A medida foi criada visando se adequar ao momento vivenciado de pandemia do novo coronavírus e contempla crianças e adolescentes até 16 anos, desacompanhados de um ou ambos os pais.
O Conselho Nacional de Justiça (CNJ) editou, através do Corregedor Nacional de Justiça, Ministro Humberto Martins, a Autorização Eletrônica de Viagem (AEV) de crianças e adolescentes até 16 anos, desacompanhados de um ou ambos os pais.
A medida foi criada visando se adequar ao momento vivenciado de pandemia do novo coronavírus. De acordo com o provimento, a emissão da declaração será feita exclusivamente por intermédio do Sistema de Atos Notariais Eletrônicos (e-Notariado), obedecendo todas as formalidades exigidas previstas no Provimento n. 100/2020.
Assim como no divórcio virtual, o ato normativo prevê a realização de videoconferência notarial para a captação do consentimento das partes sobre os termos do ato jurídico, a concordância com os termos do ato bem como a assinatura digital pelas partes e pelo Tabelião de Notas.
Ainda, a Autorização Eletrônica de Viagem poderá contemplar a necessidade de hospedagem do menor, em caso de emergências decorrentes de atrasos, alterações ou cancelamentos de voos ou viagens – tal hipótese será indagada pelo tabelião e previamente consignada no documento.
O prazo da autorização poderá ser delimitado pelos pais ou responsáveis pelo período do evento e, em caso de omissão, o documento será válido por dois anos.
A Autorização conterá, ainda, em destaque, o QR Code e chave de acesso para a verificação de autenticidade pela Policia Federal e às empresas de transporte rodoviário, marítimo ou aeroportuário. O provimento entrará em vigor em 60 dias após a sua publicação, que ocorreu no dia 04 de junho de 2020.
Read MoreAtualmente, o desejo unilateral de permanecer vinculado a um relacionamento conjugal não serve mais como norte para a manutenção da relação.
Laísa Santos[1]
Na última semana, ganhou destaque nas redes sociais uma decisão proferida pelo juízo da 4ª vara de família e sucessões de São Paulo que deferiu a tutela provisória de evidência para decretar o divórcio de um casal antes mesmo da citação da ex-esposa.
Na decisão, o juiz responsável considerou que o divórcio é um direito potestativo incondicionado, citando a Emenda Constitucional 66/2010 que autoriza o divórcio independentemente de qualquer condição, bastando tão somente a manifestação de vontade de um dos cônjuges.
No Código Civil de 1916 e nas constituições passadas, o casamento sempre foi caracterizado como indissolúvel, devendo ser preservado a qualquer custo – ainda que a felicidade dos integrantes da família fosse prejudicada. Visando modificar essa situação, em junho de 1977 foi aprovada a Emenda Constitucional nº 9 (CF de 1967), permitindo o divórcio após cinco anos de separação prévia.
Com a evolução da sociedade e das relações familiares e conjugais, a Constituição Federal de 1988, no § 6º do seu artigo 226, reduziu os prazos e formalidades, permitindo o divórcio após prévia separação judicial por mais de um ano nos casos expressos em lei ou na hipótese de comprovação da separação de fato por mais de dois anos[2].
Somente em 2010, com a Emenda Constitucional 66/2010, houve a alteração do § 6º do artigo 226, suprimindo a necessidade de prévia separação judicial ou de fato para fins de divórcio e acabando com a discussão acerca da culpa sobre o fim do relacionamento. A Emenda foi uma proposição do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) apresentada em 2007 pelo então deputado federal Sérgio Barradas Carneiro (BA).
Seguindo essa linha, em 2015, na vanguarda, o IBDFAM aprovou o Enunciado 18 no X Congresso Brasileiro de Direito Família, que previa que nas ações de divórcio e de dissolução de união estável a regra será o julgamento parcial de mérito para que seja decretado o fim da conjugalidade, seguindo a demanda com a discussão de outros temas.
Já em maio do ano passado, o Estado de Pernambuco regulamentou o divórcio unilateral pelo Provimento nº 06/2019. No provimento, a Corregedoria-Geral de Justiça de Pernambuco possibilitou o “divórcio impositivo” que se caracterizava como um ato de autonomia de vontade de um dos cônjuges, não exigindo a prévia concordância do ex-cônjuge.
O Estado foi o primeiro a adotar a medida, não demorando muito para que o Estado do Maranhão também fizesse a regulamentação através do Provimento nº 25/19. Contudo, a Associação de Direito de Família e das Sucessões (ADFAS) ingressou no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) com pedido de providências contra a regulamentação do divórcio unilateral.
Logo após, o Conselho Nacional de Justiça, através do Corregedor Nacional, Ministro Humberto Martins, expediu a Recomendação nº 36/2019, que orientava os tribunais a se absterem de editar atos que permitissem o divórcio unilateral, sob o argumento de que o ordenamento jurídico brasileiro não permite que o divórcio seja realizado extrajudicialmente quando não há consenso entre o casal. Na oportunidade, também solicitou que aqueles tribunais que já tinham editado atos normativos providenciassem a sua imediata revogação.
Ainda que inexista, até o momento, regulamentação sobre o assunto, aos poucos o Poder Judiciário vem se manifestando no sentido de facilitar o divórcio, destravando barreiras antes impostas ao cônjuge que não tenha mais interesse em continuar o matrimônio.
