
Programa Empresa Pró-Ética 2025-2026: integridade como diferencial competitivo
A Controladoria-Geral da União (CGU) publicou o regulamento do Programa Empresa Pró-Ética 2025-2026, iniciativa que reconhece empresas que adotam medidas efetivas de prevenção à corrupção, responsabilidade socioambiental e respeito aos direitos humanos. Conduzido pelo principal órgão de controle interno do país, o programa possui reconhecimento nacional e internacional e se consolidou como uma das maiores referências em boas práticas de compliance empresarial.
O programa evolui em sua nova edição ao incorporar temas ligados à agenda ESG, como sustentabilidade, diversidade e direitos humanos — ampliando sua abordagem sobre o que significa, hoje, ter um programa de integridade robusto e eficaz.
Por que participar?
Ser reconhecida como Empresa Pró-Ética traz um importante diferencial reputacional. A empresa aprovada entra para a lista oficial da CGU e pode utilizar a marca “Empresa Pró-Ética” em seus materiais institucionais, reforçando sua imagem perante clientes, parceiros, investidores e o poder público. Em licitações e contratações governamentais, esse reconhecimento funciona como um indicativo de confiabilidade e maturidade institucional, aumentando a competitividade da empresa e sua atratividade no mercado.
Além do reconhecimento oficial, o processo de candidatura também oferece benefícios importantes para empresas que ainda não atingem a pontuação necessária. A estruturação dos formulários exige revisão crítica do programa de integridade e mobilização de diversas áreas internas. Empresas que atingem uma pontuação mínima na avaliação técnica costumam receber um retorno detalhado da CGU sobre pontos fortes e oportunidades de melhoria — um feedback técnico que frequentemente impulsiona aprimoramentos relevantes.
Regulamento 2025-2026: panorama das regras e critérios
A nova edição do programa apresenta regras mais robustas, com foco na ampliação temática e no rigor técnico da avaliação. Veja os principais pontos:
- Período de inscrição: de 5 de maio a 5 de junho de 2025, exclusivamente pela plataforma SAMPI.
- Adesão prévia obrigatória ao Pacto Brasil pela Integridade: é necessário obter ao menos 70% de conformidade na autoavaliação promovida pela CGU, além de ser signatária do Pacto Empresarial pela Integridade do Instituto Ethos.
- Avaliação em 10 áreas temáticas, entre elas: liderança e comprometimento da alta direção; estrutura de compliance; políticas internas; gestão de riscos; controles internos e auditoria; comunicação e treinamentos; due diligence de terceiros; canal de denúncias; medidas disciplinares e remediação; e responsabilidade socioambiental. Ao todo, o regulamento inclui 28 questões ligadas a ESG integradas nesses eixos.
- Pontuação mínima para aprovação: para ser reconhecida como Empresa Pró-Ética, a empresa deve:
- Obter pontuação total igual ou superior a 70 pontos (de um total de 100);
- Alcançar, no mínimo, 45% da pontuação em cada uma das 10 áreas avaliadas.
- Etapas do processo: a empresa deve preencher dois formulários (Perfil e Conformidade), anexando os documentos comprobatórios. Em seguida, passa por uma triagem de admissibilidade e avaliação técnica. Os casos aprovados são deliberados por um comitê multissetorial vinculado à CGU.
- Critérios de admissibilidade:
- Não estar inscrita nos cadastros CEIS (Cadastro de Empresas Inidôneas e Suspensas), CNEP (Cadastro Nacional de Empresas Punidas) ou na “lista suja” do trabalho escravo;
- Não estar respondendo a processo administrativo de responsabilização por corrupção (Lei 12.846/2013), nem ter sido condenada nos últimos 5 anos;
- Não estar sob monitoramento decorrente de acordo de leniência, nem em processo de negociação de leniência;
- Estar em situação regular nos âmbitos fiscal (Receita Federal/PGFN), trabalhista (FGTS, Justiça do Trabalho) e ambiental (Ibama).
