JANELA DE OPORTUNIDADE: POR QUE EM 2022 VIVEMOS UM ANO EXTRAORDINÁRIO PARA AS LICITAÇÕES PÚBLICAS?
O ano de 2022 é uma excelente janela de oportunidade para os profissionais que atuam em licitações públicas. A comprovação desta afirmação passa pela demonstração de três fatores.
O primeiro fator relaciona-se com as inovações legislativas no âmbito das contratações públicas, que exigirão rápida adaptação dos operadores do direito e dos empresários. O segundo está ligado ao montante de investimentos públicos. O terceiro fator, por fim, diz respeito às regras aplicáveis à Administração Pública em anos eleitorais.
Primeiro fator: A janela de oportunidades aberta pelas alterações legislativas.
No dia 1º de abril de 2022 foi publicada a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei nº 14.133/2021), que prevê a revogação da “Antiga” Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei nº 8.666/93), da Lei do Pregão (Lei nº 10.520/02) e da Lei que instituiu o Regime Diferenciado de Contratações Públicas – RDC (Lei nº 12.462/11).
Entretanto, a revogação das “antigas” leis mencionadas acima não foi automática. A maior parte dos dispositivos legais da Lei nº 8.666/93[1]O artigo 193, inciso I, da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei nº 14.133/2021) previu a revogação automática, apenas, dos artigos 89 a 108 da Antiga” Lei de Licitações e … Continue reading e a íntegra das Leis nºs 10.520/02 e 12.462/11 continuarão vigentes durante o transcurso do lapso temporal de 2 anos a partir da publicação da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos.
Dentre o lapso temporal de 2 anos, a Administração Pública tem discricionariedade para licitar e contratar de acordo com o diploma legal que entender mais conveniente, sendo vedada a aplicação conjunta, consoante disposição do artigo 191 da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos.
O lapso temporal de 2 anos da publicação da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos se encerrará no início de abril de 2023, ou seja, em pouco menos de 1 ano. A partir daí, os operadores do direito e os entes privados que atuam no setor das contratações públicas terão de estar plenamente adaptados às inovações da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, que terá aplicação obrigatória.
Nesse contexto, os operadores do direito e as empresas que estiverem mais bem ambientados com as alterações legislativas terão larga vantagem competitiva em relação aos concorrentes que ainda estejam em processo de adaptação. E é justamente por isso que, sob o aspecto legislativo, o ano de 2022, véspera da aplicação obrigatória da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, representa uma grande janela de oportunidade.
Abaixo serão mencionadas algumas das novidades trazidas pela Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos.
A primeira novidade é a efetiva implementação do Portal Nacional de Contratações Públicas (“PNCP”), que propicia a divulgação centralizada e obrigatória de informações referentes a licitações e a contratações públicas regidas pela Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, assim como viabiliza a realização facultativa de contratações pelos órgãos e entidades dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário de todos os entes federativos.
Tamanha é a relevância desta novidade legislativa que o artigo 94 da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos condiciona a eficácia dos contratos administrativos e seus eventuais aditivos à divulgação no PNCP.
A compreensão sobre as funcionalidades e os deveres e obrigações legais relacionadas ao PNCP tornam-se fundamentais aos operadores do direito e aos entes privados. Consequentemente, aqueles que estiverem melhor preparados poderão aproveitar essa janela de oportunidade.
A segunda novidade, intimamente ligada ao PNCP, é a implementação do Catálogo Eletrônico de Padronização de Compras, Serviços e Obras (“CEPCSO”). O CEPCSO é uma ferramenta informatizada com indicação de preços, destinada a automatizar o planejamento da licitação e permitir a padronização de itens a serem contratados pela Administração e que estarão disponíveis para licitação ou para contratação direta.
No dia 02/02/2022, a Secretaria de Gestão do Governo Federal publicou a Portaria SEGES/ME nº 938/22, que instituiu o CEPCSO no âmbito da Administração Pública federal direta, autárquica e fundacional. De acordo com o artigo 10 da Portaria, “o catálogo eletrônico de padronização será utilizado em licitações cujo critério de julgamento seja o de menor preço ou o de maior desconto, bem como nas contratações diretas de que tratam os incisos I do art. 74 e os incisos I e II do art. 75 da Lei nº 14.133, de 2021”.
Diante desse cenário, é de fundamental importância que as empresas e os operadores do direito compreendam o procedimento de padronização instituído no CEPCSO, inclusive para que, na medida do possível, garantam que os seus produtos (ou de seus clientes) sejam contemplados por este catálogo. Aos que estiverem mais bem ambientados, essa poderá ser mais uma grande vantagem competitiva nesta janela de oportunidades.
A terceira novidade operacional relaciona-se com as alterações no procedimento auxiliar de Sistema de Registro de Preços (“SRP”), cuja nova regulamentação está disposta entre os artigos 82 a 86 da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos.
