
COMO A FCPA PODE IMPACTAR OS NEGÓCIOS BRASILEIROS
Breve contextualização
Entre as legislações mais rigorosas, a Foreign Corrupt Practices Act (FCPA) ocupa posição de destaque em matéria de compliance, pois regula práticas anticorrupção que transcendem fronteiras e impõe responsabilidades complexas para negócios estrangeiros. Originalmente promulgada em 1977, a FCPA consolidou-se como um dos principais instrumentos de combate à corrupção internacional, atingindo não apenas empresas americanas, mas também companhias estrangeiras que mantenham vínculo com os Estados Unidos.
A aplicação da FCPA passou por ajustes estratégicos, especialmente após a suspensão temporária implementada pelo atual governo Donald Trump, o que requer atenção das empresas estrangeiras. Embora tais mudanças tenham priorizado a segurança econômica norte-americana e reduzido alguns entraves regulatórios, a lei continua representando um marco de exigência global, o que impõe elevados padrões de governança.
Em um ambiente de fiscalização ativa pelo Departmente of Justice (DOJ) e pela Securities and Exchange Commission (SEC), o alinhamento entre práticas internas e expectativas regulatórias é fator crítico para mitigar riscos jurídicos, financeiros e reputacionais. Para garantir que seu negócio esteja em conformidade com a FCPA, apresentam-se, a seguir, os principais pontos da lei, as recentes mudanças promovidas pelo atual governo norte-americano e as melhores práticas para adequação dos programas de compliance.
O que é a FCPA e qual a sua importância?
A FCPA foi criada para coibir práticas ilícitas que prejudicam a livre concorrência, como o pagamento de propinas a agentes públicos estrangeiros. Nesse sentido, a lei estabelece duas frentes principais de atuação: (i) as disposições antissuborno, que proíbem qualquer pagamento ou promessa de vantagem indevida a funcionários públicos com a finalidade de influenciar decisões ou atos, e (ii) as disposições contábeis, que impõem às empresas obrigações rigorosas de controles internos e manutenção de registros financeiros fidedignos.
Um dos aspectos mais relevantes da FCPA é sua jurisdição extraterritorial, que permite às autoridades norte-americanas processar empresas estrangeiras que mantenham vínculo com os Estados Unidos, seja por meio de transações financeiras, operações mobiliárias ou presença física no território.
Essa característica faz com que a aplicação da FCPA não se limite às fronteiras norte-americanas e possa alcançar empresas e indivíduos em outros países, inclusive o Brasil. Assim, uma mesma conduta pode gerar responsabilização simultânea nos Estados Unidos e no Brasil — à luz da Lei nº 12.846/2013 (Lei Anticorrupção Brasileira) — duplicando os riscos jurídicos, financeiros e reputacionais para as organizações envolvidas.
Por isso, compreender a FCPA não é apenas uma exigência legal, mas uma necessidade operacional e estratégica no contexto da governança corporativa global.
Quem deve observar a FCPA?
A incidência da FCPA ocorre, obrigatoriamente, em três hipóteses. A primeira trata das companhias que possuem valores mobiliários registrados na Comissão de Valores Mobiliários dos EUA ou que negociam ações no mercado norte-americano, sendo que esta classificação é chamada de “issuers” pela legislação.
Ainda, há também incidência no caso dos “domestic concern”, os quais correspondem à pessoa física ou à pessoa jurídica que esteja estabelecida nos Estados Unidos, seja através de moradia ou sede do estabelecimento, de modo que se sujeita à jurisdição norte-americana.
Por fim, também há a hipótese do “territorial jurisdiction”, que surge quando um indivíduo ou uma empresa pratica, dentro do território americano, ato relacionado à corrupção, atraindo a competência da FCPA.
Diante desse contexto, as empresas brasileiras devem se atentar para possíveis situações que as enquadrem em alguma dessas hipóteses. Por exemplo, sempre que houver subsidiária nos Estados Unidos, participação acionária negociada em bolsas norte-americanas ou negócios envolvendo atividades no país, a FCPA se torna aplicável. O descumprimento pode resultar em ações judiciais, multas expressivas e responsabilização simultânea no Brasil e nos EUA, além de danos à reputação corporativa.
