O que você precisa saber antes de realizar o TAF – Teste de Aptidão Física
Eduarda Militz
Em diversos concursos públicos, a preparação teórica do candidato não é suficiente para garantir a aprovação no certame. A depender do cargo desejado, é possível que o concurso tenha como etapa obrigatória o Teste de Aptidão Física (TAF), que, em regra, possui caráter eliminatório e tem como objetivo aferir o preparo físico do candidato.
Read MoreVaga reservada em concurso público: entenda seus direitos
Todos aqueles que pretendem assumir cargo ou emprego público sabem que, para atingir seu objetivo, dependem da aprovação em concurso público, de acordo com o artigo 37 da Constituição Federal. Essa condição foi estabelecida pelo Estado brasileiro, em síntese, para garantir a igualdade no acesso aos cargos ou empregos públicos, e com o objetivo de assegurar a meritocracia no preenchimento dessas vagas.
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A participação de pessoas físicas ou jurídicas em processos licitatórios deve ser precedida da análise sobre a inexistência de impeditivos legais.
Read MoreEntenda a declaração de inidoneidade para licitações
A declaração de inidoneidade é a espécie de sanção administrativa mais grave prevista na Lei nº 8.666/1993 e na Lei nº 14.133/2021 (Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos), que impede a sociedade empresária sancionada — licitante ou contratada — de participar de novas licitações e contratações promovidas por quaisquer órgãos do Poder Público, em qualquer nível da federação.
Read MoreÉ possível contestar fraude em concurso público? Entenda seus direitos
Os concursos públicos são a forma prevista constitucionalmente para acesso a um cargo ou emprego público. Em busca disso, milhares de brasileiros anualmente dedicam esforço à preparação para todas as etapas exigidas para alcançar esse sonho.
Ocorre que, em algumas ocasiões, o esforço e dedicação do concurseiro não são suficientes para o acesso ao cargo dos sonhos. Fraudes e outras formas de desrespeito ao certame público podem macular a competição regular e privilegiar injustamente alguns candidatos.
Neste artigo, vamos entender melhor quais as formas mais comuns de desrespeito ao concurso público e como lidar com elas.
O que significa fraude em concurso público?
A fraude em concurso público consiste na prática de qualquer ato que tenha como objetivo desrespeitar as regras do concurso para obter vantagem ilícita em favor de determinados participantes. Inclusive, este tipo de fraude foi recentemente previsto como crime, conforme disposto no artigo 311-A do Código Penal:
Art. 311-A. Utilizar ou divulgar, indevidamente, com o fim de beneficiar a si ou a outrem, ou de comprometer a credibilidade do certame, conteúdo sigiloso de:
I – concurso público;
II – avaliação ou exame públicos;
III – processo seletivo para ingresso no ensino superior; ou
IV – exame ou processo seletivo previstos em lei:
As fraudes costumam acontecer durante a realização do concurso público, sendo que as mais comuns são:
- Venda de gabaritos ou de provas antes da realização do concurso;
- Vazamento ilegal de informações;
- Falsidade ideológica (fazer a prova em nome de outra pessoa);
- Manipulação de notas e resultados;
- Utilização de aparelhos eletrônicos para obtenção de respostas;
- Privilégio de candidatos ligados à organização do concurso.
Estas práticas frustram a integridade, a meritocracia e a isonomia do concurso público, que tem como objetivo selecionar os candidatos de forma igualitária e prestigiar aqueles mais preparados para assumir cargos da administração pública.
Consequências da fraude em concurso público
Se for comprovada a fraude em concurso público, via de regra deverá ocorrer o cancelamento do certame, sendo necessário aguardar um novo lançamento de edital, a fim de evitar chancelar quaisquer resultados ilegais.
Além disso, os responsáveis, a depender das apurações, terão de indenizar o órgão público responsável pelo certame e os outros candidatos prejudicados, especialmente em relação aos gastos com inscrição e deslocamento. Inclusive, o Estado pode responder subsidiariamente pelos danos causados aos candidatos.
Além das indenizações, aqueles envolvidos no esquema fraudulento também podem responder pelo crime de fraude em certames de interesse público, cuja pena é de 1 a 4 anos de prisão. Caso a fraude tenha gerado dano para a Administração Pública, a pena será de 2 a 6 anos. E, ainda, se o agente for funcionário público, a pena será aumentada em ⅓. Em todos estes casos, também é cabível a aplicação de multa.
É possível contestar fraude em concurso público?
Se você presenciou alguma fraude ou irregularidade em concurso público, é possível tomar medidas para denunciar o fato. A denúncia pode ser feita perante o Ministério Público ou em uma Delegacia de Polícia, a depender de onde o fato aconteceu.
Se o concurso público tinha como objetivo o preenchimento de cargos municipais ou estaduais, a denúncia deve ser realizada no Ministério Público estadual ou na Polícia Civil. Já se o concurso era para cargos federais, deve-se procurar o Ministério Público Federal ou a Polícia Federal. A queixa pode ser verbal, escrita ou pela internet, a depender do modo adotado pelo órgão responsável.
Além destas opções, também há a possibilidade de relatar a irregularidade diretamente para a entidade responsável pelo concurso público, que deverá apurar as irregularidades e tomar as providências para preservar a higidez do concurso.
Após realizada a denúncia, o órgão competente deverá instaurar uma investigação para apurar os fatos relatados e levantar possíveis provas. Se estas provas forem devidamente encontradas, o Ministério Público deverá propor uma ação judicial, com o objetivo de responsabilizar as pessoas envolvidas e anular o concurso público.
É importante destacar que denunciar ao Ministério Público é um direito de qualquer pessoa, tenha ela sido diretamente lesada em razão de fraudes em concursos públicos ou não e pode ocorrer em qualquer fase do certame, desde o lançamento até após a realização das provas.
Apesar de ser possível oferecer a denúncia a qualquer tempo, de forma individual ou coletiva, sempre é possível e recomendável o contato com um advogado especializado nesta área para o acompanhamento e orientação da vítima, caso surjam dúvidas, incertezas ou mesmo para atuação direta pela anulação do concurso e pedido de indenização, por meio de um levantamento de provas a serem apresentadas numa ação judicial.
Outras formas de desrespeito ao concurso público
Além das fraudes ocorridas durante a realização do concurso, também é possível que, após a realização da prova, ocorram outras formas de desrespeito aos direitos dos candidatos no certame. Algumas delas são:
- O desrespeito à ordem de classificação dos candidatos;
- O desrespeito às cotas estabelecidas em lei ou no edital;
- A não convocação de todos os candidatos aprovados originalmente dentro do número de vagas, sem justificativa legítima para tanto;
- O não preenchimento de todas as vagas divulgadas no edital, após as desistências ou eliminação daqueles em classificação superior;
- A preterição de candidatos aprovados por profissionais precários, como terceirizados, comissionados ou temporários alocados indevidamente em serviços permanentes.
