contratação para o atendimento da necessidade a que se destina.
O ideal é que a Administração busque elaborar o estudo técnico preliminar com o maior nível de detalhamento possível. Contudo, dos requisitos elencados acima, são obrigatórios: a descrição da necessidade de contratação, as estimativas de quantidades a serem contratadas, a estimativa de valor da contratação, a justificativa para parcelamento ou não do valor total e o posicionamento conclusivo sobre a adequação da contratação para o atendimento da necessidade (alíneas ‘a’, ‘d’, ‘f’, ‘h’ e ‘m’), conforme previsto pelo artigo 18, § 2º, devendo a Administração justificar a impossibilidade de explicitar as demais informações.
De forma adicional, a Instrução Normativa SEGES nº 58/2022[2]Disponível em: … Continue reading regulamenta a elaboração do ETP em nível federal e traz esclarecimentos sobre o disposto na Nova Lei de Licitações.
Em outras palavras, o ETP é o documento em que a Administração realiza uma investigação sobre as diferentes alternativas disponíveis para a contratação, sendo que, ao final, elegerá uma delas, a qual servirá como base para a elaboração do termo de referência, anteprojeto, projeto básico e/ou projeto executivo, conforme o caso. Além disso, o estudo técnico preliminar é o documento que servirá como base para a elaboração do anteprojeto, do termo de referência e/ou do projeto básico.
TERMO DE REFERÊNCIA, ANTEPROJETO, PROJETO BÁSICO E PROJETO EXECUTIVO
Ainda na fase de planejamento, a partir do estudo técnico preliminar (ETP), a Administração deve definir exatamente qual o objeto a ser contratado para atender as necessidades encontradas. Isto será detalhado no termo de referência, anteprojeto, projeto básico e/ou projeto executivo. A definição de qual(is) documento(s) será(ão) elaborado(s) depende da natureza do objeto a ser licitado.
Para a contratação de bens e serviços, o termo de referência é o documento necessário, cujo conteúdo deve abarcar, no mínimo, os seguintes elementos (art. 6, XXIII):
- definição do objeto, incluídos sua natureza, os quantitativos, o prazo do contrato e, se for o caso, a possibilidade de sua prorrogação;
- fundamentação da contratação, que consiste na referência aos estudos técnicos preliminares correspondentes ou, quando não for possível divulgar esses estudos, no extrato das partes que não contiverem informações sigilosas;
- descrição da solução como um todo, considerado todo o ciclo de vida do objeto;
- requisitos da contratação;
- modelo de execução do objeto, que consiste na definição de como o contrato deverá produzir os resultados pretendidos desde o seu início até o seu encerramento;
- modelo de gestão do contrato, que descreve como a execução do objeto será acompanhada e fiscalizada pelo órgão ou entidade;
- critérios de medição e de pagamento;
- forma e critérios de seleção do fornecedor;
- estimativas do valor da contratação, acompanhadas dos preços unitários referenciais, das memórias de cálculo e dos documentos que lhe dão suporte, com os parâmetros utilizados para a obtenção dos preços e para os respectivos cálculos, que devem constar de documento separado e classificado;
- adequação orçamentária.
Em se tratando de aquisição de bens, a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos estabelece que os itens de consumo adquiridos para suprir as demandas das estruturas da Administração Pública deverão ser de qualidade comum, isto é, não superior à necessária para cumprir as finalidades às quais se destinam, vedada a aquisição de artigos de luxo (art. 20). A definição do que são os “artigos de luxo” é delegada aos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário de cada ente federativo, por meio de regulamento próprio – no âmbito do Poder Executivo Federal, a regulamentação é feita pelo Decreto nº 10.818/2021.
Ademais, buscando dar concretude ao princípio do desenvolvimento nacional sustentável, o artigo 26 da NLLCA autoriza a Administração a estabelecer margem de preferência para bens manufaturados e serviços nacionais que atendam a normas técnicas brasileiras (ou para bens manufaturados e serviços originários de Estados Partes do Mercado Comum do Sul – Mercosul, desde que haja reciprocidade com o país de origem) e bens reciclados, recicláveis ou biodegradáveis, conforme regulamento. Tal margem de preferência poderá ser de até 10% sobre o preço dos bens e serviços que não se enquadrem nessa qualidade (art. 26, § 1º, II) e de até 20% se os bens manufaturados nacionais e serviços nacionais forem resultantes de desenvolvimento e inovação tecnológica no País, definidos conforme regulamento do Poder Executivo federal (art. 26, § 2º).
