Ao reconhecer a falta de razoabilidade e, por consequência, a ilegalidade de decisões administrativas que eliminam candidatos na fase de aptidão médica, em razão da entrega incompleta de exames médicos por culpa exclusiva dos laboratórios e das clínicas responsáveis pela sua realização, o Poder Judiciário vem atuando como um porto seguro do interesse público em contratar o candidato mais qualificado para exercer as funções do cargo.
Candidato de concurso público não pode ser eliminado em razão de exame médico incompleto por falha do laboratório.
O ingresso em cargo ou emprego público depende de aprovação em concurso público, ocasião em que o candidato será avaliado por critérios objetivos, previstos em lei e no edital do certame.
Nesse processo, além de comprovar a capacidade técnica para o exercício do cargo, é necessário que os postulantes ao cargo público federal comprovem a higidez de sua saúde, nos termos do parágrafo único do artigo 14 da Lei Federal nº 8.112/1990 (Estatuto dos Servidores Públicos Federais), que estatui regra adotada de maneira geral por toda a Administração Pública Federal, e que, comumente, é replicada em normas estaduais e municipais:
Art. 14. A posse em cargo público dependerá de prévia inspeção médica oficial.
Parágrafo único. Só poderá ser empossado aquele que for julgado apto física e mentalmente para o exercício do cargo.
Nesse sentido, é comum que, nos próprios editais de concurso público, haja a previsão desta etapa de comprovação da aptidão médica. Inclusive, não são raras as vezes que os exames médicos necessários são pormenorizados no edital, os quais podem, em regra, ser realizados em laboratório a ser escolhido pelo candidato.
Eventualmente, laboratórios de exames médicos cometem falhas na entrega dos serviços contratos, omitindo ou atrasando a entrega de exames exigidos em concurso público. Por sua vez, os candidatos, que sequer tem expertise nesse assunto e que atuaram de forma diligente na realização dos exames dentro do prazo, acabam sendo indevidamente prejudicados por apresentar a documentação médica em desconformidade com o exigido em edital ou, ainda, fora do prazo.
Estes candidatos que, de alguma forma, foram prejudicados por falhas do laboratório ou da clínica médica responsável pela realização do exame, em razão da entrega incompleta ou atrasada de exame médico solicitado, devem informar o fato ao órgão realizador do concurso, a fim de possibilitar uma nova entrega posterior, inclusive em sede de recurso.
Este é o entendimento do Tribunal Regional Federal da 1a Região (TRF-1). Em decisão que prezou pela razoabilidade nas eliminações em concursos públicos, o TRF-1 reconheceu a ilegalidade de decisão administrativa que havia declarado a inaptidão de candidato aprovado pela apresentação incompleta de exame médico, ocasionada por falha do laboratório. Veja-se:
ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. POLÍCIA RODOVIÁRIA FEDERAL. EXAME MÉDICO. APRESENTAÇÃO INCOMPLETA DO EXAME DE HEPATITE B. ERRO DO LABORATÓRIO. CORREÇÃO DA IRREGULARIDADE POR OCASIÃO DA INTERPOSIÇÃO DE RECURSO. POSSIBILIDADE. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. NOMEAÇÃO E POSSE. CANDIDATO SUB JUDICE. […].
I – A orientação jurisprudencial já consolidada no âmbito de nossos tribunais é no sentido de que não cabe ao Poder Judiciário substituir-se aos membros de Banca Examinadora na formulação e na avaliação de mérito das questões de concurso público, podendo, contudo, pronunciar-se acerca da legalidade do certame, como no caso, em que se discute a legitimidade da eliminação de candidato, sob o fundamento de que este não teria apresentado todos os exames médicos solicitados pela impetrada.
II – Na hipótese dos autos, não se afigura razoável a eliminação de candidato em etapa específica de concurso público para avaliação de saúde, em virtude da apresentação incompleta do exame de Hepatite B, quando restou comprovado que decorreu de falha do laboratório, sendo que, ao interpor recurso administrativo, o impetrante juntou o exame laboratorial faltante, o qual demonstra, inclusive, sua higidez física. Ademais, consta do edital regente do certame a possibilidade de a junta médica solicitar exames complementares, o que não ocorreu, na espécie dos autos. Precedentes. […]
IV – Apelação desprovida. Sentença confirmada.[1]
O posicionamento adotado pelo julgado acima não está isolado do entendimento majoritário. Confiram-se outras decisões que também reconheceram a ilegalidade da eliminação de candidatos nessa mesma situação:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO ORDINÁRIA. CONCURSO PÚBLICO. EXAMES MÉDICOS. EXCLUSÃO DE CANDIDATO POR ALEGADA FALTA DE APRESENTAÇÃO DE DETERMINADO EXAME. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE.
O agravante inscreveu-se em concurso público para provimento de vagas para o cargo de Policial Rodoviário Federal, regido pelo Edital nº 01, de 11 de junho de 2013, tendo sido desclassificado na Avaliação de Saúde, sob o fundamento de ausência de entrega do exame médico “IMPEDANCIOMETRIA”.
A exclusão do candidato do certame no presente caso, pela negativa de recebimento de um exame médico com nomenclatura variada, pois relatórios médicos juntados aos autos declaram que os termos “IMPEDANCIOMETRIA” e “IMITANCIOMETRIA” referem-se ao mesmo exame, e a omissão da autoridade impetrada em conferir, no momento do recebimento, o rol dos exames entregues, não se coadunam com o princípio da razoabilidade.
Agravo de instrumento parcialmente provido para assegurar ao Agravante o direito de participar nas demais etapas do certame de Policial Rodoviário Federal.[2]
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. POLÍCIA RODOVIÁRIA FEDERAL. EXAME MÉDICO FALTANTE. EXAMES COMPLEMENTARES. POSSIBILIDADE. RAZOABILIDADE. […]
II – Na hipótese dos autos, não se afigura razoável a eliminação de candidato em etapa específica de concurso público para apresentação de exames médicos, quando faltante apenas um dentre os inúmeros solicitados, mormente quando o próprio edital regulador do certame indica etapa específica para a entrega de possíveis exames complementares, pelo que não merece qualquer reparo o julgado monocrático que concedeu a segurança postulada na espécie. Ademais, constata-se que não há qualquer pendência editalícia por parte do impetrante, já tendo este participado com aproveitamento do regular curso de formação, sendo determinada, nos presentes autos, inclusive, a sua nomeação e posse desde 27/05/2014.
