
Holding familiar: como estruturar e quais são os cuidados legais
As sociedades familiares constituem uma parcela significativa do cenário empresarial e patrimonial brasileiro. Nesse sentido, a gestão do patrimônio familiar, aliada à complexidade da sucessão hereditária e à elevada carga tributária, impulsiona a busca por mecanismos de planejamento que confiram segurança, eficiência administrativa e otimização tributária, facilitando o processo sucessório. Nesse contexto, a holding familiar tem ganhado destaque crescente como uma alternativa estratégica para a organização e proteção patrimonial e sucessória.
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Conceito de Holding Familiar
O termo “holding”, derivado do verbo inglês “to hold” (segurar, deter), refere-se a uma sociedade cujo objeto principal é a participação no capital de outras sociedades. Embora sem menção expressa, a Lei 6.404/76 (Lei das Sociedades Anônimas) indiretamente define a modalidade de empresa holding no seu art. 2º, §3º, ao estabelecer que “A companhia pode ter por objeto participar de outras sociedades; ainda que não prevista no estatuto, a participação é facultada como meio de realizar o objeto social, ou para beneficiar-se de incentivos fiscais”.
Em definição, as holdings podem ser classificadas em dois grandes grupos: as holdings puras e as mistas. A holding pura, também denominada de sociedade de participação, é completamente voltada para a participação em outras sociedades empresariais por meio da titularidade de cotas ou ações, não exercendo atividade econômica direta. Enquanto a holding mista caracteriza-se para além da participação em outras sociedades, exercendo também alguma atividade empresarial própria (prestação de serviços, atividade imobiliária, entre outros).
No contexto familiar, a holding familiar transcende a mera participação em outras empresas operacionais, ela é constituída primariamente para concentrar, sob a titularidade de uma pessoa jurídica, os diversos bens e direitos pertencentes aos membros de uma família (imóveis, participações societárias, aplicações financeiras). Trata-se, portanto, de uma pessoa jurídica que passa a ser a proprietária legal dos bens antes detidos pelas pessoas físicas que a compõem. Os membros da família, por sua vez, tornam-se sócios ou acionistas desta sociedade, detendo quotas ou ações representativas do patrimônio integralizado.
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Finalidades principais de uma Holding Familiar
A constituição de uma holding familiar geralmente visa alcançar múltiplos objetivos estratégicos, dentre eles, podemos citar:
(i) Planejamento sucessório: facilita a transmissão do patrimônio aos herdeiros em vida, por meio da doação de quotas ou ações, frequentemente com reserva de usufruto para os antecessores. Isso pode evitar a necessidade de inventário (judicial ou extrajudicial) sobre os bens integralizados na holding, reduzindo custos (taxas judiciárias, ITCMD – Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação, honorários advocatícios) e a morosidade do processo.
(ii) Proteção patrimonial: os bens da holding, em princípio, não respondem por dívidas pessoais dos sócios, e vice-versa, salvo em casos de abuso da personalidade jurídica (fraude, desvio de finalidade).
(iii) Otimização fiscal: a estrutura pode permitir uma gestão tributária mais eficiente. Nesse caso, a análise tributária comparativa é fundamental e depende do regime de tributação escolhido.
(iv) Centralização da gestão patrimonial: concentra a administração dos bens familiares em uma única entidade, permitindo uma gestão mais organizada e profissional, com regras claras definidas no contrato/estatuto social e em acordos de sócios/acionistas.
(v) Governança familiar: permite estabelecer regras claras para a tomada de decisões, distribuição de resultados, ingresso e saída de sócios (herdeiros), prevenção e solução de conflitos, preservando a harmonia familiar e a continuidade da gestão patrimonial ao longo das gerações.
Quer entender mais sobre a importância do planejamento? Leia: O planejamento patrimonial e sucessório é para todos?
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Constituição e estruturação da Holding Familiar
A constituição de uma holding familiar é um processo complexo que exige planejamento detalhado e assessoria multidisciplinar (jurídica, contábil, financeira). As etapas fundamentais incluem:
3.1. Diagnóstico familiar e planejamento estratégico
Esta fase inicial envolve:
- Levantamento e avaliação detalhada do patrimônio familiar a ser integralizado.
- Análise da estrutura familiar, relações interpessoais e objetivos de cada membro.
- Definição clara das finalidades da holding (sucessão, proteção, otimização fiscal, etc.).