Uma nova abordagem para a integridade corporativa
O Pró-Ética 2025-2026 marca uma inflexão importante na definição do que se entende por integridade empresarial. Ao incorporar temas como diversidade, direitos humanos e sustentabilidade, o programa amplia seu escopo de forma alinhada às tendências internacionais — tornando-se não apenas um referencial técnico, mas também um catalisador da cultura ética dentro das empresas.
O processo de candidatura exige a articulação entre múltiplas áreas — jurídico, RH, financeiro, compliance — e, independentemente do resultado final, promove uma visão integrada e estratégica sobre governança, riscos e responsabilidade institucional.
Como o escritório Schiefler Advocacia pode apoiar sua empresa
O escritório Schiefler Advocacia possui sólida experiência na estruturação, revisão e fortalecimento de programas de integridade, com foco em empresas que mantêm relações com o setor público. Oferecemos assessoria completa para a participação no Pró-Ética: da adesão ao Pacto Brasil à análise dos critérios do regulamento, passando pela revisão documental e orientação estratégica em cada etapa do processo.
Se sua empresa busca destacar-se pelo compromisso com a ética, a sustentabilidade e a integridade, estamos prontos para caminhar ao seu lado nessa jornada.
📌 Saiba mais:
Programa de integridade: quando ele é obrigatório?

Programa de Integridade: Quando ele é obrigatório?
1. INTRODUÇÃO
O termo compliance, de origem anglo-saxônica, não possui uma tradução exata para o português, o que justifica sua permanência na língua inglesa no uso cotidiano no Brasil. Derivado do verbo to comply, o conceito remete à ideia de conformidade e é amplamente utilizado por organizações para estabelecer diretrizes voltadas à prevenção, detecção e correção de práticas ilegais, antiéticas ou incompatíveis com os valores institucionais[1].
Nesse cenário, as ferramentas de compliance assumem papel estratégico na gestão de riscos empresariais, prevenindo condutas indesejadas tanto por colaboradores internos quanto por terceiros que integrem a cadeia de relações comerciais da organização[2].
Com esse objetivo, os Programas de Integridade despontam como uma vertente específica do compliance, com foco na promoção de uma cultura organizacional baseada na ética e na transparência, pilares essenciais da governança corporativa e elementos indispensáveis para relações públicas e privadas sustentáveis.
2. BREVE CONTEXTO HISTÓRICO
A partir de 1992, o Brasil aprofundou sua abertura comercial, adequando-se às exigências do mercado global e ampliando sua competitividade. Esse processo também demandou uma regulamentação mais rigorosa do mercado interno, em sintonia com padrões internacionais[3].
Nesse contexto, novas obrigações de conformidade emergiram, impulsionando a redefinição das responsabilidades no campo do compliance, notadamente com a promulgação de normativas voltadas à transparência e à integridade empresarial[4]. Assim, as organizações passaram a buscar maior alinhamento às boas práticas e aos incentivos promovidos pela Lei Anticorrupção[5]–[6].
Diante da recorrência de escândalos de corrupção que evidenciaram fragilidades estruturais no ambiente corporativo brasileiro, a institucionalização dos Programas de Integridade no país surgiu como uma resposta para o fortalecimento dos mecanismos de proteção empresarial.
3. COMPLIANCE COMO PILAR DE GOVERNANÇA
No cenário atual, o compliance transcendeu a função de mera estratégia de mitigação de riscos e consolidou-se como um pilar essencial de governança. Mais do que prevenir ilícitos, tornou-se um diferencial competitivo e um fator determinante para a sustentabilidade das organizações.
Dessa forma, o compliance atua como agente transformador ao fomentar uma cultura organizacional baseada na ética, transparência e responsabilidade corporativa. Inicialmente tratado como uma vantagem competitiva, o Programa de Integridade evoluiu sob o impulso da legislação e hoje se apresenta como uma exigência indispensável tanto sob a ótica estatal quanto social.
A integridade corporativa, nesse sentido, desempenha papel central no fortalecimento da confiança entre empresas, consumidores e demais stakeholders, deixando de ser um conceito abstrato para consolidar-se como um elemento estratégico fundamental na construção de um ambiente de negócios mais ético, transparente e sustentável[7].