III – Apelação e remessa oficial, tida por interposta, desprovidas.[3]
Nesse sentido, ao reconhecer a falta de razoabilidade e, por consequência, a ilegalidade de decisões administrativas que eliminam candidatos na fase de aptidão médica, em razão da entrega incompleta de exames médicos por culpa exclusiva dos laboratórios e das clínicas responsáveis pela sua realização, o Poder Judiciário vem atuando como um porto seguro do interesse público em contratar o candidato mais qualificado para exercer as funções do cargo.
Desta forma, candidatos que enfrentam situações como esta podem, para evitar a eliminação definitiva de um concurso público, interpor recurso contra a eliminação ou ajuizar ação judicial com o objetivo de ter reconhecida a ilegalidade do seu caso concreto. Para isso, é importante que o pleito seja acompanhado de documentos que atestem o erro do laboratório, a fim de comprovar a culpa exclusiva do prestador de serviço.
Este entendimento evita que candidatos mais qualificados sejam injustamente eliminados pelo erro de terceiros. A finalidade do concurso público, afinal, é contratar os candidatos por seu mérito e aptidão a desempenhar bem as funções do cargo – e não eliminá-los por aspectos alheios à sua responsabilidade, fora do seu alcance e capazes de serem corrigidos em tempo.
[1] TRF-1, Apelação nº 0009308-21.2016.4.01.3400, DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE, Quinta Turma, julgado em 26/06/2019.
[2] TRF-1, AG 0050256-88.2014.4.01.0000 / DF, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL KASSIO NUNES MARQUES, SEXTA TURMA.
[3] TRF-1, AMS 0073548-24.2013.4.01.3400 / DF, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE, QUINTA TURMA.
Read MoreA legislação que rege o ingresso e a carreira militar é a Lei Federal nº 6.880/1980 (Estatuto dos Militares), sendo que, neste diploma normativo, não há qualquer disposição de que deve ser utilizado o índice de massa corpórea (IMC) como parâmetro para aferir a aptidão médica dos aspirantes a militar.
Candidatos de concurso militar não podem ser eliminados em razão do Índice de Massa Corporal (IMC), decide STJ
É sabido que, em razão de regra constitucional, o ingresso em cargo público depende de aprovação em concurso público, ocasião em que o candidato será avaliado por critérios objetivos, previstos em lei e no edital do certame. No caso de concurso público militar, para ingresso nas Forças Armadas constituídas pela Marinha, Exército e Aeronáutica, a Constituição Federal conferiu especial atenção ao processo de escolha dos candidatos, tendo em vista a função altamente sensível para salvaguarda da soberania nacional e na garantia da democracia.
Especificamente, o inciso X do artigo 142 da Constituição[1] confere à lei a função de dispor sobre o ingresso nas Forças Armadas, em especial quanto aos critérios de seleção. Ou seja, as regras aplicáveis aos concursos militares para preenchimento de cargos devem ser estabelecidas por norma com estatura hierárquica de lei – sendo inaplicável, nesse sentido, qualquer inovação por meio de normas infralegais ou editalícias.
Hoje, a legislação que rege o ingresso e a carreira militar é a Lei Federal nº 6.880/1980 (Estatuto dos Militares), sendo que, neste diploma normativo, não há qualquer disposição de que deve ser utilizado o índice de massa corpórea (IMC) como parâmetro para aferir a aptidão médica dos aspirantes a militar. Assim sendo, é ilegal a eliminação de candidato que, aprovado nas demais fases do concurso público, possua IMC superior ao mínimo estabelecido em edital.
Como a lei não autoriza a utilização desse critério, a exclusão de candidatos com base nele é uma prática ilícita passível de controle pelo Poder Judiciário.
Em decisão recente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou este entendimento e afastou a possibilidade de eliminar candidatos em concurso militar em razão do IMC, uma vez que inexiste na lei de regência autorização específica, não sendo suficiente a mera inclusão do requisito no edital. Leia-se:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. INGRESSO NA CARREIRA MILITAR. APTIDÃO FÍSICA. ÍNDICE DE MASSA CORPORAL. PREVISÃO LEGAL ESPECÍFICA. INEXISTÊNCIA. […]
A lei de regência das forças armadas (Estatuto dos Militares – Lei nº 6.880/80) não elenca nenhuma exigência quanto ao limite de altura, peso ou IMC para o ingresso na carreira, de modo que a previsão de algum desses requisitos, em concursos públicos, somente seria permitida mediante respaldo legal específico, compatível com as atribuições do cargo, sendo insuficiente a mera inclusão como cláusula do edital.
3.Agravo interno desprovido.[2]
Esta decisão não foi tomada de modo isolado, mas representa o entendimento jurisprudencial pacífico do Poder Judiciário. Confiram-se outras decisões do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que é o órgão responsável por uniformizar o entendimento das decisões judiciais em território brasileiro:
ADMINISTRATIVO. CONCURSO. CURSO DE FORMAÇÃO DE TAIFEIROS. LIMITAÇÃO DE PESO PREVISTO NO EDITAL. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. […]
III – No caso, por mais que se possa compreender a razoabilidade da eventual fixação de limite de altura e peso para ingresso em determinadas carreira, é forçoso reconhecer que a lei (Estatuto dos Militares – Lei nº 6.880/80) não elenca qualquer exigência quanto ao limite de altura e peso ou IMC para o ingresso nas Forças Armadas, mormente para a matrícula no Curso de Formação de Taifeiros.
IV – Agravo interno improvido.[3]
[…] CONCURSO PÚBLICO. INGRESSO NA CARREIRA MILITAR. APTIDÃO FÍSICA. ÍNDICE DE MASSA CORPORAL. CRITÉRIO. EXIGÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL ESPECÍFICA. AUSÊNCIA. RECURSO IMPROVIDO. […] III – A exigência de limites máximo e mínimo de Índice de Massa Corporal (IMC), em concursos públicos, somente é permitida mediante previsão legal específica, compatível com as atribuições do cargo. Precedente.