Em janeiro deste ano, a juíza Karen Francis Schubert, titular da 3ª vara da família da comarca de Joinville (SC) decretou, liminarmente, o divórcio de um casal antes da citação do marido. Em entrevista concedida ao IBDFAM, a magistrada reiterou que o divórcio passou a ser caracterizado como um direito potestativo incondicionado, fundamentado na Constituição. Ainda, fundamentou que para a sua decretação não se exige a apresentação de qualquer prova ou condição, sendo desnecessária a formação do contraditório.
Em maio, o Juiz Substituto da 1ª Vara da Família de Águas Claras/DF também proferiu decisão semelhante. Na ocasião, uma mulher conseguiu o divórcio antes mesmo da citação do ex-cônjuge no processo. O juiz não somente atendeu o pedido de urgência por meio de uma decisão liminar, como também ordenou a expedição de mandado para a devida averbação em cartório.
Evidentemente que, nos dias atuais, o desejo unilateral de permanecer vinculado a um relacionamento conjugal não serve mais como norte para a manutenção da relação. Para tanto, tramita no Senado o Projeto de Lei nº 3457/2019, que acrescenta o artigo 733-A ao Código de Processo Civil, permitindo que um dos cônjuges requeira a averbação do divórcio no cartório de registro civil, ainda que o outro cônjuge não concorde com o fim do relacionamento.
Tendo em vista que ainda há divergência entre a orientação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e a interpretação da legislação vigente adotada por alguns magistrados, o Projeto de Lei será bem-vindo, trazendo maior segurança jurídica e eliminando os entraves burocráticos. Indubitavelmente se trata, também, de uma significativa evolução para o Direito de Família e, principalmente, para as relações afetivas e familiares como um todo.
[1] Advogada. Pós-Graduanda em Direito de Família e Sucessões pela Escola Brasileira de Direito (EBRADI). Especialista em Planejamento Sucessório pela Fundação Getúlio Vargas (FGV/SP). Graduada em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) e da Comissão de Direito de Família da OAB/SC. Co-autora do livro “Desafios Contemporâneos do Direito de Família e Sucessões” (2018) e de artigos.
[2] ROSA, Conrado Paulo da. Curso de Direito de família contemporâneo. 6. ed. rev., ampl. e atual. – Salvador: JusPODIVM, 2020, p. 288.
Read MoreVisando mitigar os efeitos da pandemia do coronavírus, o texto dispõe sobre o chamado Regime Jurídico Emergencial e Transitório das Relações Jurídicas (RJET).
Os impactos da Lei da Pandemia (Lei nº 14.010) no âmbito do Direito das Famílias e Sucessões
Laísa Santos[1]
O Projeto de Lei nº 1.179/20 foi sancionado pelo presidente na última quarta-feira, 10 de junho, após aprovação em ambas as casas legislativas. Visando mitigar os efeitos da pandemia do coronavírus, o texto dispõe sobre o chamado Regime Jurídico Emergencial e Transitório das Relações Jurídicas (RJET).
Segundo o autor, Senador Antônio Anastasia (PSD/MG), o Projeto de Lei – agora, convertido em lei – visa minimizar as consequências socioeconômicas provocadas pela pandemia, de modo a preservar contratos, suspender prazos e evitar o abalroamento do judiciário com processos em massa.
Partindo desse pressuposto, o capítulo X dispôs sobre o Direito de Família e Sucessões, em seus artigos 15 e 16.
No âmbito do Direito de Família, o artigo 15 da lei determina que, até 30 de outubro de 2020, a prisão civil por dívida alimentar deverá ser cumprida exclusivamente sob a modalidade domiciliar. Ou seja, enquanto vigente o regime jurídico emergencial, todo aquele que estiver em débito com até os últimos três meses de pensão e, tiver a sua prisão decretada, poderá cumpri-la em sua própria residência.
Contrariando o posicionamento adotado desde o início pelo Projeto de Lei (agora lei) e da Recomendação 62/2020 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), no último dia 2 de junho a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou o regime domiciliar e suspendeu a prisão do devedor de alimentos durante a pandemia. Assim, o devedor de alimentos cumprirá a prisão em regime fechado após o fim do estado de calamidade pública.
No seu voto, o relator, ministro Villas Bôas Cueva, destacou que a concessão da prisão domiciliar aos alimentantes inadimplentes relativizaria o que esta disposto na norma e argumentou que, assegurar aos presos por dívida alimentar o direito à prisão domiciliar seria medida que não cumpriria o mandamento legal, ferindo a própria dignidade do alimentando.
A questão foi afetada ao colegiado pela 3ª Turma na sessão da última terça-feira (10/06) para dirimir as divergências de entendimento com a 4ª Turma. Entretanto, o relator, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, propôs o adiamento do julgamento, tendo em vista que o prazo para veto ou sanção da “Lei da Pandemia” pela Presidência da República se esgotava naquele mesmo dia.
Diante da sanção do projeto e, consequentemente, da sua conversão em lei, o Superior Tribunal de Justiça possivelmente pautará o Habeas Corpus para a próxima semana e decidirá conforme a legislação vigente. Ainda, será necessário deliberar se a lei passará ou não a ter efeitos retroativos.
A situação exige cautela. Sabe-se que o crescimento da inadimplência alimentar está no horizonte desta crise. Contudo, é preciso assegurar o direito do mais vulnerável através de medidas que visem coagir aqueles genitores que possam aproveitar do momento, deixando de adimplir com a verba alimentar, de maneira mal-intencionada.
