
Como as vítimas de golpes virtuais podem recuperar os valores enviados aos golpistas?
Após serem atingidas por um golpe financeiro, como aqueles aplicados por falsas corretoras de investimentos, sites de apostas e cassinos online, dentre outros, o primeiro reflexo das vítimas costuma ser o de se dirigir à autoridade policial para a tomada de providências e para a formalização do Boletim de Ocorrência.
Em outra passagem, informamos ao leitor sobre as dificuldades enfrentadas pela polícia para oferecer uma rápida solução ao problema, visto que o modus operandi dos golpistas visa exatamente apagar rastros e sumir com o produto do crime mediante remessa de valores ao exterior ou para conta de “laranjas”, tornando praticamente infrutíferas as ações policiais urgentes de busca e apreensão ou de bloqueio de contas bancárias.
Nesse contexto, depois de relatarem seus casos à autoridade policial e tomarem as providências penais, as vítimas irão se tranquilizar e pensar “mas e agora, como faço para recuperar o dinheiro?”. A resposta é: muito provavelmente terão que propor uma ação judicial cível-consumerista para, saindo vitoriosos, executarem os bens dos criminosos e recomporem suas perdas.
No texto anterior sobre a série dos golpes financeiros, indicamos alguns dos mecanismos existentes no ordenamento jurídico brasileiro para se buscar a condenação dos golpistas no que se chama de “ação de conhecimento”, mais efetivamente por meio da propositura de ações coletivas propostas pelas entidades competentes (MP, PROCONs, associações e outros).
Independentemente do meio escolhido para buscar a condenação dos criminosos (por ação individual ou coletiva), as vítimas ainda se verão diante da tortuosa e demorada fase de execução para a recuperação dos ativos.
Como adiantamos, os golpistas se escondem atrás de terceiros “laranjas”, empresas de fachada ou de influenciadores digitais para blindar o seu patrimônio de forma irregular e ilegal, muitas das vezes impedindo (com sucesso) qualquer tentativa de penhora de seus bens. De forma mais direta: prevendo a condenação, o sujeito dilapida seu patrimônio e os entrega para parentes, amigos, empresas de fachada, “laranjas” ou os remete para contas no exterior.
E isso é possível porque a execução é direcionada apenas ao sujeito que consta como réu condenado na decisão judicial, não podendo, via de regra, atingir o patrimônio de terceiros estranhos ao processo.
Portanto, no intuito de contornar o impasse e buscar ativos ilegalmente enviados pelo condenado a outra pessoa, a vítima deverá alegar e provar (1) que os requisitos para a desconsideração direta ou inversa da personalidade jurídica estão preenchidos; (2) que houve fraude à execução ou fraude à credores; ou (3) que existe responsabilidade por ato igualmente ilegal de um terceiro ou intermediador.
Visto que as fraudes digitais costumam se fantasiar de relações consumeristas, a vítima poderá se valer da primeira hipótese para desconsiderar a personalidade jurídica do condenado (se for uma pessoa jurídica) a fim de atingir o patrimônio dos donos da empresa golpista com base no artigo 28 do CDC, bastando, para isso, ficar demonstrado que o executado não possui bens suficientes para reparar os danos causados. A mesma solução poderá ser adotada contra os auxiliares do criminoso, caso estes constem no título executivo.
Sendo o executado uma pessoa natural (física), a desconsideração da personalidade jurídica ainda poderá ser realizada em sua modalidade inversa com o intuito de atingir o patrimônio das empresas usadas pelo golpista para realizar confusão patrimonial e fugir de constrições judiciais de seus bens.
Mesmo que se argumentasse pela impossibilidade do uso do artigo 28 do CDC (chamada desconsideração pela teoria menor), o artigo 50 do Código Civil ainda traria os subsídios para se pleitear a desconsideração com base na teoria maior, haja vista ser inegável que a empresa constituída com o intuito de aplicar golpes e esconder patrimônio (atos ilícitos) estará obviamente desviando de sua finalidade (que pressupõe um objeto social lícito) e se valendo de confusão patrimonial, incorrendo em abuso da personalidade jurídica reprimível com a desconsideração direta ou inversa.