Em todos estes casos, um advogado especialista em concurso público poderá indicar as melhores orientações para a garantia do direito do candidato, com assistência em um possível processo administrativo, ou mesmo com a propositura de uma ação judicial perante o Poder Judiciário.
Read MoreQuais são as modalidades de licitação? Entenda as suas principais características
Um dos principais temas que envolve as licitações públicas são as suas modalidades. Isso porque, se a licitação é um procedimento administrativo formal pelo qual a Administração Pública convocará, de acordo com as condições estabelecidas em Edital, empresas que estejam interessadas em apresentar propostas e contratar com o poder público, são as modalidades de licitação que indicarão as regras gerais da competição. (mais…)
Read MoreO Diálogo Competitivo na Nova Lei de Licitações Brasileira
A promulgação da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei nº 14.133/2021), ocorrida em 1º de abril de 2021, inaugurou um novo marco legal para as contratações da gestão pública brasileira, em substituição à Lei nº 8.666/1993 (antiga Lei de Licitações e Contratos Administrativos), à Lei nº 10.520/2002 (Lei do Pregão) e à Lei nº 12.462/2011 (Regime Diferenciado de Contratações Públicas – RDC).
Nos próximos dois anos, a União Federal, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios poderão optar pela utilização da legislação antiga ou da nova. Ao fim deste período, a aplicação da Lei nº 14.133/2021 passará a ser obrigatória e as demais legislações serão completamente revogadas.
Nesse aspecto, uma das grandes novidades da Lei nº 14.133/2021 está prevista em sua Seção II, que trata das modalidades de licitação. Isso porque, em seu artigo 28, inciso V, a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos trouxe a previsão de uma nova modalidade de licitação: o Diálogo Competitivo.
Além de manter outras quatro modalidades licitatórias que já estavam previstas na Lei nº 8.666/93 e na Lei nº 10.520/2002, isto é, a Concorrência, o Concurso, o Leilão e o Pregão, e de extinguir as modalidades da Tomada de Preço e do Convite, a Nova Lei de Licitações, em muito inspirada no Direito da União Europeia, apresenta ao direito brasileiro o Diálogo Competitivo como uma nova modalidade licitatória.
Historicamente, esta nova modalidade de licitação surgiu no Direito europeu por meio do artigo 29 da Diretiva nº 2004/18/EU, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004, hoje substituída pela Diretiva nº 2014/24/EU. Sua previsão veio como uma forma de dar legitimidade a uma postura que constantemente era adotada pelos países membros do bloco europeu, isto é, a busca por procedimentos licitatórios mais caracterizados pelo diálogo, pelo consenso e pela negociação.[1]ARROWSMITH, Sue; TREUMER, Sten. Competitive Dialogue in EU Procurement. Cambrige: Cambrige University Press, 2012, p. 21-26.
Não por outra razão, a partir da Diretiva de 2014 esta modalidade deixa de ser de adoção facultativa para se tornar obrigatória, o que faz com que os estados membros da União Europeia passem a necessariamente prever o Diálogo Competitivo em suas legislações internas.[2]VIANA, Cláudia. O Diálogo Concorrencial. In: Revista de Contratos Públicos. JAN./ABR. de 2011, N. 1. Lisboa: 2011, p. 112.
Nessa linha, o Diálogo Competitivo pode ser conceituado como
[…] uma modalidade licitatória voltada para a adjudicação de contratos em relação aos quais a Administração Pública tem a necessidade do objeto contratual, mas não sabe como a suprir. Ou seja, o uso do diálogo competitivo é possível quando o objeto do contrato é dotado de uma complexidade tal que a entidade adjudicante não consegue definir por si só qual a solução apta para atender à necessidade pública.[3]OLIVEIRA, Costa. A União Europeia e sua política exterior: história, instituições e processo de tomada de decisão. Brasília: Funag, 2017, p. 4-5.
Já na Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos brasileira, o Diálogo Competitivo aparece definido, da seguinte forma, no artigo 6º, inciso XLII:
XLII – diálogo competitivo: modalidade de licitação para contratação de obras, serviços e compras em que a Administração Pública realiza diálogos com licitantes previamente selecionados mediante critérios objetivos, com o intuito de desenvolver uma ou mais alternativas capazes de atender às suas necessidades, devendo os licitantes apresentar proposta final após o encerramento dos diálogos;
Assim, em âmbito nacional, pode-se afirmar que o Diálogo Competitivo é uma modalidade de licitação que deverá ser utilizada, especialmente, para a celebração de contratos de natureza complexa, nos cenários em que a Administração não consiga definir sozinha a solução que melhor atenderá uma necessidade pública.
Em análise dessa nova modalidade licitatória, o autor Marçal Justen Filho[4]JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratações Administrativas: Lei 14.133/2021. 1. ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021, p. 458. entende que o diálogo competitivo versa sobre aquelas situações que, em razão da natureza inovadora inerente ao caso concreto, uma solução adequada aos interesses da Administração ainda é desconhecida, exigindo-se, assim, a colaboração entre a administração pública e a iniciativa privada para que possa ser encontrada a solução que será executada.
Para Marcos Augusto Perez,[5]PEREZ, Marcos Augusto. A Administração Pública Democrática. Belo Horizonte: Fórum, 2014. em comentários realizados quando a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos ainda era um projeto de lei, a previsão do Diálogo Competitivo é especialmente benéfica, porque as regras atualmente vigentes no Brasil, especialmente na Lei nº 8.666/1993, de maneira geral impossibilitam que os contratos firmados com a Administração Pública sejam negociados, o que faz com que, na imensa maioria das vezes, a Administração acabe por decidir de maneira unilateral os detalhes que vão compor um processo de contratação, antes de oferecê-los mediante licitação à iniciativa privada.
De mais a mais, o Diálogo Competitivo encontra-se melhor desenhado no artigo 32 da Lei nº 14.133/2021. Prevê o mencionado artigo, por meio dos seus incisos, que a nova modalidade de licitação destina-se às contratações que envolvam: (i) inovação tecnológica ou técnica; (ii) impossibilidade de o órgão ou entidade ter sua necessidade satisfeita sem a adaptação de soluções disponíveis no mercado; e (iii) impossibilidade de as especificações técnicas serem definidas com precisão suficiente pela administração (inciso I). Além disso, a modalidade também pode ser utilizada quando a administração pública precise definir e identificar os meios e as alternativas que possam satisfazer suas necessidades, com destaque para os seguintes aspectos: (i) a solução técnica mais adequada; (ii) os requisitos técnicos aptos a concretizar a solução já definida; e (iii) a estrutura jurídica ou financeira do contrato (inciso II).