De acordo com a Secretaria de Gestão do Governo Federal, até meados de 2022 será publicada a regulamentação infralegal do SRP, que seguirá as seguintes diretrizes: (i) potencial do SRP para fins de contratações compartilhadas ou centralizadas; (ii) uso do SRP como uma das estratégias de fundamento ao marketplace governamental; (iii) uso do SRP como ferramental à execução de transferências voluntárias; (iv) flexibilidade do SRP, em termos de reajuste e revisão de preços; (v) uso de SRP em dispensas e inexigibilidades de licitação; e (vi) otimização do emprego do SRP para obras e serviços de engenharia[2] Disponível em: https://www.gov.br/compras/pt-br/nllc/Contrataes_Pblicas_2022.pdf. p. 11. Acesso em: 13 jun. 2022..
Por fim, ainda em relação às novidades da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, é importante ressaltar que há inúmeras alterações nas regras aplicáveis aos procedimentos licitatórios e aos contratos administrativos. Esta é uma janela de oportunidades que não aparecia desde o ano de 1993, quando a Lei nº 8.666/1993 foi promulgada. Naturalmente, as empresas e, sobretudo, os operadores do direito, terão de estar muito bem familiarizados até o início de abril de 2023, prazo final para o início da aplicação obrigatória das novas regras.
Todas as alterações legislativas mencionadas neste subtópico representam excelentes janelas de oportunidades aos operadores do direito e às empresas que se adaptarem mais rapidamente às mudanças.
Em outras palavras, quem compreender primeiro as nuances das alterações legislativas e operacionais oriundas da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos sairá na frente. Aliás, vale ressaltar que, se for seguida a mesma tendência observada em relação à Lei nº 8.666/1993 – com vigência por quase 30 anos –, é bem possível que a Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos permaneça vigente pelas próximas décadas, de modo a beneficiar, por um considerável período de tempo, aqueles que se adaptaram antes às alterações legislativas.
Segundo fator: A janela de oportunidades aberta pelos investimentos públicos.
Há fatores econômicos no país, atinentes aos investimentos públicos, que também podem representar uma grande janela de oportunidade aos operadores do direito e aos entes privados que se dedicam às licitações e às contratações públicas.
O primeiro fator econômico a ser destacado é o montante de investimento público esperado para o ano de 2022. De acordo com dados informados pelo Governo Federal, as contratações públicas movimentam cerca de 12% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro por ano[3]Disponível em: … Continue reading. As estimativas para 2022 apontam que o PIB brasileiro será ligeiramente superior ao verificado em 2021[4]Disponível em: … Continue reading, de R$ 8,7 trilhões[5] Disponível em: https://www.ibge.gov.br/explica/pib.php. Acesso em: 13 jun. 2022.. Portanto, é possível estimar que o valor destinado às contratações públicas em 2022 será superior a 1 trilhão de reais.
O segundo fator econômico vem do Estado de São Paulo, responsável, em 2020, pelo percentual de 31,2% do PIB brasileiro[6] Disponível em: https://www.investe.sp.gov.br/por-que-sp/economia-diversificada/pib/. Acesso em: 13 jun. 2022.. Para o ano de 2022, o Estado aprovou orçamento recorde para investimentos públicos, no montante de R$ 27,5 bilhões. De acordo com a Administração do Estado, o biênio 2021-2022 alcançará a marca histórica de 50 bilhões em investimentos públicos (R$ 27,5 bilhões aprovados para o ano de 2022 + 22,5 bilhões que foram investidos em 2021)[7] Disponível em: < https://www.saopaulo.sp.gov.br/secretaria-de-projetos-orcamento-e-gestao/estado-de-sp-tera-o-maior-orcamento-publico-da-historia-em-2022/.. Acesso em: 19 fev. 2022..
Os operadores do direito e, principalmente, os entes privados, devem estar atentos a essas oportunidades geradas pelos investimentos públicos já destacados nos orçamentos aprovados dos entes federativos, que poderão significar uma enorme oportunidade no ano de 2022.
Terceiro fator: As peculiaridades das regras aplicáveis em anos eleitorais.
Por último, é importante que os operadores do direito e as empresas considerem que 2022 é um ano eleitoral, o que atrai a aplicação de algumas regras peculiares às contratações públicas. Aqueles que possuírem uma clara noção acerca das nuances dessas regras poderão, naturalmente, focar seus esforços e recursos nos projetos mais rentáveis.
A título de exemplo, pode-se mencionar a vedação à realização de campanhas publicitárias a partir de 02/07/2022 e a restrição às despesas de publicidade no primeiro semestre do ano de eleição, que não poderão ultrapassar os gastos médios dos últimos três anos que antecederam o seu mandato, nos termos do artigo 73, incisos VI, alínea ‘b’, e VII, da Lei Federal nº 9.504/97[8] C.f. Ac.-TSE, de 30/06/2011, no AgR-AI nº 116967..