No tocante ao Direito das Sucessões, a “Lei da Pandemia” prevê, em seu artigo 16, a prorrogação do prazo para abertura do inventário (2 meses a contar do falecimento) e a suspensão do prazo de 12 meses para a conclusão de inventários com óbitos anteriores a fevereiro de 2020.
De maneira simplificada, o artigo propõe que, para falecimentos ocorridos a partir de 1º de fevereiro de 2020, o início da contagem do prazo de dois meses para a abertura do respectivo inventário será prorrogado para o dia 30 de outubro de 2020. Ou seja, o prazo só começará a correr a partir da data aprazada.
Da mesma forma será a aplicação do prazo para finalização dos processos de inventário com óbitos anteriores a fevereiro de 2020. Assim, um inventário que iniciou em novembro de 2019 e deveria ser finalizado até novembro de 2020, terá seu prazo suspenso a partir da entrada em vigência desta lei, somente retornando após 30 de outubro. O prazo já transcorrido antes da publicação da lei será computado.
Ainda que de bom grado a redação do artigo, as consequências práticas são nebulosas. Como regra geral, em caso de não abertura do inventário no prazo estabelecido de 2 meses pelo Código de Processo Civil[2], há a incidência de multa. O estado de Santa Catarina, por exemplo, impõe uma multa de 20% sobre o valor do Imposto de Transmissão Causa Mortos e Doação (ITCMD), enquanto que o de São Paulo impõe a multa no percentual de 10 a 20% sobre o imposto devido.
Não obstante a competência da União em legislar sobre direito civil e processual e, consequentemente, sobre o prazo para abertura e finalização de inventários, é dos Estados a competência para instituir o ITCMD, bem como para estipular penalidades pela não observância de prazos.
Até o presente momento, tanto o estado de Santa Catarina quanto o de São Paulo ainda não alteraram nenhuma das normas que tratam sobre a aplicação de multa pelo atraso na abertura do inventário (Lei nº 13.136/04 e 10.705/2000, respectivamente) – em que pese o Projeto de Lei estivesse tramitando desde março. Ou seja, ainda não há qualquer movimentação para uma harmonização das referidas legislações estaduais com a nova lei sancionada.
Diante dessa incerteza e da ausência de posicionamento dos estados da federação sobre o assunto, é necessário se atentar e alertar aos herdeiros para a possibilidade da aplicação da multa pelas Fazendas Estaduais caso o contribuinte descumpra o prazo para o pagamento do ITCMD, ainda que haja a dilação de prazo da normatização transitória federal.
[1] Advogada atuante na área de Planejamento Patrimonial, Família e Sucessões do escritório Schiefler Advocacia. Graduada pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e especialista em Planejamento Patrimonial pela Fundação Getúlio Vargas (FGV/SP). Membra do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) e da Comissão de Direito de Família da OAB/SC. Co-autora do livro “Desafios Contemporâneos do Direito de Família e Sucessões” (2018) e de artigos.
[2] CPC. Art. 611. O processo de inventário e de partilha deve ser instaurado dentro de 2 (dois) meses, a contar da abertura da sucessão, ultimando-se nos 12 (doze) meses subsequentes, podendo o juiz prorrogar esses prazos, de ofício ou a requerimento de parte.
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Na hipótese de suspensão da prisão civil, o mandado de prisão do devedor de alimentos permaneceria em aberto até o fim da recomendação de distanciamento social.
É possível suspender o cumprimento da prisão do devedor de alimentos durante a pandemia decorrente de COVID-19?
Maria Luisa Machado Porath[1]
Na última semana, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) noticiou acerca da possibilidade de suspensão da decretação da prisão civil por dívida de alimentos em função da pandemia de COVID-19. A decisão da Terceira Turma do STJ repercutiu no âmbito jurídico devido à contrariedade do artigo 6º da Recomendação n. 62/2020 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ): substituição da prisão civil em regime fechado pela domiciliar, a fim de minimizar os riscos epidemiológicos[2].
Antes de adentrarmos no caso concreto, vale ressaltar que o Projeto de Lei n. 1.179/20 foi aprovado pelo Congresso Nacional e aguarda sanção do Presidente da República. O Capítulo X do Projeto de Lei trata do Direito de Família e Sucessões. Para o estudo, importa destacar que o artigo 15 aborda que, até o dia 30 de outubro de 2020, a prisão civil por dívida alimentícia deverá ser cumprida exclusivamente sob a modalidade domiciliar, sem prejuízo das exigibilidades das respectivas obrigações[3].
Caso concreto: julgamento de Habeas Corpus impetrado contra acórdão proferido pela 9ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP)
No julgado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), os desembargadores entenderam pela manutenção da prisão em regime fechado, uma vez que o devedor deixou de pagar as prestações da pensão que venceram posteriormente ao pedido de extinção da execução de alimentos.
A defesa, no STJ, ressaltou a recomendação do CNJ a respeito da prisão domiciliar em caráter excepcional em função da pandemia e da vulnerabilidade da população carcerária. Ademais, argumentou que a dívida acumulada já tinha sido quitada e que, após o pedido de exoneração de alimentos, os pagamentos persistiram, ainda que de forma parcial.