IV – Recurso improvido.[4]
O posicionamento adotado pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) é compartilhado pelos demais Tribunais pátrios. É o caso do Tribunal Regional Federal da 4a Região (TRF-4), que também decidiu no sentido de que “A Lei nº 6.880/80 (Estatuto dos Militares), de forma alguma estabelece especificamente os requisitos para exames de saúde em concursos às fileiras militares. Portanto, evidente que não existe a fixação do Índice de Massa Corpórea – IMC como fator à aptidão ou não para ingresso na carreira militar, sendo defeso fazê-lo através de portaria ou Edital de concurso, à míngua de Lei que o autorize” (AC nº 5003370-91.2017.4.04.7101/RS, Relator Desembargador Rogério Favreto).
Constata-se, assim, que predomina o entendimento dos tribunais pátrios de que é juridicamente imprópria a eliminação de qualquer candidato em concurso público para ingresso em cargo das Forças Armadas em razão do índice de massa corpórea (IMC), ainda que este requisito conste de portaria ou do edital do certame, uma vez que a legislação de regência (Estatuto dos Militares – Lei Federal nº 6.880/80) não possui disposição que autorize o estabelecimento desta restrição.
Assim, candidatos a estes cargos que, em concursos públicos, forem eliminados em fase de avaliação médica por causa do seu índice de índice de massa corpórea podem, por meio da propositura de ação judicial, buscar o reconhecimento da nulidade desta decisão. Uma vez reconhecida esta ilegalidade, como a vasta jurisprudência vem fazendo, o candidato deverá ser mantido para participar das demais fases e, a depender da sua aprovação, ser nomeado e empossado no respectivo cargo.
[1] Art. 142. As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica, são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e destinam-se à defesa da Pátria, à garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem.
[…]
X – a lei disporá sobre o ingresso nas Forças Armadas, os limites de idade, a estabilidade e outras condições de transferência do militar para a inatividade, os direitos, os deveres, a remuneração, as prerrogativas e outras situações especiais dos militares, consideradas as peculiaridades de suas atividades, inclusive aquelas cumpridas por força de compromissos internacionais e de guerra.
[2] STJ, AgInt no REsp 1761455/RS, Rel. Ministro GURGEL DE FARIA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 02/12/2019.
[3] STJ, AgInt no REsp 1570361/SP, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/03/2018.
[4] STJ, REsp 1610667/RS, Rel. Ministra REGINA HELENA COSTA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 12/12/2017.
Read MorePor inúmeras potenciais razões, há casos em que o contratado não é capaz de manter ou de comprovar a manutenção de sua regularidade fiscal durante a execução do contrato. E aí surge a questão: qual a consequência jurídica?
O Poder Público pode se recusar a pagar por serviços já prestados em razão de irregularidade fiscal posterior à celebração ou execução do contrato?
A prestação de serviços para a Administração Pública, de maneira geral, pode ser uma estratégia atrativa para empresas privadas que visam a firmar contratos de larga escala e/ou de longo prazo, em busca de lucros ou, ao menos, de fluxo financeiro, em benefício de sua saúde financeira, posicionamento no mercado ou até mesmo de expansão de atividades.
Entretanto, esta oportunidade é acompanhada de uma série de obrigações típicas, que não são comuns às contratações privadas. Ou seja, o processo de contratação pública é permeado de fases burocráticas, as quais demandam a apresentação, pelo particular, de uma grande quantidade de documentos a fim de comprovar, dentre outras coisas, as exigências contidas no inciso IV do artigo 27 da Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei Federal nº 8.666/93), que estabelece a regularidade fiscal como condicionante para a habilitação da empresa na licitação.
Sobre o tema, é necessário observar as determinações feitas pelo artigo 29 da referida Lei, que consistem, especificamente, na prova de regularidade para com a Fazenda Federal, Estadual e Municipal do domicílio ou sede do licitante, ou outra equivalente, na forma da lei. E essa demonstração de regularidade fiscal deve ocorrer na fase de habilitação da empresa licitante, que se dá, invariavelmente, em momento anterior ao início da execução dos serviços contratados.
Ocorre que, de acordo com o inciso XIII do artigo 55 da Lei de Licitações e Contratos Administrativos, o contratado tem a obrigação de “manter, durante toda a execução do contrato, em compatibilidade com as obrigações por ele assumidas, todas as condições de habilitação e qualificação exigidas na licitação”. Aplicando-se ao tema em análise, isto significa que o contratado precisa manter, durante a execução do contrato, a sua regularidade fiscal perante a Fazenda Pública.
Por inúmeras potenciais razões, há casos em que o contratado não é capaz de manter ou de comprovar a manutenção de sua regularidade fiscal durante a execução do contrato. E aí surge a questão: qual a consequência jurídica? A Administração Pública pode reter o pagamento por prestações já executadas? Deve-se rescindir o contrato?
Conforme se comprova a partir de inúmeros casos levados à análise do Poder Judiciário, há casos em que a Administração Pública retém repasses financeiros a empresas contratadas, após o início da execução dos serviços, em razão de irregularidades fiscais surgidas posteriormente à celebração ou execução do contrato.
No entanto, como não existe previsão legal que possibilite a imposição desta prática, tampouco isto se caracteriza como uma possibilidade de penalidade administrativa, os Tribunais possuem decisões reconhecendo a ilegalidade desta conduta administrativa.
Este entendimento é evidenciado em decisão recente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), de maio de 2019, proferida pela Segunda Turma de Direito Público, segundo a qual, “apesar de ser exigível a Certidão de Regularidade Fiscal para a contratação com o Poder Público, não é possível a retenção do pagamento de serviços já prestados, em razão de eventual descumprimento da referida exigência” (STJ, AgInt no REsp 1742457/CE).
De acordo com o voto do Relator Ministro Francisco Falcão, acolhido por unanimidade, a imposição de regularidade fiscal como condição para pagamento de serviços já prestados implicaria em afronta aos princípios norteadores da atividade administrativa, uma vez que não se revela razoável “que a comprovação de regularidade fiscal seja imposta como condição para a liberação do pagamento pelos serviços prestados”.