- Estudo de viabilidade econômica e tributária da estrutura pretendida.
- Discussão sobre as regras de governança desejadas.
3.2. Escolha do tipo societário
Embora o conceito de holding seja encontrado na Lei 6.404/76139 (Lei das Sociedades Anônimas), os tipos societários mais utilizados para holdings familiares no Brasil são as Sociedades Limitadas e as Sociedades por Ações (S.A).
- Sociedade Limitada: Regulada pelo Código Civil (Lei nº 10.406/2002), é geralmente mais simples e menos onerosa em sua constituição e manutenção. A responsabilidade dos sócios é limitada ao valor de suas quotas, em proteção ao patrimônio pessoal dos sócios, contudo, todos respondem solidariamente pela integralização do capital social. Dentre as suas vantagens, destacam-se a flexibilidade à definição de regras no contrato social e a possibilidade de nomeação de administrador não sócio. Esse tipo societário é adequado para estruturas familiares menos complexas.
- Sociedade por Ações (S.A.): Regulada pela Lei nº 6.404/1976 (Lei das S.A.), pode ser de capital fechado ou aberto. Oferece maior complexidade na estrutura de capital (possibilita diferentes tipos de ações – ordinárias, preferenciais, com ou sem direito a voto) e mecanismos de governança mais robustos (Conselho de Administração, Diretoria, Conselho Fiscal). Nesse tipo societário, a responsabilidade dos acionistas/sócios é limitada ao preço de emissão das ações subscritas ou adquiridas, de modo que não responderão pelas obrigações adquiridas pela sociedade. Dentre as suas vantagens, destacam-se as restrições ao direito de recesso (instrumento pelo qual o acionista pode desistir de sua participação na sociedade) e a possibilidade de constituição de duas espécies diversas de ações. Esse tipo societário pode ser mais adequado para famílias com patrimônio elevado, estruturas complexas ou planos futuros de abertura de capital ou atração de investidores, uma vez que os custos de constituição e manutenção são altos.
Durante a escolha, algumas características devem ser consideradas, como a complexidade do patrimônio, o número de membros da família, os objetivos de governança e os custos associados.
3.3. Definição da estrutura societária e integralização do capital social
Após a escolha do tipo societário mais adequado aos objetivos da família, os familiares que integrarão a sociedade devem determinar o valor do capital social, o qual será formado pelo conjunto de bens e direitos que cada um transferirá das suas pessoas físicas para a nova pessoa jurídica. Além disso, é essencial estabelecer como esse capital será representado, seja por quotas ou ações, sendo possível prever a existência de classes distintas que confiram direitos diferenciados aos seus titulares, como poderes de voto específicos ou prioridades na distribuição de resultados. Por fim, simultaneamente, deve ser definida a administração da holding, indicando quem serão os responsáveis pela gestão e detalhando seus respectivos poderes e limites de atuação no contrato ou estatuto social.
Uma vez definida a estrutura societária, o próximo passo é a integralização do capital social, que corresponde à transferência efetiva da titularidade dos bens e direitos do patrimônio pessoal dos sócios para a holding. A formalização dessa transferência patrimonial varia conforme a natureza do bem integralizado. Para bens imóveis, a transferência de propriedade para a holding exige o registro do ato no Cartório de Registro de Imóveis da circunscrição do imóvel, mediante a apresentação do contrato ou estatuto social da holding já registrado na Junta Comercial, juntamente com o comprovante de recolhimento do Imposto sobre Transmissão de Bens Imóveis (ITBI) ou a documentação que comprove a sua imunidade ou isenção. No caso da transferência de participações societárias, a formalização ocorre por meio da averbação nos registros pertinentes, como a alteração do contrato social da sociedade investida na Junta Comercial ou a anotação no Livro de Registro de Ações, conforme o caso.
Do ponto de vista tributário, a integralização de capital é um momento de atenção. Em relação ao ITBI, a regra geral é a imunidade, prevista no artigo 156, §2º, inciso I, da Constituição Federal, que desonera a transferência de bens imóveis para formação do capital social. Contudo, essa imunidade constitucional não se aplica se for constatado que a atividade preponderante da holding que recebe os bens é a de compra e venda ou locação de imóveis, ou arrendamento mercantil, o que demanda uma análise cuidadosa das fontes de receita da nova empresa. Quanto ao Imposto de Renda sobre Ganho de Capital (IRGC) para a pessoa física que transfere o bem, a legislação permite optar: transferir o bem pelo valor de custo (constante na sua declaração de IRPF), o que não gera apuração de ganho de capital naquele momento, ou transferir pelo valor de mercado, caso em que a diferença positiva em relação ao custo de aquisição será tributada como ganho de capital na pessoa física.