Para invocar a desconsideração direta ou inversa, bastará que o exequente demonstre que seus requisitos foram cumpridos. Neste caso, a parte convocada ao processo (suposto golpista ou sua empresa) se manifestará e se defenderá em incidente processual, sem necessidade de que tenha participado da fase de conhecimento anteriormente. Alerta-se apenas que há divergência jurisprudencial sobre a possibilidade de o sucumbente ser condenado ao pagamento de honorários no incidente de desconsideração, sendo, porém, a tese contrária ao pagamento a que hoje vem se consolidando no Superior Tribunal de Justiça.
Quanto à segunda hipótese, há que se diferenciar a fraude contra credores da fraude à execução. Na primeira, o desvio de bens do patrimônio do devedor (a fim de torná-lo insolvente e frustar futuros processos executórios) ocorre antes da citação no processo judicial, enquanto na segunda, a fraude é realizada após o início do processo ou durante a fase de execução, a fim de esconder bens e ativos da Justiça mediante transferência para terceiros.
Havendo indícios de fraude à credores, a vítima deverá propor a chamada “ação pauliana” a fim de tornar nulos os atos de alienação realizadas de forma fraudulenta pelo devedor com terceiros de má fé (artigo 161 do Código Civil). Tratando-se de fraude virtual, em que muito provavelmente as partes não possuíam vínculos e relações anteriores, é muito improvável que a ação anulatória possa ser utilizada.
Mais plausível é afirmar que muitas das vezes a execução restará frustrada por impossibilidade de penhora de quaisquer bens no patrimônio do condenado, visto inexistir ativos aptos a servir como garantia da condenação. Em tais circunstâncias, o credor poderá requerer a anulação das alienações realizadas em favor de terceiros durante o curso do processo, desde que possua meios de provar que o executado detinha bens e se livrou deles de modo ilegal.
O pedido de anulação poderá ser dirigido contra qualquer uma das partes do polo passivo, seja o golpista propriamente dito, sejam seus auxiliares corresponsáveis. Os terceiros de má-fé também poderão sofrer os efeitos da anulação dos atos jurídicos, mesmo que não tenham sido partes do processo de conhecimento. Caso sejam terceiros de boa-fé, poderão discutir a ordem judicial por meio de embargos de terceiros.
A terceira hipótese, por seu turno, não trata tecnicamente de uma execução/constrição sobre patrimônio de terceiros, haja vista que, para buscar a responsabilização solidária dos sujeitos que auxiliaram o golpista, a vítima ou a entidade legitimada para propositura da Ação Civil Pública (ACP), individual ou coletiva (a depender do caso), deverão, já na fase de conhecimento, incluir os terceiros como partes no processo a fim de que a decisão judicial forme coisa julgada contra eles.
Cuida-se, nesse contexto, dos casos em que terceiros ligados ao golpista tomam parte na execução do golpe, seja de forma consciente ou inconsciente, tornando-o possível ou divulgando-o para uma quantidade grande de pessoas. Como exemplo, citam-se os influenciadores digitais (influencers) que divulgam as fraudes em suas redes sociais, as plataformas que lucram com anúncios fraudulentos, os intermediadores de pagamento irregulares (empresas de fachada criadas para movimentar os ativos enviados pelas vítimas) e as instituições financeiras (como os bancos).
No caso das plataformas (redes sociais e aplicativos), a responsabilização civil só poderá ocorrer após descumprimento de decisão judicial que ordene a retirada do conteúdo fraudulento, segundo ditames do artigo 19 da Lei no 12.965/2014 (Marco Civil da Internet). Cuidando-se de instituições financeiras, a jurisprudência brasileira diverge, ora na adoção da plena responsabilização objetiva e solidária dos bancos, ora na exclusão da responsabilidade bancária quando demonstrada a culpa exclusiva das vítimas que agem sem tomar qualquer precaução para evitar golpe óbvios (imagine-se, por exemplo, um cliente que enviou um PIX para adquirir o curso “como ganhar dinheiro fingindo ser corretor de investimentos no WhatsApp”).
Para buscar a responsabilização desses terceiros, a ação de conhecimento deverá ser direcionada também contra eles, sendo obrigatória a presença destes como partes no polo passivo da ação. Afinal, alegar a existência da responsabilidade de terceiro apenas na fase de execução (salvo nas hipóteses 1 e 2 acima citadas) será considerado ato processualmente irregular, visto que só pode ser executado aquele que participou dos debates no devido processo legal.