Ressalta-se que não se trata de um entendimento isolado da Segunda Turma. Conforme se depreende do acórdão RMS 53.467/SE, de relatoria do Ministro Herman Benjamin, que seguiu exatamente na mesma linha de que é “vedada a retenção do pagamento pelos serviços prestados”.
Inclusive, o Tribunal de Contas da União (TCU) compartilha do entendimento do STJ, como se verifica do Acórdão 964/2012, do Plenário, cujo relator foi o Ministro Walton Alencar Rodrigues. O posicionamento do TCU nesse caso gerou o seguinte enunciado:
Enunciado
A perda da regularidade fiscal, inclusive quanto à seguridade social, no curso de contratos de execução continuada ou parcelada justifica a imposição de sanções à contratada, mas não autoriza a retenção de pagamentos por serviços prestados. (TCU, Acórdão 964/2012, Plenário. Relator Ministro Walton Alencar Rodrigues. Julgado em 25/04/2012)
Abaixo estão as ementas dos acórdãos da Segunda Turma do STJ mencionados:
AGRAVO INTERNO. ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ASSOCIAÇÃO BENEFICENTE. CONTRATAÇÃO COM A MUNICIPALIDADE. SERVIÇOS JÁ REALIZADOS. EXIGÊNCIA DE CERTIDÃO DE REGULARIDADE FISCAL. RETENÇÃO DO PAGAMENTO. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES.
I – Na origem, a Associação Beneficente Cearense de Reabilitação – ABCR impetrou mandado de segurança contra ato do Secretario de Saúde do Município de Fortaleza, pretendendo receber o repasse financeiro relativo a serviços por ela prestados, decorrente de contrato entabulado entre as partes, sem a necessidade de apresentação de certidão negativa expedida pela Fazenda Pública Nacional.
II – O Tribunal a quo manteve a decisão concessiva da ordem.
III – Ao recurso especial interposto pela municipalidade foi negado provimento, com base na Súmula 568/STJ, em razão da jurisprudência da Corte encontrar-se pacificada no mesmo sentido da decisão recorrida: apesar de ser exigível a Certidão de Regularidade Fiscal para a contratação com o Poder Público, não é possível a retenção do pagamento de serviços já prestados, em razão de eventual descumprimento da referida exigência. Precedentes: REsp n. 1.173.735/RN, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, DJe 9/5/2014, RMS n. 53.467/SE, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 27/06/2017, dentre outros.
IV – Os argumentos trazidos pelo agravante não são suficientes para alterar o entendimento prestigiado pela decisão atacada.
V – Agravo interno improvido. [grifo acrescido]
(STJ, AgInt no REsp 1742457/CE, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 23/05/2019, DJe 07/06/2019).
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRATO ADMINISTRATIVO. ILEGALIDADE NÃO CONFIGURADA. DIREITO LÍQUIDO E CERTO NÃO DEMONSTRADO.
[…] 2. O Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe concedeu parcialmente a ordem, para determinar à autoridade impetrada, exclusivamente, que se abstenha de condicionar o pagamento relativo às faturas das notas fiscais referentes aos serviços executados, decorrentes do contrato administrativo 55/2013, à apresentação de certidões negativas de débitos e/ou de regularidade fiscal (fls. 121-129, e-STJ).
- A decisão impugnada não merece reforma, pois cabe à recorrente cumprir com sua obrigação de apresentar a comprovação de sua regularidade fiscal, sob pena de ver rescindido o contrato com o Município pelo descumprimento de cláusula contratual, em que pese ser vedada a retenção do pagamento pelos serviços prestados, como ocorreu na espécie, no que tange às notas fiscais apresentadas na petição inicial. […]
- A recorrente não trouxe argumento capaz de infirmar os fundamentos da decisão recorrida e demonstrar a ofensa ao direito líquido e certo.
- Recurso Ordinário não provido. [grifo acrescido]
(STJ, RMS 53.467/SE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/06/2017, DJe 30/06/2017)
Portanto, o entendimento que prevalece na Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) e no Tribunal de Contas da União (TCU) é de que, embora seja dever da empresa contratada comprovar a sua regularidade fiscal, inclusive durante a execução do contrato, o Poder Público não pode se recusar a pagar pelos serviços já prestados, sob pena de cometer um ato administrativo ilegal e passível de reforma pelos órgãos de controle. As exceções existentes a este entendimento são bastante pontuais e estão relacionadas a casos em que a Administração Pública corre o risco de ser responsabilizada pelo débito fiscal pendente e inadimplido por parte do contratado.
Read MoreExiste o entendimento de que a suspensão do direito de licitar não se aplica a todas os processos licitatórios, ou seja, de que essa suspensão é válida apenas para as licitações lançadas pelo órgão ou entidade que aplicou a penalidade. Foi o que decidiu o Tribunal de Contas da União (TCU).
A penalidade de suspensão temporária do direito de licitar é válida apenas para o órgão/entidade que aplicou a sanção?
O descumprimento de contratos decorrentes de processos licitatórios pode trazer graves prejuízos para a Administração Pública, colocando em risco a segurança e a efetividade desta forma de contratação. Por este motivo, a Lei Federal nº 8.666/1993[1]Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8666cons.htm estabelece diversas penalidades a serem aplicadas às empresas contratadas que descumprirem com a execução dos contratos administrativos firmados.
Exemplo disso é a suspensão temporária do direito de licitar, sanção prevista no artigo 87, inciso III, da Lei Federal nº 8.666/1993[2]Art. 87. Pela inexecução total ou parcial do contrato a Administração poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções: […] III – suspensão … Continue reading. Esta medida impede que determinada empresa volte a participar de processo licitatório e firme contratos com a Administração por até dois anos, em decorrência de descumprimento do objeto contratual anteriormente pactuado.
Entretanto, existe divergência a respeito da amplitude desta penalidade. Por um lado, há o entendimento de que a suspensão do direito de licitar não se aplica a todas os processos licitatórios, ou seja, de que essa suspensão é válida apenas para as licitações lançadas pelo órgão ou entidade que aplicou a penalidade.