3.4. Elaboração do Contrato Social/Estatuto Social e Acordo de Sócios/Acionistas
A etapa final da constituição formal da holding familiar envolve a elaboração do contrato social, no caso de uma sociedade limitada, ou o estatuto social, se for uma sociedade por ações, e, de forma complementar e estratégica, o acordo de sócios ou acionistas.
O contrato ou estatuto social representa o ato constitutivo formal da pessoa jurídica, sendo o documento que lhe confere existência legal após o devido registro na Junta Comercial. Este instrumento deve obrigatoriamente conter as cláusulas exigidas pela legislação societária vigente, além de estabelecer as regras fundamentais que nortearão o funcionamento da holding, como a sua estrutura de capital, a forma de administração, o objeto social, entre outras disposições essenciais.
Em paralelo ao documento constitutivo principal, a celebração de um acordo de sócios ou acionistas assume um papel de extrema relevância estratégica, uma vez que confere a possibilidade de detalhar minuciosamente as regras de convivência societária, estabelecer mecanismos de governança corporativa adaptados à dinâmica familiar, planejar a sucessão da participação societária na própria holding e prever métodos eficazes para a prevenção e resolução de conflitos.
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Cuidados legais
Para que a holding familiar alcance seus objetivos com segurança e eficácia jurídica, é indispensável a observância de um conjunto de normas e cuidados legais.
No âmbito societário, é crucial garantir a regularidade formal da constituição e do funcionamento contínuo da empresa, incluindo o cumprimento de todas as exigências de registro, arquivamento de atas e manutenção de livros. A preservação da autonomia patrimonial deve ser um dos pilares centrais nas holdings familiares, evitando a confusão patrimonial entre os bens da sociedade e dos sócios ou o desvio de finalidade da pessoa jurídica, visto que tais práticas podem levar à desconsideração da personalidade jurídica e expor o patrimônio pessoal a riscos.
No âmbito tributário, recomenda-se a análise prévia detalhada dos impactos fiscais, comparando a carga tributária na pessoa física versus na estrutura da holding (considerando ITBI, ITCMD, IRGC, IRPJ, CSLL, PIS, COFINS, ISS), bem como a escolha do regime de tributação mais adequado. Além disso, o planejamento tributário deve antecipar a incidência do ITCMD sobre futuras doações de quotas, considerando as alíquotas estaduais e a correta avaliação das participações. Por fim, a manutenção de escrituração contábil regular é essencial para a distribuição de lucros isentos e, fundamentalmente, para comprovar a existência de um propósito negocial legítimo, afastando o risco de a estrutura ser considerada planejamento tributário abusivo.
Sobre o ITCMD (Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação), tributo comumente incidente nas transferências de quotas, recomendamos a leitura: Quais são os fatos geradores do ITCMD?
No que tange ao aspecto sucessório, o planejamento realizado através da holding deve obrigatoriamente respeitar a legítima dos herdeiros necessários, garantindo que as doações de quotas não invadam a parte indisponível do patrimônio. As doações precisam observar as formalidades legais, e a imposição de cláusulas restritivas (como inalienabilidade e/ou incomunicabilidade) sobre a legítima requer justificativa plausível.
Para evitar litígios familiares, é recomendável estruturar o planejamento com base em acordos transparentes e formalizados, como apontamos em: Como o planejamento sucessório pode ajudar a evitar disputas entre herdeiros?
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Conclusão
Em síntese, é possível concluir que a holding familiar surge no ordenamento jurídico e no cenário empresarial brasileiro como uma ferramenta estratégica para o planejamento patrimonial e sucessório, em razão da sua capacidade de centralizar a gestão de bens, otimizar a carga tributária, facilitar a transição geracional familiar e oferecer um grau de proteção patrimonial, tornando-a atraente para famílias que buscam segurança e eficiência na administração de seus bens.
Contudo, a estruturação de uma holding familiar exige uma análise integrada das implicações tributárias, sucessórias e familiares. Nesse sentido, as precauções legais detalhadas neste artigo são fundamentais para assegurar a validade, a eficácia e a segurança jurídica da estrutura.