Um exemplo pode ilustrar bem do que estamos tratando: imagine-se que um influenciador digital (influencer) anuncie em sua rede social um investimento fraudulento de um terceiro que cause danos indevidos a um indivíduo. Neste caso, a vítima poderá direcionar sua ação reparatória tanto em face do golpista quanto do influenciador, com base na responsabilização solidária do CDC que permitirá, no futuro, que a execução recaia sobre o patrimônio de dois sujeitos (aumentando as chances de execução frutífera).
Também se pautando na responsabilização solidária a vítima poderá posicionar no polo passivo da ação os terceiros (como empresas ou pessoas “laranjas”) que participaram da execução do golpe, como nas muito comuns empresas de fachada que se passam por pequenas instituições de crédito intermediadoras de pagamento.
Mesmo que os “laranjas” sejam empresas, por se tratar de relação consumerista fraudulenta, ainda caberia a desconsideração da personalidade jurídica pelo simples fato de não serem encontrados bens suficientes em seu patrimônio para ressarcir os danos causados. Como já explicado, mesmo que se entenda pela adoção da teoria maior da desconsideração (artigo 50 do Código Civil), acredita-se que o próprio fato do cometimento do golpe já é motivo suficiente para fundamentar a ocorrência do desvio de finalidade da empresa e, consequentemente, do abuso da personalidade jurídica.
Obtendo condenação favorável contra todos (tanto golpistas como terceiros auxiliares), a vítima estará livre para cobrar a dívida completa contra todos eles, sendo-lhe lícito direcionar seus esforços para a penhora de bens do executado que aparenta ter melhores chances de pagar o débito (artigo 18, caput e § 6o, incisos II e III, do CDC e artigo 275 do Código Civil).
Conjuntamente às ações, sejam individuais, sejam coletivas, as vítimas de golpes praticados por meio da Internet dispõem, também, da provocação das Polícias Civil e Federal e dos Ministérios Públicos Estaduais e Federal. Assim, a vítima, sempre que possível por meio intermédio de advogado, deve comunicar o fato a essas autoridades, que têm competência para instaurar inquéritos, no caso das Polícias, e para propor ações coletivas, no caso dos Ministérios Públicos.
Especificamente quanto à instauração de inquéritos, veja-se que, a depender do sucesso das investigações policiais, pode-se solicitar que o juiz profira ordem de quebra de sigilo bancário das pessoas físicas e jurídicas investigadas e ordem de busca e apreensão de bens dos investigados. Se comprovada a prática de crime, esses bens podem ser utilizados para ressarcir a vítima, ao fim da ação penal.
Além disso, em caso de propositura de ação penal por parte dos Ministérios Públicos, a vítima pode se habilitar para o recebimento dos valores provenientes de eventual condenação penal dos autores do crime.
Em qualquer das hipóteses, quando houver remessa de produtos do ilícito para o exterior (conforme o modus operandi comumente adotado pelos golpistas digitais), medidas de cooperação jurídica internacional, acionados pelo Poder Judiciário com o auxílio do Departamento de Recuperação de Ativos e Cooperação Jurídica Internacional (DRCI) — ligado ao Ministério da Justiça e Segurança Pública —, poderão ser tomadas a fim de efetivar providências para bloquear bens ou encontrar informações que tenham sido levadas ilicitamente para o estrangeiro (incluindo os paraísos fiscais). A eficácia da medida, entretanto, dependerá do grau de comprometimento do Estado nacional acionado.
Achou que algumas das estratégias apresentadas por este texto se aplicam ao seu caso? Não hesite em contatar um advogado especialista em recuperação de ativos perdidos em golpes financeiros para uma consulta detalhada e individualizada.
Read MoreEm uma votação apertada (3x2), os ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) concluíram nesta terça-feira (8/6) o julgamento sobre a possibilidade da implantação de embriões do casal após a morte de um dos cônjuges.
Em uma votação apertada (3×2), os ministros da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) concluíram nesta terça-feira (8/6) o julgamento sobre a possibilidade da implantação de embriões do casal após a morte de um dos cônjuges.