Como se pode perceber a partir das previsões destacadas acima, o instituto poderá se mostrar bastante útil em âmbito nacional, uma vez que a solução obtida pela modalidade do Diálogo Competitivo é, regra geral, qualificada consensualmente. Em um momento em que a Administração Pública do país cada vez mais realiza contratações complexas, a busca pela melhor solução passar pelo debate com agentes que por vezes possuem soluções eficientes – o setor privado – mostra-se de grande valia.
No mais, após análise das previsões insculpidas nos §§1º e 2º e seus incisos, também do já citado artigo 32 da Lei nº 14.133/2021, e levando-se em consideração os destaques realizados por Eduardo André Carvalho Schiefler, em dissertação de Mestrado apresentada no Programa de Pós-Graduação da Universidade de Brasília (UnB)[6]SCHIEFLER, Eduardo André Carvalho. Controle das Compras Públicas, Inovação Tecnológica e Inteligência Artificial: o paradigma da administração pública digital e os sistemas inteligentes na … Continue reading, também pode ser apontado, quanto ao instituto do Diálogo Competitivo, que
(i) a administração pública precisará apresentar, no edital de lançamento da licitação, as exigências de participação e as suas necessidades, conferindo prazo aos interessados para se manifestarem, prevendo os critérios da pré-seleção dos licitantes e admitindo todos os que atenderem aos requisitos objetivos (artigo 32, § 1º, incisos I e II);
(ii) a administração não poderá divulgar informações de modo a favorecer algum licitante ou revelar a outros licitantes as soluções propostas ou informações sigilosas comunicadas por um licitante sem o seu consentimento (incisos III e IV);
(iii) a fase de diálogo entre os licitantes e a administração pública, cujas reuniões deverão ser registradas em ata e gravadas em áudio e vídeo, poderá ser mantida até que esta identifique, fundamentadamente, a solução que atenda à sua necessidade (incisos V e VI);
(iv) a depender da necessidade que se pretende atender, o edital poderá prever fases sucessivas de diálogo competitivo para restringir em cada uma delas as soluções ou as propostas a serem discutidas (inciso VII); e
(v) ao final da etapa de diálogo, a administração pública declarará a sua conclusão, definindo qual é a solução eleita, e iniciará a fase competitiva com a divulgação de novo edital, contendo a especificação da solução alcançada para atender à sua necessidade e os critérios objetivos para a seleção da proposta mais vantajosa, as quais serão apresentadas pelos licitantes pré-selecionados (inciso VIII), sendo que a proposta vencedora deverá ser definida conforme os critérios divulgados no início da fase competitiva e deve retratar a contratação mais vantajosa (incisos IX e X).
Como se vê a partir das previsões acima, o Diálogo Competitivo formaliza um diálogo público-privado há muito existente nas contratações públicas. Inclusive, formaliza a noção de diálogo público-privado como fenômeno imprescindível para o regular desempenho das atividades administrativas. Até mesmo, nesse sentido e em hipótese ilustrativa, o autor Gustavo Henrique Carvalho Schiefler exemplifica situação cotidiana “em que um governante conhece a existência e a extensão do problema de mobilidade urbana que assola a população de seu município, mas desconhece a solução técnica mais adequada. Existe uma infinidade de alternativas para solver a necessidade: a construção de novas rodovias, viadutos, pontes, túneis, a ampliação de trechos já existentes, o investimento em novos meios de transporte, dentre outros. Para decidir a respeito de qual a melhor solução, é comum e natural que a administração pública busque informações no mercado para conhecer as soluções mais avançadas, de forma a consultar especialistas que não pertencem aos quadros administrativos.”[7]SCHIEFLER, Gustavo Henrique Carvalho. Diálogos público-privados. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2018, p. 19.
Nota-se, enfim, a partir das previsões e apontamentos realizados acima, que, de modo geral, a estrutura do Diálogo Competitivo brasileiro assemelha-se em muito com a do Direito europeu. Por exemplo, segundo o item 4 do artigo 26 da Diretiva nº 2014/24/EU,[8]EUROPA. Parlamento Europeu e Conselho. Directive nº 2014/24/EU, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004. Disponível em: … Continue reading o Diálogo Competitivo, no âmbito da União Europeia, deve ser aplicado nos seguintes casos:
(i) as necessidades da autoridade adjudicante não podem ser satisfeitas sem a adaptação de soluções facilmente disponíveis;
(ii) os produtos ou serviços incluem a concepção de soluções inovadoras; e
(iii) o contrato não pode ser adjudicado sem negociações prévias devido a circunstâncias específicas relacionadas com a natureza, a complexidade ou a montagem jurídica e financeira ou devido a riscos a ela associados.
Em resumo, é inegável que a instituição de uma nova modalidade de licitação no Direito nacional trará uma série de desafios e abrirá palco para inúmeras discussões.
Nesse aspecto, pode-se dizer que as grandes inovações do instituto concentram-se, em muito, na fase do diálogo propriamente dito, ao passo que suas previsões abrem espaço para uma série de questionamentos, muitos deles, inclusive, já bem observados por Marina Fontão Zago.[9]Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/depeso/346368/dialogo-competitivo-para-o-que-e-para-quem#comentario>. Acesso em: 26/10/2021. São eles: (i) quais serão os critérios de “habilitação” para os interessados em participar do diálogo? (ii) como serão feitos os diálogos e as negociações, na prática? (iii) como equilibrar publicidade e transparência, e a detenção de sigilos e estratégias comerciais? (iv) as informações obtidas nas negociações com um interessado poderão ser compartilhadas (se sim, como e em que medida), considerando serem essas informações estratégicas para as empresas, mas necessárias para a posterior fase competitiva? e (v) como e em que momento os critérios de escolha da melhor solução são definidos – no edital inicial, ou ao longo do processo?
Longe de já se ter a resposta para todas as questões acima, o fato é que esses são pontos que permearão o instituto do Diálogo Competitivo nos próximos anos. O sucesso da nova modalidade de licitação brasileira dependerá de um conjunto de fatores, tais como uma regulamentação adequada, entendimentos jurisprudenciais que potencializem a utilização do instituto e doutrinas que aprofundem a nova modalidade e a sua aplicação dentro do Direito nacional.
Aguardemos os próximos capítulos!
