O que é diferente em uma licitação de publicidade?
Diferenciando-se de outros tipos de contratação, os serviços ou contratos de publicidade possuem natureza altamente criativa e estratégica, principalmente no contexto da publicidade institucional promovida pelo Poder Público.
Por esse motivo, as licitações de publicidade não podem considerar, para o julgamento das propostas técnicas das licitantes, apenas fatores objetivos, pois, do contrário, não seria possível encontrar a proposta técnica qualitativamente mais vantajosa ao Poder Público.
Por mais que preços e prazos continuem sendo importantes, licitações para contratação de serviços de publicidade precisam pontuar a capacidade das agências de criar e executar campanhas que envolvam imaginação, originalidade e sensibilidade, e que, portanto, demonstrem que a empresa licitante tenha a capacidade de transmitir maneira eficaz a mensagem pretendida pelo órgão ou pela entidade da Administração, contratante.
Neste texto, são apresentadas distinções importantes e características únicas desse modelo de contratação.
Primeiramente, considerando que existem elementos não objetivos e, essencialmente, criativos que precisam ser avaliados quando do julgamento das propostas técnicas, é de fundamental importância que os avaliadores do certame – em regra, uma Subcomissão Técnica – disponham da expertise necessária para essa análise e sejam imparciais na aplicação das notas.
Neste sentido, por ser condizente com o interesse público que se busque a contratação de agência(s) cujo trabalho exala qualidade técnica, a Lei nº 12.232/2010 prevê que a Subcomissão Técnica será composta por profissionais com formação em comunicação, publicidade ou marketing ou que, apesar de formados em outro campo, atuem em uma dessas áreas.
As regras relacionadas com o sorteio e a seleção dos integrantes da Subcomissão Técnica estão dispostas no art. 10 da Lei 12.232/2010, norma que trata especificamente da contratação de serviços de publicidade pelos órgãos públicos, segundo a qual, dentre outras obrigações de sorteio, ao menos 1/3 dos membros julgadores não poderão manter nenhum vínculo funcional ou contratual, direto ou indireto, com o órgão ou entidade responsável pela licitação.
Pelo mesmo motivo, ou seja, também em decorrência da importância de se assegurar que a agência contratada tem as habilidades técnicas necessárias para o atendimento do contrato, enquanto as Leis Gerais de Licitação (Lei nº 8.666/1993 e Lei nº 14.133/2021) prevêem critérios de seleção guiados exclusivamente pela rentabilidade financeira do contrato, as contratações regidas pela Lei nº 12.232/10 priorizam o elemento “técnica”. Consequentemente, serviços de publicidade não podem ser contratados por “menor preço” ou “maior retorno econômico”, mas apenas por “melhor técnica” ou “técnica e preço”.
Além disso, as propostas técnicas e a forma como estas são apresentadas também devem obedecer a certas peculiaridades, as quais merecem ser pontuadas.
Inicialmente, é interessante notar que as propostas técnicas de licitações de publicidade possuem dois objetivos principais, sendo eles (i) comprovar a qualidade artística do trabalho da agência e (ii) comprovar a capacidade da agência de atender ao contrato objeto de dada licitação. Por esse motivo, as propostas técnicas são divididas, como regra, em 3 envelopes:
Envelope 1 – Campanha simulada, em via anônima (Plano de Comunicação Publicitária – Via Não Identificada)
Envelope 2 – Versão identificada da campanha simulada (Plano de Comunicação Publicitária – Via Identificada)
Envelope 3 – Elementos que comprovem a capacidade da agência de atender ao contrato (geralmente distribuídos nos quesitos Capacidade de Atendimento, Repertório e Relatos de Soluções de Problemas de Comunicação)
É no Plano de Comunicação Publicitária que a licitante demonstra ao futuro órgão ou entidade pública contratante sua habilidade e criatividade para construir e operacionalizar a divulgação de uma campanha publicitária, geralmente baseada em um caso fictício, com um problema de comunicação a ser resolvido pela(s) licitante(s), estabelecido no edital, comumente denominado “briefing”. Conquanto possa haver variações, geralmente os editais de licitações de publicidade tratam o Plano de Comunicação como um quesito único, subdividido em quatro subquesitos para fins de avaliação, a saber:
- Raciocínio Básico: no qual a licitante deverá demonstrar que entendeu a proposta de campanha apresentada no briefing e a problemática a ser resolvida pela agência a partir dela;
- Estratégia de Comunicação Publicitária: na qual a licitante deverá apresentar sua estratégia de campanha sugerida para resolver o problema de comunicação apresentado no briefing do processo licitatório;
- Ideia Criativa: na qual a licitante deverá apresentar uma lista escrita de peças que seriam utilizadas nessa campanha, além de elaborar e apresentar, dentre essas, as peças publicitárias que considerar mais importantes para o sucesso da campanha proposta, geralmente chamadas de “peças corporificadas” ou “exemplificadas”, que podem ser impressas ou digitais, a depender da estratégia e do que requer o edital; e
- Estratégia de Mídia e Não Mídia (e anexos): na qual a licitante esmiúça a estratégia de veiculação da campanha e das peças propostas por ela, detalhando os valores utilizados, o quantitativo de inserções e impressões de cada peça, o período de veiculação da campanha, etc.