Contudo, em seu voto o relator Ministro Villas Bôas Cueva evidenciou que a recomendação do CNJ poderia relativizar o disposto no artigo 528, parágrafos 4º e 7º, do Código de Processo Civil de 2015: prisão civil em regime fechado devido ao débito alimentar de até as 3 prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que vencerem no curso processo[4]. Isso porque é inviável que o caráter coercitivo da prisão permaneça, uma vez que a recomendação da Organização Mundial da Saúde (OMS) é no sentido de que todos que puderem fiquem em casa.
Análise do Julgado da Terceira Turma do STJ
Tendo em vista o Projeto de Lei n. 1.179/20, ressalta-se que é compreensível a recomendação do CNJ, porém entende-se como acertada a decisão da Terceira Turma do STJ. Num momento crítico de pandemia, a população tem permanecido em casa, a fim de se evitar a propagação do vírus Sars-CoV-2. Nesse sentido, a substituição da prisão civil em regime fechado pela domiciliar, de fato, faz perder a eficácia do caráter coercitivo.
Há opiniões de que essa suspensão poderia trazer um sentimento de impunidade, posto que a coerção não seria imediata. Assim, haveria o risco de ocorrer a mitigação do bem jurídico tutelado: a vida do alimentando. Ao contrário do posicionamento ressaltado, entende-se, a bem da verdade, que o que acarretaria essa mitigação seria a substituição da prisão civil em regime fechado pela domiciliar.
Conforme já mencionado anteriormente, qualquer medida que restrinja os direitos de locomoção nos mesmos parâmetros da recomendação da OMS poderá diminuir o impacto coercitivo da prisão, uma vez que estamos em distanciamento social devido à situação pandêmica. Inclusive, assim também entendeu a 7ª Câmara de Direito Privado do TJSP em recente julgado:
HABEAS CORPUS. Execução de alimentos. Mandado de prisão expedido. Alegação de ilegalidade da prisão decretada. Dívida incontestável. Valor arbitrado a título de alimentos que foi apontado como fator impeditivo para saldar o débito alimentar vencido e não pago. Afastamento. Admitida a existência da dívida. O habeas corpus é medida judicial que autoriza tão somente o resguardo ao direito de ir e vir, quando violado ou ameaçado por ato ilegal ou praticado com abuso de poder (CF, art. 5º, inc. LXVIII), não permitida a dilação probatória. Rito do artigo 528, § 3º, do Código de Processo Civil, em consonância com a Súmula 309 do Superior Tribunal de Justiça. Situação fática que demonstra inadimplemento das prestações de caráter alimentar desde o mês de janeiro de 2019. Valor arbitrado que deve ser discutida em ação revisional já proposta. Prisão. Expedição de alvará de soltura, pois, a análise ficará suspensa até vencida a pandemia e levantado o estado de calamidade pública nacional, salientando que o fundamento da suspensão seria a proteção da parte alimentanda e não mais do alimentante, como constou nos embargos de declaração [grifo nosso]. Ordem concedida em parte por outro fundamento, com observações.
No voto proferido, o eminente desembargador ressalta que a medida coercitiva seria inócua, já que toda a população está sendo obrigada a permanecer em distanciamento social.
[…] Todavia, a prisão deverá ser suspensa, com expedição de alvará de soltura, até vencida a pandemia e levantado o estado de calamidade pública nacional. Embora tenha julgados no C. STJ determinando que a prisão seja domiciliar, considerando-se a disseminação do COVID-19, aqui, no caso presente, esta punição seria inócua, já que todos somos obrigados a permanecer em isolamento social. A medida restritiva tem o efeito de punir o devedor inadimplente e a prisão domiciliar, na atual conjuntura, privilegiaria em detrimento da parte alimentanda, assim, anoto que a suspensão da prisão civil tem por fundamento a proteção dos alimentandos e não mais a proteção do alimentante, como constou nos embargos de declaração que foram opostos por este[5].
Conclusão
Por um lado, tanto o Projeto de Lei n. 1.179/20 quanto a recomendação do CNJ são no sentido de preservar a vida do devedor, uma vez que não há como praticar o distanciamento social em cárcere. Assim, buscam tutelar a dignidade do ser humano, sem excluir o direito do alimentando. Contudo, em virtude do distanciamento social a que todos estão obrigados, acaba por mitigar o caráter coercitivo da prisão civil.
Por todo o exposto, e com fundamentação no recente entendimento acertado da Terceira Turma do STJ, entende-se possível a suspensão da prisão civil, por dívida alimentar, devido à pandemia da COVID-19. Assim, o mandado de prisão do devedor de alimentos permanecerá em aberto até o fim da recomendação de distanciamento social; momento em que ele cumprirá a pena imposta, não se valendo mais da crise de saúde pública vivenciada em todo o mundo para se eximir do cumprimento em regime fechado.
No mais, caberá ao juízo de origem a avaliação acerca do término da decretação da calamidade pública que atualmente assola todo o território nacional. Por consequência, também a revogação da suspensão da prisão do devedor de alimentos, para o seu devido cumprimento em regime fechado.
[1] Estagiária do escritório Schiefler Advocacia. Graduanda da sétima fase em Direito na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Graduada em Licenciatura e Bacharelado em Teatro na Universidade do Estado de Santa Catarina (UDESC) – 2015.
[2] Art. 6º. Recomendar aos magistrados com competência cível que considerem a colocação em prisão domiciliar das pessoas presas por dívida alimentícia, com vistas à redução dos riscos epidemiológicos e em observância ao contexto local de disseminação do vírus.