Referências[+]
↑1 | ARROWSMITH, Sue; TREUMER, Sten. Competitive Dialogue in EU Procurement. Cambrige: Cambrige University Press, 2012, p. 21-26. |
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↑2 | VIANA, Cláudia. O Diálogo Concorrencial. In: Revista de Contratos Públicos. JAN./ABR. de 2011, N. 1. Lisboa: 2011, p. 112. |
↑3 | OLIVEIRA, Costa. A União Europeia e sua política exterior: história, instituições e processo de tomada de decisão. Brasília: Funag, 2017, p. 4-5. |
↑4 | JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratações Administrativas: Lei 14.133/2021. 1. ed. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2021, p. 458. |
↑5 | PEREZ, Marcos Augusto. A Administração Pública Democrática. Belo Horizonte: Fórum, 2014. |
↑6 | SCHIEFLER, Eduardo André Carvalho. Controle das Compras Públicas, Inovação Tecnológica e Inteligência Artificial: o paradigma da administração pública digital e os sistemas inteligentes na Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos. 2021. Dissertação (Mestrado em Direito) – Programa de Pós-Graduação em Direito, Universidade de Brasília – UnB, Brasília, 2021. |
↑7 | SCHIEFLER, Gustavo Henrique Carvalho. Diálogos público-privados. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2018, p. 19. |
↑8 | EUROPA. Parlamento Europeu e Conselho. Directive nº 2014/24/EU, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 31 de março de 2004. Disponível em: <http://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/ALL/?uri=CELEX:32004L0018>. Acesso em 25 de outubro de 2021. |
↑9 | Disponível em: <https://www.migalhas.com.br/depeso/346368/dialogo-competitivo-para-o-que-e-para-quem#comentario>. Acesso em: 26/10/2021. |
Tanto a remoção como a licença possuem requisitos próprios para serem concedidos por meio de requerimento administrativo ou de ação judicial.
É comum que cônjuges ou companheiros de servidores públicos sejam deslocados para trabalhar em outra localidade, muitas vezes de ofício (ex officio) e no interesse da administração.
Independentemente de se tratar de um professor universitário, um técnico administrativo ou qualquer outro cargo da carreira federal, um servidor público federal possui o direito de acompanhar o seu marido, a sua esposa ou o seu companheiro(a) no caso de este(a) ser deslocado para outro ponto do território nacional brasileiro.
Este direito está previsto na Lei nº 8.112/1990, também conhecida como Estatuto dos Servidores Públicos Federais, e normalmente consiste nos institutos da remoção para acompanhar cônjuge (artigo 36 da lei) [1]Art. 36. Remoção é o deslocamento do servidor, a pedido ou de ofício, no âmbito do mesmo quadro, com ou sem mudança de sede. Parágrafo único. Para fins do disposto neste artigo, entende-se … Continue reading e da licença por motivo de afastamento de cônjuge, com exercício provisório (artigo 84 da lei)[2]Art. 84. Poderá ser concedida licença ao servidor para acompanhar cônjuge ou companheiro que foi deslocado para outro ponto do território nacional, para o exterior ou para o exercício de … Continue reading.
Cada um destes institutos, seja a remoção, seja a licença, possuem requisitos próprios para serem concedidos por meio de requerimento administrativo ou de ação judicial, normalmente por meio de Mandado de Segurança, com pedido liminar.
Nesse sentido, é muito comum surgirem dúvidas como:
(1) Se o servidor deslocado possuir um cônjuge/companheiro também servidor público, ele possui direito de ser removido para fins de acompanhamento, independentemente do interesse da administração?
(2) É possível remover professores ou técnicos administrativos entre diferentes universidades federais ou institutos federais distintos?
(3) A coabitação prévia é um requisito para o acompanhamento de cônjuge por remoção ou por licença com exercício provisório (remunerada)?
(4) A licença com exercício provisório é remunerada e por tempo indeterminado?
(5) O Ministério da Educação pode indeferir o pedido de remoção ou de licença?
(6) Eu preciso de um advogado para pedir a minha remoção ou licença para acompanhamento de cônjuge?
Para conhecer as respostas a estas e outras dúvidas, acesse os artigos escritos pelo advogado do escritório especialista no assunto:
Artigo 1 – A remoção de Professor entre Universidades Federais distintas
Artigo 2 – Servidor Público cujo cônjuge foi deslocado possui direito à licença
Entre em CONTATO com o advogado especialista em acompanhamento de cônjuge caso queira uma avaliação sobre um caso particular.
Texto escrito por: Eduardo Schiefler
Referências[+]
↑1 | Art. 36. Remoção é o deslocamento do servidor, a pedido ou de ofício, no âmbito do mesmo quadro, com ou sem mudança de sede.
Parágrafo único. Para fins do disposto neste artigo, entende-se por modalidades de remoção: I – de ofício, no interesse da Administração; II – a pedido, a critério da Administração; III – a pedido, para outra localidade, independentemente do interesse da Administração: a) para acompanhar cônjuge ou companheiro, também servidor público civil ou militar, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, que foi deslocado no interesse da Administração; b) por motivo de saúde do servidor, cônjuge, companheiro ou dependente que viva às suas expensas e conste do seu assentamento funcional, condicionada à comprovação por junta médica oficial; c) em virtude de processo seletivo promovido, na hipótese em que o número de interessados for superior ao número de vagas, de acordo com normas preestabelecidas pelo órgão ou entidade em que aqueles estejam lotados. |
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↑2 | Art. 84. Poderá ser concedida licença ao servidor para acompanhar cônjuge ou companheiro que foi deslocado para outro ponto do território nacional, para o exterior ou para o exercício de mandato eletivo dos Poderes Executivo e Legislativo.
§ 1º A licença será por prazo indeterminado e sem remuneração. § 2º No deslocamento de servidor cujo cônjuge ou companheiro também seja servidor público, civil ou militar, de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, poderá haver exercício provisório em órgão ou entidade da Administração Federal direta, autárquica ou fundacional, desde que para o exercício de atividade compatível com o seu cargo. |
A URP, abreviação para Unidade de Referência de Preços (URP), é um indexador econômico que, até fevereiro de 1989, orientou reajustes, em relação à taxa de inflação, de preços e de salários. Instituída no âmbito do Plano Bresser, a URP tem impacto significativo na remuneração de servidores, tendo sido objeto de muitas discussões jurídicas até os dias atuais.
Eduardo Schiefler[1]Eduardo Schiefler – Advogado no escritório Schiefler Advocacia. Mestrando em Direito pela Universidade de Brasília (UnB). Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). … Continue reading
Matheus Dezan[2]Matheus Dezan – Estagiário de Direito no escritório Schiefler Advocacia. Bacharelando em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (FD|UnB). Editor Assistente da Editoria … Continue reading
O objetivo deste artigo é analisar o pagamento da URP (Unidade de Referência de Preço) de fevereiro de 1989, mais conhecida como URP/1989, que foi instituída, no âmbito do Plano Bresser[3]CPDOC. Verbete “Plano Bresser” do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Disponível em: … Continue reading, pelo Decreto-Lei n.º 2.335/1987[4]BRASIL. Decreto-Lei n.º 2.335, 12 de junho de 1987. Dispõe sobre o congelamento de preços e aluguéis, reajustes mensais de salários e vencimentos, institui a Unidade de Referência de Preços … Continue reading, revogado pela Lei n.º 7.730/1989[5]BRASIL. Lei n.º 7.730, de 31 de janeiro de 1989. Institui o cruzado novo, determina congelamento de preços, estabelece regras de desindexação da economia e dá outras providências. Divisão de … Continue reading. Resumidamente, a URP/1989 é um indexador econômico que até fevereiro de 1989 orientou reajustes, em relação à taxa de inflação, de preços e de salários.