Os envelopes que geralmente são numerados como 1 (Plano de Comunicação – Via Não Identificada) e 2 (Plano de Comunicação – Via Identificada) devem possuir o mesmo conteúdo. No entanto, é essencial que o primeiro não contenha nenhum elemento que permita a identificação de sua autoria.
Como o julgamento da campanha simulada contém, inevitavelmente, certo grau de subjetividade quanto à qualidade das peças, à escolha da estratégia e ao uso de um veículo ou outro, a exigência de anonimização busca assegurar um julgamento final imparcial e objetivo.
O envelope que comumente é numerado como “Envelope 3”, por sua vez, será identificado e assinado pela licitante, e conterá informações referentes ao proponente, as quais, nos termos do art. 8º da Lei 12.232/2010, devem buscar atestar a capacidade de atendimento deste, assim como o nível dos trabalhos por ele realizados para outros clientes.
Ou seja, essa “segunda etapa” (dividida apenas para fins formais, mas avaliada conjuntamente no certame) da proposta técnica tem o objetivo de convencer a Subcomissão Técnica da expertise da agência licitante e de sua capacidade de atender ao órgão contratante com excelência.
Por isso, é possível que a agência tenha que apresentar seus profissionais e seus respectivos currículos, seus clientes, as ferramentas de marketing que utiliza para preparar a estratégia e a campanha (o que geralmente é resumido no quesito “Capacidade de Atendimento”), um portfólio de trabalhos anteriores (o que geralmente é resumido no quesito “Repertório”) e atestados de clientes anteriores sobre os trabalhos realizados (o que geralmente é resumido no quesito “Relatos de Soluções de Problemas de Comunicação”), dentre outros.
Ainda que estas sejam apenas algumas das várias características únicas de uma licitação de publicidade, fica claro que se trata de um processo de licitatório bastante diferente de pregões e de concorrências para execução de obras e serviços ordinários, o que enseja, da agência de publicidade participante, o conhecimento profundo das normas aplicáveis e dos ritos e pormenores do certame.
Dessa forma, seja você uma agência de publicidade mais experientes em licitações, seja uma agência com menor experiência no nicho, recomenda-se que contate um especialista de sua confiança para acompanhá-lo nesses processos licitatórios e garantir a maior chance de êxito possível.
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Read MoreOs efeitos da penalidade retroagem ou não aos contratos celebrados em momento anterior ao da sanção?
Os contratos administrativos vigentes e a superveniência de sanção restritiva do direito de licitar e de contratar: os efeitos da penalidade retroagem ou não aos contratos celebrados em momento anterior ao da sanção?
Se a dúvida sobre a amplitude da penalidade de suspensão de contratar com a Administração já é bastante pertinente (se é restrita ao ente sancionador ou abrange toda a administração pública brasileira[1]), há ainda outra questão a ser enfrentada no que toca ao tema: afinal, a suspensão temporária para contratar com a Administração – ou outra penalidade análoga, como a declaração de inidoneidade ou o impedimento de licitar e de contratar – produz efeito ex nunc ou ex tunc no que toca aos contratos vigentes, celebrados em momento anterior ao da infração?
Para que seja sanada esta dúvida, deve-se, primeiramente, recorrer à Lei nº 8.666/93, a Lei de Licitações e Contratos Administrativos.
Em seu artigo 87, a Lei dispõe, em ordem crescente de gravidade, sobre as sanções administrativas aplicáveis aos contratados que não honrarem o contrato administrativo, quer pela inexecução parcial, quer pela inexecução total das obrigações nele avençadas.