Portanto, conclui-se que o sucesso na implementação de uma holding familiar está intrinsecamente ligado a um planejamento minucioso, personalizado às necessidades e características de cada família, e à condução do processo por profissionais qualificados e experientes nas diversas áreas do direito envolvidas.
A atuação do escritório Schiefler Advocacia em planejamento patrimonial e sucessório
O escritório Schiefler Advocacia atua de forma estratégica na estruturação de holdings familiares e planejamentos sucessórios complexos, oferecendo soluções jurídicas personalizadas para proteger o patrimônio e garantir a continuidade da gestão entre gerações.
Nossa equipe conta com experiência na constituição e governança de estruturas societárias, na análise tributária preventiva e no enfrentamento de disputas familiares e sucessórias, atuando com discrição, técnica e foco na pacificação e longevidade do patrimônio familiar.
Apoiamos nossos clientes desde a análise patrimonial e definição de objetivos, até a implementação jurídica e acompanhamento da gestão da holding, com atenção à segurança jurídica e à sustentabilidade da estrutura ao longo do tempo.
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A ineficácia da criação de novo CNPJ como mecanismo de proteção patrimonial
1. Por que abrir nova empresa para fugir de dívidas pode configurar fraude
Diante da elevada carga tributária e da instabilidade econômica, muitos empresários têm recorrido à constituição de nova pessoa jurídica como estratégia para manter suas atividades empresariais e afastar os efeitos da inadimplência fiscal. Na prática, esse movimento costuma se materializar por meio da abertura de uma nova sociedade empresária com quadro societário semelhante, endereço, ramo de atuação e, em muitos casos, com contabilidade e estrutura operacional interligadas à empresa anterior.
Embora possa parecer uma medida de reestruturação, esse tipo de iniciativa, quando destituída de bases jurídicas sólidas e motivada pela simples intenção de afastar credores, pode ser enquadrada como hipótese de grupo econômico de fato, com consequente redirecionamento das execuções fiscais à nova empresa e, eventualmente, aos seus sócios. Trata-se, portanto, de uma forma ineficaz — e arriscada — de tentar promover a blindagem patrimonial.
2. Como o Fisco identifica grupos econômicos de fato
O grupo econômico de fato é caracterizado pela atuação coordenada de empresas formalmente distintas, mas que, na realidade, operam de maneira conjunta, com interesses e estruturas comuns. A legislação tributária não define expressamente esse instituto, mas tanto a jurisprudência quanto a doutrina o reconhecem a partir de elementos objetivos, como:
- Identidade de sócios ou quadros societários constituídos por pessoas da mesma família;
- Compartilhamento de sede, telefone, funcionários e contabilidade;
- Movimentações financeiras entre as empresas, sem justificativa contratual ou mercadológica;
- Confusão patrimonial e ausência de autonomia gerencial.
O Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF) reforça esse entendimento ao considerar como indícios de grupo econômico de fato a existência de mútuos não convencionais, pagamentos cruzados entre empresas, uso de procuradores em comum e contabilidade centralizada.
Dessa forma, não é necessário que exista formalização jurídica do grupo. A atuação prática das empresas é suficiente para o Fisco configurar o vínculo econômico e promover a responsabilização solidária entre a pessoa jurídica antiga e a que foi constituída posteriormente.
3. Casos reais: o entendimento da jurisprudência
A jurisprudência tem evoluído no sentido de admitir o redirecionamento da execução fiscal às demais empresas do grupo econômico de fato, independentemente dos sujeitos passivos descritos na Certidão de Dívida Ativa. O Superior Tribunal de Justiça (STJ), em diversas oportunidades, reconheceu que há responsabilidade solidária entre pessoas jurídicas quando houver confusão patrimonial e gestão unificada.
A título de exemplo, menciona-se o voto do Ministro Relator Herman Benjamin no REsp nº 1.808.645/PE, em que se indicou que, apesar da legislação tributária não mencionar especificamente a definição de grupo econômico de fato, o combate deste instituto, quando atua de maneira antijurídica, é amplamente admitido na jurisprudência do STJ.
Apesar disso, ainda persiste uma controvérsia sobre os limites do redirecionamento da execução fiscal. A Primeira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por ocasião do julgamento do REsp 1.775.269/PR, firmou o entendimento de que, nos casos em que a nova empresa do grupo econômico não esteja mencionada na Certidão de Dívida Ativa e não se enquadre nas hipóteses previstas nos artigos 134 e 135 do Código Tributário Nacional, é indispensável a instauração do Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica (IDPJ).