Foi o que decidiu o Tribunal de Contas da União (TCU), em decisão de fevereiro de 2019, que acolheu a manifestação da unidade técnica. Confira-se:
3. Por outro lado, o Diretor da unidade técnica especializada manifestou concordância parcial com a proposta de mérito, divergindo apenas quanto ao juízo sobre o procedimento da DPU ao inabilitar a representante em face de sanção pretérita de suspensão do direito de participar de licitações e de impedimento de contratar com a Administração (art. 87, inciso III, da Lei 8.666/1993), aplicada por outro órgão promotor, em afronta ao entendimento do TCU de que a abrangência dessa penalidade se restringe ao órgão/entidade sancionadora.[3]TCU, Acórdão nº 266/2019, TC 042.073/2018-9, Plenário, Relator Aroldo Cedraz, julgado em 13/02/2019.
Este entendimento adota o entendimento de que a mesma Lei que estabelece esta penalidade também conceitua importante diferença semântica entre as expressões “Administração Pública” e “Administração”. Por Administração Pública, tem-se o conjunto de órgãos e entidades do poder público através dos quais se exerce a administração direta e indireta da União. Já a Administração diz respeito a uma unidade administrativa isolada, através da qual a Administração Pública opera.
Note-se que, para o Tribunal de Contas da União (TCU), o conceito de Administração faz parte do conjunto da Administração Pública, mas não se confunde com ela. Apesar de, à primeira vista, se tratar de uma diferença conceitual sutil, na prática estes dois conceitos fazem toda a diferença. A penalidade disposta no artigo 87, inciso III da Lei de Licitações expressa claramente que haverá “suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração”, ou seja, que a parte penalizada não poderá firmar contrato com o órgão individual que aplicou a penalidade citada.
Por outro lado, existe o entendimento sustentado, ao menos até o momento, pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). Veja-se um exemplo:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. SUSPENSÃO TEMPORÁRIA DE PARTICIPAR DE LICITAÇÃO E IMPEDIMENTO DE CONTRATAR. ALCANCE DA PENALIDADE. TODA A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. […] 2. De acordo com a jurisprudência do STJ, a penalidade prevista no art. 87, III, da Lei n. 8.666/1993 não produz efeitos apenas em relação ao ente federativo sancionador, mas alcança toda a Administração Pública […][4]STJ, AIRESP 201301345226, GURGEL DE FARIA, STJ – PRIMEIRA TURMA, DJE DATA:31/03/2017.
O entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) adota um conceito ampliado de Administração, que enfatiza o princípio da unidade administrativa, assumindo que os efeitos da conduta que inabilita o sujeito para a contratação devem se estender a qualquer órgão ou entidade da Administração Pública.
Por fim, registre-se que a Lei Federal nº 13.979/2020 permitiu, excepcionalmente, a contratação de particular que esteja com inidoneidade declarada ou com o direito de participar de licitação ou contratar com o Poder Público suspenso, desde que, comprovadamente, seja o único fornecedor do bem ou serviço necessário ao enfrentamento da emergência de saúde pública decorrente da COVID-19 (art. 4º, § 3º).
Referências[+]
↑1 | Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8666cons.htm |
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↑2 | Art. 87. Pela inexecução total ou parcial do contrato a Administração poderá, garantida a prévia defesa, aplicar ao contratado as seguintes sanções: […]
III – suspensão temporária de participação em licitação e impedimento de contratar com a Administração, por prazo não superior a 2 (dois) anos. |
↑3 | TCU, Acórdão nº 266/2019, TC 042.073/2018-9, Plenário, Relator Aroldo Cedraz, julgado em 13/02/2019. |
↑4 | STJ, AIRESP 201301345226, GURGEL DE FARIA, STJ – PRIMEIRA TURMA, DJE DATA:31/03/2017. |
A crise que se instalou no Brasil pode servir como gatilho para o desenvolvimento de uma nova administração pública: mais digital do que nunca.
Está em todos os jornais. Todas as redes sociais. Todos os grupos de WhatsApp. Todas os canais de televisão.
Os países em todo o planeta estão envidando esforços para tentar conter o contágio desenfreado do COVID-19 entre a população, principalmente entre aquela considerada “de risco”. Para tanto, os governos estão expedindo normas que visam à diminuição das interações sociais, como a suspensão dos serviços públicos “não essenciais” e do transporte público coletivo, o fechamento de fronteiras e, em alguns casos, até mesmo a proibição do trânsito de cidadãos nas ruas, entre outras medidas.
Como era de se esperar, o Brasil não está isento da crise mundial que se instalou. Os cidadãos brasileiros estão assistindo aos seus governantes adotarem medidas extremas para frear o contágio e tentar “dilui-lo” ao longo do tempo, para evitar a saturação do sistema de saúde, que não possui condições de atender uma demanda generalizada de pacientes em estado grave.
Uma das medidas adotadas, como salientado, foi a suspensão de alguns serviços públicos que demandam a presença física dos servidores e da população, os quais proporcionariam um ambiente propício para o contágio do COVID-19. Além disso, houve um movimento nacional para viabilizar e implementar o home office de servidores públicos, com o intuito de evitar tanto o contágio como a paralisação total da atividade administrativa.
E foi justamente nesse momento de crise que veio à tona a importância de existir processos administrativos eletrônicos e serviços públicos em formato digital, que estejam à disposição dos cidadãos brasileiros. A simbiose desses instrumentos permite a efetividade das medidas até o momento adotadas por algumas administrações públicas: o home office dos servidores e a continuidade dos serviços públicos cuja presença física do destinatário é prescindível.
A propósito, algumas aplicações digitais já foram desenvolvidas e adotadas pelas administrações públicas para fazer frente ao contágio do COVID-19.
É o caso do Município de Florianópolis, que lançou, no dia 16 de março, o programa “Alô, Saúde”, responsável por oferecer atendimento pré-clínico por meio de telefone e aplicativos, 24 horas por dia, aos moradores da capital catarinense que estejam cadastrados nos centros de saúde do município. O atendimento pode ser realizado por meio de telefone, WhatsApp, website ou aplicativo de celular (iOS e Android), sendo possível marcar consultas, solucionar dúvidas sobre o sistema de saúde e resultados de exames[1].
No âmbito nacional, o Ministério da Saúde também desenvolveu aplicativo que visa à divulgação de informações sobre o COVID-19 e ao combate às fake news relacionadas à doença. Por meio do aplicativo “Coronavírus – SUS” (também disponível em iOS e Android), o cidadão pode conhecer dicas de prevenção, descrição de sintomas, formas de transmissão e mapa de unidades de saúde, por exemplo[2].