Em maio deste ano, o ministro relator, Marco Buzzi, votou no sentido de permitir a implantação, uma vez que, no seu entendimento, era incontroverso que o falecido nutria o desejo de ter filhos com a sua esposa.
Para o ministro Buzzi, a realização de inseminação artificial não serviria para outro fim.
Contudo, após pedido de vista, o ministro Luis Felipe Salomão abriu divergência. Em voto vencedor divergente, o ministro não autorizou a realização da implantação do material biológico, uma vez que inexistia manifestação expressa sobre a destinação dos embriões em caso de falecimento.
Para o ministro, nos casos em que a expressão de autodeterminação significar projeção de efeitos para além da vida da pessoa, com repercussões existenciais e patrimoniais, é imprescindível a autorização prévia e inequívoca do falecido para que se permita à viúva realizar a fertilização. Ou seja, para a implantação post mortem não basta a mera presunção da vontade do falecido, mas a sua autorização expressa.
Os ministros Antonio Carlos Ferreira e Raul Araújo acompanharam o voto divergente.
Fonte: https://ibdfam.org.br/noticias/8564/Viúva+não+tem+direito+a+implantar+embriões+sem+autorização+prévia+do+marido%2C+decide+STJ
REsp: 1918421
Read MoreNo presente texto, pretende-se abordar, brevemente, alguns dos instrumentos de natureza contratual que que estão à disposição e podem ser utilizados na hora de planejar a sucessão.
No último artigo publicado pela área de Planejamento Patrimonial, Família e Sucessões do escritório, abordou-se o tema do planejamento sucessório de uma maneira bastante ampla, trazendo-se o seu conceito e a sua finalidade. No presente texto, pretende-se abordar, brevemente, alguns dos instrumentos de natureza contratual que que estão à disposição e podem ser utilizados na hora de planejar a sucessão.
É importante destacar que a escolha dos critérios, estratégias e instrumentos dependerá dos objetivos do titular do patrimônio, dos seus familiares e de terceiros que porventura vierem a ser contemplados. Assim, a estrutura deve ser individualizada e personalizada conforme as peculiaridades do caso concreto e do grupo familiar.
Abaixo serão abordados alguns instrumentos de natureza contratual que são rotineiramente utilizados quando do planejamento:
Contrato de compra e venda entre ascendente e descendente
É muito comum, como medida integrante do planejamento sucessório, a realização de venda de bens entre ascendente e descendente.
Mas é necessário ter cautela com este instrumento. Para impedir que o ascendente possa beneficiar um dos seus descendentes em prejuízo dos demais, desrespeitando a legítima, o Código Civil veda a alienação do bem sem que os outros herdeiros expressamente consintam com o ato. A finalidade da norma é evitar a desigualdade na atribuição dos herdeiros necessários, o que pode ser feito através de uma venda simulada ou fraudulenta, como aquela efetivada a preço vil. Em outras palavras, o objetivo é coibir doações inoficiosas, camufladas de compra e venda.
Ainda, é necessário que haja o consentimento do cônjuge para a venda, na medida em que este também é considerado herdeiro necessário – salvo se o casamento foi celebrado sob o regime de separação obrigatória de bens.
Evidencia-se que o consentimento para a venda de ascendente a descendente pelos demais herdeiros deve se dar por escrito, podendo tal anuência ser ou não contemporânea àquele ato negocial.
Se, entretanto, um dos descendentes ou mesmo o cônjuge recusar consentimento à venda desmotivadamente, poderá o descendente comprador ou o ascendente vendedor requerer o suprimento daquele assentimento em juízo.
Importante destacar, ainda, que se o referido ato de alienação não atender aos requisitos dispostos em lei, poderá ser anulado. Assim, é necessário que todos os requisitos intrínsecos e extrínsecos sejam rigorosamente cumpridos.
Abaixo, faz-se um breve apanhado sobre as principais utilidades da venda de ascendente para descendente como providência pertinente ao planejamento patrimonial e sucessório:
- Atribuir a determinado descendente bem que se revele indispensável à sua sobrevivência ou desenvolvimento;
- Propiciar ao ascendente os recursos advindos da alienação para a sua manutenção e subsistência, garantindo, ainda, que o referido bem continue no seio familiar;
- Quando o ascendente, ciente das possibilidades de divergência entre os herdeiros, queira pôr termo a qualquer possibilidade de questionamento futuro acerca da destinação que em vida foi por ele outorgada a determinado bem, já que, ao contrário da doação, a compra e venda, uma vez feita com anuência dos demais herdeiros, dificilmente poderá vir a ser impugnada; e
- Quando o ascendente deseja transferir a um de seus descendentes algum bem determinado e já comprometeu a parcela disponível do seu patrimônio ou extrapolou a legítima.