4. A OBRIGATORIEDADE DE PROGRAMAS DE INTEGRIDADE NAS CONTRATAÇÕES DE GRANDE VULTO
A Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (NLLCA – Lei nº 14.133/2021)[8] prevê expressamente a adoção de programas de integridade como critério relevante em diversas situações. Especificamente, estabelece sua utilização como critério de desempate em licitações (art. 60, IV), reconhece sua adoção como fator atenuante na aplicação de sanções administrativas (art. 156, §1º, V) e exige sua implementação como requisito para a reabilitação de licitantes eventualmente sancionados (art. 163, parágrafo único).
Além disso, a NLLCA impõe a obrigatoriedade de programas de integridade em contratações de grande vulto — aquelas cujo valor estimado ultrapasse R$ 200 milhões (art. 25, §4º)[9]. A exigência visa fortalecer a segurança jurídica e mitigar riscos em contratos de alto impacto financeiro para a Administração Pública, reforçando a necessidade de mecanismos que assegurem transparência, ética e conformidade na execução contratual.
A regulamentação dessa exigência foi aprimorada pelos Decretos nº 11.129/2022 e 12.304/2024, que detalham os parâmetros essenciais para a estruturação de um programa de integridade eficaz e estabelecem critérios objetivos para a avaliação dos programas exigidos em contratações de grande vulto.
Dessa maneira, as empresas contratadas no grande vulto, devem adotar medidas concretas para assegurar a conformidade e mitigar riscos, implementando mecanismos eficazes que garantam a integridade nos contratos firmados com a Administração Pública. Dentre essas medidas, destacam-se:
- Código de Ética e Conduta, com diretrizes claras para a atuação organizacional.
- Procedimentos de controle interno, com práticas que assegurem a efetividade da conformidade.
- Canal de denúncias, garantindo um mecanismo seguro e anônimo para o reporte de irregularidades.
- Treinamentos periódicos, com um cronograma de capacitação contínua para a disseminação da cultura de integridade.
- Políticas de prevenção a fraudes e corrupção, com normativas voltadas à mitigação de riscos e ao fortalecimento da transparência.
Ante o exposto, a obrigatoriedade dos programas de integridade em contratações de grande vulto representa um avanço significativo na prevenção de ilícitos e no fortalecimento da governança pública.
5. OS PROGRAMAS DE INTEGRIDADE NAS CONTRATAÇÕES ESTADUAIS
A exigência de programas de integridade como condição para a celebração de contratos com a Administração Pública tem se tornado uma realidade crescente no Brasil. Diversos entes federativos, em movimento prévio à regulamentação federal, instituíram normas específicas impondo tal requisito, muitas vezes com critérios próprios e valores mínimos distintos.
Entre os estados que adotaram essa diretriz, destacam-se:
- Rio de Janeiro (Lei 7.753/2017): determina a obrigatoriedade de programas de integridade em contratos acima de R$ 1,5 milhão para obras e serviços.
- Goiás (Lei 20.489/2019): fixa a exigência para contratos acima de R$ 650 mil para compras e R$ 1,5 milhão para obras públicas.
- Distrito Federal (Lei 6.308/2019): estabelece o limite de R$ 5 milhões para a implementação obrigatória de programas de integridade.
- Rio Grande do Sul (Lei 15.228/2018): estipula a obrigatoriedade para contratos de R$ 10 milhões ou mais.
- Amazonas (Lei 4.730/2018): fixa valores de R$ 3,3 milhões para obras e serviços de engenharia, e R$ 1,43 milhão para compras e serviços.
- Pernambuco (Lei 16.722/2019): apresenta uma graduação nos valores, exigindo a partir de 2022 programas de integridade para contratos de obras e serviços de engenharia acima de R$ 10 milhões, reduzindo esse limite para R$ 5 milhões em 2024 e, a partir de 2025, aplicando a regra a contratos administrativos gerais acima de R$ 10 milhões.