[3] Art. 15. Até 30 de outubro de 2020, a prisão civil por dívida alimentícia, prevista no art. 528, § 3º e seguintes da Lei nº 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil), deverá ser cumprida exclusivamente sob a modalidade domiciliar, sem prejuízo das exigibilidades das respectivas obrigações.
[4] Art. 528. No cumprimento de sentença que condene ao pagamento de prestação alimentícia ou de decisão interlocutória que fixe alimentos, o juiz, a requerimento do exequente, mandará intimar o executado pessoalmente para, em 3 (três) dias, pagar o débito, provar que o fez ou justificar a impossibilidade de efetuá-lo.
- 4º A prisão será cumprida em regime fechado, devendo o preso ficar separado dos presos comuns.
- 7º O débito alimentar que autoriza a prisão civil do alimentante é o que compreende até as 3 (três) prestações anteriores ao ajuizamento da execução e as que se vencerem no curso do processo.
[5] TJSP; Habeas Corpus Cível 2035776-32.2020.8.26.0000; Relator (a): José Rubens Queiroz Gomes; Órgão Julgador: 7ª Câmara de Direito Privado; Foro de Mauá – 2ª Vara da Família e Sucessões; Data do Julgamento: 05/06/2020.
Read MoreO testamento é o ato de manifestação de última vontade de uma pessoa acerca do destino dos seus bens e de outros assuntos de caráter não patrimonial, considerado um dos atos mais solenes do ordenamento jurídico.
Laísa Santos[1]
A propagação do novo coronavírus no Brasil e o significativo aumento no número de mortes provocou em todos a reflexão sobre este momento e os efeitos que dele decorrem. Isto pode ser percebido, por exemplo, pelo expressivo aumento nas consultas relativas à gestão patrimonial e à elaboração de testamentos, o que demonstra a preocupação das famílias com a sucessão da herança. Apesar de ainda ser considerado um tabu, o cenário atual fez com que, desde março de 2020, houvesse uma maior procura de indivíduos e famílias para sanar dúvidas a respeito da sucessão patrimonial.
A Associação dos Notários e Registradores do Paraná (Anoreg-PR), por exemplo, afirmou que, desde o dia 8 de março do presente ano, época que coincide com a ampla divulgação da pandemia do novo coronavírus no Brasil, houve um aumento de 70% da procura pelo registro de testamentos[2].
Ainda que a lei determine a transmissão dos bens para os herdeiros diretos, esta divisão de bens costuma gerar inúmeros descontentamentos que se transformam em disputas judiciais desgastantes e demoradas. Para buscar evitar tais judicializações, há diversos instrumentos que podem ser feitos em vida para definir a sucessão patrimonial, dentre elas, o testamento.
Mas afinal, o que é o testamento?
O testamento é o ato de manifestação de última vontade de uma pessoa acerca do destino dos seus bens e de outros assuntos de caráter não patrimonial. É considerado um dos atos mais solenes do ordenamento jurídico, uma vez que a lei determina a observância de minuciosas formalidades para assegurar que a vontade de quem testa (testador) seja livre e fielmente externada.
Via de regra, o testamento é feito para dispor sobre direitos patrimoniais: formas de divisão dos bens, destinação de um imóvel determinado, orientação sobre investimentos, etc. No entanto, o testador poderá dispor também de assuntos de caráter não patrimonial, como o reconhecimento de um filho, a nomeação de um curador para administrar os bens dos filhos menores, a indicação de um beneficiário do seguro de vida ou a nomeação de um tutor para os filhos que ainda não atingiram a maioridade. Poderá, também, dispor sobre os bens acumulados em vida no ambiente virtual, como páginas, contatos, senhas, músicas, perfis e outros elementos adquiridos nas redes sociais.
Para existir, o testamento não depende da aceitação da herança ou da concordância dos herdeiros. Basta a vontade de quem testa e o seu pleno discernimento. Logo, o testamento exige, para a sua validade, apenas a capacidade do testador no momento em que é feito[3].
Salvo exceção, o testamento é considerado como um ato revogável e modificável – por quantas vezes se entender devido – até o momento do falecimento. Ainda, é importante destacar que ele não pode ser simultâneo, ou seja, duas ou mais pessoas não podem dispor de suas últimas vontades em um único testamento.
Tipos mais comuns de testamento
1) Testamento público: é considerado a forma mais segura de realizar a disposição de última vontade, pois é redigido e registrado por um Tabelião em seu Livro de Notas, de acordo com as declarações do testador. Após escrito, ele será lido em voz alta pelo tabelião ao testador e duas testemunhas e assinado na sequência. Em regra, a solenidade do ato (escritura pública) exige o emprego do idioma nacional, diversamente do cerrado e particular, que permitem o idioma estrangeiro. Todavia, há doutrinadores que entendem que o testamento público pode ser lavrado em língua estrangeira, desde que, por ocasião da sua leitura, se faça presente um tradutor juramentado[4].
Junto ao testamento e, com o objetivo de resguardar a própria vontade do testador, pode-se anexar um ou mais atestados médicos, devidamente datados e subscritos por profissionais especializados, onde se comprova que quem testou, no momento do ato, estava em perfeitas condições de saúde mental[5].