Vale destacar, contudo, que, embora a fixação de margens de preferência em relação à procedência dos objetos já fosse prevista na Lei nº 8.666/1993, a sua adoção é bastante rara nas licitações, sobretudo porque implica a possibilidade de contratação mais custosa aos órgãos e entidades.
Já para a contratação de obras e serviços de engenharia, a NLCCA prevê que o processo de contratação deve ser instruído, alternativa ou cumulativamente, pelos projetos básico e executivo e pelo anteprojeto. A necessidade de elaboração de cada documento dependerá do regime de execução eleito pela Administração.
O projeto básico é o documento que apresenta o conjunto de elementos necessários e suficientes, com nível de precisão adequado, para definir e dimensionar a(s) obra(s) ou o(s) serviço(s) objeto(s) da licitação, elaborado com base nas indicações dos estudos técnicos preliminares. Seu objetivo é assegurar a viabilidade técnica e o adequado tratamento do impacto ambiental do empreendimento e possibilitar a avaliação do custo da obra e a definição dos métodos e do prazo de execução. Tal documento deve conter, no mínimo, os seguintes elementos (art. 6º, XXV):
- levantamentos topográficos e cadastrais, sondagens e ensaios geotécnicos, ensaios e análises laboratoriais, estudos socioambientais e demais dados e levantamentos necessários para execução da solução escolhida;
- soluções técnicas globais e localizadas, suficientemente detalhadas, de forma a evitar, por ocasião da elaboração do projeto executivo e da realização das obras e montagem, a necessidade de reformulações ou variantes quanto à qualidade, ao preço e ao prazo inicialmente definidos;
- identificação dos tipos de serviços a executar e dos materiais e equipamentos a incorporar à obra, bem como das suas especificações, de modo a assegurar os melhores resultados para o empreendimento e a segurança executiva na utilização do objeto, para os fins a que se destina, considerados os riscos e os perigos identificáveis, sem frustrar o caráter competitivo para a sua execução;
- informações que possibilitem o estudo e a definição de métodos construtivos, de instalações provisórias e de condições organizacionais para a obra, sem frustrar o caráter competitivo para a sua execução;
- subsídios para montagem do plano de licitação e gestão da obra, compreendidos a sua programação, a estratégia de suprimentos, as normas de fiscalização e outros dados necessários em cada caso;
- orçamento detalhado do custo global da obra, fundamentado em quantitativos de serviços e fornecimentos propriamente avaliados, não sendo obrigatório para os regimes de execução integrada e semi-integrada, e obrigatório para os demais.
Com base em todas as informações coletadas nos estudos e no projeto básico, é elaborado o projeto executivo, compreendido como o conjunto de elementos necessários e suficientes à execução completa da obra, com o detalhamento das soluções previstas no projeto básico, a identificação de serviços, de materiais e de equipamentos a serem incorporados à obra, bem como suas especificações técnicas, de acordo com as normas técnicas pertinentes (art. 6º, XXVI).
Contudo, que a elaboração dos projetos básico e executivo pode ser dispensada ou transferida da Administração ao particular futuro contratado, a depender da natureza do objeto e do regime de execução contratual eleito. Isso porque, se no estudo técnico preliminar for constatado que a necessidade pode ser atendida pela contratação de obras e serviços comuns de engenharia[3]De acordo com a alínea “a” do inciso XXI do artigo 6º da NLLCA, serviço comum de engenharia é “todo serviço de engenharia que tem por objeto ações, objetivamente padronizáveis em termos … Continue reading, a especificação do objeto poderá ser realizada apenas em termo de referência ou em projeto básico, dispensada a descrição detalhada da solução no ETP ou a elaboração de outros projetos – e desde que seja demonstrada a inexistência de prejuízo para a aferição dos padrões de desempenho e qualidade almejados (art. 18, § 3º).
Além disso, se for adotado o regime de execução semi-integrada, a Administração também é dispensada de elaborar o projeto executivo, o qual ficará à cargo do futuro contratado – sendo permitida a alteração de determinados pontos do projeto básico, previamente identificados pela Administração.