Em específico, os incisos III e IV desse artigo tratam, respectivamente, da sanção de suspensão temporária do direito de participação em processo licitatório e impedimento de contratar com a Administração, e da declaração de inidoneidade. Leia-se:
Art. 87. Pela inexecução total ou parcial do contrato a Administração poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções:
[…]
III – suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, por prazo não superior a 2 (dois) anos;
IV – declaração de inidoneidade para licitar ou contratar com a Administração Pública enquanto perdurarem os motivos determinantes da punição ou até que seja promovida a reabilitação perante a própria autoridade que aplicou a penalidade, que será concedida sempre que o contratado ressarcir a Administração pelos prejuízos resultantes e após decorrido o prazo da sanção aplicada com base no inciso anterior.
Percebe-se, da leitura do dispositivo, que inexiste expressão na norma a qual ampare a interpretação literal de que esta sanção administrativa, em regra, possuiria efeitos retroativos.
Esta conclusão apoia-se também no princípio da legalidade, insculpido no artigo 37 da Constituição Federal e que rege toda a atividade da Administração Pública, sendo verdadeira pedra-basilar, de modo que não se pode presumir na Lei o que não está nela escrito, sobretudo em se tratando de direito sancionatório.
Assim, ao menos no que toca à eficácia direta da sanção, não há dúvidas de que seus efeitos promanam-se, em regra, prospectivamente, e não de maneira ex tunc. E desse entendimento não destoa a jurisprudência, que o aplica com tal efeito à mais grave sanção de declaração de inidoneidade, prevista no inciso IV do mesmo artigo. Leia-se:
Administrativo. Declaração de lnidoneidade para licitar e contratar com a Administração Pública. Efeitos ex nunc da Declaração de lnidoneidade: Significado. Precedente da 1.ª Seção (STJ, MS 13.964/DF, DJe de 25/05/2009).
Portanto, da Lei Federal nº 8.666/1993 extrai-se interpretação sólida e benéfica ao licitante/contratado, de que a penalidade de suspensão temporária de participar em licitação e impedimento de contratar com a Administração, ou mesmo a declaração de inidoneidade, produz efeito ex nunc (isto é, prospectivo – ao futuro), e não ex tunc (isto é, retroativo – ao passado).
No entanto, reside ainda a seguinte dúvida: os efeitos da sanção são, em regra, prospectivos, não havendo o que se cogitar de anulação de contratação vigente e sem relação com o vício que levou à sanção; mas, afinal, aplicar-se-á a penalidade, mesmo que prospectivamente, de alguma forma, aos contratos e licitações vigentes à época da declaração da sanção? Ou seja, ainda que não se reconheça a aplicação retroativa, o futuro das licitações e dos contratos em andamento poderá ser afetado? Será necessário promover a rescisão contratual?
Se a questão ventilada anteriormente é de menor controvérsia, não o é esta última.
No entendimento de Marçal Justen Filho, em relação à eficácia da punição sobre contratos vigentes, “O art. 55, XIII, determina que o contratado deverá manter os requisitos de habilitação e qualificação ao longo da execução do contrato. Essa disciplina é compatível com o entendimento de que o preenchimento dos requisitos de habilitação envolvem não propriamente uma formalidade a ser cumprida somente por ocasião da licitação, mas evidenciam a capacitação do sujeito para executar a contratação. Portanto, desaparecido o requisito de habilitação durante a contratação, o contrato deve ser rescindido.”.[2]
Malgrado o entendimento do reconhecido jurista, verifica-se, em certos órgãos de controle, como o Tribunal de Contas da União (TCU), a existência de entendimento diverso: de que as sanções impeditivas do direito de licitar e de contratar não atingem, em regra, os contratos em curso.
A propósito, veja-se acórdão prolatado pelo Plenário do TCU em setembro de 2019, relatado pelo Ministro Augusto Sherman Cavalcanti:
Voto
12. Com efeito, a despeito da proximidade das datas, a superveniência da mencionada sanção administrativa, por si só, não teria o condão de ensejar a nulidade ou a rescisão do contrato em epígrafe, uma vez que a suspensão temporária para licitar produz efeitos ex nunc, não se aplicando automaticamente aos contratos já celebrados, sobretudo em contratos outros distintos do que gerou a sanção, consoante jurisprudência predominante desta Casa.