Observa-se que, em muitas unidades da federação, os valores exigidos para a implementação de programas de compliance são inferiores aos previstos na legislação federal. Além disso, há estados que adotam requisitos mais rigorosos. Também há requisitos similares. No Rio de Janeiro, por exemplo, exige-se que o programa de integridade esteja implementado em até 180 dias após a assinatura do contrato, enquanto a legislação federal estipula o prazo de seis meses.
A tendência reflete a crescente importância da governança corporativa nas contratações públicas, obrigando empresas que desejam contratar com o setor público a adotarem mecanismos de compliance eficazes. Em um cenário de maior controle e exigência de transparência, estar em conformidade com as normas não é apenas um diferencial competitivo, mas um requisito imprescindível para aqueles que pretendem atuar junto à Administração Pública.
[1]SOUSA, Henrique Adriano de; PASSOS, Gabriela de Abreu; PORTULHAK, Henrique; AZEVEDO, Sayuri Unoki de; IRIGARAY, Hélio Arthur Reis; STOCKER, Fabricio. A evolução na divulgação de práticas de compliance por companhias abertas brasileiras no período “Lava Jato”. Cadernos EBAPE.BR, v. 22, n. 1, 2024. Disponível em: https://doi.org/10.1590/1679-395120230041. Acesso em: 10 mar. 2025.
[2]SÁNCHEZ RIOS, Rodrigo; ANTONIETTO, Caio. Criminal Compliance: Prevenção e minimização de riscos na gestão da atividade empresarial. Revista Brasileira de Ciências Criminais, São Paulo, v. 114, p. 341-375, mai.-jun. 2015. IN MAGALHÃES JÚNIOR, Danilo Brum de. Gerenciamento de risco, compliance e geração de valor: os compliance programs como ferramenta para mitigação de riscos reputacionais nas empresas. Revista dos Tribunais, v. 997, p. 575-594, nov. 2018. Disponível em: <DTR\2018\20828>. Acesso em: 12 fev. 2025.
[3]DALLA PORTA, Flaviano Carvalho. As diferenças entre auditoria interna e compliance. 2011. 91 f. Dissertação (Mestrado Profissional em Economia) – Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Faculdade de Ciências Econômicas, Programa de Pós-Graduação em Economia, Porto Alegre, 2011.
[4]SALES, Absolon Silva de. A corrupção transnacional e os programas de compliance. 2023. 155 f. Dissertação (Mestrado em Direito) – Faculdade de Direito, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2023. Disponível em: http://www.bdtd.uerj.br/handle/1/21659. Acesso em: 3 mar. 2025
[5]MAGALHÃES JÚNIOR, Danilo Brum de. Gerenciamento de risco, compliance e geração de valor: os compliance programs como ferramenta para mitigação de riscos reputacionais nas empresas. Revista dos Tribunais, v. 997, p. 575-594, nov. 2018. Disponível em: <DTR\2018\20828>. Acesso em: 12 fev. 2025.
[6]BRASIL. Lei nº 12.846, de 1º de agosto de 2013. Dispõe sobre a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 2 ago. 2013. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12846.htm. Acesso em: 10 mar. 2025.
[7]MARTINS, Ana Luiza Gomes; NEGRI, Luiz Felipe Almeida. Dia Internacional da Proteção de Dados: um marco global e nacional. São Paulo: Schiefler Advocacia, 2025. Disponível em: https://schiefler.adv.br/dia-internacional-da-protecao-de-dados/ Acesso em: 10 mar. 2025.
[8]BRASIL. Lei nº 14.133, de 1º de abril de 2021. Estabelece novas normas gerais de licitação e contratação para a administração pública. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 1º abr. 2021. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/l14133.htm. Acesso em: 10 mar. 2025.
[9]Art. 6º, Lei 14.133/2021. Para os fins desta Lei, consideram-se: XXII – obras, serviços e fornecimentos de grande vulto: aqueles cujo valor estimado supera R$ 200.000.000,00 (duzentos milhões de reais)
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Os benefícios do compliance para o poder público
A Administração Pública é responsável pela prestação de serviços à sociedade nos mais variados âmbitos: saúde, educação, segurança pública, dentre outros. Como toda prestação de serviços, porém, há uma série de riscos envolvidos, os quais precisam ser adequadamente tratados para que a referida prestação seja realizada com qualidade e com eficiência.