Esses são apenas alguns exemplos – trazidos ao texto em razão da utilidade e por estarem mais próximo de quem vos escreve, nesse período de fundamental “quarentena social” – de como a crise instalada no país exaltou a necessidade de transformação da administração pública brasileira.
É o momento de salientarmos a importância da administração pública digital, a qual, por meio de processos administrativos eletrônicos e mediante o uso das tecnologias mais modernas, busca aumentar a eficiência, a transparência, a participação social, o controle, a simplificação da burocracia, a agilidade e qualidade na prestação de serviços públicos, etc.
Esses objetivos podem ser alcançados em razão de que a administração pública mais digitalizada fortalece, por exemplo, (1) a celeridade na expedição de intimações, no protocolo de petições e nas tomadas de decisões, (2) a avaliação de desempenho e produtividade dos servidores em tempo real, (3) a diminuição do tempo ocioso do processo parado na repartição pública, (4) a qualificação dos servidores para atuar numa administração pública mais tecnológica, (5) a diminuição dos impactos ambientais, (6) a mitigação de tarefas repetitivas e a consequente especialização das funções administrativas e (7) a tramitação simultânea ou paralela entre diversos órgãos públicos.
É preciso ressaltar, ainda, que o processo administrativo eletrônico, e consequentemente a administração pública digital, carregam potencial para “a incorporação célere de tecnologias contemporâneas disruptivas, apresentando-se como o primeiro passo rumo ao desenvolvimento de uma administração pública moderna e tecnológica, atenta aos anseios da sociedade da informação do século XXI, aos direitos fundamentais dos cidadãos e à prestação de serviços públicos digitais com qualidade”[3].
Alguns exemplos de tecnologias atualmente existentes e que podem ser aproveitadas pela administração pública digital que atua mediante processos administrativos eletrônicos são: (1) a computação em nuvem (cloud computing) nas entidades e órgãos públicos, (2) a utilização mais efetiva das redes sociais para alcançar a população mais distante da esfera administrativa, (3) o processamento de Big Data para conferir mais eficiência e qualidade aos serviços públicos, (4) a tecnologia blockchain nos processos de contratações públicas, mas não restrito a eles, e (5) o uso de ferramentas que operam com inteligência artificial.
Portanto, o desprezo das possibilidades e benefícios proporcionados à administração pública pelas tecnologias mais modernas é algo inadmissível diante da realidade que o início da terceira década do século XXI nos impõe. As tecnologias já fazem parte do cotidiano da sociedade brasileira e, em momentos de crise como esta, torna-se evidente a necessidade de repensar a administração pública tipicamente analógica.
O COVID-19 chegou ao país e, a partir de agora, resta saber se ele será o gatilho para o desenvolvimento de uma nova concepção de administração pública: mais digital do que nunca.
Eduardo Schiefler – Advogado no escritório Schiefler Advocacia, com atuação específica na área de Direito Administrativo. Mestrando em Direito pela Universidade de Brasília (UnB). Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Integrante do Grupo de Estudos em Direito Público (GEDIP/UFSC). Integrante do Grupo de Pesquisa em Direito, Racionalidade e Inteligência Artificial (DRIA.UnB). Colaborador do Portal Jurídico Investidura (PJI). Colaborador da Loja.Legal. Autor de artigos acadêmicos, especialmente na área de Direito Administrativo e Tecnologia.
[1] Disponível em: https://g1.globo.com/sc/santa-catarina/noticia/2020/03/16/florianopolis-lanca-servico-de-atendimento-virtual-para-casos-de-coronavirus-e-outras-doencas.ghtml. Acesso em 18 mar. 2020.
[2] Disponível em: https://www.unasus.gov.br/noticia/ministerio-da-saude-disponibiliza-aplicativo-sobre-o-coronavirus. Acesso em 18 mar. 2020.
[3] SCHIEFLER, Eduardo André Carvalho. Processo Administrativo Eletrônico. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2019. p. 157.
Texto originalmente publicado em: https://www.jota.info/coberturas-especiais/inova-e-acao/covid-19-e-a-importancia-da-administracao-publica-digital-18032020
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Giovanna realizará seus estudos na área de Direito do Estado, subárea Teoria do Estado, tratando do tema de políticas públicas e corrupção.
A advogada Giovanna Gamba foi aprovada e ingressou, no segundo semestre de 2019, no mestrado do Programa de Pós-Graduação em Direito da Universidade de São Paulo (USP), sob orientação da Prof. Dra. Maria Paula Dallari Bucci, autora de diversas obras na área de Direito e Políticas Públicas.
Giovanna realizará seus estudos na área de Direito do Estado, subárea Teoria do Estado, tratando do tema de políticas públicas e corrupção.
Read MoreA Locus Iuris é uma das maiores empresas juniores de Direito do Brasil e atua, principalmente, na área do Direito Empresarial, com foco nas empresas startups.
O estagiário José Vitor Schmitz foi aprovado no processo seletivo da Locus Iuris, empresa júnior do Curso de Direito da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), e assumiu o cargo de Gerente de Projetos.
O período trainee teve inicio em abril de 2019, sendo que, ao final, José Vitor foi efetivado como membro da Diretoria, no cargo de Gerente de Projetos. Esta função é responsável pela coordenação e gerenciamento dos projetos realizados pela equipe, além do esclarecimento de dúvidas e orientação dos demais membros que assessoram a execução.
A Locus Iuris é uma das maiores empresas juniores de Direito do Brasil e atua, principalmente, na área do Direito Empresarial, com foco nas empresas startups.
A advogada abordou tópicos referentes à Inteligência Artificial e ao Projeto VICTOR STF/UnB, do qual participa como pesquisadora.
A advogada Roberta Zumblick compôs painel sobre Processo e Tecnologia no II Congresso Brasileiro de Processo Civil, que ocorreu em Florianópolis nos dias 24, 25 e 26 de julho.
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Em sua mesa, que contou com a participação da Dra. Marina Polli e dos Drs. Erik Navarro e Bruno Bodart, Roberta Zumblick abordou tópicos referentes à Inteligência Artificial e ao Projeto VICTOR STF/UnB, do qual participa como pesquisadora.