O contrato de compra e venda entre ascendente e descendente pode ser um excelente instrumento para o planejamento sucessório, desde que tais transações sejam sempre pautadas pela boa-fé e desde que sejam observados os requisitos para a sua perfectibilização.
Contrato de doação
Assim como o contrato de compra e venda entre ascendente e descendente, o contrato de doação é um instrumento extremamente utilizado durante a elaboração de um planejamento sucessório.
A doação é, de maneira bastante simplista, um contrato por meio do qual uma pessoa – denominada doadora – transfere a outra – designada donatária –, por mera liberalidade, bens ou vantagens integrantes do seu patrimônio.
De modo geral, as doações de ascendentes a descendentes ou de um cônjuge ao outro – desde que sejam herdeiros – importam em adiantamento de herança. Ou seja, os bens recebidos em doação deverão ser levados à colação por ocasião do inventário dos bens deixados pelo doador com vistas à equalização da legítima. Na hipótese de o donatário não levar o bem recebido a título de liberalidade à colação, sujeitar-se-á ele à pena de sonegados e à perda do direito sobre o bem. Cumpre destacar que é nula a doação da parte que exceder àquela que o doador, no momento da liberalidade, poderia dispor em testamento (doação inoficiosa).
Não obstante, pode o doador dispensar o donatário de levar o bem doado à colação, esclarecendo expressamente que a liberalidade se comporta em sua metade disponível e que dela foi retirado.
Diferentemente do contrato de compra e venda, a doação não reclama o consentimento dos demais descendentes, pois é, de antemão, considerada adiantamento de herança. Contudo, é necessária a outorga uxória – salvo se o casamento foi celebrado sob o regime da separação de bens ou se o bem doado for incomunicável.
Ainda, é indispensável que o contrato de doação seja instrumentalizado por escrito, através de escritura pública ou instrumento particular, permitindo-se a doação verbal apenas quando esta versar sobre bens de pequena monta.
A bem da verdade, a doação dos pais aos filhos significa, na sua grande maioria, uma verdadeira partilha em vida, produzindo efeitos desde o momento da efetiva transferência do bem.
Uma vez efetivada a doação, pode o doador revogar a liberalidade, através de ação judicial, em apenas quatro hipóteses, quais sejam: (i) se o donatário atentou contra a vida do doador ou cometeu crime de homicídio doloso contra ele, seu cônjuge, ascendente, descendente ou irmão; (ii) se cometeu contra ele ou seus familiares próximos ofensa física; (iii) se injuriou gravemente ou caluniou o doador; e (iv) se recusou ao doador os alimentos de que este necessitava, caso pudesse auxiliá-lo.
O prazo para a revogação da doação por quaisquer dos motivos mencionados é de um ano a contar do conhecimento do fato pelo doador. É importante mencionar que o direito de revogar a doação é personalíssimo e privativo do doador – com exceção do homicídio doloso.
Se assim desejar, o doador poderá, ainda, reservar para si o usufruto do acervo objeto da liberalidade, garantindo-lhe a percepção dos frutos e dos rendimentos daqueles bens, transferindo apenas a nua propriedade aos donatários. Pode, também, celebrar a doação com cláusula de reversão em favor do doador na hipótese de falecimento do donatário.
Cabe destacar que no momento da avaliação da conveniência do uso deste instrumento para o planejamento sucessório, é importante contabilizar a incidência do Imposto de Transmissão Causa Mortis ou Doação (ITCMD), devendo o referido tributo ser recolhido previamente à lavratura da escritura pública ou instrumento particular.