É aí que entra o compliance no setor público: um dos principais pilares de um programa de compliance é, justamente, a análise e gestão dos riscos a que está sujeita uma determinada organização, inclusive as públicas, com o objetivo de mitigar esses riscos e reduzir potenciais prejuízos.
Mas, afinal, o que é compliance?
O compliance pode ser definido como o conjunto de medidas e procedimentos que tem o objetivo de evitar, detectar e remediar a ocorrência de irregularidades, fraudes e corrupção. O compliance não se limita, porém, à conformidade com leis e regulamentos!
Para que uma determinada organização esteja verdadeiramente em compliance, é necessário que a condução dos seus processos internos e de suas relações com terceiros seja pautada pela ética, pela integridade e por uma preocupação constante com a conduta dos envolvidos no dia a dia dessa organização, estimulando uma cultura organizacional que privilegie a tomada de decisões orientadas pela responsabilidade e pela preocupação com a integridade.
A principal forma de estruturar o compliance enquanto uma estratégia de mitigação de riscos e aprimoramento organizacional é por meio da implementação de um programa de compliance (também chamado “programa de integridade”), identificando os riscos, planejando as estratégias de prevenção e implementando as melhores práticas de governança e métodos para mitigação dos riscos identificados.
E o compliance público?
O compliance público nada mais é do que a implementação de um programa de compliance em órgãos públicos, abrangendo, por exemplo, empresas estatais, autarquias, estados, municípios e demais integrantes da Administração Pública.
A estrutura de um programa de compliance público é muito parecida com aquela existente em programas de compliance da iniciativa privada, visto que os sistemas de gestão de compliance contidos nas regulamentações específicas sobre o tema, como, por exemplo, ISO 37301 e ISO 37001, são aplicáveis tanto às organizações privadas, quanto às organizações públicas.
Nesse sentido, o programa de compliance pode contribuir para que uma gestão seja eficiente e traga bons resultados, atentando para a responsabilidade no uso dos recursos públicos e para a otimização de seus processos, promovendo um serviço eficiente e de alta qualidade para todos os cidadãos.
Principais marcos regulatórios do compliance no setor público
Apesar de não haver uma norma única que “compile” todas as diretrizes do compliance no setor público, no ordenamento jurídico brasileiro temos uma série de leis e decretos que trazem disposições sobre o tema, prevendo a adoção de boas práticas de compliance ou mesmo obrigando a implementação de programas de compliance em algumas situações. Vejamos abaixo algumas dessas normas:
1. Lei Anticorrupção (Lei Federal nº 12.846/2013):
Apesar de não se tratar de uma norma especificamente voltada ao compliance no setor público, foi a partir da promulgação da Lei Federal nº 12.846/13, conhecida como Lei Anticorrupção, que o compliance passou a receber maior destaque dentro do ordenamento jurídico brasileiro, de modo que vale aqui mencionar em linhas gerais do que trata a referida norma.
De forma resumida, a maior inovação trazida pela Lei Anticorrupção foi a previsão da responsabilidade objetiva para as pessoas jurídicas, que se tornaram responsáveis pelos atos lesivos praticados por seus dirigentes, administradores ou funcionários, independentemente da comprovação de dolo ou de culpa.
Na prática, a Lei Anticorrupção prevê que empresas, órgãos públicos, ONGs e organizações em geral responderão, civil e administrativamente, sempre que a ação de um de seus representantes causar prejuízos ao patrimônio público, infringir as regras da gestão pública ou obrigações internacionais assumidas pelo Brasil.
O Decreto Federal nº 8.420/2015, por sua vez, trouxe a regulamentação a respeito de como as empresas e organizações em geral devem implementar mecanismos de compliance e mitigação de riscos, tendo sido revogado e substituído, recentemente, pelo Decreto nº 11.129/2022.