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Coordenado pelo Prof. Pedro Miranda de Oliveira, o evento contou com mais de 120 renomados juristas e mais de 70 mesas, que discutiram temas relevantes e atuais do ponto de vista do direito processual civil e suas nuances. O número de inscrições superou 2.000 congressistas, alcançando o patamar de maior evento jurídico de 2019.
Caso o procedimento administrativo sancionatório (sindicância ou processo disciplinar) não seja instaurado e finalizado em tempo hábil, a Administração perderá o direito de punir o servidor ou empregado público.
A Administração Pública pode perder o direito de aplicar uma penalidade administrativa a servidor ou empregado público em razão da demora em fazê-lo desde a descoberta dos fatos que justificariam esta sanção. Esta perda do direito de punir em razão do lapso temporal para aplicar a penalidade é denominada prescrição[1].
Em linhas gerais, a prescrição é um instituto jurídico que possui origem vinculada ao princípio da segurança jurídica, sendo que o seu objetivo é reconhecer estabilidade à relação funcional entre o agente público e a Administração em virtude do decurso do tempo.
Para o que interessa à questão desta nota, verifica-se que o instituto da prescrição possui plena aplicabilidade aos Processos Administrativos Disciplinares (PADs). Inclusive, a incidência da prescrição está expressamente prevista no artigo 142 da Lei Federal nº 8.112/1990, que disciplina o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais.
Leia-se o que dispõe o referido artigo:
Art. 142. A ação disciplinar prescreverá:
I – em 5 (cinco) anos, quanto às infrações puníveis com demissão, cassação de aposentadoria ou disponibilidade e destituição de cargo em comissão;
II – em 2 (dois) anos, quanto à suspensão;
III – em 180 (cento e oitenta) dias, quanto à advertência.
§ 1º O prazo de prescrição começa a correr da data em que o fato se tornou conhecido.
§ 2º Os prazos de prescrição previstos na lei penal aplicam-se às infrações disciplinares capituladas também como crime.
§ 3º A abertura de sindicância ou a instauração de processo disciplinar interrompe a prescrição, até a decisão final proferida por autoridade competente.
§ 4º Interrompido o curso da prescrição, o prazo começará a correr a partir do dia em que cessar a interrupção.
As regras estabelecidas no artigo 142 da Lei Federal nº 8.112/1990 são claras, mas, na prática, insuficientes para responder a todas as questões que surgem sobre a aplicabilidade da prescrição aos Processos Administrativos Disciplinares (PADs).
Por exemplo: (i) O prazo da prescrição começa a correr desde que se tornou conhecido por quem? Por qualquer outro servidor público? Pela autoridade competente para aplicar a sanção? (ii) Há um prazo máximo para que seja promovido o reinício do prazo prescricional após a interrupção prevista no § 3º do artigo 142 da Lei Federal nº 8.112/1990? Ou a demora da Administração Pública em finalizar a sindicância ou processo disciplinar mantém indefinidamente a interrupção e impede a possibilidade de se reconhecer a prescrição?
A jurisprudência nacional recentemente estabilizou as respostas a essas questões práticas. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) elaborou uma súmula sobre o assunto. Trata-se da Súmula nº 635, aprovada em junho de 2019 pela 1ª Turma da Corte Superior, que é responsável por julgar os processos com matéria de direito público. A súmula possui a seguinte redação:
Súmula nº 635 – STJ
Os prazos prescricionais previstos no art. 142 da Lei n. 8.112/1990 iniciam-se na data em que a autoridade competente para a abertura do procedimento administrativo toma conhecimento do fato, interrompem-se com o primeiro ato de instauração válido – sindicância de caráter punitivo ou processo disciplinar – e voltam a fluir por inteiro, após decorridos 140 dias desde a interrupção.
De acordo com a Súmula 635 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), portanto, o prazo prescricional inicia-se quando a autoridade competente para a abertura do procedimento administrativo toma conhecimento do fato. Destaque-se que o início da contagem do prazo prescricional não exige que a autoridade competente para aplicar a sanção tome conhecimento do fato, apenas que este fato seja de conhecimento da autoridade competente para abrir o procedimento administrativo sancionatório.
Além disso, estabeleceu-se a regra de que, com a abertura do processo sancionatório, o decurso do prazo prescricional deve ser necessariamente reiniciado após 140 dias. Ou seja, a interrupção não pode ocorrer por tempo indefinido.
O retorno da fluência do prazo, por inteiro, após os 140 dias desde a instauração ocorre em razão de que “esse seria o prazo legal para término do processo disciplinar (§ 4º do art. 142 c/c arts. 152 e 167)”[2], também nos termos da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Note-se que este entendimento encontra-se sumulado precisamente porque reverbera uma jurisprudência consolidada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça (STJ), como se verifica do seguinte julgado:
MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. TERMO INICIAL DO PRAZO PRESCRICIONAL. CONHECIMENTO DOS FATOS PELA ADMINISTRAÇÃO, MAS NÃO PELA AUTORIDADE COMPETENTE PARA APURAR AINFRAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE DE APLICAÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL PREVISTO NO CPB, POR INEXISTÊNCIA DE AÇÃO PENAL E CONDENAÇÃO EM DESFAVOR DO IMPETRANTE. APLICAÇÃO DO PRAZO QUINQUENAL PREVISTO NA LEGISLAÇÃO ADMINISTRATIVA (ART. 142 DA LEI 8.112/90). INSTAURAÇÃO DE PAD. INTERRUPÇÃO DO PRAZO PRESCRICIONAL. REINÍCIO APÓS 140 DIAS. TRANSCURSO DE MAIS DE 5 ANOS. PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA. ORDEM CONCEDIDA, EM CONSONÂNCIA COM O PARECER MINISTERIAL.
1. O excepcional poder-dever de a Administração punir a falta cometida por seus Servidores não se desenvolve ou efetiva de modo absoluto, de sorte que encontra limite temporal no princípio da segurança jurídica, de hierarquia constitucional, uma vez que os administrados não podem ficar indefinidamente sujeitos à instabilidade originada da potestade disciplinar do Estado, além de que o acentuado lapso temporal transcorrido entre o cometimento da infração e a aplicação da respectiva sanção esvazia a razão de ser da responsabilização do Servidor supostamente transgressor.