Por outro lado, a Segunda Turma do STJ adota posicionamento mais flexível. No AgInt no AREsp 2.135.698/RJ, reconheceu que o redirecionamento pode ocorrer mesmo sem o IDPJ, desde que fundado nos artigos 124, 133 e 135 do CTN, especialmente em situações que envolvam confusão patrimonial e interesses econômicos comuns entre as empresas.
De todo modo, prevalece o entendimento de que, havendo indícios concretos de atuação conjunta e confusão patrimonial, o redirecionamento pode alcançar outras empresas e seus administradores, ainda que não listados originalmente como devedores.
4. O que pode ser feito de forma legal para reestruturar uma empresa com dívidas
Apesar dos riscos, é possível realizar uma reestruturação fiscal e empresarial segura e eficaz. Para isso, é fundamental contar com assessoria jurídica especializada que possa:
- Elaborar um diagnóstico jurídico e contábil do passivo tributário;
- Avaliar a viabilidade de recuperação judicial ou extrajudicial;
- Estruturar operações societárias legítimas (como cisões, incorporações e holdings), respeitando os limites legais;
- Identificar a possível existência de cobranças indevidas realizadas pelo Fisco;
- Negociar os débitos com a Fazenda Pública através da transação tributária ou realizar o parcelamento dos débitos;
- Garantir a separação patrimonial e contábil entre empresas, evitando os riscos de responsabilização solidária.
Assim, o empresário evita práticas que possam ser caracterizadas como fraude ou evasão fiscal e adota soluções amparadas no ordenamento jurídico, preservando tanto o seu negócio quanto o seu patrimônio pessoal.
A reestruturação empresarial diante de passivos fiscais exige estratégias jurídicas bem fundamentadas, sob pena de expor o empresário e suas empresas à responsabilização solidária e ao redirecionamento de execuções fiscais. Nesse cenário, contar com uma assessoria jurídica especializada é essencial para preservar a continuidade da atividade empresarial e proteger o patrimônio dos envolvidos.
O diagnóstico da estrutura societária e do passivo fiscal, passando pela análise de riscos e viabilidade de reorganizações, até a adoção de medidas seguras e juridicamente eficazes é fundamental para garantir a prosperidade e longevidade de qualquer empreendimento.
A equipe do escritório Schiefler Advocacia pode auxiliar na identificação da melhor solução para o seu caso concreto, além de oferecer suporte em processos administrativos e judiciais, com atuação estratégica perante a Fazenda Pública e o Poder Judiciário, sempre com base em sólida argumentação técnica e atualizada jurisprudência.
Nosso objetivo é garantir segurança jurídica e efetividade nos processos de reestruturação empresarial, evitando que medidas precipitadas ou mal orientadas resultem em penalidades severas ou perdas patrimoniais. Se sua empresa enfrenta desafios fiscais, estamos prontos para construir soluções legais, seguras e sustentáveis.
Read MoreAquele que deseja empreender sozinho, sem sócios, no Brasil, possui basicamente três opções: tornar-se empresário individual, abrir uma EIRELI ou constituir uma sociedade limitada unipessoal.
Marcelo John Cota de Araújo Filho[1]
O risco inerente ao exercício de uma atividade empresarial é algo que causa muita preocupação àqueles que se sentem inseguros em empreender com um sócio. A possibilidade de discordância sobre alguma estratégia de negócios específica e o receio da formação de desavenças pessoais pela diferença de ideias são exemplos que levam muitos a optarem por desenvolver um empreendimento sem a participação de outras pessoas.
Aquele que deseja empreender sozinho, sem sócios, no Brasil, possui basicamente três opções: tornar-se empresário individual, abrir uma Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (EIRELI) ou constituir uma sociedade limitada unipessoal. Cada uma das alternativas possui especificidades que podem ser vistas como vantagens ou como desvantagens, cabendo ao empreendedor decidir qual a melhor solução para o modelo de negócio que deseja desenvolver.
Essas especificidades serão abordadas a seguir, por meio do detalhamento das características de cada alternativa e das considerações pertinentes que devem orientar a decisão do empreendedor.
O EMPRESÁRIO INDIVIDUAL
Empresário individual é a pessoa física que exerce, em nome próprio, uma atividade empresarial. Isto é, empresário individual é a pessoa natural que desenvolve, com seus próprios recursos, seu empreendimento.