A importância da análise desta verba se dá em razão de que, por força de decisão liminar da Ministra do Supremo Tribunal Federal (STF) Cármen Lúcia, primeira relatora do Mandado de Segurança n.º 28.819/DF, impetrado pelo Sindicato dos Trabalhadores da Fundação Universidade de Brasília (SINTFUB/DF), os servidores públicos da Universidade de Brasília (UnB), instituição federal de ensino superior, recebem, mensalmente, desde o ano de 2010, o pagamento da URP/1989.
Ainda vigente, esta decisão teve por objetivo, “considerando a natureza alimentar da parcela da URP/89, paga aos substituídos durante alguns anos, suspender os efeitos dos atos […] dos quais resulte diminuição, suspensão e/ou retirada daquela parcela da remuneração dos servidores substituídos, e/ou que impliquem a devolução dos valores recebidos àquele título, até a decisão final da presente ação, com a consequente devolução das parcelas eventualmente retidas desde o ajuizamento desta”. Além disso, a então Ministra relatora também consignou em sua decisão que, “ao apreciar alegação de desrespeito à liminar que concedi no Mandado de Segurança n. 26.156, asseverei que a observância do que decidido importava no pagamento da parcela discutida na forma como vinha sendo realizada antes da prolação dos atos impugnados, ou seja, incluídos todos os substituídos (sem distinção quanto à época de ingresso na Fundação Universidade de Brasília) e sem sua absorção por reajustes salariais posteriores.”.
Nesse cenário, uma questão que vem ganhando espaço em julgamentos recentes do STF diz respeito ao fato de que os servidores públicos (técnicos administrativos ou docentes) da Universidade de Brasília (UnB) que, quando redistribuídos para outras instituições federais de ensino superior públicas em razão da Lei n.º 8.112/1990[6]BRASIL. Lei n.º 8.112/1990, de 11 de dezembro de 1990. Dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais. Diário Oficial … Continue reading, deixam de receber o pagamento mensal da URP de fevereiro de 1989.
Isso porque, no entendimento de algumas instituições de ensino superior para as quais os servidores públicos da Universidade de Brasília (UnB) são redistribuídos, este deslocamento acarretaria a interrupção do vínculo entre esses servidores públicos e a Universidade de Brasília (UnB), de modo que a decisão liminar da Ministra Cármen Lúcia no âmbito do Mandado de Segurança n.º 28.819/DF deixaria de abarcá-los.
Isto é, para essas instituições, os servidores transferidos deixariam, em razão da redistribuição, de ser beneficiários do Mandado de Segurança n.º 28.819/DF. Assim, uma vez redistribuídos, os servidores públicos não mais perceberiam o pagamento mensal da URP de fevereiro de 1989.
Notadamente, é preciso notar que os atos administrativos das instituições federais de ensino superior que suprimem o pagamento mensal da URP/1989 dos servidores públicos redistribuídos da Universidade de Brasília (UnB) ignoram que, por força do artigo 37, XV, da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/1988)[7]BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Diário Oficial da União, Poder Legislativo, Brasília, DF, 05 out. 1988, p. 1. e do artigo 37, I e II, da Lei n.º 8.112/1990 (Estatuto dos Servidores Públicos Civis da União – Servidores Federais), a redistribuição ocorre, sempre, em razão do interesse da Administração, e não dos servidores públicos, motivo pelo qual se assegura a equivalência dos vencimentos e dos subsídios.
Por essa razão, não é lícito que a Administração Pública, isto é, as instituições federais de ensino superior, suprima o pagamento mensal da URP de fevereiro de 1989 dos servidores públicos redistribuídos, originariamente, da Universidade de Brasília (UnB). Confiram-se os dispositivos:
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CRFB/1988)
Art. 37. […]: XV – o subsídio e os vencimentos dos ocupantes de cargos e empregos públicos são irredutíveis, ressalvado o disposto nos incisos XI e XIV deste artigo e nos arts. 39, § 4º, 150, II, 153, III, e 153, § 2º, I;
Lei n.º 8.112/1990
Art. 37. Redistribuição é o deslocamento de cargo de provimento efetivo, ocupado ou vago no âmbito do quadro geral de pessoal, para outro órgão ou entidade do mesmo Poder, com prévia apreciação do órgão central do SIPEC, observados os seguintes preceitos:
I – interesse da administração;
II – equivalência de vencimentos;
[…]
Isso faz com que a referida supressão viole a garantia de irredutibilidade de subsídios e de vencimentos dos servidores públicos, bem como ignore que a redistribuição não ocorre no interesse exclusivo dos servidores públicos — mesmo que eles tenham demandado a redistribuição —, mas de acordo com o interesse da Administração, que deve, por essa razão, arcar com o ônus econômico-financeiro dessa redistribuição.
É dizer: a Administração jamais procederá à redistribuição de um servidor público se não for do interesse administrativo, não podendo — e a jurisprudência pátria é pacífica nesse sentido — ser compelida a redistribuir um servidor (para tanto, existem outros institutos aplicáveis e oponíveis à Administração, como a remoção para acompanhar cônjuge e a licença por motivo de afastamento de cônjuge, com exercício provisório, por exemplo).
Naturalmente, existem situações em que o interesse da Administração e o do servidor estão alinhados no sentido da redistribuição (o que é até desejável, já que torna o deslocamento legítimo e mitiga o risco de desgaste interno no serviço público). Entretanto, este alinhamento não é requisito para a redistribuição, bastando, entre eles, apenas o interesse da Administração, de sorte que a redistribuição promovida após a solicitação do próprio servidor não tem o potencial de descaracterizá-la como uma medida administrativa efetivamente adotada no interesse da Administração — e, como tal, portadora de consequências que impactam a esfera jurídica dos servidores.
Assim, a supressão do pagamento mensal da URP de fevereiro de 1989 dos servidores públicos redistribuídos da Universidade de Brasília (UnB) viola, a um só tempo, os princípios da confiança, da legítima expectativa, da boa-fé e da segurança jurídica — uma vez que esses servidores públicos, munidos de boa-fé, supuseram, desde o princípio, que a redistribuição a que se submetiam corresponderia àquela positivada pelo artigo 37 da Lei n.º 8.112/1990, que estabelece requisitos e garantias em favor dos servidores públicos, a exemplo da equivalência de seus vencimentos.