2. O art. 142, I da Lei 8.112/90 (Regime Jurídico dos Servidores Públicos da União) funda-se na importância da segurança jurídica no domínio do Direito Público, instituindo o princípio da inevitável prescritibilidade das sanções disciplinares, prevendo o prazo de cinco anos para o Poder Público exercer o jus puniendi na seara administrativa, quanto à sanção de demissão.
3. A Terceira Seção desta Corte pacificou o entendimento de que o termo inicial do prazo prescricional da Ação Disciplinar é a data em que o fato se tornou conhecido pela Administração, mas não necessariamente pela autoridade competente para a instauração do Processo Administrativo Disciplinar (art. 142, § 1o. da Lei 8.112/90). Precedente: MS 11.974/DF, Rel. Min. LAURITA VAZ, DJU07.05.2007.
4. Qualquer autoridade administrativa que tiver ciência da ocorrência de infração no Serviço Público tem o dever de proceder à apuração do ilícito ou comunicar imediatamente à autoridade competente para promovê-la, sob pena de incidir no delito de condescendência criminosa (art. 143 da Lei 8.112/90); considera-se autoridade, para os efeitos dessa orientação, somente quem estiver investido de poder decisório na estrutura administrativa, ou seja, o integrante da hierarquia superior da Administração Pública. Ressalvado ponto de vista do relator quanto à essa exigência.
5. Ainda que o ilícito administrativo configure, em tese, ilícito penal, não havendo a formalização de denúncia contra o Servidor, aplica-se o prazo prescricional previsto na Lei 8.112/90 à sancionabilidade administrativa; a eventual presença de indícios de crime, sem a devida imputação, afasta a aplicação da norma penal no cômputo da prescrição (RMS 20.337/PR, Rel. Min. LAURITA VAZ, DJU07.12.2009), o mesmo ocorrendo no caso de o Servidor ser absolvido na Ação Penal (MS 12.090/DF, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, DJU21.05.2007); não seria razoável aplicar-se à prescrição da punibilidade administrativa o prazo prescricional da sanção penal, se sequer se deflagrou a iniciativa criminal, sendo incerto, portanto, o tipo em que o Servidor seria incurso, bem como a pena que lhe seria imposta, o que inviabiliza a apuração da respectiva prescrição.
6. Neste caso, entre o conhecimento dos fatos pela Administração e a instauração do primeiro Processo Disciplinar transcorreu pouco menos de 1 ano, não havendo falar em prescrição retroativa. Contudo, o primeiro procedimento válido teve início em 26 de agosto de 2002, pelo que a prescrição voltou a correr em 25 de dezembro de 2002, data em que findou o prazo de 140 dias para conclusão do PAD. Desde essa data, passaram-se mais de 5 anos até a edição da Portaria Conjunta AGU/MPS/PGR 18, de 25 de agosto de 2008, que designou nova Comissão de Processo Administrativo Disciplinar para apurar irregularidades referentes ao convênio objeto de apuração.
7. A prescrição tem o condão de eliminar qualquer possibilidade de punição do Servidor pelos fatos apurados, inclusive futuras anotações funcionais em seus assentamentos, já que, extinta a punibilidade, não há como subsistir qualquer efeito reflexo.
8. Ordem concedida, em conformidade com o parecer ministerial.[3] [grifo acrescido]
Dessa sorte, caso o procedimento administrativo sancionatório (sindicância ou processo disciplinar) não seja instaurado e finalizado em tempo hábil, a Administração perderá o direito de punir o servidor ou empregado público.
Em atenção à questão que intitula esta nota, portanto, responde-se que as diretrizes para a contagem dos prazos prescricionais em Processos Administrativos Disciplinares (PADs) seguem atualmente as regras indicadas no artigo 142 da Lei Federal nº 8.112/1990 e a interpretação conferida pela Súmula nº 635 do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Gustavo Schiefler – Advogado no escritório Schiefler Advocacia (www.schiefler.adv.br). Doutor em Direito do Estado pela Universidade de São Paulo (USP). Mestre e graduado em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).
[1] A título de esclarecimento, a prescrição no âmbito das sanções administrativas não se confunde com a prescrição na teoria geral do direito civil, prevista no artigo 189 do Código Civil, que se refere à perda da pretensão de exigir a reparação de um direito violado em razão da inércia de seu titular. A rigor, a prescrição prevista na Lei Federal nº 8.112/1990 se assemelha até mesmo ao instituto denominado por decadência no direito civil, uma vez que também ocorre a própria perda do direito (no caso, de exercer o poder-dever de punir o indivíduo), distanciando-se conceitualmente da decadência apenas em razão de que, na prescrição da sanção administrativa, admite-se a interrupção e a suspensão do prazo.
[2] STJ – MS: 17954 DF 2011/0302495-0, Relator: Ministro BENEDITO GONÇALVES, Data de Julgamento: 26/02/2014, S1 – PRIMEIRA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 19/03/2014
[3] STJ – MS: 14391 DF 2009/0107475-0, Relator: Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, Data de Julgamento: 24/08/2011, S3 – TERCEIRA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 10/02/2012
Read MoreTemas importantes da atualidade, como inteligência artificial, tecnologia blockchain e Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) foram abordadas durante os dois dias de evento.
Registro da advogada Roberta Zumblick, em sua participação no EXPOJUD, Congresso de Inovação, Tecnologia e Direito para Ecossistema de Justiça, que aconteceu em Brasília (DF) nos dias 12 e 13 de junho.
O evento é o primeiro encontro sobre a revolução exponencial desse segmento, possuindo como objetivo a promoção de debates sobre inovação, tecnologia e empreendedorismo no âmbito do sistema judicial. Temas importantes da atualidade, como inteligência artificial, tecnologia blockchain e Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) foram abordadas durante os dois dias de evento.
Em seu painel, cujo moderador foi o Dr. Caio Moyses de Lima, Juiz Federal do TRF-1, a advogada analisou alguns aspectos que foram abordados em seu livro “Inteligência Artificial e Direito”, escrito em coautoria com o seu orientador de Mestrado, Prof. Fabiano Hartmann.
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