Por outro lado, se o regime adotado for o de execução integrada, ambos os projetos básico e executivo serão de responsabilidade do futuro contratado. Neste caso, a Administração deve disponibilizar o anteprojeto, que é, de acordo com a definição trazida pelo artigo 6º, inciso XXIV, a peça técnica com todos os subsídios necessários à elaboração do projeto básico, devendo conter, no mínimo, os seguintes elementos:
- demonstração e justificativa do programa de necessidades, avaliação de demanda do público-alvo, motivação técnico-econômico-social do empreendimento, visão global dos investimentos e definições relacionadas ao nível de serviço desejado;
- condições de solidez, de segurança e de durabilidade;
- prazo de entrega;
- estética do projeto arquitetônico, traçado geométrico e/ou projeto da área de influência, quando cabível;
- parâmetros de adequação ao interesse público, de economia na utilização, de facilidade na execução, de impacto ambiental e de acessibilidade;
- proposta de concepção da obra ou do serviço de engenharia;
- projetos anteriores ou estudos preliminares que embasaram a concepção proposta;
- levantamento topográfico e cadastral;
- pareceres de sondagem;
- memorial descritivo dos elementos da edificação, dos componentes construtivos e dos materiais de construção, de forma a estabelecer padrões mínimos para a contratação.
Destaca-se, por fim, que nas contratações integradas e semi-integradas, os riscos decorrentes de fatos supervenientes à contratação associados à escolha da solução de projeto pelo contratado deverão ser alocados como de sua responsabilidade na matriz de riscos (art. 22, § 4º).
Ou seja, na contratação semi-integrada, o contratado é responsável pelas soluções técnicas que ele mesmo definiu no projeto executivo, ficando a Administração responsável, via de regra, pelas soluções definidas no projeto básico. Já na contratação integrada, o particular é responsável pelas soluções dos projetos básico e executivo, restando a Administração responsável pelos riscos decorrentes das soluções por ela fixadas no anteprojeto. A lógica aqui é que “a parte que elabora o projeto e define as soluções a serem adotadas deve arcar com os riscos associados, pois ela é, em primeira análise, a parte capaz de evitar esses riscos, elaborando adequadamente os estudos técnicos”[4]HELLMANN, Lucas. A alocação eficiente de riscos contratuais conforme a Lei nº 14.133/2021: por um método de repartição de responsabilidades com a manutenção do equilíbrio econômico … Continue reading.
CONCLUSÃO
Dando diretrizes práticas ao planejamento da licitação, a Lei nº 14.133/2021 prevê com maior riqueza de detalhes que a lei anterior (Lei nº 8.666/1993) a fase preparatória da licitação, trazendo definições e regramentos específicos para os diversos tipos de estudos preparatórios para a contratação pública.
As referidas etapas preparatórias são de extrema importância não apenas para a Administração Pública, mas também para as empresas que pretendem realizar contratos administrativos. A adequação com as diretrizes planejadas pelo poder público e o conhecimento integral do planejamento da contratação são fatores essenciais para o sucesso do negócio.
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Referências[+]
↑1 | BRASIL. Tribunal de Contas da União. Auditoria Operacional Sobre Obras Paralisadas. Brasília: Tribunal de Contas da União, 2018. Disponível em: https://portal.tcu.gov.br/biblioteca-digital/auditoria-operacional-sobre-obras-paralisadas.htm. Acesso em: 9 mar. 2022. |
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↑2 | Disponível em: https://www.gov.br/compras/pt-br/acesso-a-informacao/legislacao/instrucoes-normativas/instrucao-normativa-seges-no-58-de-8-de-agosto-de-2022#:~:text=AGOSTO%20DE%202022-,INSTRU%C3%87%C3%83O%20NORMATIVA%20SEGES%20N%C2%BA%2058%2C%20DE%208%20DE%20AGOSTO%20DE,sobre%20o%20Sistema%20ETP%20digital |
↑3 | De acordo com a alínea “a” do inciso XXI do artigo 6º da NLLCA, serviço comum de engenharia é “todo serviço de engenharia que tem por objeto ações, objetivamente padronizáveis em termos de desempenho e qualidade, de manutenção, de adequação e de adaptação de bens móveis e imóveis, com preservação das características originais dos bens”. |
↑4 | HELLMANN, Lucas. A alocação eficiente de riscos contratuais conforme a Lei nº 14.133/2021: por um método de repartição de responsabilidades com a manutenção do equilíbrio econômico financeiro dos contratos administrativos. 2021. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Direito) – Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2021. Disponível em: https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/228676. Acesso em: 21 mar. 2022. |