2. Lei das Estatais (Lei Federal nº 13.303/2016):
A Lei das Estatais, como é popularmente conhecida a Lei Federal nº 13.303/2016, traz disposições expressas que obrigam as empresas estatais, sejam elas empresas públicas ou sociedades de economia mista, a adotar certas ferramentas de compliance público.
É o caso, por exemplo, da previsão contida no artigo 6º, que estabelece que “O estatuto da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias deverá observar regras de governança corporativa, de transparência e de estruturas, práticas de gestão de riscos e de controle interno […]”.
O artigo 9º, por sua vez, dispõe que as empresas públicas e sociedades de economia mista deverão adotar regras de estruturas e práticas de gestão de riscos e controle interno, elaborando, ainda, um Código de Conduta e Integridade que disponha sobre os seus princípios, valores e missão, e que traga orientações sobre a prevenção de conflito de interesses e vedação a atos de corrupção e fraude.
3. Decreto da Governança Pública Federal (Decreto Federal nº 9.203/2017)
Outro marco legal muito importante no âmbito do compliance público é o Decreto da Governança Pública (Decreto nº 9.203/2017), que dispõe sobre a política de governança na Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional.
Trata-se da principal norma vigente hoje sobre governança pública, contendo uma série de obrigações e diretrizes relacionadas às boas práticas de governança, além de desenhar os programas de compliance em órgãos públicos federais, conforme previsto no artigo 19 do Decreto:
Art. 19 – Os órgãos e as entidades da administração direta, autárquica e fundacional instituirão programa de integridade, com o objetivo de promover a adoção de medidas e ações institucionais destinadas à prevenção, detecção, punição e remediação de fraudes e atos de corrupção, estruturado nos seguintes eixos:
I – comprometimento e apoio da alta administração;
II – existência de unidade responsável pela implementação no órgão ou na entidade;
III – análise, avaliação e gestão dos riscos associados ao tema da integridade; e
IV – monitoramento contínuo dos atributos do programa de integridade.
O artigo 19 faz menção a diversos pilares considerados essenciais a um programa de compliance, como o comprometimento da alta gestão, o estabelecimento de uma unidade responsável pela implementação do programa no órgão, a análise e gestão de riscos e o monitoramento contínuo do programa de compliance.
4. Manual para Implementação de Programas de Integridade – Orientações para o setor público
Ainda que não seja uma norma propriamente dita, e sim um compilado de recomendações e boas práticas opcionais para órgãos públicos, vale aqui mencionar também o Manual para Implementação de Programas de Integridade – Orientações para o setor público, elaborado pela Controladoria-Geral da União (CGU).
Trata-se de um manual elaborado pela CGU com o objetivo de orientar os gestores públicos sobre questões que devem ser discutidas e implementadas com o intuito de mitigar a ocorrência de corrupção e desvios éticos em seus órgãos ou entidades, apresentando uma proposta de implementação de programa de compliance.
O manual traz os elementos básicos de um programa de compliance, as ações e medidas que precisam ser executadas, bem como formas de monitoramento e aprimoramento contínuo do programa.
Para além das normativas federais, no âmbito estadual podemos citar como exemplos de entes públicos que aderiram aos programas de compliance os seguintes estados:
- Minas Gerais (Decreto Estadual nº 47.185/2017);
- Rio de Janeiro (Decreto Estadual nº 46.745/2019);
- Santa Catarina (Lei Estadual nº 17.715/2019);
- Paraná (Lei nº 19.857/2019);
- Mato Grosso (Lei Estadual nº 10.691/2018);
- Goiás (Lei Estadual nº 9.406/2019); e
- Distrito Federal (Decreto nº 39.736/2019).
Compliance público: por que é importante?
Em razão do cenário sensível envolvendo as compras públicas e a gestão da coisa pública, que possuem riscos inerentes, a implementação de um programa de compliance pode contribuir muito para mitigar riscos, auxiliando tanto na prevenção de riscos relacionados à corrupção quanto de riscos de outras naturezas, como aqueles relacionados à má gestão de recursos públicos e possível ineficiência administrativa.