Principais implementos para adequação à FCPA
Estar em conformidade com a FCPA exige a implementação de programas robustos de compliance, alinhados às melhores práticas internacionais. O Departamento de Justiça dos Estados Unidos (DOJ), órgão responsável por aplicar a lei, apresenta diversas orientações para que as empresas avaliem a efetividade de seus programas. A seguir, destacam-se as instruções essenciais para garantir conformidade:
- O programa de compliance é bem desenvolvido?
Essa avaliação considera se o programa contempla análise de riscos, políticas claras e conformidade com legislações federais. Também verifica a qualidade das políticas internas, bem como a realização e frequência dos treinamentos.
Isso inclui a existência de canais seguros de denúncia e mecanismos eficazes de due diligence, de modo que a empresa apresente um programa abrangente e consistente.
- O programa de compliance tem recursos e independência para funcionar?
Nesse ponto, avalia-se o comprometimento da alta administração com as políticas internas. Também se analisa o grau de independência do comitê de integridade e das auditorias, de modo que estejam bem estruturados e qualificados para cumprir, de fato, o papel previsto no programa.
- O programa de compliance funciona na prática?
Essa etapa busca analisar a continuidade das revisões e melhorias das políticas que integram o programa. Além disso, avalia-se a efetividade dos controles e das investigações de suspeitas de corrupção, bem como a aplicação de medidas corretivas após a identificação de irregularidades.
Como boas práticas complementares, recomenda-se a realização de treinamentos contínuos, a classificação de terceiros por nível de risco, a inclusão de cláusulas anticorrupção em contratos, a manutenção de registros contábeis completos e a adoção de controles internos robustos.
Mudanças sob o governo Trump: novo direcionamento da FCPA
A gestão de Donald Trump adotou uma política mais pragmática em relação à aplicação da FCPA, com novos direcionamentos. Após a suspensão de 180 dias para revisão da legislação, houve uma redefinição dos focos de fiscalização, agora mais voltados à proteção da segurança econômica e nacional dos Estados Unidos, com a eliminação de barreiras consideradas excessivas ao comércio americano no exterior. A aplicação da lei passou a priorizar:
(i) organizações criminosas internacionais e cartéis;
(ii) casos que envolvam setores estratégicos da economia americana;
(iii) situações que causem prejuízos significativos à competitividade das empresas americanas;
(iv) práticas de corrupção com dolo evidente e com mecanismos sofisticados de ocultação.
Esse redirecionamento não deve ser interpretado como uma flexibilização completa, mas como uma concentração de esforços em condutas mais graves e de maior impacto econômico. Na prática, empresas que atuam em mercados sensíveis, como defesa, tecnologia e energia, continuam sob intensa fiscalização.
Empresas brasileiras: riscos e medidas essenciais
Empresas brasileiras com operações internacionais, participação acionária nos EUA ou subsidiárias em território americano devem adequar-se rigorosamente à FCPA. Algumas recomendações estratégicas incluem:
- Fortalecer programas de compliance com políticas anticorrupção e revisão periódica;
- Estabelecer due diligence rigorosa para terceiros, parceiros e agentes;
- Reforçar controles internos contábeis, garantindo registros transparentes;
- Regular práticas de hospitalidade e brindes;
- Promover treinamentos constantes, assegurando que todos os colaboradores compreendam as regras e saibam utilizar os canais de denúncia.
A adoção dessas práticas não apenas evita sanções severas, como também fortalece a imagem corporativa perante investidores, parceiros e órgãos reguladores.
Conclusão
A conformidade com a FCPA vai muito além da simples mitigação de riscos. Em um ambiente globalizado e altamente competitivo, estar em conformidade é sinônimo de credibilidade, governança sólida e sustentabilidade empresarial. Empresas que negligenciam esse aspecto expõem-se a sanções financeiras e reputacionais, enquanto aquelas que implementam políticas eficazes de integridade constroem diferenciais competitivos duradouros.
Diante da complexidade da FCPA e da relevância estratégica da integridade corporativa, é indispensável contar com um parceiro jurídico experiente e especializado.
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