O Ministro do Supremo Tribunal Federal Ricardo Lewandowski apreciou, ao menos em cinco ocasiões, no âmbito das Reclamações n.º 36.499/RN[8]STF. Ag. Reg. Emb. Decl. Recl. n.º 36.499/RN. Relator Ministro Ricardo Lewandowski. Órgão Julgador: Segunda Turma. Julgado em: 08 mar. 2021., n.º 41.780/GO[9]STF. Ag. Reg. Recl. n.º 41.780/GO. Relator Ministro Ricardo Lewandowski. Órgão Julgador: Segunda Turma. Julgado em: 15 mar. 2021., n.º 45.760/CE, n.º 45.828/GO[10]STF. Recl. n.º 45.760/CE. Relator Ministro Ricardo Lewandowski. Órgão Julgador: Segunda Turma. Julgado em: 12 mar. 2021., n.º 46.478/MG [11]STF, Recl n.º 46.478 / MG, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, 5 de maio de 2021.e n.º 47.652/RJ[12]STF. Recl. n.º 47.652/RJ. Relator Ministro Ricardo Lewandowski. Órgão Julgador: Segunda Turma. Julgado em: 30 jun. 2021., a questão da manutenção ou da supressão do pagamento da URP/1989 aos servidores públicos redistribuídos da Universidade de Brasília (UnB) para outras instituições de ensino superior públicas.
Nesses processos, decidiu-se que a supressão em questão afronta a autoridade da decisão liminar da Ministra Cármen Lúcia no âmbito do Mandado de Segurança n.º 28.819/DF, do mesmo modo que viola a garantia à irredutibilidade dos subsídios e dos vencimentos dos servidores públicos redistribuídos, positivada pelo artigo 37, XV, da Constituição de 1988 e pelo artigo 37, II, da Lei n.º 8.112/1990. Do mesmo modo, o ato administrativo que suprime o pagamento da verba vai de encontro aos princípios da confiança, da legítima expectativa, da boa-fé e da segurança jurídica, uma vez que é preciso que a redistribuição observe, sempre, o artigo 37, II, da Lei n.º 8.112/1990.
Destarte, assenta-se o entendimento de que os servidores públicos transferidos da Universidade de Brasília (UnB) para outras instituições federais de ensino têm o direito de continuar recebendo, após a sua redistribuição, o pagamento da URP de fevereiro de 1989, sem que esse pagamento seja, de qualquer forma, suprimido, suspenso ou interrompido, ao menos até o julgamento do mérito do Mandado de Segurança n.º 28.819/DF.
Referências[+]
↑1 | Eduardo Schiefler – Advogado no escritório Schiefler Advocacia. Mestrando em Direito pela Universidade de Brasília (UnB). Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Integrante do Grupo de Estudos em Direito Público (GEDIP/UFSC). Integrante do Grupo de Pesquisa em Direito, Racionalidade e Inteligência Artificial (DRIA.UnB). Autor do livro “Processo Administrativo Eletrônico” (2019) e de artigos acadêmicos, especialmente na área de Direito Administrativo e Tecnologia. |
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↑2 | Matheus Dezan – Estagiário de Direito no escritório Schiefler Advocacia. Bacharelando em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (FD|UnB). Editor Assistente da Editoria Executiva da Revista dos Estudantes de Direito da Universidade de Brasília (RED|UnB). Membro do Grupo de Pesquisa certificado pelo CNPq Direito, Racionalidade e Inteligência Artificial (DR.IA|UnB). Membro do Grupo de Estudos em Direito e Economia (GEDE|UnB|IDP). Membro do Grupo de Pesquisa em Hermenêutica do Direito Administrativo e Políticas Públicas (HDAPP|UniCeub). Monitor da disciplina “Direito Processual Civil 1”, ministrada pelo docente Marcus Flávio Horta Caldeira na Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (FD|UnB). Monitor da disciplina “Direito Comercial 1”, ministrada pela docente Amanda Athayde na Faculdade de Direito da Universidade de Brasília (FD|UnB). |
↑3 | CPDOC. Verbete “Plano Bresser” do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC) da Fundação Getúlio Vargas (FGV). Disponível em: http://www.fgv.br/cpdoc/acervo/dicionarios/verbete-tematico/plano-bresser. Acesso em: 02 jul. 2021. |
↑4 | BRASIL. Decreto-Lei n.º 2.335, 12 de junho de 1987. Dispõe sobre o congelamento de preços e aluguéis, reajustes mensais de salários e vencimentos, institui a Unidade de Referência de Preços (URP), e dá outras providências. Divisão de Orçamento, Finanças e Contabilidade (DOFC), Poder Executivo, Brasília, DF, 009214, 13 jun. 1987, p. 2. |
↑5 | BRASIL. Lei n.º 7.730, de 31 de janeiro de 1989. Institui o cruzado novo, determina congelamento de preços, estabelece regras de desindexação da economia e dá outras providências. Divisão de Orçamento, Finanças e Contabilidade (DOFC), Poder Executivo, Brasília, DF, 01 fev. 1989, p. 1745. |
↑6 | BRASIL. Lei n.º 8.112/1990, de 11 de dezembro de 1990. Dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais. Diário Oficial da União, Poder Executivo, Brasília, DF, 19 abr. 1991, p. 1. |
↑7 | BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil, de 05 de outubro de 1988. Diário Oficial da União, Poder Legislativo, Brasília, DF, 05 out. 1988, p. 1. |
↑8 | STF. Ag. Reg. Emb. Decl. Recl. n.º 36.499/RN. Relator Ministro Ricardo Lewandowski. Órgão Julgador: Segunda Turma. Julgado em: 08 mar. 2021. |
↑9 | STF. Ag. Reg. Recl. n.º 41.780/GO. Relator Ministro Ricardo Lewandowski. Órgão Julgador: Segunda Turma. Julgado em: 15 mar. 2021. |
↑10 | STF. Recl. n.º 45.760/CE. Relator Ministro Ricardo Lewandowski. Órgão Julgador: Segunda Turma. Julgado em: 12 mar. 2021. |
↑11 | STF, Recl n.º 46.478 / MG, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, 5 de maio de 2021. |
↑12 | STF. Recl. n.º 47.652/RJ. Relator Ministro Ricardo Lewandowski. Órgão Julgador: Segunda Turma. Julgado em: 30 jun. 2021. |
Se o campo geral das licitações e contratações públicas pode(e deve) se modificar com as interpretações sobre a Lei nº 14.133/2021, é possível que o microssistema especial das estatais também possa sofrer uma influência reflexa - abrindo-se aqui, possivelmente, o espaço para a aplicação subsidiária ou para analogia nos casos de lacunas a serem preenchidas na aplicação.