Além da vantagem de o testamento público conceder segurança da sua elaboração – por ser realizado pelo Oficial do Tabelionato – resguarda-se, ainda, a inteireza do documento por constar em livro público, possibilitando a obtenção de cópia a qualquer tempo.
No entanto, ressalta-se algumas desvantagens como o custo do serviço – variável de acordo com as taxas e emolumentos vigentes no local – como também pela publicidade, tornando a vontade do testador passível de conhecimento por terceiro.
2) Testamento particular: é uma forma mais simplificada e acessível para dispor de última vontade. Pode ser escrito de próprio punho ou por processo mecânico (computador) e deve ser lido e assinado, ao mesmo momento, por quem o escreveu e por, pelo menos, três testemunhas. Poderá ser escrito em língua estrangeira desde que as testemunhas compreendam a língua.
Importante destacar que já se consolidou, pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), a tese de que são admissíveis determinadas flexibilizações nas formalidades legais exigidas para a validade do testamento particular, a depender da gravidade do vício, para preservar a vontade do testador[6].
Apesar de ser de baixo custo, facilmente elaborado e dispensado de certas formalidades, o testamento particular pode se extraviar com facilidade ou, ainda, ser destruído ou ocultado. Para evitar tais riscos, sugere-se que duas ou mais vias deste testamento sejam deixados pelo testador com diversas pessoas de sua confiança, em lugares diferentes[7].
Ainda, é importante destacar que, após o falecimento, as testemunhas que o subscreveram deverão ir a juízo para confirmá-lo, o que poderá ser mais um óbice na hora de optar por este tipo de testamento.
3) Testamento de urgência: Ainda que seja uma modalidade de testamento particular, cabe aqui destacá-lo em virtude da situação atual vivenciada. Em circunstâncias excepcionais, caracterizadas como situações imprevisíveis que fogem por inteiro à normalidade e ocasionam graves riscos de vida à pessoa, impedindo o acesso aos meios regulares para testar e pela absoluta falta de quem possa testemunhar o ato, é permitido testar, de próprio punho, sem a presença de testemunhas.
Contudo, há alguns requisitos a serem cumpridos. É imprescindível que o ato seja assinado e que haja, junto às disposições finais, uma declaração expressa explicando sobre a circunstância excepcional. Na atual conjuntura, acrescentar-se-ia a recomendação das autoridades públicas ao distanciamento social. Caso não sejam seguidas as exigências, haverá invalidade da disposição testamentária.
Apesar de o testamento de urgência não se enquadrar nos tipos de testamentos especiais (marítimo, aeronáutico ou militar), há doutrinadores que entendem que, por ser feito em situação excepcional, deveria ser passível de um mesmo requisito dos testamentos especiais, qual seja, o prazo de caducidade. Neles, se o testador não falece no evento especial ou nos 90 dias subsequentes ou, se, ao fim das circunstâncias excepcionais que autorizam a sua confecção, o testador, podendo fazê-lo, não testar por uma das formas testamentárias ordinárias[8], o testamento perderá sua eficácia. É o que está previsto no Enunciado 611 da 7ª Jornada de Direito Civil.
Este tipo excepcional de testamento está previsto no artigo 1.879 do Código Civil e, apesar de o dispositivo condicionar a validade do ato ao crivo judicial, não há dúvidas de que ele se encaixa perfeitamente a este momento de pandemia. No entanto, aconselha-se que, uma vez relaxadas as medidas de restrição do novo coronavírus, o testamento seja refeito para evitar o enfrentamento de argumentações dessa ordem.
4) Testamento cerrado (secreto): É escrito pelo testador ou por outra pessoa a seu rogo, ficando sujeito à aprovação do tabelião. O conteúdo é, em regra, sigiloso, somente sendo conhecido pelo próprio testador. Este tipo de testamento é composto de duas partes: a carta testamentária propriamente dita, com o ato de última vontade do testador, e o auto de aprovação, redigido pelo tabelião. A entrega do documento será realizada na presença de duas testemunhas e ele poderá ser escrito em língua nacional ou estrangeira.
Após a leitura do auto de aprovação, o instrumento é cerrado, cosido e entregue ao testador. O tabelião, por sua vez, lançará em seu livro nota do lugar, dia, mês e ano em que o testamento foi aprovado e entregue. Embora não exista o costume dos testadores deixarem o testamento cerrado depositado no cartório onde foi aprovado, nada impede que isso ocorra.
Tal atitude, inclusive, resguardaria o testador sobre a guarda e manutenção do documento. Apesar da vantagem do sigilo absoluto do documento, o custo financeiro da sua submissão a aprovação do notário, bem como a manutenção do documento por pessoa de confiança do testamento, acaba gerando inúmeros impasses, que fazem com que este tipo de testamento seja raramente utilizado.
É importante que o ato seja realizado com o auxílio de um advogado de confiança, visto que há formalidades inerentes ao testamento que podem, inclusive, gerar nulidade do documento.
E qual é o tipo de testamento mais apropriado?
Não existe um tipo de testamento mais apropriado que se encaixe em todas – ou quase todas – as situações. É necessário averiguar não somente a totalidade do patrimônio, como também a existência e a quantidade de herdeiros e o objetivo principal do próprio testador. São inúmeras as variantes para um planejamento adequado.