Além disso, nos anos eleitorais é proibida a distribuição gratuita de bens, valores ou benefícios por parte da Administração Pública, salvo nos casos de calamidade pública, estado de emergência ou de programas sociais autorizados em lei e que já estejam em execução orçamentária no exercício anterior. Nos casos de distribuição gratuita por meio de programas sociais, vale ressaltar que o Tribunal Superior Eleitoral, em interpretação literal e restritiva do dispositivo legal, tem exigido a existência concomitante dos dois requisitos: (i) existência de programa social autorizado em lei e (ii) já em execução orçamentária no exercício anterior, consoante o disposto no incisos IV e no §10 do artigo 73 da Lei Federal nº 9.504/97.
Ainda em relação à exceção quanto aos programas sociais, há a indicação de que estes não poderão ser executados por entidade nominalmente vinculada a candidato ou por esse mantido, conforme a regra do artigo 73, § 11, da Lei Federal nº 9.504/97.
Por último, vale ainda ressaltar que a Administração Pública, nos últimos dois quadrimestres de mandato, não poderá contrair obrigação de despesa que não possa ser cumprida integralmente dentro dele, ou que tenha parcelas a serem pagas no exercício seguinte sem que haja suficiente disponibilidade de caixa para tanto, nos termos do artigo 42, caput e parágrafo único, da Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101/2000).
As regras acima mencionadas, assim como todas as demais aplicáveis em anos eleitorais devem ser minuciosamente compreendidas por operadores do direito e entes privados que pretendam atuar no setor das contratações públicas. A compreensão exata dessas normas poderá garantir que, em anos eleitorais (2 em 2 anos), os entes privados possam focar seus recursos e esforços, primordialmente, nos setores mais rentáveis ao seu objeto social.
Na prática, portanto, um ano eleitoral representa uma excelente janela de oportunidades, seja aos operadores do direito, que poderão estar mais bem preparados às complexas demandas que envolvem as contratações públicas nesses períodos, seja às empresas, que poderão focar recursos e esforços em projetos voltados a setores mais rentáveis.
Conclusão
As janelas de oportunidades para o ano de 2022 estão vinculadas a três principais fatores, conforme demonstrado ao longo do texto: (i) inovações legislativas oriundas na Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, que impactarão em larga medida as licitações e contratações públicas no Brasil, conferindo vantagens competitivas àqueles que compreenderem primeiro as nuances das novas regras e dinâmicas operacionais; (ii) investimentos públicos a serem realizadas no Brasil neste ano de 2022; e (iii) particularidades das regras aplicáveis em anos eleitorais.
A dedicação à compreensão das regras atinentes às licitações e contratações públicas, por óbvio, sempre será vantajosa aos operadores do direito e aos entes privados, porém, o ano de 2022 faz com que a atenção destes tenha de ser redobrada, para que não percam as janelas de oportunidades que estão abertas no mercado.
Referências[+]
↑1 | O artigo 193, inciso I, da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei nº 14.133/2021) previu a revogação automática, apenas, dos artigos 89 a 108 da Antiga” Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei nº 8.666/93), que versavam sobre os crimes relacionados às licitações públicas e às suas respectivas regras processuais e procedimentais. A partir da publicação da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos, esses crimes passaram a ser previstos no Código Penal, no Capítulo destinado aos “Crimes praticados por particular contra a administração em geral”, especificamente dentre os artigos 337-E a 337-P. |
---|---|
↑2 | Disponível em: https://www.gov.br/compras/pt-br/nllc/Contrataes_Pblicas_2022.pdf. p. 11. Acesso em: 13 jun. 2022. |
↑3 | Disponível em: https://www.gov.br/economia/pt-br/assuntos/noticias/2022/janeiro/economia-assina-acordo-em-contratacoes-publicas-com-agencia-americana-de-comercio-e-desenvolvimento#:~:text=As%20contrata%C3%A7%C3%B5es%20p%C3%BAblicas%20movimentam%20cerca,melhores%20pr%C3%A1ticas%20internacionais%20na%20%C3%A1rea. Acesso em: 13 jun. 2022. |
↑4 | Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/business/puxado-pelos-servicos-pib-brasileiro-deve-crescer-11-para-2022-diz-ipea/#:~:text=O%20Produto%20Interno%20Bruto%20(PIB,compara%C3%A7%C3%A3o%20com%20o%20ano%20passado. Acesso em: 13 jun. 2022. |
↑5 | Disponível em: https://www.ibge.gov.br/explica/pib.php. Acesso em: 13 jun. 2022. |
↑6 | Disponível em: https://www.investe.sp.gov.br/por-que-sp/economia-diversificada/pib/. Acesso em: 13 jun. 2022. |
↑7 | Disponível em: < https://www.saopaulo.sp.gov.br/secretaria-de-projetos-orcamento-e-gestao/estado-de-sp-tera-o-maior-orcamento-publico-da-historia-em-2022/.. Acesso em: 19 fev. 2022. |
↑8 | C.f. Ac.-TSE, de 30/06/2011, no AgR-AI nº 116967. |