Além disso, há uma série de adequações que a Administração Pública precisa fazer em sua gestão, como, por exemplo, a necessidade de compatibilização da proteção de dados pessoais com o dever de transparência ativa, visto que o Poder Público está sujeito tanto à Lei Geral de Proteção de Dados – LGPD (Lei Federal nº 13.709/2018) quanto à obrigação de promover a transparência independentemente de provocação do particular.
Uma outra particularidade do compliance público diz respeito à tomada de decisão. Sabe-se que as decisões tomadas pelos gestores públicos impactam não apenas o seu órgão específico, mas todos os administrados que se beneficiam de alguma forma da atuação daquele órgão. A adoção de um programa de compliance permite promover mecanismos de registro inteligentes, com o objetivo de demonstrar de que forma as decisões foram tomadas dentro da Administração Pública.
Por exemplo, a implementação de controles internos pode contribuir para documentar um processo de contratação de determinada empresa, especificando por que se escolheu contratar aquela empresa e não outra, ou por que se optou por uma modalidade licitatória e não por outra em um caso concreto. O programa de compliance público contribui, portanto, não apenas para promover a transparência da gestão pública, mas também para salvaguardar os agentes públicos envolvidos na tomada de decisões, que eventualmente podem ser chamados a responder por suas escolhas perante órgãos de controle.
Como implementar e aplicar o compliance público?
Para aplicar de forma prática os pilares de um programa de compliance em órgãos públicos, são recomendáveis as seguintes ações:
- Obter o comprometimento da alta administração do órgão e manifestar esse comprometimento para todos os servidores do órgão, em todos os níveis funcionais;
- Estabelecer uma instância responsável pela gestão do programa de compliance;
- Realizar uma análise dos riscos de integridade a que o órgão está sujeito, mapeando as áreas e processos que representam riscos;
- Estabelecer padrões de ética e conduta que direcionem a atuação dos servidores;
- Realizar iniciativas de comunicação e treinamento para a correta apreensão das diretrizes de integridade;
- Implementação de canais de denúncia para viabilizar o reporte de potenciais irregularidades;
- Implementar medidas de controle e medidas disciplinares, com o objetivo de mitigar os riscos na atuação do órgão;
- Em caso de comprovadas irregularidades, tomar ações de remediação dos danos e estabelecer novos controles para evitar a reincidência.
Quer saber mais sobre o Compliance Público ou deseja iniciar a implementação de um programa de compliance no órgão em que você trabalha? Não hesite em contatar um advogado especialista do nosso escritório para uma consulta detalhada e individualizada!
Read MorePor mais que muitas normas e conceitos estabelecidos pela CLT não façam sentido dentro do modelo de negócios inovador e disruptivo das startups, essas empresas continuam legalmente obrigadas pelas normas trabalhistas aplicáveis a qualquer outra empresa.
Victoria Magnani[1]
As chamadas startups, empresas ligadas à inovação que se encontram em estágio inicial de desenvolvimento, podem ser definidas como empresas de perfil inovador cujo modelo de negócios se caracteriza como repetível e escalável, além de ser marcado por um cenário de extrema incerteza. Essas empresas têm como característica, além do fator inovação, um potencial de crescimento exponencial associado a baixos investimentos, bem como uma ampla flexibilidade no que diz respeito às noções tradicionais associadas ao direito trabalhista.
Devido a essa dinâmica única, típica do ambiente das startups[2], surge uma série de embates com os conceitos trabalhistas “tradicionais” previstos na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), diploma legal que muitas vezes se mostra insuficiente para lidar com a prática do dia a dia dessas empresas.
Apesar do modelo de negócios marcado pelo alto risco e instantaneidade, a preocupação trabalhista não pode ser deixada em segundo plano, visto que eventual irregularidade na contratação e gestão da equipe pode gerar diversas consequências graves para as startups, que vão desde multas oriundas de órgãos fiscalizadores até reclamações trabalhistas, impactando a imagem da empresa e, consequentemente, o seu financiamento.