Uma característica marcante dessa modalidade é a responsabilidade ilimitada e direta do empresário individual, que responde por todas as dívidas contraídas com o seu patrimônio pessoal. Como não há uma pessoa jurídica à frente da atividade desenvolvida, não existe a hipótese de separação patrimonial, de forma que o patrimônio da pessoa física responde direta e ilimitadamente por quaisquer dívidas oriundas do exercício da empresa.
Apesar de essa característica ser vista como uma grande desvantagem, essa modalidade de empresário possui uma característica vantajosa para pequenos empreendimentos: a possibilidade de enquadramento como MEI (Microempreendedor Individual), que tem um procedimento de registro simples e um regime de tributação muito mais brando se comparado às outras modalidades de empresário.
Com efeito, o Microempreendedor Individual é isento de tributos fiscais federais (Imposto de Renda, PIS, Cofins, IPI e CSLL), devendo pagar apenas um valor fixo mensal, que corresponde a uma contribuição para o INSS e ao pagamento do ICMS ou ISS. Esse valor mensal, para o ano de 2020, equivale à quantia de R$ 53,25 para atividades relacionadas ao comércio e indústria, R$ 57,25 para atividades relacionadas a serviços e R$ 58,25 para atividades relacionadas ao comércio e serviços. No entanto, cumpre ressaltar que o MEI é uma categoria que se restringe a atividades mais simples, sobretudo por possuir um limite de faturamento bruto anual baixo, no valor de R$ 81 mil.
Embora seja comum confundir a figura do empresário individual com a do microempreendedor individual, eles são institutos distintos. Ser empresário individual é um requisito necessário para configurar-se como MEI, mas esse enquadramento só é possível se o empresário individual não ultrapassar o limite de faturamento anual de R$ 81 mil.
Diante do exposto, conclui-se que a opção de empreender sozinho através da roupagem de empresário individual só é conveniente para pequenos negócios. A grande vantagem para o empreendedor dessa modalidade reside na possibilidade de enquadrar-se como MEI, mas, caso esse enquadramento não seja possível, a responsabilidade direta e ilimitada do empresário individual, que faz com que seus bens pessoais possam responder pelas dívidas oriundas do exercício da empresa, é um motivo mais que suficiente para que o empreendedor busque outra alternativa para iniciar sua empresa.
A EMPRESA INDIVIDUAL DE RESPONSABILIDADE LIMITADA (EIRELI)
Integrada ao ordenamento jurídico brasileiro com a Lei nº 12.411/11, por muito tempo a Empresa Individual de Responsabilidade Limitada (EIRELI) foi a única alternativa para aqueles que desejavam exercer atividade empresarial sozinhos e, ao mesmo tempo, gozar do instituto da separação patrimonial entre pessoa física e pessoa jurídica.
A EIRELI é uma pessoa jurídica tutelada pelo artigo 980-A do Código Civil e rege-se, no que couber, pelas mesmas regras aplicadas às sociedades limitadas[2]. Isso significa que a EIRELI proporciona ao seu titular a mesma blindagem patrimonial que uma sociedade limitada oferece ao seu sócio, ou seja, existe uma separação patrimonial, de maneira que o patrimônio da pessoa jurídica não se confunde com o patrimônio da pessoa física.
Dessa forma, é certo dizer que a pessoa física que constituiu uma EIRELI limita sua responsabilidade ao capital investido para a formação da pessoa jurídica.
Ocorre que, no caso da EIRELI, há a imposição de um capital social mínimo de 100 salários mínimos para a sua constituição. Esse requisito mínimo pode ser visto como uma desvantagem principalmente para empreendedores iniciantes e que não possuem grande poder econômico, pois necessitariam de um investimento inicial elevado para poder exercer sua atividade empresarial devidamente.
Além disso, outra grande ressalva a se fazer sobre a EIRELI é que a pessoa natural que a constitui só pode ser titular de uma única pessoa jurídica desse tipo. Isso representa uma barreira principalmente para empreendedores mais dinâmicos e ousados, que têm o desejo de exercer atividades empresariais em mais de um ramo econômico, pois só poderiam ser titulares de uma única EIRELI, inviabilizando a constituição de outra pessoa jurídica desse tipo para desenvolver empresas distintas.