Além disso, embora o testamento seja um dos mecanismos de planejamento sucessório mais utilizados, existem outros meios capazes de satisfazer a vontade da pessoa. Doação, contrato de compra e venda, seguro de vida, codicilos, legado, constituição de sociedade holding, offshore ou fundos de investimento são algumas das inúmeras possibilidades para um planejamento patrimonial.
Ainda que o momento atual de pandemia faça com que as pessoas pensem mais sobre a finitude e a importância do planejamento sucessório, há de se ter cautela. O testamento – ou qualquer outro instrumento utilizado para planejamento sucessório – quando realizado sem a devida atenção pode não garantir que todas as disposições sejam cumpridas de acordo com aquele que planejou ou, até, gerar mais despesas (incidência de impostos, custos com a defesa judicial de seu conteúdo e validade, dentre outros) do que o necessário.
Para todos os casos, é essencial a presença de um advogado especialista na área para um acompanhamento jurídico e auxílio na elaboração da sucessão desejada.
[1]Advogada. Pós-Graduanda em Direito de Família e Sucessões pela Escola Brasileira de Direito (EBRADI). Especialista em Planejamento Sucessório pela Fundação Getúlio Vargas (FGV/SP). Graduada em Direito pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC). Membro do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM) e da Comissão de Direito de Família da OAB/SC. Co-autora do livro “Desafios Contemporâneos do Direito de Família e Sucessões” (2018) e de artigos.
[2]https://noticias.r7.com/economia/cartorios-tem-aumento-na-procura-por-testamentos-apos-coronavirus-17042020. Acesso em 03/05/2020.
[3] SIMÃO, José Fernando. Arquitetura do planejamento sucessório/ Daniele Chaves Teixeira (coord). 2. ed. rev. ampl. e atual. – Belo Horizonte: Fórum, 2019, p. 504
[4] FONSECA, Priscila Corrêa da. Manual do Planejamento patrimonial das relações afetivas e sucessórias. São Paulo: Thomson Reuters, Brasil, 2018, p. 360
[5] CARVALHO, Luiz Paulo Vieira de. Direito das sucessões. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2017, p. 600-601
[6] Rosa, Conrado Paulo da. Inventário e Partilha. Salvador: Editotra JusPodivm, 2019, p. 222
[7] Veloso, Zeno. Comentários ao Codigo Civil: parte especial: direito das sucessões, vol. 21. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 141.
[8] Rosa, Conrado Paulo da. Inventário e Partilha. Salvador: Editora JusPodivm, 2019, p. 224
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É preciso ficar atento às eventuais mudanças que a pandemia gerará no cotidiano familiar, bem como às alternativas jurídicas aptas a buscar a readequação momentânea e o reequilíbrio dessas relações.
Laísa Santos[1]
Gustavo Schiefler[2]
É inegável que o caos provocado pela pandemia da COVID-19 afetou não só a rotina e a economia do mundo, mas também as relações familiares.
Durante o período de quarentena, por exemplo, várias cidades da China registraram um recorde no número de pedidos de divórcios. Em alguns distritos, todos os horários disponíveis em escritórios locais estão superlotados para tratar sobre o assunto[3]. Já na França, o governo anunciou nesta segunda-feira (30/03) que pagará quartos de hotel para vítimas de violência doméstica e abrirá centros de aconselhamento após dados mostrarem que o número de casos de abusos subiu consideravelmente durante a primeira semana de quarentena[4].
No Brasil, pode-se esperar um grande impacto nas relações familiares dentro de algumas poucas semanas. Pagamento de pensões alimentícias, visitas e períodos de convivência sofrerão alterações. A reorganização da rotina, da convivência com o cônjuge, dos dias em que cada genitor permanecerá com as crianças ou com os idosos e a forma de prestar alimentos também passará por modificações e readequações.
Nesse contexto, o Superior Tribunal de Justiça concedeu, nesta última quarta-feira (25/03), habeas corpus coletivo para todos os presos por dívidas alimentícias no país em virtude da pandemia da COVID-19[5]. Com essa decisão, todos os devedores passarão a cumprir a sanção em regime domiciliar. As condições de cumprimento, entretanto, ainda serão estipuladas pelos juízes estaduais, inclusive quanto a sua duração.
Assim como o Tribunal de Justiça do Paraná[6], o Tribunal de São Paulo[7] também restringiu a convivência física entre pai e filho em situações que colocariam o menor ou familiares em risco de contrair a doença.
Já o juiz Iolmar Alves Baltazar, da 1ª vara de Balneário Piçarras, no litoral norte de Santa Catarina, negou nesta terça (31/03) o pedido de uma mãe que pretendia levar seu filho pequeno a Londres para conhecer a família do pai. Nesta situação específica, além de o genitor ter se recusado a assinar a autorização da viagem, o fator decisivo para a negativa foi a pandemia do novo coronavírus.
Na decisão, o juiz ressaltou a importância da viagem para conhecer o parentesco paterno. Todavia, argumentou que no momento pelo qual atravessa a humanidade frente à presente pandemia, uma viagem internacional ao continente europeu violaria, inclusive, o melhor interesse e proteção da criança em questão[8].
Já na 1ª vara da família e registro civil da capital do Recife, o magistrado Clicério Bezerra celebrou um casamento de forma virtual na terça-feira (17/03). Segundo ele, foi a forma encontrada para tentar evitar a proliferação do coronavírus, impedindo aglomerações e, ao mesmo tempo, impedindo a frustração dos noivos[9].