Embora o Direito do Trabalho não possua grande incidência nas startups early stage[3], conforme as empresas vão crescendo e se desenvolvendo as questões trabalhistas tornam-se cada vez mais presentes em sua realidade. Assim, para as startups que se encontram em growth stage[4] é essencial tratar as questões relacionadas ao Direito do Trabalho de forma adequada, uma vez que, caso estas sejam mal conduzidas, o surgimento de um eventual passivo trabalhista pode vir a prejudicar a própria captação de recursos externos nas próximas rodadas de investimento.
Nesse sentido, é importante destacar que, apesar de possuírem um modelo de negócios distinto daquele atribuído às empresas “tradicionais”, as startups não possuem tratamento normativo diferenciado, estando sujeitas à mesma legislação trabalhista que as demais empresas.
Vale dizer que, por mais que muitas normas e conceitos estabelecidos pela CLT não façam sentido dentro do modelo de negócios inovador e disruptivo das startups (tipicamente marcado pela instantaneidade e flexibilidade), essas empresas continuam legalmente obrigadas pelas normas trabalhistas aplicáveis a qualquer outra empresa.
É nesse panorama que acabam surgindo alguns riscos trabalhistas derivados do próprio modelo de negócios das startups, principalmente aqueles relacionados à contratação e gerenciamento dos colaboradores. A título de exemplo, é possível citar a celebração de contratos de prestação de serviços e a contratação de pessoas jurídicas[5], duas alternativas que se popularizaram no ambiente das startups justamente por se adequarem ao baixo orçamento dessas empresas e não envolverem tantas formalidades para sua realização, mas que podem ocasionar inúmeros problemas na Justiça do Trabalho caso não sejam executados de maneira correta.
Logo, a contratação dos diversos colaboradores da startup, seja por meio de contratos de prestação de serviços, contratos celebrados com pessoas jurídicas ou mesmo os contratos de vesting[6], deve ser elaborada em consonância com a legislação, a fim de minimizar riscos trabalhistas e eventuais ilegalidades.
Por que pensar preventivamente?
Uma boa prevenção de demandas trabalhistas traz inúmeras vantagens competitivas, pois, além da significativa redução de custos, a melhoria do meio ambiente de trabalho por meio do aperfeiçoamento da estrutura organizacional reflete diretamente na produtividade da empresa, influenciando no seu faturamento. Além disso, esses atributos são interessantes para atrair investidores, uma vez que estes certamente irão priorizar startups que, além de oferecerem menos riscos, também trazem o melhor retorno para o seu capital.
[1] Graduanda em Direito na Universidade Federal de Santa Catarina, atualmente cursando a oitava fase. Foi bolsista do Programa de Educação Tutorial – PET Direito UFSC de 2017 a 2019, e atualmente desenvolve pesquisa de iniciação científica no campo do Direito Ambiental do Trabalho como bolsista voluntária do Programa Institucional de Iniciação Científica – PIBIC UFSC.
[2] FEIGELSON, Bruno; NYBØ, Erik Fontenele; FONSECA, Victor Cabral. Direito das Startups. São Paulo: Saraiva Educação, 2018.
[3] Como são chamadas as startups em estágio inicial de desenvolvimento.
[4] As startups em growth stage são aquelas que, depois de terem provado seu valor no mercado e obtido financiamento, estão no processo de crescimento, tentando escalar seu produto. O foco não é mais simplesmente na inovação, mas em expandir o produto já existente e aprovado pelo mercado.
[5] Fenômeno conhecido como “pejotização”.
[6] O contrato de vesting consiste em uma promessa de participação societária, estabelecida com colaboradores estratégicos com vistas a estimular a expansão, o êxito e a consecução dos objetivos sociais da startup (FEIGELSON; NYBO; FONSECA, 2018).
E mais: “o Vesting, entre outras hipóteses, consiste em um Contrato de opção de aquisição de participação societária, de forma gradual, mediante cumprimento de metas em/ou dado período de tempo.” (MAY, Pedro Henrique. O Contrato de Vesting no sistema societário brasileiro e a sua aplicabilidade em startups constituídas na forma de sociedade limitada. Monografia (graduação) – Curso de Graduação em Direito, Universidade Federal de Santa Catarina, 2018. p. 42).
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