13. Como é sabido, em sanção mais grave de declaração de inidoneidade, esta Corte seguindo jurisprudência inaugurada pelo STJ nos MS 13.101-DF, Min. Eliana Calmon, de 9/12/2008, e 13.964, Min. Teori Zavascki, de 25/5/2009, estabeleceu que seus efeitos são para o futuro ou ex nunc, nos termos dos Acórdãos 1262/2009-Plenário, Min. José Jorge, e 1340/2011-Plenário, Min. Weder de Oliveira. Mesma regra se aplica a suspensão temporária para licitar.[3]
Ademais, como se percebe do Acórdão nº 2183/2019 do TCU, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), órgão jurisdicional responsável pela uniformização dos entendimentos judiciais em todo o Brasil, estabeleceu a regra de que a sanção de inidoneidade produz efeito para o futuro (ex nunc), de modo a não prejudicar os contratos administrativos celebrados antes da aplicação da sanção. Confira-se o acórdão paradigma e um exemplo da jurisprudência surgida a partir dele:
ADMINISTRATIVO – LICITAÇÃO – INIDONEIDADE DECRETADA PELA CONTROLADORIA GERAL DA UNIÃO – ATO IMPUGNADO VIA MANDADO DE SEGURANÇA.
1. Empresa que, em processo administrativo regular, teve decretada a sua inidoneidade para licitar e contratar com o Poder Público, com base em fatos concretos.
2. Constitucionalidade da sanção aplicada com respaldo na Lei de Licitações, Lei 8.666/93 (arts. 87e 88).
3. Legalidade do ato administrativo sancionador que observou o devido processo legal, o contraditório e o princípio da proporcionalidade.
4. Inidoneidade que, como sanção, só produz efeito para o futuro (efeito ex nunc), sem interferir nos contratos já existentes e em andamento.
5. Segurança denegada.[4]
ADMINISTRATIVO. DECLARAÇÃO DE INIDONEIDADE PARA LICITAR E CONTRATAR COM A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. EFEITOS EX NUNC DA DECLARAÇÃO DE INIDONEIDADE: SIGNIFICADO. PRECEDENTE DA 1ª SEÇÃO (MS 13.964/DF, DJe DE 25/05/2009).
Segundo precedentes da 1ª Seção, a declaração de inidoneidade “só produz efeito para o futuro (efeito ex nunc), sem interferir nos contratos já existentes e em andamento” (MS 13.101/DF, Min. Eliana Calmon, DJe de 09.12.2008). Afirma-se, com isso, que o efeito da sanção inibe a empresa de licitar ou contratar com a Administração Pública (Lei 8666/93, art. 87), sem, no entanto, acarretar, automaticamente, a rescisão de contratos administrativos já aperfeiçoados juridicamente e em curso de execução, notadamente os celebrados perante outros órgãos administrativos não vinculados à autoridade impetrada ou integrantes de outros entes da Federação (Estados, Distrito Federal e Municípios). Todavia, a ausência do efeito rescisório automático não compromete nem restringe a faculdade que têm as entidades da Administração Pública de, no âmbito da sua esfera autônoma de atuação, promover medidas administrativas específicas para rescindir os contratos, nos casos autorizados e observadas as formalidades estabelecidas nos artigos 77 a 80 da Lei 8.666/93. […][5]
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. LICITAÇÃO. DECLARAÇÃO DE INIDONEIDADE PARA LICITAR E CONTRATAR COM A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. EFEITOS EX NUNC DA DECLARAÇÃO DE INIDONEIDADE: SIGNIFICADO. JULGADO DA PRIMEIRA SEÇÃO (MS 13.964/DF, DJe DE 25.5.2009). AGRAVO INTERNO DA SOCIEDADE EMPRESÁRIA A QUE SE NEGA PROVIMENTO. […]
2. É certo que a jurisprudência desta Corte Superior de Justiça entende que a sanção prevista no art. 87, III da Lei 8.666/1993 produz efeitos não apenas no âmbito do ente que a aplicou, mas na Administração Pública como um todo (REsp. 520.553/RJ, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 10.2.2011).
3. A declaração de idoneidade não tem a faculdade de afetar os contratos administrativos já aperfeiçoados juridicamente ou em fase de execução, sobretudo aqueles celebrados com entes públicos não vinculados à autoridade sancionadora e pertencente a Ente Federado diverso (MS 14.002/DF, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, DJe 6.11.2009).