Não há dúvidas sobre os impactos que a pandemia e o isolamento social trarão para as relações familiares. E é exatamente por implicar repentinas mudanças e, consequentemente, conflitos, que situações como as expostas chegarão ao Poder Judiciário, a quem caberá resolver de maneira ágil e adequada, buscando priorizar o equilíbrio entre as relações bem como o melhor interesse da criança frente à atual situação imposta por esta pandemia.
Especificamente com relação à proteção da saúde dos infantes, é necessário o bom senso dos pais que transitaram por locais de risco ou que tiveram contatos com pessoas que possuem sintomas ou testaram positivo para o vírus em manter distanciamento temporário dos seus filhos. Igualmente, é importante que sejam seguidas as orientações dadas pela Organização Mundial da Saúde (OMS) e do município e/ou estado sobre a circulação em estabelecimentos públicos ou privados.
Por outro lado, pais que mantêm a guarda da criança ou que estão responsáveis por ela nesse período de quarentena devem utilizar de toda a tecnologia disponível para que haja a manutenção do contato e dos laços com o outro genitor. Assim como determinou a juíza do Paraná no caso supracitado, os aparatos digitais podem ser o caminho para remediar os impasses existentes, visto que a convivência virtual pode auxiliar a manter aquilo o que a Constituição Federal garante a toda a criança e adolescente, qual seja, o direito de se relacionar e desenvolver em contato com ambos os núcleos familiares.
Necessário ressaltar que o distanciamento físico não representa, na maioria dos casos, em distanciamento afetivo. Os meios virtuais podem – e devem – ser instrumentos para aumentar os laços afetivos entre pais e filhos.
Outro ponto delicado a ser enfrentado em breve pelo judiciário é quanto ao pagamento das pensões alimentícias. Inevitavelmente a reviravolta econômica trará severas consequências no pagamento das verbas alimentícias, impactando a realidade das famílias com o agravamento das dívidas.
Para aqueles que pagam sob um percentual dos seus rendimentos líquidos, embora possa existir uma redução do salário, a questão estará mais facilmente resolvida. Todavia, em relação aos trabalhadores autônomos ou empresários que enfrentarão quedas ou interrupções do trabalho, é provável que haja uma corrida ao judiciário para ajuizar ações revisionais que objetivem a diminuição do valor pago.
Essas e outras tantas situações evidenciam brevemente os impactos que a COVID-19 têm nas relações familiares. Diante deste contexto, é preciso ficar atento às eventuais mudanças que a pandemia gerará no cotidiano familiar, bem como às alternativas jurídicas aptas a buscar a readequação momentânea e o reequilíbrio dessas relações.
[1] Advogada, graduada pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), pós-graduanda em Direito de Família e Sucessões pela Escola Brasileira de Direito (EBRADI) e especialista em Planejamento Sucessório pela Fundação Getúlio Vargas (FGV).
[2] Advogado. Doutor em Direito do Estado (USP). Mestre e graduado em Direito (UFSC).
[3] https://www.bbc.com/portuguese/internacional-52012304. Acesso em 26/03/2020.
[4] https://www.poder360.com.br/internacional/franca-colocara-vitimas-de-violencia-domestica-em-hoteis/. Acesso em 31/03/2020.
[5] http://www.stj.jus.br/sites/portalp/Paginas/Comunicacao/Noticias/STJ-estende-liminar-e-concede-prisao-domiciliar-a-todos-os-presos-por-divida-alimenticia-no-pais.aspx. Acesso em 26/03/2020.
[6] […] A medida é necessária no caso em apreço considerando a informação de que a criança reside com pessoa enquadrada em grupo de risco, de acordo com a classificação do Ministério da saúde, já estando, inclusive, em isolamento domiciliar. Friso, novamente, que se trata de uma medida temporária, num momento em que os cuidados para com a criança devem ser adotados por ambos os pais, não se rompendo por completo o convívio com nenhum dos genitores, ainda que esse contato se dê de forma virtual. Neste caso, pensando no bem-estar da criança e visando evitar a ruptura do vínculo paterno-filial, adequado que se mantenha o convívio paterno de forma segura mediante chamada de vídeo nos mesmos dias de visitação acordados entre as partes. (TJPR, Juíza Fernanda Maria Zerbeto Assis Monteiro, Decisão 20/03/2020).
[7] […] Como no momento vivenciamos situações de excepcionalidade, dadas as restrições de locomoção de pessoas em todos os continentes, a situação a que a autora se refere guarda perfeita relação de pertinência. Em razão da pandemia decorrente da propagação do coronavírus, é realmente recomendável, por força da profissão exercida pelo requerido. As visitas do pai a filha até o dia 21 de março ficam suspensas, a partir da data ele deverá exercer o seu direito normalmente, caso não tenha apresentado nenhum dos sintomas da gripe causada pelo coronavírus”. (TJSP, 1014033-60.2018.8.26.0482, Juiz Eduardo Gesse, Decisão 18/03/2020)
[8]https://www.tjsc.jus.br/web/imprensa/-/negado-pedido-de-mae-que-queria-fazer-turismo-com-filho-no-exterior-em-plena-pandemia?inheritRedirect=true&redirect=%2F. Acesso em 31/03/2020.
[9]https://www.leiaja.com/noticias/2020/03/20/em-tempo-de-covid-19-juiz-realiza-casamento-virtual. Acesso em 31/03/2020.
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