O contrato de doação é um importante instrumento para o planejamento sucessório, uma vez que é por seu intermédio que se permite aos donatários, quando futuros herdeiros, de imediato tornarem-se proprietários de determinados bens. A doação apresenta significativas vantagens. Veja-se:
- Possibilita a transferência da titularidade do bem, desde logo, subtraindo a necessidade de partilha, caso seja retirado da parte disponível do titular do patrimônio;
- Permite que possam os donatários, quando futuros herdeiros, administrar os bens recebidos a título de antecipação de herança;
- Assegura a propriedade específica de determinado bem em favor de um donatário específico, eliminando, assim, indesejados condomínios;
- Propicia proteção ao donatário eventualmente desprovido de recursos, pois a doação poderá assegurar, por exemplo, que um imóvel sirva de moradia;
- Os bens doados podem ser gravados com cláusula de incomunicabilidade e impenhorabilidade, propiciando segurança de que eles permanecerão no seio familiar.
Seguro de vida
O seguro de vida constitui uma modalidade de seguro de pessoas e é feito, em sua grande maioria, para assegurar a sobrevivência de familiares ou pessoas próximas, até que tenham acesso aos bens deixados pelo titular do patrimônio, pois enseja o recebimento imediato do valor pago pela seguradora, o que garante ao respectivo beneficiário numerário suficiente para fazer frente ao recebimento da herança, além de valores para garantir a sua mantença.
Destaca-se que a aplicação da ordem sucessória do Código Civil só ocorrerá se o segurado não indicar beneficiário ou, caso tenha indicado, por qualquer motivo não puder ser respeitada essa indicação, como acontece, por exemplo, na hipótese em que o beneficiário falece antes do segurado.
A relevância como instrumento de planejamento sucessório reside em alguns importantes diferenciais, quais sejam:
- O capital será recebido imediatamente pelo beneficiário livremente indicado pelo segurado, independentemente da quantidade de débitos que o falecido tenha deixado;
- Poderão ser contratadas quantas apólices forem necessárias para atender os anseios do segurado, titular do patrimônio;
- A escolha do beneficiário é livre;
- Pode evitar a venda de bens móveis e imóveis para custeio das despesas com inventário e pagamento de impostos, garantindo, também, que seus beneficiários tenham condições econômicas de subsistência.
Evidencia-se, por fim, que o valor do capital segurado não estará sujeito a pagamento de dívidas do seguro e tampouco integrará a herança deste – salvo se houver o falecimento de algum beneficiário.
É notório que há diversos instrumentos contratuais que podem ser utilizados para a realização de um planejamento sucessório eficaz. Para além dos mencionados acima, pode-se citar o pacto antenupcial, o contrato de namoro, o contrato de mandato e o contrato de comodato.
Não obstante, como trazido anteriormente, para a escolha do melhor instrumento para planejar a sucessão, é necessário analisar detalhadamente o caso concreto e a composição familiar para que se possa abarcar os anseios do titular do patrimônio e de todos aqueles que serão beneficiados.
Nos próximos artigos da unidade de Planejamento Patrimonial, Família e Sucessões, continuaremos a abordar mais detalhadamente os principais instrumentos utilizados para a construção de um planejamento sucessório.
Caso você tenha alguma dúvida, entre em contato com um dos especialistas da área através do nosso e-mail contato@schiefler.adv.br.
Read MoreO evento fará parte do II Congresso Brasileiro de Direito Privado, que discute as implicações da Covid-19 nas relações privadas.
Amanhã (29 de abril), a advogada Laísa Santos ministrará a palestra “Os impactos da pandemia no planejamento sucessório”, em sua participação no II Congresso Brasileiro de Direito Privado, que acontecerá remotamente entre os dias 28 a 30 de abril de 2021.
Entre outros temas, Laísa tratará sobre o crescimento pela busca por planejamentos sucessórios durante a pandemia e os instrumentos que podem ser utilizados para que as famílias atinjam suas metas a longo prazo, dentro dos limites impostos pela rigidez da norma.
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Amanhã (28 de abril), o advogado Eduardo Schiefler ministrará a palestra “Estado e Pandemia: a importância da Administração Pública Digital para os Negócios Privados”, em sua participação no II Congresso Brasileiro de Direito Privado, que acontecerá remotamente entre os dias 28 a 30 de abril de 2021.
Entre outros temas, Eduardo tratará da recentíssima Lei do Governo Digital (Lei nº 14.129/2021), da prestação de serviços públicos digitais em tempos de pandemia e sua importância para as relações privadas, assim como da oportunidade de novos negócios (GovTechs).
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