Com a publicação da nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, promulgada no dia 1º de abril de 2021 sob o número 14.133, significativas mudanças são realizadas neste campo do direito administrativo brasileiro, em todos os âmbitos das Administrações Públicas diretas, autárquicas e fundacionais da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, positivando entendimentos jurisprudenciais e doutrinários, mas também trazendo inovações práticas que deverão ser levadas em consideração pelos gestores públicos e pelos particulares interessados em contratar com o Poder Público (confira aqui as três novidades que você precisa conhecer sobre a Lei nº 14.133/2021).
Dada a sua vasta abrangência, é legítimo que surja a dúvida se o novo diploma se aplica às estatais e, em caso afirmativo, de que modo afetaria suas licitações e seus contratos administrativos.
Antes de se buscar a resposta, é preciso entender o que são as chamadas estatais e a que regime jurídico estão submetidas no direito administrativo pátrio. Atualmente, a expressão [empresas] estatais é utilizada na doutrina para se referir de modo geral a qualquer das entidades empresariais regidas pela Lei nº 13.303/2016. Conforme o caput do seu art. 1º, estas entidades são as empresas públicas e as sociedade de economia mista e suas subsidiárias dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, ainda que a atividade econômica esteja sujeita ao regime de monopólio da União ou seja de prestação de serviços públicos. Não é por outra razão que a Lei nº 13.303/2016 é a chamada de Lei das Estatais e, desde a sua promulgação, tem regido, na condição de estatuto especial, as licitações e os contratos administrativos realizados por essas entidades.
Assim, considerando a preexistência do regime jurídico específico da Lei nº 13.303/2016, a Lei nº 14.133/2021 oferece à questão que serve de título a este artigo uma resposta preliminar já no seu art. 1º, § 1º, o qual determina que “Não são abrangidas por esta Lei as empresas públicas, as sociedades de economia mista e as suas subsidiárias, regidas pela Lei nº 13.303, de 30 de junho de 2016, ressalvado o disposto no art. 178 desta Lei.”
O fato de a nova Lei de Licitações ter distinguido o regime jurídico das estatais encontra, de certo modo, explicação no caráter da Lei nº 13.303/2016. Como se percebe, a Lei das Estatais é especial, isto é, prescreve regime próprio de licitações e contratos para estas entidades, que já se sobrepunha ao regime tradicional de licitações, anteriormente baseado na Lei nº 8.666/93 (normas para licitações e contratos administrativos), na Lei nº 10.520/02 (modalidade pregão) e na Lei nº 12.462/12 (Regime Diferenciado de Contratações – RDC). A nova Lei de Licitações, neste sentido, respeitou a especialidade da Lei nº 13.303/2016.
Contudo, em que pese o seu caráter especial, a Lei das Estatais prevê, explicitamente, três casos de aplicação de dispositivos normativos que devem ser encontrados alhures. Com efeito, o art. 32, inciso IV, da Lei nº 13.303/2016 estabelece que:
Art. 32. Nas licitações e contratos de que trata esta Lei serão observadas as seguintes diretrizes:
[…]IV – adoção preferencial da modalidade de licitação denominada pregão, instituída pela Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002, para a aquisição de bens e serviços comuns, assim considerados aqueles cujos padrões de desempenho e qualidade possam ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais no mercado.
Por meio do artigo e inciso supracitados, a Lei das Estatais determina que, para a aquisição de bens e serviços comuns, deve-se adotar preferencialmente o pregão como modalidade de licitação. Contudo, destaca-se o entendimento doutrinário predominante segundo o qual a adoção da modalidade pregão pelas estatais se limita aos aspectos procedimentais, não excluindo a observância da Lei nº 13.303/2016 no que diz respeito aos demais aspectos substanciais do rito licitatório e do contrato.
Ao revogar expressamente a Lei nº 10.520/2002 (após decorridos dois anos da sua publicação oficial), a nova Lei de Licitações substitui a Lei do Pregão na regência desta modalidade, determinando, pelo comando do seu art. 189, que a Lei nº 14.133/2021 seja aplicada às hipóteses previstas na legislação que façam referência expressa à Lei nº 8.666/1993, à Lei nº 10.520/2002, e aos arts. 1º a 47-A da Lei nº 12.462/2011. Como consequência, sendo o caso da adoção do pregão como modalidade de licitação pelas estatais, o regime a ser aplicado será o da nova Lei de Licitações. Essa circunstância faz surgir a questão de saber qual será o entendimento doutrinário e jurisprudencial sobre o alcance da sua aplicabilidade, isto é, permanecerá limitado ao procedimento? Tal questão, provavelmente, será objeto de debates nos tribunais.
O segundo caso em que se vê mitigada a especialidade da Lei das Estatais é o previsto no seu art. 55, inciso III, que determina a adoção de critérios de desempate estabelecidos na Lei nº 8.666/1993. Veja-se:
Art. 55. Em caso de empate entre 2 (duas) propostas, serão utilizados, na ordem em que se encontram enumerados, os seguintes critérios de desempate:
[…]III – os critérios estabelecidos no art. 3º da Lei nº 8.248, de 23 de outubro de 1991, e no § 2º do art. 3º da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993.
Como a Lei nº 8.666/1993 também será revogada pela nova Lei de Licitações após decorridos dois anos da sua publicação oficial, os seus critérios de desempate se tornarão inaplicáveis e serão tacitamente substituídos pelos que são estabelecidos no § 1º do art. 60 da Lei nº 14.133/2021. Esta substituição promoverá algumas mudanças, notadamente em razão dos incisos I e IV do referido parágrafo, a saber: dar-se-á preferência para empresas estabelecidas no território do Estado ou do Distrito Federal do órgão ou entidade da Administração Pública estadual ou distrital licitante ou, no caso de licitação realizada por órgão ou entidade de Município, no território do Estado em que este se localize (inciso I); e para empresas que comprovem a prática de mitigação relativa à Política Nacional sobre Mudança do Clima – PNMC, nos termos da Lei nº 12.187/2009 (inciso IV). Além disso, o inciso V do § 2º do art. 3º da Lei nº 8.666/1993, que assegurava preferência aos bens e serviços produzidos ou prestados por empresas que comprovem cumprimento de reserva de cargos prevista em lei para pessoa com deficiência ou para reabilitado da Previdência Social e que atendam às regras de acessibilidade previstas na legislação, não é reproduzido na nova Lei de Licitações como critério de desempate, mas como exigência da fase de habilitação (art. 63, inciso IV).
A terceira remissão da Lei das Estatais encontra-se em seu art. 41, segundo o qual “Aplicam-se às licitações e contratos regidos por esta Lei as normas de direito penal contidas nos arts. 89 a 99 da Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993”.