4. A sanção aplicada tem efeitos apenas ex nunc para impedir que a Sociedade Empresária venha a licitar ou contratar com a Administração Pública pelo prazo estabelecido, não gerando como consequência imediata a rescisão automática de contratos administrativos já em curso (MS 13.101/DF, Rel. Min. JOSÉ DELGADO, Rel. p/ Acórdão Min. ELIANA CALMON, DJe 9.12.2008).5. Agravo Interno da Sociedade Empresária a que se nega provimento.[6]
A despeito desses precedentes, é de se ressaltar que a questão ainda é controversa na doutrina e na jurisprudência, havendo tanto entendimentos favoráveis quanto contrários ao sancionado no que toca aos contratos vigentes à época da suspensão.
Inclusive, tão controversa é a questão que a jurisprudência do STJ concebeu ainda um tertium genus de aplicação normativa, aplicando uma sorte de teoria mitigada da manutenção dos contratos vigentes, relegando tal decisão à discricionariedade motivada do gestor público. Veja-se:
ADMINISTRATIVO. DECLARAÇÃO DE INIDONEIDADE PARA LICITAR E CONTRATAR COM A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. EFEITOS EX NUNC DA DECLARAÇÃO DE INIDONEIDADE: SIGNIFICADO. PRECEDENTE DA 1ª SEÇÃO […]. 1. Segundo precedentes da 1ª Seção, a declaração de inidoneidade “só produz efeito para o futuro (efeito ex nunc), sem interferir nos contratos já existentes e em andamento” (MS 13.101/DF, Min. Eliana Calmon, DJe de 09.12.2008). Afirma-se, com isso, que o efeito da sanção inibe a empresa de “licitar ou contratar com a Administração Pública” (Lei 8666/93, art. 87), sem, no entanto, acarretar, automaticamente, a rescisão de contratos administrativos já aperfeiçoados juridicamente e em curso de execução, notadamente os celebrados perante outros órgãos administrativos não vinculados à autoridade impetrada ou integrantes de outros entes da Federação (Estados, Distrito Federal e Municípios). Todavia, a ausência do efeito rescisório automático não compromete nem restringe a faculdade que têm as entidades da Administração Pública de, no âmbito da sua esfera autônoma de atuação, promover medidas administrativas específicas para rescindir os contratos, nos casos autorizados e observadas as formalidades estabelecidas nos artigos 77 a 80 da Lei 8.666/93. […][7]
Segundo este entendimento do STJ, a regra seria a da não aplicação automática da penalidade aos demais contratos vigentes; podendo, todavia, a Administração promover medidas administrativas justificadas e específicas para rescindir estes contratos.
Vê-se daí que, embora haja fundamentos tanto para a aplicação retroativa quanto para a aplicação prospectiva das sanções previstas nos incisos III e IV do artigo 87 da Lei de Licitações e Contratos Administrativos, o tema ainda é objeto de controvérsia, não existindo posição sedimentada, sobretudo no que concerne à jurisprudência pátria.
Se, por um lado, a interpretação conjunta do 87 com o artigo 55, inciso XIII, da Lei Federal nº 8.666/93 enseja aplicação mais severa da norma, com o escopo de estender a penalidade a todos os contratos vigentes da apenada, uma interpretação mais benéfica e principiológica do ordenamento jurídico, calcada na legalidade estrita exigida no direito sancionatório, na tipicidade e na razoabilidade dos atos administrativos, conclui pela possibilidade de limitação da penalidade somente às licitações e aos contratos futuros.
[1] Cf. “A penalidade de suspensão temporária do direito de licitar é válida apenas para o órgão/entidade que aplicou a sanção?” Disponível em: https://schiefler.adv.br/a-penalidade-de-suspensao-temporaria-do-direito-de-licitar-e-valida-apenas-para-o-orgaoentidade-que-aplicou-a-sancao/.
[2] FILHO, Marçal Justen. Comentários à lei de licitações e contratos administrativos: lei 8.666/1993. ed. 16., rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista do Tribunais, 2014. p. 1159.
[3] TCU, Acórdão nº 2183/2019, Plenário, Relator: AUGUSTO SHERMAN, Data de Julgamento: 11/09/2019.
[4] STJ, MS 13.101/DF, Rel. Ministro JOSÉ DELGADO, Rel. p/ Acórdão Ministra ELIANA CALMON, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 14/05/2008.
[5] STJ, MS 14.002/DF, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 28/10/2009.
[6] STJ, AgInt no REsp 1552078/DF, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 30/09/2019.
[7] MS nº 14.002-DF, Relator: Ministro Teori Albino Zavascki, 1ª Seção do STJ, DJe de 06.11.2009.
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