Assim, em que pese a EIRELI proporcionar a separação patrimonial, de forma que, ressalvados os casos de fraude[3], somente o patrimônio da pessoa jurídica será responsável pelas dívidas decorrentes do exercício da atividade empresarial, as restrições ligadas à constituição dessa pessoa jurídica podem estabelecer entraves a determinados empreendedores, sobretudo àqueles que não possuem condições de fazer um investimento inicial na monta de 100 salários mínimos e àqueles que possuem a pretensão de exercer diversas empresas.
SOCIEDADE LIMITADA UNIPESSOAL
Possibilidade existente desde a promulgação da Lei nº 13.874/2019, também conhecida como Lei da Liberdade Econômica, a Sociedade Limitada Unipessoal também representa uma alternativa para quem deseja empreender sozinho no Brasil.
Tratando-se de pessoa jurídica, a sociedade limitada unipessoal também promove a separação patrimonial entre o patrimônio da sociedade (pessoa jurídica) e o patrimônio pessoal do sócio (pessoa física), isto é, os bens pessoais do sócio não responderão pelas dívidas contraídas pela sociedade.
Como os patrimônios da pessoa física e da pessoa jurídica não se comunicam, é possível dizer que o sócio responderá de forma subsidiária[4] e limitada pelas obrigações sociais. Ou seja, quem responde por essas obrigações é a própria sociedade, com seus próprios bens, de forma que os bens particulares do sócio estão, em princípio, resguardados.
Vale ressaltar que essa blindagem patrimonial não é absoluta, existindo a possibilidade de responsabilização pessoal do sócio em caso de abuso da personalidade jurídica, hipótese configurada quando o sócio utiliza a sociedade para cometer irregularidades envolvendo o desvio de finalidade da pessoa jurídica ou para promover uma confusão patrimonial com o intuito de ocultar os próprios bens. Nesses casos, pode ocorrer a desconsideração da personalidade jurídica, responsabilizando-se diretamente o patrimônio do sócio pelas irregularidades cometidas[5].
Portanto, ressalvados os casos de abuso, a sociedade limitada unipessoal retrata uma opção viável para a proteção patrimonial da pessoa que deseja empreender de forma a diminuir os riscos inerentes ao exercício da atividade empresarial no Brasil. Fornecendo blindagem patrimonial mas não se prendendo a restrições como ocorre no caso da EIRELI, a sociedade limitada unipessoal representa um grande avanço legislativo pátrio na área do Direito Empresarial, possibilitando aos mais diversos tipos de empreendedores o exercício adequado da atividade empresarial.
CONCLUSÃO
O desejo de empreender é latente a muitos cidadãos brasileiros, independente das condições de vida e esfera social em que estão inseridos. Do pequeno ao grande empreendedor, a possibilidade de exercer uma atividade empresarial sozinho deve ser avaliada em conformidade com as condições concretas do empreendedor e com a expressividade da atividade que ele pretende desenvolver, cabendo-lhe, assim, selecionar a alternativa mais viável entre as existentes para o seu modelo de negócios.
[1] Estagiário de Direito no escritório Schiefler Advocacia. Bacharelando em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Membro do grupo de extensão Inteligência Jurídica (UFU). Ex-assessor de presidência e ex-consultor de Negócios da Magna Empresa Júnior, além de ex-representante discente do Conselho da Faculdade de Direito (CONFADIR) da UFU.
[2] Art. 980-A. […] § 6º Aplicam-se à empresa individual de responsabilidade limitada, no que couber, as regras previstas para as sociedades limitadas.
[3] Art. 980-A. […] § 7º Somente o patrimônio social da empresa responderá pelas dívidas da empresa individual de responsabilidade limitada, hipótese em que não se confundirá, em qualquer situação, com o patrimônio do titular que a constitui, ressalvados os casos de fraude.
[4] A responsabilidade subsidiária surge na hipótese em que o sócio ainda não integralizou todo o capital social subscrito, estando limitada a esse valor subscrito mas ainda não integralizado.
[5] Art. 50. Em caso de abuso da personalidade jurídica, caracterizado pelo desvio de finalidade ou pela confusão patrimonial, pode o juiz, a requerimento da parte, ou do Ministério Público quando lhe couber intervir no processo, desconsiderá-la para que os efeitos de certas e determinadas relações de obrigações sejam estendidos aos bens particulares de administradores ou de sócios da pessoa jurídica beneficiados direta ou indiretamente pelo abuso.
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