Resta averiguar, então, o efeito do disposto no art. 178 Lei nº 14.133/2021. Este artigo acrescenta ao Código Penal os artigos 337-E a 337-P, sob o Capítulo II-B – Dos Crimes em Licitações e Contratos Administrativos, transferindo para o códex próprio os dispositivos penais que integravam a Lei nº 8.666/1993, porquanto revogou expressa e imediatamente os seus artigos 89 a 108. Como consequência, o regime disciplinar penal aplicável à Lei das Estatais se encontra doravante no Código Penal, perdendo efeito o art. 41 da Lei nº 13.303/2016, o qual determinava a aplicação às licitações e contratos regidos por esta lei das normas de direito penal contidas nos arts. 89 a 99 da Lei nº 8.666/1993. A mudança, porém, não se limita a este aspecto formal, pois este regime disciplinar sofreu algumas alterações de natureza material.
Isto se evidencia pela comparação dos novos tipos penais criados no Código Penal pela Lei nº 14.133/2021 com os correspondentes dispositivos revogados na Lei nº 8.666/1993, que revela, à primeira vista, uma continuidade normativo-típica, porém, com alterações nos preceitos secundários, mediante cominações mais gravosas e a substituição do regime de detenção pelo de reclusão.
A mudança mais vistosa consiste, portanto, no aumento do rigor punitivo, que tem consequências relevantes. Vejamos, por exemplo, os novos artigos 337-E e 337-L do Código Penal. Eles correspondem respectivamente aos revogados artigos 89 e 96 da Lei nº 8.666/1993, e previam penas de detenção de 3 (três) a 5 (cinco) anos e multa, e de 3 (três) a 6 (seis) anos e multa, respectivamente. Além de promoverem mudanças na tipificação para ampliar a sua abrangência, os novos artigos mudaram a sua cominação, não somente substituindo a detenção pela reclusão, mas também majorando em um ano o tempo mínimo da pena de privação de liberdade, que passou a ser, para ambos os tipos penais, 4 (quatro) anos.
As consequências são relevantes. Em primeiro lugar, verifica-se o recrudescimento da punição, pois a pena de reclusão é reservada para condenações mais severas, sendo geralmente cumprida em estabelecimentos de segurança média ou máxima, permitindo o início do seu cumprimento em regime fechado. Em segundo lugar, com o aumento da pena mínima para 4 (quatro) anos, os artigos 337-E e 337-L impedem a celebração de acordos de não persecução penal, uma vez que o art. 28-A do Código de Processo Penal autoriza o Ministério Público a propor tal medida despenalizadora apenas em casos de “prática de infração penal sem violência ou grave ameaça e com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos”.
Outra alteração digna de atenção no regime disciplinar penal doravante aplicável automaticamente a todas as licitações e contratos administrativos afeta diretamente o sistema de cálculo das multas cominadas. De fato, revogou-se o art. 99 da Lei nº 8.666/1993, que determinava o pagamento de quantia fixada na sentença e calculada em índices percentuais, cuja base devia corresponder ao valor da vantagem efetivamente obtida ou potencialmente auferível pelo agente. Estes índices, porém, estavam limitados pelo disposto no parágrafo 1º, não podendo ser inferiores a 2% (dois por cento), nem superiores a 5% (cinco por cento) do valor do contrato licitado ou celebrado com dispensa ou inexigibilidade de licitação. Já o novo art. 337-P do Código Penal estabelece que a multa cominada aos crimes em licitações e contratos administrativos seguirá a metodologia de cálculo prevista neste Código, mantendo-se o limiar de 2% (dois por cento) sobre o valor do contrato licitado ou celebrado com contratação direta, sem, contudo, estipular um teto próprio, aplicando-se, porém, o limite máximo previsto no art. 49 do Códex Criminal.
Nem tudo, porém, é releitura do sistema disciplinar penal precedente. Há um tipo penal completamente novo, introduzido pelo artigo 337-O, que visa coibir a frustração do caráter competitivo da licitação ou da seleção da proposta mais vantajosa para a Administração Pública. Atente-se para o dispositivo do § 2º, que determina que a pena prevista no caput do artigo se aplica em dobro se o crime for praticado com o fim de obter benefício, direto ou indireto, próprio ou de outrem.
Estas considerações nos permitem afirmar, por fim, que a nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos afeta as estatais, pelo menos, de três modos. Em primeiro lugar, sendo o caso da adoção do pregão como modalidade de licitação pelas estatais, a lei de regência para este procedimento passa a ser a nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos. Em segundo lugar, os critérios de desempate que devem ser observados nos procedimentos licitatórios das empresas estatais estabelecidos § 2º do art. 3º da Lei nº 8.666/1993 serão substituídos pelos do § 1º do art. 60 da Lei nº 14.133/2021, com inovações referentes ao local de estabelecimento das concorrentes e à observância da Política Nacional sobre Mudança do Clima – PNMC. E em terceiro lugar, o sistema disciplinar penal aplicável às estatais, que antes da publicação da Lei nº 14.133/2021, se encontravam, com remissão expressa, na Lei nº 8.666/1993, a partir de 1º de abril de 2021 se integram ao Código Penal, aplicando-se indiscriminadamente às licitações e contratos administrativos, pouco importando o seu regime jurídico. Além dessa alteração de cunho formal, verifica-se que, do ponto de vista material, ao proceder à sua transferência para o Código Penal, a Lei nº 14.133/2021 promoveu, de modo geral, um endurecimento do regime disciplinar penal, buscando, ao que tudo indica, responder a um anseio social de combate à corrupção.
Embora essas sejam as três únicas remissões expressas da Lei das Estatais aos antigos diplomas gerais de licitações, há que se ponderar que sendo a Lei nº 14.133/2021 um novo diploma geral, todo o léxico de licitações e contratações públicas passa a encontrar um novo fundamento legal “de base” neste mais recente diploma. Assim, há que se cogitar que a interpretação da Lei das Estatais poderá sofrer influência das interpretações futuras da Lei nº 14.133/2021. Em outras palavras, se o campo geral das licitações e contratações públicas pode (e deve) se modificar com as interpretações sobre a Lei nº 14.133/2021, é possível que o microssistema especial das estatais também possa sofrer uma influência reflexa – abrindo-se aqui, possivelmente, o espaço para a aplicação subsidiária ou para analogia nos casos de lacunas a serem preenchidas na aplicação.
Afora essas três modificações que possuem previsão de eficácia ou imediata ou para daqui a dois anos, portanto, resta ainda saber se e como a nova Lei de Licitações influenciará o regime especial de licitações e contratações das estatais. Essas, no entanto, são questões que serão respondidas pela doutrina, pelos tribunais e pelos operadores do Direito em geral – todos no seu devido tempo.
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